Classe dos Guerreiros - A Sexta Geração escrita por Milady Sara


Capítulo 3
Recrutamento


Notas iniciais do capítulo

Caraca, como eu fiquei feliz com os primeiros comentários! Tive medo de acontecer o que houve com minha última fic, que os comentários só vieram depois de eu termina-la BUT... Enfim, aqui vai mais um cap :)



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Por uma estrada esburacada, andava uma carruagem. Era elegante, completamente fechada, e sem cavalos. Movia-se sozinha, e algumas pessoas que andavam na mesma estrada pareciam impressionadas por um instante, até perceberem do que se tratava.

Era época de recrutamento dos Guerreiros, então, ver coisas como carruagens que andam sozinhas, se tornavam comuns na época.

A carruagem sacolejava violentamente em alguns pontos da estrada, até que finalmente chegou ao seu destino. Uma pequena cidade, humilde e constituída de duas ou três ruas, casas e comércios enfileirados lado a lado e algumas fazendas que ficavam nosarredores.

A carruagem parou na entrada da cidade. Ninguém pareceu se surpreender, há meses o prefeito falava do incrível evento que seria escolha da próxima geração da Classe Hélio bem ali, na pequena cidade Urano.

A porta do veículo se abriu. De dentro dele saiu uma mulher que deveria ter no máximo vinte anos. Ela usava uma blusa branca, jaqueta de couro e calças jeans que quase batiam no chão, deixando a mostra somente os saltos de suas botas. Seus cabelos estranhamente brancos estavam amarrados em um alto rabo de cavalo e mesmo assim eles batiam em sua cintura.

E em seu pescoço pendia um colar de ouro. Nele havia um pingente grande que ficava na altura de seu peito, algo aparentemente simples. Um círculo com um corvo dentro, e os olhos da ave eram pequenas ametistas. Aquilo era sua identificação. Quem visse aquele colar, apesar de não saber quem era, saberiam o que era.

Seus olhos cinzentos percorreram a cidade. As casas eram de madeira desbotada e em algumas era possível ver indícios de cupins. As mulheres usavam vestidos sujos e os homens simples coletes também sujos, aos olhos dos cidadãos, a mulher misteriosa era uma espécie de deusa.

– Esse lugar parou no tempo. – falou consigo mesma fechando a porta da carruagem. A cidade Urano, décadas atrás fora um ponto estratégico do reino na guerra contra os lobisomens, hoje era um lugar paupérrimo que o governo fingia não existir mais. Ela mesma achava que o lugar hoje não passasse de uma terra em ruínas, até os Videntes a mandarem para lá, dizendo que aquele seria o lugar onde ela encontraria seus aprendizes. – Vamos lá.

A mulher de cabelos brancos começou a andar, o lugar onde encontraria seus discípulos e outras crianças inúteis era um bar. Que lugar perfeito para isso. Enquanto andava, viu ao lado da porta da hospedaria, um cartaz com os dizeres:

Não percam! Em duas semanas, seleção para a classe Hélio!

Com direito a presença da nova mestra, Marin Curtis no Soldado Mordido às 10 horas!

Tragam suas crianças!

A boca de Marin se abriu em indignação, e ao ver que havia diversos cartazes como aquele em quase todas as paredes, seus olhos brilharam violetas como sempre acontecia quando estava com raiva. Fora transformada em atração turística!

Quase queria que o prefeito tivesse ido recepcioná-la, só para poder dar um soco na cara dele. Mas os políticos evitavam os Guerreiros, então teria de se controlar para não bater em algum cidadão.

Agora sim aquela seleção seria horrível. Com aqueles cartazes, dezenas de crianças iriam aparecer. Com os punhos cerrados, andou até o bar. Uma construção de madeira como tudo na cidade, com uma placa em que estava escrito “Soldado Mordido” com o desenho de um homem com o braço marcado por dentes. Chegando a porta dele, ouviu os gritos.

– Que droga... – resmungou ouvindo a algazarra feita pelas crianças. Respirou fundo e entrou. O som do pequeno sino em cima da porta fora abafado pelos gritos de pelo menos sessenta crianças que se amontoaram no pequeno local. Elas pulavam corriam e derrubavam móveis. – Bebês... – disse ao ver crianças de colo em cima de uma mesa. Sentou-se no balcão e escondeu o rosto nas mãos.

– Sinto muito por isso. – Marin levantou os olhos e viu um homem gordo de bigode limpando um copo.

– Não mais do que eu...

– Pode apostar que sim. Essas coisas vão me dar um grande prejuízo! – o homem parecia levemente zangado. –Mas mesmo assim vou lhe dar uma bebida por conta da casa. O que vai querer?

– Obrigada. Qualquer vinho que você tenha... – a mulher tinha medo de se virar e ver aqueles projetos de seres humanos quase que desafiando-a como se dissessem “Ei, você não vai conseguir fazer sua tarefa senhora esquisita com cabelos de vovó!”. O homem do bar colocou uma taça a frente de seu rosto e encheu com um líquido vermelho sangue que Marin bebeu de um gole só, e virou-se para enfrentar seu maldito dever.

As crianças ainda não haviam percebido sua presença, até ela se levantar e ficar na frente deles. Uma a uma, as crianças se calaram, ficando paralisadas.

– Sentem-se. – disse a mulher com ar autoritário, e rapidamente os pequenos se sentaram no chão a frente dela. Eram muitas, mas muitas crianças. – Todos aqueles... – falou colocando os dedos nas têmporas e falou devagar. – Que estiverem aqui porque foram mandados, por acharem que isso será fácil, tiverem um lar para voltar, tiverem menos de seis anos de idade ou não tiverem nenhum poder mágico... – muitas crianças arregalaram os olhos. – Vão embora. Agora!

Marin observou enquanto praticamente todas as crianças se levantavam envergonhadas, algumas pegaram os bebês no colo, e saíam pela porta devagar causando uma pequena comoção.

E quando a multidão desapareceu, só sobraram ali, ela, o homem de bigode, três garotas e dois garotos. Nenhuma das crianças que estiveram ali antes estava exatamente limpa, mas esses cinco eram piores. Além de muito sujos, estavam machucados, pareciam famintos e mal. Todos estavam encostados na parede, separados, sentados e encolhidos.

– Venham aqui. – disse Marin, e as crianças se postaram na frente dela. Eles cambaleavam, um menino e uma menina de cabelos castanhos somente se arrastaram e uma meio loura mancava. A mulher se abaixou, apoiando os joelhos no chão. – Só sobraram vocês... – os pequenos olhos a fitavam neutros, o que era estranho. A maioria das crianças tinha medo dela, de sua aparência. – Vocês têm casas para voltar? – todos sacudiram as cabeças negativamente. Marin cerrou os olhos. – Mostrem seus pés.

As crianças esticaram as pernas, e os que tinham sapatos os tiraram e Marin se surpreendeu. Os pés do garoto descalço e das meninas de cabelo mel e ruivo estavam repletos de calos. Os do outro garoto, repleto de bolhas, e os da menina de cabelo castanho, com tudo isso, e arranhado, algumas partes em carne viva.

– Quais seus nomes? – ela perguntou com um pingo quase imperceptível de compaixão, e eles responderam pela ordem em que estavam sentados.

– Hunter. – disse o menino descalço.

– Lena. – disse a menina de vestido.

– Drica. – disse a menina ruiva.

– Caleb. – disse o menino de cabelos castanhos.

– Mia. – finalizou a menina que tinha os pés machucados. Marin assentiu ao ouvir nome de cada um.

– Eu disse para os que não tinham magia saírem... O que vocês podem fazer?

Hunter olhou para a mulher, até seu rosto mudar, assumindo as feições felinas que usara para fugir.

Lena pegou um graveto que havia em seus cabelos assanhados, e em sua mão ele se tornou um cabo, do tipo para martelos.

Drica levou sua mão a lateral da testa de Caleb, onde havia um corte, este se encolheu enquanto seu machucado sarava.

Em seguida o garoto pegou o cabo que Lena havia feito, o apertou em suas mãos calejadas e sua pele se tornou igual à madeira.

E Mia, somente colocou sua mão na frente do rosto, e nesta surgiu uma chama que parecia dançar em seus dedos.

As crianças pareciam mais impressionadas umas com as outras do que Marin com todos. Ela somente sorriu, voltou ao balcão e falou algo ao homem de bigode. As crianças se entreolharam confusas, mas logo a mulher voltou com uma bandeja com cinco copos grandes, os quais deu um para cada pequeno.

– Bebam. É caldo de hima, uma planta rara que só cresce por aqui. – os cinco pareciam intrigados com aqueles copos fumegantes em suas mãos, que exalavam um cheiro delicioso. – Andem, acho que precisam de algo quente para beber.

As crianças bebericaram da bebida, e logo a tomavam com desespero, só então percebendo o quando estavam com sede e fome. Marin as observava curiosa, lembravam muito ela mesma quando fora recrutada. Sozinha, ferida de diversos modos e faminta.

– Não sei exatamente o que dizer para vocês então... – os pequenos ainda bebiam vorazes o caldo, mas baixaram um pouco os copos para ouvir a mulher de cabelos brancos. – Vou dizer o que o meu mestre disse para mim. – respirou fundo. – Sei pelo que vocês tem passado. Podem achar que não, mas sei. Não ter um lugar para voltar, ser perseguida ou mesmo rejeitada... – os cinco ouviam com interesse. – Somos iguais. E provavelmente por isso estão aqui. Olhem uns para os outros. – as crianças se entreolharam novamente. – Todos vocês são iguais. Tem algo em especial, algo que os fez sofrer, mas que os torna quem são. Vocês agora são uma família. Antes não tinham ninguém, mas agora tem uns aos outros e a mim. Então só preciso perguntar... Querem vir comigo? Será uma jornada dura, mas acreditem... – Marin olhou para baixo momentaneamente. – Será a melhor oportunidade de suas vidas. – todos sacudiram as cabeças afirmativamente. – Perfeito. – disse a mais velha com um sorriso. – Deixem o copo no balcão, e agradeçam a esse senhor. Vamos para sua nova casa.

Um a um, os pequenos deixaram seus copos no balcão de madeira e sussurraram “obrigado” para o homem, e foram até a porta.

– Lena e Drica... Podem ajudar Mia, por favor? – disse Marin ao ver Mia mal conseguir se manter em pé. As duas garotas obedeceram prontamente, colocando cada uma, um braço de Mia em volta do pescoço apesar de seus próprios pés doerem muito . – A carruagem está na entrada da cidade. – quando os cinco passaram pela porta, a mulher pôs a mão no bolso da calça e colocou seis moedas de ouro no balcão.

– Ei! – gritou o homem de bigode enquanto Marin passava pela porta. – Isso é muito! E eu disse por conta da casa!

– Eu sei. – disse a mulher com um sorriso e foi em direção a sua carruagem. Ao lado desta, havia um homem barbado, com roupas melhores e mais bem cuidado que o resto da cidade. Ele olhava para as crianças parecendo confuso. – Entrem crianças. – disse Marin abrindo a porta da carruagem e fitando o barbado.

– Eu sou o...

– Prefeito. – completou a mulher. – Já imaginava.

– Er... Que crianças eram aquelas? Não são da cidade!

– Olha... – disse Marin devagar. – Eu vou falar pessoalmente com alguns ministros para trazer essa cidade de volta ao mapa, por causa do que vi aqui. E vou me certificar de que você seja demitido do cargo.

– O-o que?

– E mais! – continuou com os olhos brilhando violeta. – Nunca mais, faça os Guerreiros de piada! – o home suava. –Isso não foi um concurso, foi um recrutamento! Não nos trate como se ser o que somos fosse fácil! – e se controlando, entrou na carruagem e fechou a porta. Por dentro, o transporte era tão simples quanto por fora. Somente dois bancos estofados e macios um de frente para o outro, e das janelas era possível olhar do lado de fora, mas o contrário não.

Marin tirou uma esfera de cristal do bolso, pouco menor do que uma maça, do bolso da jaqueta e a colocou num espaço próprio para ela ao seu lado, numa das paredes da carruagem. Fumaça começou a se formar na esfera, e a carruagem a andar.

– Tudo bem. – falou para as crianças. – Vamos para a capital central, lá vamos poder conversar melhor. Até lá, podem dormir. – levantou um dedo e o mexeu levemente para o lado, os pequenos caíram uns sobre os outros, dormindo profundamente. Marin não queria enfeitiça-los, mas sabia que de outro modo suas pequenas mentes não descansariam.

Olhando para as gotas de chuva que caíam na janela de vidro da carruagem, a mulher de cabelos brancos lembrava-se do dia em que fora recrutada.

~*~

A viagem já durava horas e estava perto do fim. Marin pegou um pequeno pedaço de vidro do bolso de sua jaqueta e o colocou na palma da mão. Logo, duas imagens se projetaram acima do vidro.

Uma era de um homem moreno, com cabelos castanhos e um sorriso simpático. E a outra era uma mulher com cabelos negros e lisos em um corte Chanel e olhos azuis. Ambos usavam colares como o de Marin, mas no do homem, ao invés de um corvo havia uma raposa com olhos de esmeralda e no da mulher uma lontra com olhos de opala.

– Seth, Cassandra. – disse Marin.

E aí! – disse o homem.

Olá! – disse a mulher.

Estávamos nos perguntando quando você entraria em contato. – disse Seth. – Depois que mandaram você para Urano... Bem, admito que achei que ia ser difícil.

Idem. – disse Cassandra.

Mas claro, você conseguiu!

– Pois é... – disse Marin rindo levemente.

E então, qual o futuro da classe Hélio?

– Recrutei cinco. – virou o espelho de modo que as projeções vissem as crianças dormindo no banco da frente. – Estão acabados... Mas tem poderes incríveis e acho que posso dar conta. E vocês?

Bem,– disse Cassandra. – Quase não aguentei o frio daqui das terras do norte, mas... Consegui achar duas crianças perto de uma caverna. – a imagem de Cassandra tremeu e Marin e Seth viram um menino e uma menina, esta mais nova, dormindo um sobre o outro. A imagem tremeu novamente e voltou para o rosto da mulher de cabelos pretos. – Tem poderes incomuns e raros, uma boa aquisição para a classe Torin.

– E você Seth?

Fui até rápido na verdade... Quando os Videntes me mandaram retornar a minha terra natal achei que fosse a cidade onde me recrutaram, mas por sorte parei no caminho para dar uma olhada no orfanato onde fui criado e achei essa belezura. – o rosto de Seth se desfocou e mostrou uma garota de cabelos curtos, quase um corte masculino deitada, e logo voltou para o homem. – Achei que nunca iria encontrar alguém que me agradasse, mas graças aos céus a classe Giebra não vai terminar em mim!

Os três se encararam um segundo. Anos atrás quando se conheceram, jamais pensaram que seriam eles a pegarem os cargos de mestres de suas classes. E ali estavam eles, dando início a uma nova geração.

– Bem... – disse Marin quebrando o silêncio. - Vamos começar com os procedimentos, e quando tudo estiver certo entramos em contato para a iniciação. Certo?

Ok. – disse Cassandra.

Tudo bem. – concordou Seth.

– Até então. – Marin deu um curto aceno para seus amigos, que retribuíram o gesto, e o rosto dos dois sumiu. Suspirando, a mulher de cabelos brancos olhou para o céu.

Só esperava ser uma boa mestra para aquelas crianças, assim como o seu fora para ela e seu irmão.


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Notas finais do capítulo

E então e então e então e entããããããão, o que acharam???



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