A Areia Vermelha escrita por Phantom Lord


Capítulo 12
Capítulo 11, Nas entranhas escuras




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Os holofotes me cobrem quando me ponho ao lado de Katniss. Ambos estamos sorrindo, sorrisos que não tenho certeza se são verdadeiros. Bom, o meu é. De certa forma. Estou feliz porque ela agora está em minhas redes. Meu gosto sádico vem à tona quando sugiro:

_ O que vocês acham de organizar uma cerimônia de casamento aqui mesmo na Capital?

_ Nada poderia ser mais brilhante e maravilhoso, presidente!_ diz Katniss quase rasgando os cantos da boca. Ela sorri de modo estranho, como se estivesse convicta do que está dizendo. É quase uma resposta real.

Peeta consente com um gesto com a cabeça e inicia os aplausos que se seguem na multidão que nos assiste. Caesar Flickerman se dirige a mim quando pergunta:

_ E o senhor presidente tem uma data em mente para esta belíssima festa?

_ Oh._ hesito falsamente._ Antes de marcarmos uma data, é melhor esclarecer tudo com a mãe de Katniss..._ contorno o ombro de Katniss com meu braço direito._ Talvez se o país todo tiver isso em mente, possamos casá-la antes dos trinta anos.

Todos riem. Ela própria ri, menos tensa do que o normal e diz:

_ Você provavelmente terá de aprovar uma nova lei...

_ Se for necessária._ digo e dou uma risada divertida. Ela faz o mesmo e a multidão recomeça os aplausos, gritos e risadas de aprovação. Está tudo tão maravilhoso que eles sequer desconfiam do que pode estar acontecendo.

Mas está acontecendo. Essa conversa improvisada me embrulha o estômago. Isso convence apenas os tolos da Capital. Mas não aquela gente que vive em ruelas distritais, se martirizando enquanto tenta convencer a nação de que são revolucionários.

Seja lá como for, eu já tenho tudo planejado. Plutarco tem sido bem útil sugerindo-me um meio de silenciar essa revolução de modo que Katniss Everdeen seja destruída sem evidências da participação intencional da Capital. Para tanto, ele explica que a nova edição dos Jogos Vorazes sairá bastante cara para os cofres do Governo de Panem.

No fim, o resultado é satisfatório. Estou ansioso para anunciar de que forma estou para aniquilar Katniss e todos esses inimigos. Mas devo aguardar o momento certo.

Não é necessário dizer que tal casamento não passa de uma lorota que irá iludir um pouco mais os cidadãos mais idiotas. Em especial, esse povo abobalhado e superficial que mora em torno da minha mansão. Enquanto eu atravesso o salão de festas da mansão estou pensando sobre como isso afeta aqueles que sabem que o que acontece aqui é muito menos do que amor juvenil e mais do que um simples ato de desespero. Imagino o quanto estão furiosos, sedentos do meu sangue. Mas e em relação à Katniss? O que ela é para eles? Um símbolo de revolução ou uma evidência de que eu domino o país?

As duas coisas, eu imagino. Todos assistem o modo como ela desesperadamente anseia pela sobrevivência. Como tenta enganá-los, dizendo-se apaixonada demais com Peeta Mellark para se preocupar com o fato de que é um símbolo de rebeldia, mas eles sabem que não é a verdade. Sabem que ela está sendo obrigada a fazer o que faz diante das câmeras. Isso talvez os desanime um pouco. Saber que embora tentem, até mesmo a menina que desafiou a Capital teme pela vida.

Estou me dirigindo à Sala de Chá. Quero ficar lá enquanto essa festinha durar. Meus pensamentos estão se desenrolando e eu sinto que o controle será recuperado em breve. Desta vez, não bebo chá enquanto penso, apenas permaneço sentado como uma estátua de olhos vidrados.

Mais tarde, eu decido caminhar pelos corredores. A mansão é tão grande que ainda existem quartos que nunca visitei ou que já fazem muito tempo que não ponho os pés. Descubro uma sala cheia de espelhos oxidados. A sala chama minha atenção porque por onde quer que eu olhe há muitos outros presidentes Snow me encarando.

Descubro outra sala que se parece um pouco com o meu gabinete. No entanto ela é inteiramente oval e no lugar do símbolo de Panem no carpete, há uma águia. Uma bandeira de faixas vermelhas e brancas e um retângulo azul estrelado está imóvel e empoeirada num suporte de madeira. Há uma placa enorme de pedra na parede em que leio o seguinte:

“Réplica do Salão Oval, Casa Branca – Washington D.C. – EUA”

E mais abaixo a lista de antigos presidentes daquela nação. Lendo um por um, começo a imaginar seus rostos. Tenho certeza que alguns viveram há muito tempo, mas será que lidaram com conspirações como está acontecendo agora em Panem?

Passo por mais alguns corredores e subo as escadas para os andares superiores. Uma sala de jantar, sala de TV, biblioteca antiga, Sala de Tesouros. Essa última é gigantesca e tem tantos itens empilhados ou embrulhados que desperta meu interesse também. Não há muitos tesouros de matéria preciosa, mas parecem ser relíquias muito antigas das épocas em que a grande catástrofe que levou à criação de Panem ainda não havia acontecido. Passo a mão sobre um punhado de livros empoeirados e descubro títulos distintos, desde contos infantis até edições antigas de livros populares que temos ainda hoje na Capital.

Há um retângulo grande sobre uma estrutura de madeira, envolto em papel pardo preso por barbantes. Eu o desembrulho e descubro que é um quadro. É pesado demais para que eu possa transportá-lo ou mesmo carregá-lo. A sala está escura, mas apanho uma lanterna deixada sobre uma velha estante de carvalho e ilumino a tela. É uma mulher estranha, de rosto esbelto e um sorriso pouco sugestivo. Ela tem os braços cruzados sobre vestes de um estilo bem antigo. Pelo modo como ela está tão naturalmente representada, penso que ela realmente viveu e talvez fosse alguém importante. Só então noto uma etiqueta plástica na ponta direita inferior da parte de trás da tela com letras minúsculas. Meu interesse se esvai e eu leio apenas as letras “DV” estampadas no topo da etiqueta.

Este ponto da casa é tão isolado que sequer escuto qualquer ruído, seja música ou vozes. Este breve momento de solidão me traz uma calma que não sinto há dias. Consigo me deixar esquecer todas essas coisas que me afligem e que eu secretamente guardo debaixo de todo o meu sentimento de controle total sobre as coisas. Estou suspirando tranquilamente quando arrasto meus pés de volta para o corredor.

Eu sei que estou absolutamente inconstante e muito disperso, mas é assim que deve ser, pelo menos até que tudo retorne aos eixos. Porque sinto que as coisas estão perecendo, se esfarelando entre meus dedos. As pessoas começam a me olhar de modo diferente. A rosa branca já não tem um efeito amedrontador, ela apenas parece algo que garante que o cheiro do sangue que vaza das minhas feridas não incomode tanto quem se aproxima. Minha própria silhueta parece mais fina e endurecida. Snow, como você está velho.


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