Somewhere I Belong escrita por Akasha Korhinny Aylam


Capítulo 1
Capítulo Um: O Sacrifício do Cordeiro


Notas iniciais do capítulo

Bem, originalmente, ela tinha um cap. apenas. Mas tenho pavor de caps gigantes, então fragmentei-a em quatro ^-^ Espero que agrade.
Boa Leitura...



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Era início de mais uma noite de outono europeia. Uma van comportando um grupo de nove amigos avançava pela estrada deserta. Seu destino era a reluzente Paris. O padrinho de um dos rapazes convidara-o para ficar do feriado de Halloween ao Dia de Finados em sua casa. E permitira que levasse alguns amigos.

Chovia bastante, e pensar que menos de quatro horas atrás fazia um calmo sol. As gotas de água colidiam com avidez contra a superfície externa do veículo prata, como os punhos de quem grita por socorro à porta alheia. Essa visão fazia um estranho sentimento se revolver dentro do peito do mais belo do grupo, que se encontrava à deriva em pensamentos no fundo da van.

When this began I had nothing to say

And I'd get lost in the nothingness inside of me

Tentando livrar-se daquela sensação, Shun moveu os olhos para o interior da van. Os amigos seguiam conversando animadamente, inertes a suas divagações. Perguntou-se o porquê de ter aceitado o convite de Hyoga. Ou melhor, a razão para ele tê-lo convidado. Já que ninguém parecia ligar para sua presença, tal como era em casa.

(I was confused)

Depois de tanto tempo, poderia dizer que já estava acostumado com isso, o que não era nem de longe a verdade. Embora correspondesse a todas as brincadeiras de mau-gosto, que também eram a maioria esmagadora de tentativas de incluir-lhe nos assuntos, com sorrisos bem humorados. Não estava, naquele dia, com energia o suficiente para tais encenações. Fosse pelo desespero das gotas da forte chuva. Fosse pelo deserto sem nome que só fazia crescer dentro de si. Fosse pelo o que fosse, não tinha vontade alguma de sorrir.

Hyoga gargalhava de alguma coisa que Seiya dissera quando o chamou. Ao olhar-lhe, a face dele era o sinônimo corriqueiro de “O que foi, Shun?”, ainda com um sorriso bobo delineando-a.

– Por que me convidou? – perguntou sem rodeiros e com transparência na face. Talvez assim ele realmente levasse aquelas quatro palavras a sério.

And I let it all out to find that

I'm not the only person with these things in mind

– Mas que pergunta, Shun! – disse Seiya, intrometendo-se aos risos. – Você é tão amigo do Hyoga quanto nós!

(Inside of me)

– Ele tem razão – concordou o russo com a testa levemente franzida. – Seu lugar é com a gente. Como sempre foi.

Meu lugar é com vocês, como sempre foi...? Será mesmo?

– Hmm... – resmungou, buscando entre a enxurrada de pensamentos algo para dizer, e ficou estático ao vê-los retornar ao assunto anterior, como se não estivesse ali.

but all the vacancy the words revealed

Is the only real thing that I've got left to feel

Poderia ter aproveitado aquele momento para dizer muitas coisas que seguiam entaladas em sua garganta, mas retraiu-se a seu recanto junto à janela seca e fria.

(Nothing to lose)

Trancando-se junto àquele deserto que só crescia e baforejando no vidro para depois desenhar os kanjis que explicavam bem toda a extensão de seu sentimento, e de forma bastante poética.

Just stuck, hollow and alone

Vai ser um longo Dia das Bruxas… Pensou, desenhando um sorriso somente para as gotas. Como se com ele pudesse libertá-las de tal surto. Como se elas pudessem ouvir as palavras mudas impressas nele e dar uma resposta coerente e resoluta. Como nos tempos que lançavam hereges à fogueira.

And the fault is my own

And the fault is my own

Ao volante, Geki reclamava da pouca visibilidade da estrada, mais dificultada pela chuva. Ainda assim os outros conversavam despreocupados, só Nachi dava a devida atenção ao problema, embora pouco pudesse fazer.

Só... Queria que alguma coisa emocionante acontecesse...

Com um forte solavanco de som oco e ensurdecedor, os rapazes foram arremessados à frente. Mesmo de cinto, Shun bateu o rosto nas costas do banco dianteiro e sentiu um sabor férreo instigar-lhe o paladar. Se Geki não tivesse tratado de frear, alguém poderia ter saído seriamente machucado. E num silêncio mortal de olhos esbugalhados o grupo ficou. Apenas o ronco surdo do vivo motor, suas respirações pesadas e o insistente murmurar da chuva eram escutados. Haviam batido em algo.

Um trovão rimbombou pelo céu e o clarão de seu raio iluminou a estrada escura por um breve instante. O virginiano entreabriu a boca, num misto de espanto e preocupação. Podia jurar que vira alguém em meio à chuva, parado no meio da estrada, olhar diretamente para ele. Tinha certeza absoluta de que vira aqueles olhos serem banhados com a cor do relâmpago. Olhos mais melancólicos do que os seus. Estariam chorando? Por Deus! Será que atropelamos uma pessoa?! Os outros nada viram, os calafrios que assaltavam seus corpos também os entorpeceram.

Mais preocupado com o desconhecido do que com o que poderia acontecer a si mesmo, Shun abriu a porta direita da van e saiu de seu recanto seco, estremecendo por causa do frio. Afinal, a razão para alguém com um olhar tão deprimido estar só num lugar tão escuro e deserto como aquele, encharcando-se no temporal a risco de resfriar-se ou de ser atropelado, devia ser extremamente grave. Talvez estivesse acompanhado, provavelmente estava. Será que...? Não podia ignorar sua situação. Será que...?

Quando chegou a frente da van, prendeu a respiração. Não era uma pessoa ali, mas um cordeiro. Ouviu alguns dos amigos confabularem, pareciam aliviados. Por que estariam? Ver aquela lã branca manchada de vermelho, o chão ao seu redor manchado de vermelho, o para-choque da van manchado de vermelho não deixava Shun nem um pouco calmo, e sim apavorado. O que tinham acabado de fazer?

Afastou-se alguns passos, de um passo e outro, colhendo ar como quem já não respira desde que nasceu, só sentindo o multiplicar dos grãos de areia ao redor de seu poço particular. Tão obscuro e profundo quanto o Olho da Mauritânia.

Não tem como se aliviar com isso... Convenceu-se, meneando a cabeça. Isso é triste! Recordou-se daquele olhar preenchido de relampejante pesar que vislumbrara. No fim, seu dono realmente estava só no temporal. Será que sentia-se tão mal quanto o possuidor das esmeraldas no deserto e vazias? Shun não o sabia, entretanto poderia jurar que a aflição em tal olhar era profunda. Muito mais do que a recente e irremediável atrocidade seria capaz de exercer de pronto. Era algo pior, algo que garimpara o âmago de tal olhar.

Geki manobrava com a van, contornando o pequeno obstáculo. Deu às costas cena. Queria falar com aquela pessoa. Qualquer coisa que pudesse abrandar sua dor. Já que, por muitas vezes, se sentia igual e tudo o que desejava era que alguém se dignasse a perceber. Nem que dissesse para deixar tais infantilidades de lado, ainda que estas não fossem. Melhor uma palavra verdadeira repleta de azedume do que palavra alguma. Apenas isso.

I wanna heal, I wanna feel

What I thought was never real

I wanna let go of the pain I've held so long

(Erase all the pain till it's gone)

Com apenas a parca iluminação dos faróis do veículo, não conseguiu encontrar o dono daquele olhar, então passou a chamar por ele com a voz enfraquecida pelas circunstâncias e as mãos ladeando a boca. Fora as órbitas vítreas do transporte e o pouco do céu em seu rugir instável nada se podia ver.

– Onde você está?! – Não houve resposta. – Por favor, apareça! – continuou a chamar, afastando-se mais e mais da van. – Responda, por favor! – Nada.

– Shun, o que você está fazendo?! – chamou-o Seiya. – Volte para o carro agora!

Voltou-se para onde viera, procurando pela fraca luz da van e distinguiu duas silhuetas paradas a frente dela. Seiya devia ser uma delas.

– Shun, vamos sair logo desse lugar maldito! – agora era Hyoga.

Não podia mais ver o cordeiro. Eles pretendiam mesmo ir embora e deixá-lo ali, estirado no meio da estrada? Os outros também começaram a chamá-lo. Shun ouvia suas vozes completamente mudo e estagnado no mesmo ponto onde estivera ao gritar por aquela pessoa da última vez. Sentia o coração apequenar-se de angústia. Mesmo estando ali parado no meio do nada, com um vasto nada crescendo dentro do peito, e um nó de palavras sufocando-o, queria ajudá-la. Então, por que não respondia? Continuava escutando a voz dos amigos como meros sons ocos, abafados pela água da chuva.

– O que eu devo fazer? – murmurou o pensamento, dando um suave espirro. – Não podemos ir embora assim... Não posso ir embora assim...

Mais um estrondear do céu, mais um clarão de raio, e pôde ver de relance uma silhueta poucos passos à direita. Novamente aqueles olhos tristonhos lhe observavam.

– O que lhe aflige tanto? – perguntou, mas não obteve resposta se não do céu em fúria. Submerso nas palavras irritadas e inatendíveis dos amigos. E aquém aos gritos longínquos que só sabiam aumentar. – Seja o que for não pode valer sua vida... Não vale. Realmente, não pode valer!

I wanna heal, I wanna feel

Like I'm close to something real.

I want to find something I've wanted all along

Somewhere I belong

Cuidado!

Virou-se na direção da desconhecida voz a tempo de ver a luz dos faróis baixos que avançavam em sua direção. Mas não a tempo de sair do caminho deles. Ouviu-se o som dos pneus cantando acima das notas da chuva.

E depois silêncio.


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