Incandescente escrita por Catiele Oliveira


Capítulo 3
2. A segunda face da moeda.


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!!



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Capítulo 2

A segunda face da moeda.

O noticiário dizia que uma nova onda de violência atingiu Seattle nos últimos cinco meses, os números de pessoas sendo mortas em tentativas de assalto cresceram gradativamente. Eu tinha que ouvir Alva gritando nos quatro cantos da sala de star que eu deveria parar de me resmungar pelo Volvo furtado e agradecer por estar vivo, concordava até certo ponto. Mas a revolta ainda era maior, bem maior. Tudo estava errado e eu só me perguntava quando voltaria para o lugar. Primeiro meus pais se foram abruptamente, ainda está quente na memória a última lembrança dos dois. Era uma noite chuvosa de terça-feira...

— Isso são horas Christopher? Você nunca pode ligar avisando que não vai comparecer as reuniões? — Sua voz era ríspida como sempre. Meu pai parecia relaxado sentado na sua poltrona de couro do escritório, tinha entre seus dedos um copo preenchido com um liquido âmbar e feição do seu rosto era tranquila. Se não fosse sua voz autoritária de sempre eu acharia que ele estava feliz. Mas eu nunca o tinha visto feliz, meu pai nunca fora feliz. Isso resultou numa vida estranha para mim e minha mãe. Ela vivia dizendo um papo furado de que na sua infância ele não recebeu muito amor e atenção dos pais e isso fez dele um homem um pouco duro e blá blá blá, mas eu também já sou um homem crescido e hoje essa historinha para dormir não cola.

— Eu não fiz falta como aparenta...

Ficamos em silêncio. Ele me analisava minuciosamente após deixar seu copo sobre a mesa e se por de pé. Eu continuei fazendo o que havia começado, só tinha invadido seu espaço em busca de um livro para me auxiliar no trabalho, já sabia que ouviria uma cessão de advertências por ter faltado mais uma reunião de família. Um jantar idiota com pessoas que não se suportam inventou para fingirem que se amam, mas, no entanto uma espera a morte do outro chegar bem rápido.

— Você estava com ela? — Respirei fundo.

— Nina? — Ele assentiu com rapidez — Ah... Sim. — Eu não estava disposto a ter essa discussão agora, mas Joseph nunca deixaria uma discussão para o dia seguinte.

— Você não entende, não é garoto? Ela não serve pra você Christopher. Essa vadia só quer o seu...

— Por favor, meu pai! Não vamos começar com isso outra vez, por favor? — Tentava manter a calma, mas estava a cada dia mais difícil. E algo dizia que seria cada dia pior...

— Tudo bem, agora você a defende com toda sua vida. De onde surgiu essa paixão desenfreada, meu filho? Eu sempre te ensinei tanto sobre as mulheres. Disse-te todo o tempo como você deve usá-las, maneá-las. Caso contrário elas usam você! É isso que essa... Essa moça está fazendo. Ela é uma erva daninha, Christopher.

— O que está acontecendo? Vocês já estão brigando de novo? — Mamãe atravessou a porta como um furacão. Dona Cicília parecia bem cansada como sempre. Olhos fundos e olheiras por todo lado, mais algumas noites em claro então, algo me dizia que era culpa do seu digníssimo marido.

— É o seu filho e aquela piranha! — Gritou Joseph. Minha mãe fechou os olhos com força. Eu simplesmente odiava quando ela fazia isso.

— De novo a senhorita Vermont fazendo intrigas?

— Não é nada disso, mãe! Argh. Eu só vim buscar um livro pai, poderia deixar-me em paz? Eu escolho minhas mulheres!

— Você não vai ficar com ela! Eu prometo a você garoto.

— Ah não, e como pretende me impedir? Porque estou mais que disposto a estar com ela você querendo ou não. A escolha não é sua, Joseph!

Silêncio. Exatos vinte e sete segundos de silêncio.

— E como pretende sustentá-la? — Mamãe me encarou — Você nunca andou com as próprias pernas. Tudo que tem é com o meu dinheiro! Você nunca vai ser ninguém sem esse dinheiro. Ninguém nunca vai te amar sem o dinheiro, você é insuportável Christopher! Olha como sua mãe está? É culpa sua!

— PARE COM ISSO JOSEPH! — Ela gritou enlouquecida. — Que diabos, por que você tem o prazer de fazer isso com ele?

Porque ele é um infeliz – essa é a resposta, a única, mas não quero dizer. Não preciso. Minha mãe me encara com compaixão, a última coisa que necessariamente eu preciso é compaixão.

— Eu quero que você morra logo. — Digo sem pensar, a raiva está transbordando. Aperto meus punhos com força. Ele parece incrédulo ao que digo — Só assim poderei gastar todo seu dinheiro sem ouvir essa ladainha repetitiva de como eu sou odiado por todos os lados.

Bom, foi isso. Uma simples conversa. Simples e irreversível, como conviver com o arrependimento eterno?

Nina? Quem é Nina? No começo não era nada. Apenas esbarrões casuais pelos corredores e salas aleatórias da faculdade. Eu cursava administração e ela economia. Era pra ser assim desde o inicio, como um ímã eu sempre estava junto a ela. Mas eu novo e inconsequente, entrei nessa relação de cabeça, o que serviu para arrumar problemas em casa. Joseph nunca gostou de ser contestado e não seria eu a contestá-lo, mas Nina estimulava um lado diferente em mim. Um lado que nunca foi posto para fora e então eu me transformei em outro homem. Mais impaciente e autoritário, grosso, frio, rígido, eu estava me tornando tudo que eu não queria. Eu estava me tornando o meu pai. Mas isso aconteceu há cinco anos e não há porque me lamentar no presente. Certas situações em nossas vidas são irreversíveis.

*~*
 

— Eu preciso que você telefone para o Sr. Shepard, Susan e passe a ligação em seguida, vou esperar na linha. — Ouvi toda a transação que a minha secretária fez no minuto seguinte, logo a voz descontraída do meu amigo sobrepôs o barulho terminante do sinal de chamada.

— Por que me incomoda às dez da manhã, Molina? — A voz enfadonha do outro lado da linha me fez rir. Provavelmente ele estava dormindo, o que já era de se esperar.

— Eu preciso falar com você. Ainda hoje. Está de ressaca?

— Estou.

— Cruzes, que mau humor Shepard. Bom, não tenho tempo para papo furado. Ao meio dia no Vianna, ok? Até logo, meu caro.

O corredor agora parecia mais longo que o normal, Susan seguia ao meu lado um tanto calada. Ás vezes suspirava alto, nós nunca tínhamos muito assunto a tratar. Desde que assumi o lugar de meu pai ela é a única que não me olha torto ou faz algum questionamento sobre a minha capacidade, enquanto os outros acionistas murmuram e fofocam sobre mim por todos os lados, minha fiel secretária se mantém longe dos níveis da fofoca. Eu aprecio isso.

— Eu odeio essas reuniões. — Digo baixinho para ela. Susan tenta não rir, mas deixa escapar uma risada oca. Eu via meu pai virar outra pessoa quando discutia a o lucro do fim do mês e eu temia que ficasse bem pior que ele. Esse sou eu, um cara rabugento de vinte e cinco anos reclamando de alguns centavos a menos faturados.

— É estressante de fato — Ela concordou. Segundos depois já estávamos dentro e uma vez dentro três horas depois fora. E foi realmente tudo que previ, houve quase gritos e ofensas, no fim eu estava percebendo que se o percentual não aumentasse arrumariam um jeito de colocar a culpa em mim. Culpa da nova e inexperiente administração. Deixei como estava, algo teria que mudar e logo conversaria com meu Marqueteiro.

Ao meio-dia estava eu em uma das mesas largas de um restaurante italiano. A decoração era o que mais me agradava, aconchegante, antiga, amadeirada com janelas venezianas largas e ocupando quase uma parede inteira. Cortinas nute estampadas de algo que nunca consigo decifrar. As mesas tem uma distância das outras perfeitas para que ninguém ouça conversa alheia. Os acentos são acolchoados e confortáveis. O ar fresco e corrente, mas principalmente a comida: deliciosa. O melhor fetuccine da minha vida eu comi aqui.

Quando o garçom apareceu para me checar pela segunda vez Pablo já havia chegado, tirou os óculos de sol do seu rosto mostrando um olho roxo. Tentei não rir e me perguntei no que diabos ele tinha se metido. Fizemos nosso pedido, e a entrada chegou quase instantaneamente. Uma leve salada de vegetais e algumas verduras cozidas.

— Seu carro, notícias? — Foi ele que puxou assunto. Respirei fundo. Lembrar do meu carro, lembrava o motivo de ter marcado nosso almoço.

— Sem ainda. Provavelmente já virou sucata, que seja... Eu trabalho, posso comprar outro.

— Claro. Rico esnobe! — Brincou, nós rimos.

— E esse olho roxo? Achou que ia passar despercebido?! — Gargalhei. Pablo franziu o cenho.

— Me meti em uma briga.

— De bar?

— De boate. — Arqueei a sobrancelha. Pablo é o cara mais tranquilo que eu conheço, não consigo imaginá-lo em uma briga de bar. — Meu amigo quer um conselho? Não se case. As mulheres já nos faz cometer loucuras, imagine a sua própria mulher!

— Não diga que brigou por Molly? — Ah... Molly! Sua tão adorável e angelical esposa. Agora que tudo se tornava bizarro. Nunca imaginei meu amigo brigando por causa da esposa.

— Christopher, se você estivesse no meu lugar o cara não sairia de lá vivo. O canalha tentou agarrá-la a força. Acabou que todos nós fomos expulsos. Mas agora já entendi, homens casados não podem frequentar esses tipos de lugares com a esposa. Essa fase já passou, entende?

— Que situação foi essa hein! Eu entendo claro. — Apesar de nunca ter passado pelo mesmo. Sorte a minha, ele tinha toda razão, se fosse comigo não teria terminado em socos certamente.

— Mas, me diga o que me trás aqui? Tenho uma mulher louca em casa.

— Recém-casados! Está foda, hein Pablo? Precisa de um tempo de homem cara! — Grunhi, ele deu de ombros. Ás vezes parecia extremamente alienado do mundo real, vivia em função da mulher — Você comentou comigo um dia desses sobre um cara que vivia pedindo dinheiro emprestado a você... Alguma coisa com “Sullivan” se recorda?

Ele pareceu pensar e eu resolvi comer. Pablo bebericou sua taça com água e respirou fundo, ponderou uma, duas vezes antes de voltar a falar.

— Gregório Sullivan. O empresário falido. Hipotecou a casa e agora está desesperado por grana. Mas é um pobre coitado viciado em jogos.

— Hm... Interessante. E você pretende emprestar?

— Só se fosse pra ter mais dor de cabeça que já tenho! Não estou caducando ainda, meu caro. Mas qual seu interesse nisso? — Ele estava curioso. E eu arriscando demais, o que a filha de um empresário, mesmo que falido, estava fazendo trabalhando no subúrbio de Seattle? Ela provavelmente deveria estar procurando dinheiro para ajudar a família? Até que faz algum sentido.

— Você sabe se ele tem filha?

— Tem sim, uma. Por quê? Ele foi te pedir dinheiro também, não é? Não empresta. Esse cara é maior pilantra Molina! — Bingo! Agora eu tinha certeza, ou quase. É ela. Eu sabia que já tinha ouvido falar do seu sobrenome. O demônio de olho verdes iria me pagar pela afronta.

— Felipa é seu nome?

— Como você sabe? — Não precisei de mais confirmações. Gargalhei. Meu amigo estava confuso com minha reação e essa era a hora de eu tirar proveito de toda essa história.

— Bom... Eu preciso que você seja intermediário em um negócio meu com Gregório Sullivan.

— O que você está armando, Christopher?

— Bom... Eu vou matar dois coelhos com uma cajadada só, meu caro. Ele quer o dinheiro, eu quero Felipa. Temos um negócio a caminho?


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Notas finais do capítulo

Ai Chris, que malvado. Que filho péssimo. Hahaahahahaha



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