Herança escrita por Janus


Capítulo 65
Capítulo 65




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     Sabia que era algo grave quando foi chamado. A própria rainha pediu para que ele retornasse ao palácio e seguisse direto para a enfermaria de lá. Durante o trajeto ele imaginou quem estaria ferido e porque ele e não Amy fora chamado. Talvez alguém estivesse com problemas com algum aparelho desconhecido, ou tivesse sido atacado por algo inesperado, como radiação, gosma desconhecida, qualquer coisa.
     Mas nunca imaginou ver o que viu quando chegou.
     Afonso estava deitado na mesa da enfermaria com vários sensores flutuando acima dele. Mas estava como que encarcerado em um tipo prisão. Parecia que tinham derrubado mel sobre ele e endurecido este mel.
     A primeira coisa que Amy disse quando ele chegou foi que Afonso estava em animação suspensa. Demorou quase um minuto para ele se mover e iniciar as analises do que era aquilo que estava cobrindo seu amigo.
     Mas em seu intimo ele não queria achar a resposta.
     Fazia tempos desde que tinha visto algo similar. Em outra época, quando jovem e nem imaginava que um dia iria passear pelas estrelas e conhecer outros povos. Uma época mais simples em que suas preocupações eram farrear nos ciclos de intervalo das suas aulas e pesquisar sobre suas origens, as origens de seu povo.
     Pediu para que alguém fosse no seu laboratório para que lhe trouxessem alguns equipamentos. Precisava ter certeza do que era aquilo antes de agir.
     E queria ter certeza de que estava errado.
     Enquanto esperava que lhe trouxessem o que pediu, olhou para os monitores. Todos indicavam que não havia pulso, respiração, temperatura do corpo estava normal, atividade cerebral muito reduzida... realmente era uma animação suspensa. Ele estaria protegido ali dentro daquela coisa. Mas não poderia libertá-lo diretamente. Seria arriscado tentar abrir uma brecha ali e com isso matá-lo por asfixia.
     A posição dele congelada dentro daquela coisa indicava que parecia ter notado que algo estava acontecendo. Seu rosto estava virado, seus olhos indicavam que ele tentava ver algo a esquerda. Seus braços estavam um pouco para trás – talvez tivesse sido atingido pelas costas – e sua espinha estava curvada.
     Finalmente uma enfermeira trouxe seus aparelhos e ele começou a trabalhar. Primeiro tentou determinar que material era aquele. Acionou o seu visor e ativou uma pequena bola que começou a flutuar perto dos sensores médicos e a emitir uma luz azulada. Com o seu visor ele analisava o reflexo dela e tentava determinar que tipo de onda de luz era refletida. Com isso poderia saber alguma coisa de sua composição.
     Não ficou surpreso ao perceber que apenas captava a luz sendo difundida como um prisma. Isso confirmava sua primeira impressão e temor. Mas ainda queria confirmar mais. Afonso estava seguro e protegido dentro daquilo, portanto tinha tempo para estudar.
     Claro que Amy não sabia disto, e provavelmente nem concordava. Podia notar na periferia de seus olhos ela estava um pouco agitada, tentando obter leituras do paciente.
     Pegou a bola que flutuava e retirou dois de seus emissores de luz, substituindo por uma antena e um cano mais comprido. Era na verdade um emissor de raios.
     Soltou a bola novamente e desta vez ela ficou percorrendo o bloco que estava na mesa a poucos centímetros. Disparava um pequeno raio e a antena captava o ruído elétrico resultante.
     Enquanto fazia isso, ele se aproximou dos consoles e iniciou uma analise de ressonância. Ondas infra-sonoras bombardeavam aquele bloco sólido e através do eco destas um mosaico era montado, como em uma ressonância magnética.
     Configurou alguns filtros para identificar um material de densidade específica. Algo que ele não queria achar na verdade. Mas os primeiros dados captados pela sondagem elétrica já estavam confirmando o que ele não queria descobrir.
     Em uma imagem holográfica surgiu o que ele estava buscando. Um pequeno disco estava preso nas costas de Afonso. Um disco com dois milímetros de espessura e cinco centímetros de raio.
     Ele tinha razão.
     Maldição!
     Aquilo não era um gel, mas uma prisão feita com entrelaçamento de moléculas da atmosfera. Era incrivelmente resistente a impactos e temperaturas. E justamente por isso não poderia simplesmente cortar caminho até libertar o prisioneiro em seu interior.
     Aquilo era um dispositivo de captura utilizado pela segurança de seu mundo natal. Aquilo era tecnologia do seu povo!
     Como fora parar ali na Terra?
     Pelo menos agora ele sabia como tirá-lo de lá.
     - Amy – disse ele de forma entrecortada e logo corrigiu-se pois a enfermeira ainda estava lá observando o que faziam – Sailor Mercúrio, preciso do seu visor.
     - Como... como é?
     Ele não perdeu muito tempo explicando. Retirou um pequeno pino de seu visor e ficou observando ela, esperando a mesma acionar o seu. Um pouco confusa ela o fez, e logo em seguida ele colocou aquele pino no visor dela.
     - Preciso da tecnologia mercuriana para desativar o imobilizador. Isto que conectei no seu visor é uma interface de status. Seu visor irá tentar acoplar este e quando o fizer o dispositivo irá interpretar como se um oficial de justiça estivesse próximo.
     - Pode explicar melhor isso? – perguntou claramente confusa.
     - Ele está preso em um dispositivo de captura. Um equivalente para as algemas de força que temos neste planeta. Posso tirar isto dele com um anulador de comandos, mas vou demorar dias para construir um aqui. Outro recurso é o que estamos fazendo agora.
     - E que planeta usa tal tecnologia e como você a conhece?
     - Respondendo as duas perguntas... o meu planeta usa isso.
     Um blip soou no visor dela e ele se aproximou do bloco e colocou a mão neste. Para a surpresa da sailor e da enfermeira, sua mão atravessou aquilo como se estivesse pondo ela em um holograma, e foi até as costas de Afonso. Logo depois ele retirou a mão e o bloco desapareceu.
     Mas não houve muito tempo para comemorar pois em seguida uma onda de choque atingiu a todos ali, destruindo os equipamentos e estourando a porta, bem como pondo a enfermeira a nocaute.
     Quando sailor Mercúrio se levantou pronta para um combate, deparou-se com Afonso sentado na biocama e olhando ao redor muito surpreso e confuso.
     - Ai... ele deve ter tentado arrancar o dispositivo com seu poder e foi congelado antes de usar – disse Orion esfregando a nuca.
     Sem perder tempo, Amy pegou a enfermeira desacordada e a colocou na outra cama – que apesar de danificada ainda funcionava - já tratando dela imediatamente.
     - O que.. meu Deus... ela, ela...
     - Ela vai ficar bem Afonso – respondeu a sailor – Orion, explique o que aconteceu a ele e examine-o para ter certeza de que está bem. A mocinha aqui ficou bem ferida. E não fique se torturando Afonso... não tinha como você saber. E nem nós. E cuide para que eu possa transferi-la para outra enfermaria. Esta biocama aqui não está muito boa.
     - Vamos – disse Orion segurando-o no ombro e o conduzindo pela porta arrombada, sob o olhar atônito dos seguranças que estavam de prontidão do lado de fora.
    

-x-

 

     A luminosidade da janela se esvaia conforme o dia terminava. A porta foi aberta de forma natural, não demonstrando que aquela que estava entrando na casa estava na verdade com uma verdadeira tempestade no cérebro. Fechou a porta e entrou pela sala, parando por alguns instantes para pensar em como proceder agora.
     Iria ficar um bom tempo pensando e avaliando suas opções, portanto talvez fosse melhor preparar algum lanche agora. Virou a esquerda na escada que dava no segundo andar e adentrou na cozinha. Sobre o tampo de vidro da mesa de refeições estava ainda uma prato de comida com o garfo no largado na mesa, com um pouco de comida mãe devia estar comendo quando foi avisada do que aconteceu. O sistema de limpeza automático só iria ser acionado caso os vapores de comida estragada fossem detectados. Até lá, seria preciso alguém para dar a ordem, ou fazer isso pessoalmente.
     Normalmente ela própria pegaria o prato, o garfo e um pano para limpar aquilo. Mas não hoje.
     - Computador, acionar os robôs para limpar a mesa da cozinha.
     Enquanto uma portinhola abaixo da pia se abria e um robô cilíndrico saia flutuando por este, ela foi até a geladeira e a abriu. Pegou alguns tomates, um pouco de arroz que tinha sido feito na véspera e duas fatias de peixe já temperadas. Colocou tudo sobre um prato limpo e o colocou no forno automático.
     Estava suja, suada e cansada de vagar pela cidade destruindo os fantasmas negros, se surpreendendo em quantos youmas se mostraram para ajudar seus amigos, e também com pessoas que eram filhos ou netos de outros que como sua mãe tinham "renascido".
     Surpresa interessante, mas não era hora para perturbá-la com perguntas nesse sentido. Saiu da cozinha em direção ao banheiro, tirando a sua roupa pelo caminho e acionando um robô para pegar esta e lavá-la. Não queria ouvir nada de sua mãe quando esta chegasse. Pelo não referente a ordem na casa.
     Ela já iria falar um monte por ela não ter ficado para a reunião onde trocariam informações e decidiriam como agir.
     Iriam deixá-la de lado – e todas as suas amigas também – como sempre faziam em assuntos "acima de seu nível". Preferia ir para casa e estudar no porão alguma pista que pudesse esclarecer onde poderiam ter levado sailor Urano.
     Tinham uma central ali interligada diretamente com os computadores do palácio. Se houvesse alguma pista que desse o paradeiro dos generais, ela poderia encontrá-la.
     Entrou no Box e abriu a água gelada, lavando-se em tempo recorde, mesmo para ela. Ao sair colocou seu roupão e foi diretamente para a cozinha pegar o seu prato que já deveria estar pronto.
     Ao entrar nesta, notou que o robô ainda estava terminando de limpar a mesa – ela se lavou tão rápido assim? – e que havia um recado para ela se comunicar com sua mãe.
     - Computador, informe minha mãe que estou bem e irei estar no porão – ela pegou o prato e pensou um pouco – e informe também que não irei atendê-la salvo uma emergência que precise de mim como sailor.
     Dito isto ela sai da cozinha, atravessa a sala de estar do térreo, passa pelo corredor onde ficava o seu quarto e o quarto de sua irmã de criação e para diante da porta de acesso ao subsolo. Respira profundamente antes de abri-la e prossegue em sua jornada.
     Assim que terminou as escadas em espiral ela observou um pouco as coisas por ali. A centro estava limpo, apenas com algumas estantes na parede com umas bugigangas ou outras. Desde que ela começou a ser treinada em casa também aquele chão duro conheceu o seu rosto muitas vezes. E por todas as noites sem exceção. Queriam mesmo ajudá-la a seguir por aquele caminho, de ser uma sailor. As vezes imaginava se ela na verdade não estiva realizando o sonho de sua família.
     Mas não importava agora. Atravessou a sala e abriu uma das duas portas ali. Assim que entrou colocou o prato na pequena escrivaninha e acionou o computador.
     Apesar de estar calma e controlada, ela se desesperava por dentro. Não ia admitir facilmente, mas amava a sua mãe. Estava muito preocupada com o que houve com ela e porque a seqüestraram. Tinha sido derrotada de forma avassaladora por aquela general, mas se a encontrasse novamente já tinha imaginado como se defender. Se ela manipulava mesmo a gravidade, então tinha certos limites que poderia aproveitar tendo a chance.
     A questão era saber se teria chance. Quando estava Transformada em sailor Titã notou que a mulher parecia ser bem mais prudente que arrogante, atacando-os mas não demonstrando superioridade em sua face em nenhum momento. E como não matou ninguém – apesar de ter chegado bem perto disto – isso lhe deixava com algumas perguntas...
     Porque queria que estivessem vivas? Para que precisava da sailor Urano? Porque simplesmente não pegou ela e saiu voando dali como já tinha feito da primeira vez em que se encontraram na escola?
     Talvez porque pudesse ser seguida... claro! Não queria ser seguida... não queria que alguém descobrisse onde iria. Por isso deixou ela e seus amigos vivos mas em risco de vida. Queria que quem chegasse ali se preocupasse em salva-los, deixando-a fugir.
     Isso também indicava que não devia ter muitos locais para ir, muito provavelmente apenas um. Um simples esconderijo onde talvez sua mãe, sua mamãe Haruka estivesse cativa.
     O problema era que enquanto aquele aparelho de Orion estivesse funcionando, nem ela, nem o pai de Joynah poderiam localizá-la. E isso lhes daria pelo menos dois dias de vantagem. Dois dias em que pudesse fazer o que quisessem com sua mãe sem serem perturbados. Talvez até tivessem planejado isto. Estavam vigiando-os atentamente, não? Talvez andassem pela cidade tranqüilamente, pelo menos até Diana sentir o cheiro de um deles. Ou melhor, do único deles que conhecia o cheiro. Agora ela conhecia de pelo menos dois. Daquele tal Djogor, do malviano e desta mulher que quase a matou.
     Mas não ajudaria muito se não soubessem onde começar a farejar.
     Ouviu seu bracelete soar um blip e a contragosto tirou o seu visor normal dele e o encaixou no nariz.
     Como suspeitava, era a sua mãe.
     "- Filha! O que pensa que está fazendo?"
     - Já lhe disse tudo o que sabia. Prefiro perder tempo tentando achar uma pista. E vocês com certeza vão me informar depois o que for decidido, correto? E eu duvido que vão me deixar procurar minha mãe.
     Houve silencio por alguns instantes. Um silencio que ela aproveito para começar a acessar o dossiê sobre os generais de Klarta que tinham arquivado no computador.
     "- Filha, sei que está preocupada, mas não acho que agir independentemente de nós irá ajudar."
     - Vai atrapalhar?
     "- Se nos informar o que descobrir, caso descubra alguma coisa, não. Somos uma equipe filha. Sou sailor como você, e quero que um dia atinja o seu potencial. Mas também sou sua mãe, e sei como deve estar abalada com tudo."
     - Meu único abalo – sua voz começou a tremer um pouco – foi não poder fazer absolutamente nada para ajudar minha mãe. Aquela mulher não queria perder tempo, não nos deu a chance de arquitetar nada. Mas não nos matou apesar de poder fazer isso. Queria tempo para conseguir fugir. E foi vitoriosa. Se eu encontrar uma pista de onde ela pode estar eu aviso. E já estou comendo alguma coisa, não se preocupe.
     "- Filha..."
     - Mãe, eu estou bem. Quase morri, mas sabia que isto poderia acontecer. E mais do que tudo estava preparada para morrer defendendo o que acredito, e aqueles que amo.
     "- Filha, eu... – havia uma forte emoção na sua voz – eu... – ela suspirou – certo, sailor Titã. Vocês não são mais juniores. Avise se encontrar algo. Eu te amo."
     Ela concordou com ela? Sem discussão? Sem falar que era sua mãe e todas aquelas outras palavras para convencê-la de algo que nunca prestou atenção?
     Mais que isso... ela a chamou de sailor Titã... E disse que não eram mais juniores...
     - Também te amo mãe. E amo a mamãe Haruka também. Mas se contar para ela...
     "- Pode deixar – ela riu – depois nos falamos."
     A ligação se desfez e ela ficou um pouco pensativa. Ainda lhe incomodava ninguém ter sido morto por aquela general. Apesar de ter imaginado um bom motivo, ainda assim não compreendia muito bem.
     Procurando deixar esta questão para depois, Anne sentou-se diante da escrivaninha e enquanto com uma mão pegava uma garfada de comida, com a outra começava a digitar no teclado virtual.


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