Herança escrita por Janus


Capítulo 64
Capítulo 64




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     Seis horas tinham se passado desde que as crianças foram atacadas por dois generais de Klarta, e as criaturas sombrias atacaram em vários pontos da cidade. As emissoras já transmitiam boletins especiais indicando que aparentemente a situação estava completamente sob controle, sendo que nenhum outro incidente tinha sido registrado na ultima hora.
     Foi em verdade uma hora de terror para a maioria dos habitantes da cidade, fugindo de criaturas assustadoras e vendo que além das sailors haviam outros na cidade que podiam enfrentar aquilo. Estranhamente os verdadeiros méritos daqueles responsáveis por deter o grosso da invasão nem eram comentados.
     A guarda robô.
     Sem estes robôs de vigilância teria sido bem mais difícil conter as criaturas. Felizmente eles não tinham emoções ou necessitavam de agradecimento, mas os responsáveis pela existência deles estavam satisfeitos.
     Indiferentes a isso, quatro sailors também conhecidas com Asteroid Senshi prosseguiam em sua patrulha para certificar-se de que tudo tinha acabado. Eram vistas ocasionalmente por pais, filhos, amigos e até os desesperados que faziam fila em postos policiais, creches, hospitais e outros abrigos naturais procurando amigos e parentes.
     Nenhuma baixa tinha sido registrada entre os civis, apenas alguns ferimentos e lesões. O caso mais grave tinha sido de um homem atingido pela névoa corrosiva das criaturas, mas já estava sendo medicado e preparavam um implante de células clonadas nas partes de seu corpo atingidas.
     Sumire recebia estas informações de seu namorado por meio de seu visor, ao mesmo tempo em que prosseguia na busca por Afonso. Não acreditava ainda ao ter localizado nenhum sinal dele ou ter sentido sua energia. Será possível que um guardião capaz de encarar sua mãe de frente tinha sido... morto por um único golpe?
     Impossível! Não podia aceitar isso. Algo devia ter acontecido a ele depois daquilo que o deixou incomunicável.
     Talvez tivesse sido seqüestrado também. Ou talvez aquela coisa que Orion fez – porque ele fez isso afinal? – para mascarar sua semente estelar tenha ocultado seu poder. Isso explicava ela ter que dar saltos enormes para olhar ao redor e ver se localizava algo.
     Mas achava que estava procurando na direção errada. Já tinha avançado cinco quilômetros desde o ponto em que as lunares tinha lutado e nenhum sinal.
     Apenas rocha, grama rala, poeira e um Sol muito quente.
     E depois de achá-lo ainda tinha que falar com a rainha sobre sua missão ali. Encontrar um youma desaparecido que não dava notícias.
     Hum... será que estava bancando a idiota? Seu visor tinha sido presente de Ryo, e perdia apenas para um visor mercuriano. Ele não teria nada para localizar pessoas?
     Pensando nisso, acionou o seu visor e ficou examinando as opções deste – quando poderia ter um que fizesse aquilo por pensamento? – por fim achou algo interessante. Um sensor de emissões calóricas. Olhou ao redor com este e notou uma coisa.
     Era um ponto distante, mas era uma claro sinal diferente do resto da paisagem. Foi saltando na direção indicada e conforme se aproximava, mais e mais a imagem se parecia com um corpo humano. Um corpo deitado de bruços no chão!
     Devia ser ele. Dois minutos depois ela retira o visor e observa uma cena que não entendeu a principio.
     Havia um homem deitado ali no chão, mas havia também algo ao redor dele. Como um tipo de gel cobrindo-o da cabeça ao pés.
     Com cuidado levou sua mão para tocar naquilo e a afastou em seguida.
     Não era um gel. Era um tipo de cristal ou talvez vidro. Era sólido.
     Olhou para a pessoa no interior e viu que esta se parecia com Afonso. Era verdade que não o via já há um bom tempo, mas acreditava que era ele sim. Se não fosse, quem era aquele?
     Ficou meio indecisa de como agir. Não sabia se podia movê-lo ou não, assim decidiu chamar por ajuda. Talvez sailor Mercúrio soubesse o que fazer.

 

-x-

 

     Não se lembrava de ter ficado tanto tempo transformada antes. Talvez no máximo tenha sido apenas por uma hora durante os treinos de sábado. Diferente de Joynah ou Anne que acabavam agindo as vezes com uma das outras mais experientes, Rita nunca tinha atuado sozinha antes.
     E não se incomodava com isso. Não se sentia pressionada ou nervosa por estar agora em uma "missão solo" verificando se estava tudo limpo na cidade. Não se sentiu assim quando procurou por sua mãe antes e foi avisada que tinham-na encontrado. Não pensou demais no que fazer quando em suas idas e vindas na cidade encontrou pessoas em perigo e as salvou das criaturas. E mesmo quando acabava vendo um youma ou outra pessoa com poderes – viu uma ruiva usando poderes da sailor Júpiter para destruir um grupo de sombrios – o máximo que fazia era verificar se precisava de ajuda. Geralmente não precisava.
     Os que a viram achavam que era bem experiente e tinha uma boa prática. Mas não. Rita apenas fazia o que sempre fez... agia como se soubesse o que fazer. Parecia mesmo que sabia para onde ir para ajudar alguém, e no momento apenas pensava em ir ao castelo saber de notícias de seu pai.
     Sentia que não tinha mais nada para fazer na cidade. Mas tinha recebido ordens – ordens para a sailor lunar Miranda, como sua mãe bem especificou – para verificar se tudo estava bem e estava cumprindo isso. Assim que recebeu ordens de Titã para tirar a pequena princesa de lá e deixá-la em segurança, horas antes.
     Pulou para outro prédio para observar a rua abaixo e franziu o cenho. Tinha algo estranho ali. Pulou para a rua bem no meio daquela roda acalorada e observou todos os cinco rapazes que emudeceram ao vê-la.
     - Algum problema? – perguntou ela gentilmente.
     Todos ficaram em silencio. Na verdade ela sentiu que alguns estavam envergonhados - mas como sentiu isso? – e nada lembrando como se apontavam e gritavam uns com os outros.
     - Rapazes... – insistiu ela – a cidade está em estado de alerta e vocês estavam aqui discutindo em voz alta. Na verdade estavam gritando. Há algum motivo para isso ou posso pedir gentilmente para irem para casa?
     Nenhum deles respondeu, mas todos olharam para o chão. E agora ela sentia.. medo? Vindo deles.
     Ela mal se tocou disto. Nunca tinha demonstrado perceber as emoções das pessoas antes, salvo as da sua mãe – mas até ai a maioria dos adolescentes também faziam isso – simplesmente encarou a sensação como algo natural e aguardou que alguém lhe respondesse.
     Mas continuaram em silêncio.
     - Meninos, vou chamar alguns guardas robôs para escoltarem vocês para o posto policial mais próximo. Estão agindo de forma nada normal. Se querem ajudar o amigo de vocês falem logo. Hum... – ela pos o dedo na boca – eu disse isso? Bom, já disse.
     - Sabe do Demétrio? – disse um deles um pouco surpreso.
     - Não.
     - Mas disse para ajudar nosso amigo... como sabe que falávamos dele?
     - Eu não sei – tornou simplesmente – nem sei o que falo as vezes. Na verdade as vezes nem sei se falei alguma coisa. O que tem esse Demétrio?
     - Ele... começou um deles – nos salvou. Mas o Jonas aqui o chamou de youma e ele fugiu para lá – ele apontou com a mão em direção a um beco próximo. Pelo menos parecia ser isso.
     - Mas ele é um youma! – disse um dos rapazes.
     - Precisava falar daquele jeito? Parecia que estava xingando ele.
     - Não começa, porque ele nunca contou isso para a gente antes? Meu pai disse que youmas são criaturas perigosas e meio animais. Tem que se tomar cuidado com elas e...
     - QUE CUIDADO O QUE!
     - TEM SIM!
     Um brilho e uma explosão no meio da roda os fez se calarem e pularem para trás de susto. Dois deles chegaram a correr um pouco, mas logo pararam e observaram a sailor de braços cruzados e maneando a cabeça levemente.
     - Fiquem aqui que vou procurar ele. E se saírem – ela se voltou apontando o dedo – ai sim vão ter encrenca!
     Impressionados, os rapazes ficaram quietos.
     Sailor Miranda seguiu calmamente pela rua em direção ao beco indicado. Mas em vez de entrar lá ela pulou em direção em direção ao teto e pousou em uma das escadas de incêndio deste. Na sua frente estava um menino com talvez doze anos agachado e soluçando.
     - Tudo bem? – começou ela.
     O menino se virou sobressaltado e rosnou de forma ameaçadora. Tinha pelos no rosto e dentes bem pontiagudos, como se fosse um lobisomem de filmes de feito uma pose bem ameaçadora e seus pelos tinham mesmo ficado eriçados.
     - Não vim te fazer mal – continuou ela sem demonstrar nenhum temor. Na verdade parecia que nem tinha notado o que ele fez – só quero saber se está chorando por causa do que seu amigo disse.
     - Me déia em paz.
     - Eu não posso – ela se ajoelhou ao lado dele o falava de forma macia e suave – não sei porque, mas não posso te deixar em paz. Você está com um problema e quero te ajudar. Você se escondia deles, não é?
     Ele não disse nada. Apenas abraçou os seus joelhos e se encolheu um pouco.
     - Não sei como é isso. Nunca tiveram medo de mim antes. Bom – ela fez uma careta – teve aquela vez em que eu fui carregar o bolo da minha amiga e todo mundo ficou desesperado. Não sei porque... mas continuando, deve ser bem difícil. Tão difícil como descer uma escada de patins carregando o bolo de minha amiga.
     O menino riu um pouco.
     - O que foi?
     - O que você disse.
     - De não saber como é isso?
     - Não – ele riu de novo – de descer as escadas de patins carregando um bolo.
     - Qual o problema?
     O menino olhou para ela estranhando-a um pouco.
     - O bolo não ia descer sozinho, e pediram para eu pegar ele. Porque todos ficaram com medo?
     Ele riu mais forte desta vez, não acreditando muito.
     - Você sabe porque ficaram com medo? Me conta?
     Ele continuou rindo. A sailor por sua vez não entendia o motivo.
     - Tudo bem, pode guardar segredo. Se não quer contar a graça não me conte. Mas me diga... você pode mudar sua aparência?
     - Não – disse ele ficando sério de novo – perdi meu aparelho. Perdi na luta com as coisas pretas. Eles ficaram com medo de mim – ele começou a se encolher de novo – me chamaram de youma. Não quero ser youma, não quero!
     - E acha que eu queria ser sailor?
     - Você é venusiana.
     - Isso é uma palavrão da sua terra?
     - Não! É o que você é, onde nasceu. Em Vênus. Aprendi isso lá no norte. Seu brilho é laranja, por isso é de Vênus.
     - Brilho?
     - Não vê o brilho de seu corpo?
     - Não... – ela olhou para os braços – como apago isso? Dá para usar para ler um livro a noite?
     O menino riu de novo, mas nada respondeu.
     - Mas não estamos falando de mim. Bom, você está falando de mim e estou falando de você... quer dizer. Ah! Sei lá. Que tal parar de chorar? Eu te levo para o palácio e um amigo meu pode te fazer outra dessas maquinas para se esconder.
     - Tenho outra em casa. Não quero ir no palácio.
     - Porque?
     - Eu não quero que saibam que sou um youma.
     - Não quer? – Ela coçou a cabeça – mas todos os youmas da cidade estão registrados no palácio. Foi o que minha mãe me disse. Você é de outra cidade?
     - Não sabem que estou aqui!
     - Não sabem? – ela o olhou divertida – puxa... alguém vai levar um puxão de orelha no setor de registros. E acho que vai ser eu. Deve ter sido na minha vez de ficar conferindo as fichas que isso aconteceu, com certeza.
     - Não! Ninguém sabe que estou aqui. Nem minha mãe ou meu pai. Eu estava em outra cidade e vim para cá escondido.
     - E mora onde?
     - Na casa de um amigo. Ele... é youma também.
     - Menininho... não sei bem o que está me dizendo, só vim aqui para dizer que seus amigos só estão assustados e não vão ficar mexendo com você. Isso passa logo.
     - Como sabe?
     - Não sei. Só sei que sei isso.
     - Mas como?
     - Sabendo.
     - Ninguém sabe de algo sem saber como sabe.
     - Eu sei. Ou não sei. Não, eu sei.
     - Não estou entendendo...
     - Ora... sabe a cor do céu?
     - Azul.
     - Sabe porque?
     - Não...
     - Viu? É a mesma coisa. Não sei porque, mas sei que seus amigos só estão um pouco assustados agora.
     - É porque você é venusiana.
     - Quer parar de me xingar? Ainda não acredito nisso. Nasci na Terra, não em Vênus.
     - Mas deve ser filha de venusianos.
     - Bom... – ela coçou a orelha – minha mãe é a sailor Vênus, mas ela também nasceu...
     - Viu? Venusiana.
     - Tá bom, chega – ela começou a cutucar ela na barriga – vamos descer daqui e falar com seus amigos, anda!
     Rindo um pouco ele a seguiu. Pularam para a rua e andaram calmamente em direção a roda de meninos que permaneceu no mesmo lugar.
     - Bom turma – começou a sailor – este rapazinho aqui salvou a vida de vocês e como agradeceram? O fizeram ficar em um canto chorando.
     - Era disso que eu...
     - CALA A BOCA! – gritou ela fazendo o rapaz pular – seu nome é Jonas, não é? Há quanto tempo conhece o Demétrio?
     - Huns dois anos...
     - E ele parecia perigoso?
     - Não – ele estava emburrado.
     - Viu? Ele não salvou a vida de vocês?
     - Foi – responde ele.
     - Quer pedir desculpas ou vai continuar com esse medo todo?
     - Não estou com medo!
     - Ela é venusiana – disse Demetrio de forma instigante – ela sabe o que você sente. Se disse que está com medo então está com medo.
     - É assim que eu sei disso? – perguntou ela para ele.
     - Foi o que minha professora falou.
     - Tanto faz – ela deu de ombros – E então? Está com medo e envergonhado. Não quer dizer algo?
     - Eu – murmurou ele – tava com medo Demi... mas é que eu nunca vi um youma antes. E essa sua cara...
     - E a sua cara cheia de espinhos é o que? – tornou a sailor com as mãos na cintura – ele só precisa fazer a barba.
     Os outros começaram a rir dele, e depois de um tempo envergonhado ele riu também.
     - Certo meninos, vão para casa. Não foi só o Demetrio que se mostrou não. Outros youmas e outras pessoas com poderes também ajudaram a defender as pessoas. Agora vão embora antes que eu prenda todos por vadiagem.
     - Você não é policial – disse um deles.
     - Não estraga minha festa – tornou ela rindo – adeus Demétrio. Depois a gente fala sobre aquela outra coisa.
     - Mas nem sabe onde moro – disse ele, mas ela já tinha pulado e tomado distancia – a professora tinha razão. Venusianos não prestam atenção nas coisas.
     A sailor por sua vez continuava na sua rotina de pular uns dois ou três prédios, olhar ao redor e conferir novas informações no visor. Mal se incomodava daquele jovem youma a chamar de venusiana ou de ter percebido que estava percebendo os sentimentos que os outros sentiam.
     Como tudo na vida dela. Sailor Miranda, alias, Rita não se incomodava em como podia fazer certas coisas, como arrumar uma paquera para cada fim de semana ou as vezes saber onde ir para achar alguém. Para ela era algo corriqueiro. Mesmo quando estava ao pé da cama de sua mãe no hospital e ela acordou de repente, não se sentiu diferente.
     Mesmo sabendo que teve algo a ver com aquilo não se incomodou.
     Como tudo o mais que fez e faria em sua vida, aquilo era simplesmente algo natural.


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