Born to Die escrita por Agatha, Amélia


Capítulo 69
A escolha - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Pedimos desculpas pelo capítulo gigante, na nossa mente teria apenas 6000 palavras, só que acabamos nos empolgando com as cinco narrações. Tudo culpa da Sarah! Na verdade, tudo o que fizemos foi essencial para o desenvolvimento do capítulo, mesmo que não pareça.
Tiramos inspiração de trechos da HQ, edições 100, 106, 125 e 126. Já dá pra imaginar o que está por vir, certo?
Nesse capítulo, tivemos ajuda da leitora Sarah Chase, que salvou o nosso gif. Obrigada! Aliás, esse será o último gif da Gabriela... E o último capítulo, de quem vocês acham que será o gif?
Esperamos que gostem e não achem cansativo.
Boa leitura!



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*Narrado por Avery Hopper

Após a fala de Carl, que me trouxera de volta à realidade, nenhuma palavra fora dita. Caminhamos em silêncio, e, apesar de estarmos apressados, não corremos. A estrada era longa e precisaríamos de energia, fora isso não havia muitos problemas. Tudo o que precisávamos fazer era seguir a oeste até o Alto do Morro, a pior parte seria subir a colina onde se encontrava a comunidade. Apesar da inclinação do relevo, eu precisava admitir, era uma ótima localização. Dava para ver toda a região em um raio de vários quilômetros e, além disso, atrasava a chegada dos caminhantes.

O Sol da tarde estava no topo, levemente inclinado. Fazia muito calor para um dia de inverno e eu já estava ficando cansada. A minha mochila, que antes parecia leve, se tornava mais pesada à medida que caminhávamos. Eu só levava roupas, alguns alimentos, água e outros utensílios de sobrevivência. O revólver estava no coldre, ao lado da minha faca com punhal. Carl, um pouco à minha frente, era o oposto. Ele estava completamente focado, parecia não sofrer com cansaço algum, suas passadas eram mais rápidas e firmes que as minhas. Sua determinação era tanta que eu chegava a pensar que nem mesmo um meteoro o impediria de chegar ao Alto do Morro.

Quando finalmente avistei a colina mais ao fundo, comecei a imaginar que estávamos próximos. Entretanto, uma placa velha e enferrujada na lateral da estrada indicava que só havíamos percorrido um mísero quilômetro. Isso foi desanimador, mesmo assim continuei andando. Parei alguns metros à frente, quando esbarrei em Carl. Por algum motivo ele tinha parado, e fitava algum ponto no horizonte. Olhei para aquela direção e pude avistar uma van preta estacionada mais à frente, próxima a um trailer.

– O que é? – indaguei confusa.

– Não é “o que”, a pergunta certa seria quem são – meu namorado respondeu num tom mais baixo, ajeitando o chapéu para impedir a passagem dos raios solares. Ao lado dos veículos, havia dezenas de homens com trajes negros, que seguravam armas brancas. Não deveriam ser amigáveis, foi o julgamento que fiz apenas por vê-los de costas. Certamente suas expressões confirmariam essa ideia. Mais homens de preto pareciam escoltar as pessoas que saíam do trailer, levando-as até a parte traseira da van. Foquei a visão nesse pequeno grupo e, apesar da maioria estar de cabeça baixa, pude reconhecê-los.

Eles eram jogados no veículo de maneira hostil, e, mesmo contrariados, não reagiam. Talvez fosse por serem minoria e estarem desarmados. Torci para que fosse apenas uma miragem ou ilusão provocada pela minha mente confusa por causa do Sol, porém, no fundo, eu sabia que era verdade. Ver minha família naquela situação era terrível, e o que me deixava mais atordoada era não poder fazer nada. Voltei-me para Carl, na esperança de que ele conhecesse a resposta, tivesse um plano ou soubesse como deveríamos agir, contudo ele parecia completamente sem reação.

– O que nós vamos fazer? – perguntei depois de algum tempo.

– Não sei – era possível detectar o medo em sua voz, apesar do disfarce.

– Ei, rapazes! Olhem só, temos visitas! – um dos homens gritou, apontando um taco de beisebol coberto de arame para nós. Era Negan, eram os Salvadores. O máximo que pude fazer foi dar um pequeno passo para trás, depois disso todos os meus músculos pareceram congelar. Os homens começaram a vir até nós, e eu simplesmente não sabia o que fazer.

– Ave, corre! – Carl me puxou pela mão e começou a correr na direção contrária. Enquanto ele parecia estar desesperado, eu era praticamente arrastada, parecia estar no modo automático enquanto meu cérebro absorvia aquelas informações. Os Salvadores tinham capturado eles.

Eu não sabia exatamente o que estava fazendo, para onde estava indo ou o que passava pela cabeça de Carl. Ainda tinha uma pontada de medo que me perturbava bastante, tinha a possibilidade de tudo dar errado. Eu já era adulta o suficiente para saber que um elemento surpresa não cairia do céu para nos salvar, isso tudo era real. Não ousei olhar para trás por um segundo sequer, eles poderiam estar a dois passos de nós. Era lógico que os Salvadores não nos deixariam ir, por isso continuei correndo aos tropeços. Mas meus pés não foram os responsáveis por me derrubar.

O som do tiro pareceu congelar o tempo.

Carl foi o primeiro a cair, se chocando contra o asfalto quente. Como estávamos juntos, acabei indo junto. Só tive a mão esquerda de apoio, então tudo pareceu rodar antes de escurecer. Sentia muita dor por todo o corpo, mas não sabia exatamente onde era. Minha pele ardia muito, provavelmente por causa do asfalto, fora isso eu estava bem. Por outro lado, se não tinha nada errado comigo, o que havia acontecido com o tiro?

Soltei Carl, usando a mão direita para me levantar, já que a outra estava ralada e o braço estava dolorido. Só então pude ver o estado em que meu namorado se encontrava. Ele estava deitado de lado, seus olhos aparentemente fechados indicavam perda de consciência. O chapéu de cauboi estava jogado alguns metros adiante. Do tronco para cima não havia nenhuma marca de tiro, o que já era um bom sinal. Quando meus olhos chegaram aos membros inferiores, o que encontrei foi uma poça de sangue. Havia dois furos em sua calça, na região da coxa esquerda, o que significava que a bala havia saído de lá.

– Carl... Você está bem? Carl! – chacoalhei seu ombro cuidadosamente, e só obtive resposta ao usar um tom mais alto. Seus olhos se abriram lentamente, e ele pareceu bastante atordoado.

– Eu estou OK.

– Vai ficar tudo bem – disse com firmeza, colocando a mão no seu rosto. Apesar disso, eu sabia que não poderíamos estar piores. Se não tratássemos aquele ferimento logo, Carl poderia morrer ou algo do tipo, e os Salvadores ainda estavam lá.

– Ora, ora... O que temos aqui? Um casal apaixonado, que tocante – Negan comentou se aproximando, ele já não tinha tanta pressa assim. – Se não são a loirinha e o cara de chapéu da base militar! – ele se voltou para Carl, parecendo feliz ao notar seu ferimento. – Corrija se eu estiver errado, mas me lembro de você ter matado muitos dos meus homens. Fiquei com uma puta raiva de você. Mas, como sou um cara bom, vou deixar verem a sua família e ficar junto com ela, por enquanto... Antes disso, passem as armas.

O homem estendeu a mão, e eu preferi não contestar. Carl, não parecia estar bem, apesar de ter afirmado o contrário. Negan tinha muitos homens e aquele taco de beisebol que era capaz de me aterrorizar. Algo me dizia que ele deveria estar louco para usá-lo em alguém, e a última coisa que eu queria era enfurecer aquele homem. Tirei a faca e o revólver da cintura antes de pegar as armas de Carl, que não gostou nada daquilo. Ele sabia muito bem que não estávamos em posição de contestar nada, Negan parecia bem mais macabro visto de baixo, o fato de estarmos no chão já significava uma imensa desvantagem.

Dois homens sérios se aproximaram para nos levar. O que segurou Carl se preparou para bater nele, porém Negan fez um gesto coma mão que o interrompeu. Fomos empurrados até a van, meu namorado mancava muito, por isso o percurso pareceu ser mais longo. Quando chegamos ao veículo, todos voltaram as atenções para nós. Apesar disso, nenhuma palavra foi dita. A presença dos Salvadores não tornava o local propício para um reencontro ou uma repreensão.

Carl foi jogado de qualquer jeito lá, juntamente com seu chapéu, enquanto eu apenas fui empurrada. A porta se fechou e o local ficou escuro, tudo o que podíamos ouvir era o som do motor sendo ligado. Logo fui para o local onde minha mãe estava, a única coisa que consegui fazer foi abraçá-la. Algumas lágrimas de medo rolaram pelas minhas bochechas, a incerteza me deixava apavorada.

Tudo não podia ter dado mais errado. Estávamos cercados por inimigos, sendo levados para um local desconhecido e não havia nada que pudéssemos fazer. Além disso, meu namorado estava ferido gravemente e, mesmo que Sarah estivesse com ele, não havia muito que ser feito naquela van. Talvez Negan tivesse impedido aquele homem de bater nele por isso, ele queria que Carl sangrasse até a morte. No final das contas, estávamos errados. A única coisa que nós dois havíamos conseguido fora piorar tudo. Talvez não devêssemos ter voltado, com certeza Scott e Mika estavam bem melhor.

– Para onde estamos indo? – sussurrei para minha mãe com uma voz trêmula e infantil.

– Para o Santuário – na verdade, o que eu pude ouvir foi que estávamos indo para a morte.

*Narrado por Gabriela Hopper

Eu estava sentada no chão do veículo quando a porta se abriu, permitindo a entrada de uma luminosidade que incomodou meus olhos. Dois vultos foram jogados dentro do veículo, aquilo não poderia ser verdade.

Após alguns segundos de relutância, tínhamos abaixado as armas e sido delicadamente conduzidos até a van preta dos Salvadores. Nada fora feito depois que nos distribuíramos pelo pequeno espaço destinado a nós no veículo, então nenhum de nós dissera absolutamente nada. Durante aquele tempo, havíamos evitado contato visual entre nós, ninguém queria ver o medo refletido nos olhares dos outros. O único que permanecera com a cabeça erguida fora Jesus, mirando a porta por onde tínhamos entrado, a raiva era visível em seus olhos azuis.

Havíamos ficado muito tempo presos naquela escuridão, apenas aguardando a van ser ligada para nos levar até o Santuário. A espera era uma tortura, Negan poderia fazer o que quisesse conosco. Seus planos poderiam ser os piores possíveis, provavelmente ele acabaria com a guerra dependendo do que fizesse. Matar dois dos quatro líderes da oposição seria o mais sensato a se fazer, ou talvez ele matasse o grupo inteiro. Todas as possibilidades que tinham passado pela minha cabeça nesse período de tempo só serviram para me atormentar mais, algo que a simples presença de Negan já era capaz de provocar.

Eu não podia acreditar que Avery e Carl estavam lá. Dois homens os soltaram no chão, e os garotos caíram gemendo de dor. Rick logo foi até o filho, porém não pude ver mais nada, pois Avery se jogou sobre mim. Apertei minha filha o mais forte que podia, tentando reconfortá-la. Apesar disso, ela tremia bastante e tive a impressão de que começou a chorar.

– Para onde estamos indo? – Avery perguntou num tom quase inaudível.

– Para o Santuário.

Voltamos a ficar em silêncio depois disso, o ar da van parecia muito pesado. O veículo se movimentava rapidamente, o que fazia com que chacoalhasse às vezes. Enquanto isso, Carl continuava sangrando, e a situação não era nada boa. O estrondo que escutáramos na fora depois de termos sido colocados na van fora um tiro e esse atravessara a perna de Grimes. Sarah tentava fazer o máximo que podia com a falta de recursos. O ideal seria uma sala de cirurgia, contudo isso estava fora de questão. Ela disse que precisaria de folhas de chá, água e uma vela, mas com certeza os Salvadores não seriam gentis. A única coisa a ser feita era interromper o sangramento, parando a circulação.

O carro finalmente parou e, apesar de não termos noção alguma de espaço, todos sabiam que estávamos no Santuário. A minha angústia inicial se foi por completo, eu já não tinha vontade alguma de sair daquela van escura e abafada. Se eu ao menos pudesse tirar minha filha de lá, estaria mais tranquila, porém isso não seria possível. Apesar de querer muito saber como ela e Carl tinham sido capturados pelos Salvadores, não era o momento. E ainda havia Scott, Mika, Grace, Sam e Hesh, eu tentava dizer a mim mesma que eles estavam bem.

– Mãe, eu preciso te falar uma coisa... – ela começou em forma de sussurro. Podíamos ouvir claramente os passos de Negan e dos outros em direção a traseira do carro, não tínhamos mais tempo.

– Não precisa dizer nada, querida.

– Sam e os outros estão bem. Eles estão seguindo o plano e vão ficar bem sozinhos. Carl e eu voltamos para tentar ajudar – o alívio foi instantâneo, isso acabava com metade das minhas preocupações. Eu até poderia me sentir bem, porém havia Avery. – Nós devíamos ter ficado lá, mas eu não podia te deixar. Eu sinto muito.

– Está tudo bem – não adiantava falar mais nada, o estrago já tinha sido feito. – Eu te amo muito, isso é o que importa. Agora...

– Ei, segura a Lucille pra mim. Eu quero ver a cara desses cuzões – ouvimos a voz de Negan do outro lado. – Dwight, Daryl, venham aqui! Vocês vão gostar de ver isso.

A porta dupla se abriu assim que aquelas palavras foram ditas, revelando o líder dos Salvadores ao lado do homem com rosto deformado. Ele estava bastante sério, ao contrário de Negan, que parecia se divertir com a situação. Daryl, atrás dele, se manteve indiferente, apesar dos olhares que recebia. Deveria estar sendo terrível para ele saber que todos o odiavam e, acima de tudo, saber o que Negan estava prestes a fazer e não ser capaz de interferir.

– Bem, parece que o Gregory não mentiu mesmo, ele nos ajudou a pegá-los – Dwight comentou. – O que pretende fazer com eles?

– Você verá. Agora, seus arrombados, se não querem morrer aqui é melhor saírem logo do carro.

Todos obedeceram, dessa vez não foi necessário que os Salvadores nos empurrassem. Passamos de cabeça baixa pelo pátio, seguindo até o interior da fábrica. Rick, Glenn e Maggie lançaram olhares duros para Daryl, apesar de toda a raiva, eles ainda estavam magoados com aquilo, e eu não podia culpá-los. Evitei contato visual com meu namorado, eu tinha medo de transparecer alguma emoção positiva em relação a ele, até porque não havia como ter uma na situação me que nos encontrávamos.

O interior do Santuário tinha uma aparência melhor que o lado de fora, já que não havia errantes, atrás de mim eu podia escutar os gemidos dos mordedores presos nas grades. As paredes eram cinzentas com algumas manchas de sangue, o local era frio e possuía escadas de metal, que levavam a outros andares. Mais ao fundo era possível ver esteiras e outras máquinas, todas paralisadas. O pátio central onde estávamos era espaçoso e completamente vazio. As escadas que circundavam a região estavam repletas de pessoas, o mais estranho era que nenhuma delas possuía qualquer tipo de arma. Deveriam ser moradores do Santuário, pessoas que não eram como os Salvadores.

– Ei, você! Vem cá! – Negan acenou para um de seus homens. Ele era jovem e inseguro, trazia nas mãos o taco de beisebol do seu líder. – Você que trouxe ela pra mim de lá até aqui?

– Sim, senhor.

– Você foi cortês com ela? Foi gentil? – o homem perguntou deixando todos confusos, principalmente o jovem. O que mais assustava era a sua expressão completamente séria.

– Eu...

– Tratou ela como uma dama?

– Tratei, acho que tratei.

– Comeu a buceta dela igual a de uma dama? – Negan pareceu mais sério do que antes, assustando mais o jovem. Revirei os olhos discretamente, ele era uma pessoa desprezível, não era possível que estivesse falando tais asneiras quando estava prestes a nos matar ou algo do tipo.

– Bem, eu...

– Tô te zoando! Um taco de beisebol não tem buceta! – dizendo isso, ele pegou a arma e começou a rir, como se fosse a coisa mais natural do mundo, e era óbvio que ninguém estava achando graça. – Agora dê o fora daqui e volte para o seu lugar. Onde estávamos?

– Negan, antes de começar eu gostaria de acertar as contas com ela – Daryl falou apontando para mim. Fiquei chocada assim como todos, eu não sabia o que ele pretendia fazer com aquilo, por isso apenas aguardei uma resposta do líder dos Salvadores.

– A sua mulher? Ou ex-mulher? Você tem bom gosto. Claro que pode, só se lembre das regras. Nós não estupramos.

– Pode deixar, é apenas um acerto de contas – ele prosseguiu com frieza enquanto caminhava na minha direção. Daryl puxou o meu braço violentamente, e eu comecei a ir com ele, porém fui interrompida por Avery, que me segurou.

– Mãe!

– Eu vou ficar bem – tentei passar segurança na voz. Por mais que todos duvidassem disso, eu sabia que ele não me machucaria e, se eu dissesse a verdade, talvez minha filha fosse capaz de acreditar. Mas, no fundo, eu tinha certo receio, e isso poderia me ajudar e fingir que estava com medo. – Fique viva.

Daryl saiu do pátio me arrastando, suas mãos apertavam meu braço de tal forma que chegava a doer. Ele parou em um corredor vazio e me arremessou contra uma estante, o choque me deixou tonta e dolorida. Voltei à realidade quando suas mãos seguraram meus ombros, dessa vez mais delicadamente do que antes.

– Você está bem? – sua voz rouca saiu um pouco preocupada, e eu me limitei a balançar a cabeça afirmativamente, apesar da dor. – Onde estão as crianças?

– Scott e Mika estão com eles indo para um lugar seguro. Os Salvadores não vão encontrá-los lá.

– Eu vou soltar Malcom e Rose, você precisa desligar os geradores, como fez no posto avançado. Vai escurecer logo, e isso deve atrasar o showzinho do Negan.

*Flashback (narrador observador)

Frederick deu três batidas na porta. Enquanto aguardava ansiosamente por uma resposta, ajeitou o paletó, a gravata, os cabelos e a flor de enfeite no bolso. Ele não poderia estar mais nervoso para a ocasião, apenas os noivos o venciam nesse quesito. Fred seria padrinho no casamento de sua irmã mais velha, além de fotógrafo da cerimônia, um presente simbólico para o casal, já que não tinha dinheiro para comprar algo. Ele terminaria a escola naquele verão, e fazia pequenos trabalhos com fotografias para bancar sua paixão por antiguidades. O que ele fazia era pouco perto do esforço da família Morris, que gastara muito para realizar a cerimônia. Mesmo assim, Sarah havia ficado comovida com a atitude do irmão e, mesmo que James desejasse contratar algo mais profissional, aceitara o gesto de Fred prontamente.

Lá fora o céu pareceu finalmente se abrir, como se fosse um presente para os noivos, já que os primeiros dias de primavera haviam sido cinzentos e chuvosos. Se o tempo tivesse continuado do jeito que estava, não haveria mais celebração depois da cerimônia na igreja e talvez nem casamento, já que a família Morris exigia nada menos que a perfeição para a ocasião. Tudo já estava pronto, a ornamentação da igreja, assim com a do jardim da casa dos pais de James, estava devidamente colocada, enfeitando os dois ambientes com flores silvestres, os aperitivos e outros pratos estavam sendo preparados para que estivessem frescos na hora que os noivos e os convidados chegassem e até mesmo a noiva estava pronta. Na verdade, ela estava pronta fisicamente, mas psicologicamente estava à beira de um ataque de nervos, aflita, Sarah não sabia que decisão tomar e essa dúvida havia surgindo justamente naquele momento, faltando uma hora para o casamento.

Do outro lado, ela abriu a porta. A maquiagem da noiva fora feita, assim como os cabelos. Algumas machas haviam sido presas, deixando o restante solto, uma exigência de Sarah. As joias que usavam foram presentes da sogra, desde os brincos até a delicada pulseira de ouro branco. O vestido que Sarah usava tinha sido escolhido em duas semanas, não por indecisão, mas para ter certeza de que era o vestido ideal. E ele fora encontrado depois da noiva visitar cinco lojas com a sua família. Delicado como ela queria, a barra do vestido repleta de rendas, a cintura marcada delimitando a saia rodada que ia até o chão. A parte superior possuía uma camada de rendas, que cobria até os ombros, era fina e graciosa.

– Sarah, você está linda! – Fred exclamou ao constatar o quão bela estava sua irmã mais velha.

– Obrigada! – a médica recém-formada agradeceu com um sorriso radiante, apesar da insegurança. – Você não deveria estar na igreja com a Taylor?

– Ela ainda está se arrumando – assim como ele seria padrinho, Taylor, a prima de James, seria madrinha do casamento. Ela era uma garota loira, de 18 anos, assim como Fred, olhos claros, como toda a família, e pele rosada. Era sorridente e possuía bochechas volumosas, o que acentuava sua expressão alegre e juvenil, e fazia com que ela parecesse bem mais nova. Fred rapidamente fizera amizade com ela nos ensaios para o casamento, e a futura sogra de Sarah, Eva Morris, estivera empenhada nas últimas semanas a unir sua sobrinha e o cunhado de seu filho. – Além do mais, tenho que tirar algumas fotos da noiva, antes que ela fuja – o garoto brincou, porém logo em seguida pôde notar o susto estampado no rosto de Sarah. – O que foi? Não vai me dizer que estava planejando isso.

– Fred! Não brinque com uma coisa séria! Mas eu já pensei nessa possibilidade...

– Vem cá – ele conduziu a irmã até sua cama, fazendo com que se sentasse. – O que aconteceu com aquela mulher determinada que mal via a hora de subir no altar?

– Eu não sei... – a noiva desviou o olhar dele, segurando as mãos trêmulas na frente do corpo. – É um passo grande de mais, não sei se estou pronta para fazer isso. Não envolve só a minha vida amorosa e afetiva, eu vou me mudar para outro estado, começar a trabalhar de verdade em outro lugar e ficar longe da minha família.

Frederick ficou pensativo por alguns minutos, observando pela janela as árvores floridas da primavera. Sua irmã falava sobre decisões e ele sabia que não era a pessoa certa para falar sobre isso. Faltavam algumas semanas para entrar na faculdade e o jovem ainda não sabia o que pretendia cursar, uma decisão tão grande quanto a de Sarah. Ele não era a pessoa mais indicada, contudo a única em que ela confiava e que tinha no momento.

– Eu não tenho dúvidas do meu amor pelo James, só não sei se estou preparada para abrir mão de tudo isso para viver com ele. Nunca tomei uma decisão tão difícil na minha vida. Eu sempre soube o que responder quando um garoto mais velho me convidou para o baile da formatura, tive certeza do que dizer quando ele me pediu em namoro, depois em casamento. Sempre soube que carreira seguir. Tudo o que eu construí foi feito dessas escolhas, e agora eu tenho medo de me arrepender. Realmente vale a pena fazer isso?

– Você sabe que eu não sou bom com isso. Não vou mentir, você tem algo bom aqui na Geórgia, enquanto o seu futuro no Alabama é completamente incerto. Mas a verdade é que o tempo todo você terá alguém que ama do seu lado. A pergunta não é o que você deve fazer, e sim se está disposta a abrir mão disso tudo pelo seu amor.

– Eu não quero abrir mão de você.

– Não precisa. Eu prometo que, independentemente das nossas escolhas, sempre estaremos juntos. Somos irmãos, sempre teremos um ao outro, e não tem distância no mundo que possa nos separar, nem mesmo alguns quilômetros.

– Eu não sei se devo fazer isso...

– Você o ama, não é? Então não preciso dizer mais nada. Você já fez a sua escolha, só não sabe disso. Isso reflete a sua personalidade, você faz qualquer coisa pelas pessoas que ama.

– Obrigada.

Depois da conversa, Fred iniciou seu trabalho tirando as primeiras fotos da noiva. Em seguida, a levou até o carro, onde o pai dos irmãos esperava para ir até a igreja. Ele tirou outras fotos de Sarah com Tyler West, que estava muito emocionado pelo casamento. Ele levaria sua única filha ao altar, e também seria um de seus últimos dias juntos antes de se separarem. Meses antes de ficar noivo, James fora transferido para um escritório em Jackson, no Alabama. A proposta era irrecusável, já que era a oportunidade aguardada pelo advogado. Por isso a cerimônia tinha sido organizada tão rapidamente, Sarah não queria se separar do namorado, muito menos ele dela. O casal estava junto havia 12 anos, já estavam prontos para o casamento e não tinham dúvidas de que queriam passar o resto de suas vidas juntos.

A conversa entre os irmãos, apesar de breve, tivera um grande significado. Sarah daria um grande passo na sua vida, e as palavras de Fred tinham sido o suficiente para mostrar a ela que não deveria temer aquilo. O garoto, por outro lado, havia aprendido a importância de uma escolha, e sempre fazer o que julgava certo, apesar das dificuldades e riscos. Parecia ser o destino dos West fazer tudo pelas pessoas que amavam, colocá-las como prioridade acima de tudo, deixando a si mesmos em segundo plano, porque não havia coisa mais importante do que sua família e o bem estar dela. E isso não incluía apenas os laços de sangue, também havia a amizade, a fraternidade, a paixão.

*Narrado por Sarah Grimes

Todos ficaram chocados com a frieza de Daryl quando ele pegou Gabriela e a arrastou para fora. Eu não conseguia compreender como alguém poderia mudar tanto em poucas semanas, mas talvez ele sempre tivesse sido assim, apenas esperando uma oportunidade. Porém eu não era psicóloga, nunca compreenderia a mente daquele homem. Não gostava de pensar no que aconteceria com Gabriela, entretanto o nosso futuro era tão assustador quanto o dela. Mesmo sem termos uma noção do que aconteceria, a morte era uma certeza.

– Acho que fui bem claro quando expliquei as coisas pela primeira vez, mas, como parece que ninguém entendeu, vou falar de novo. Veja bem, Rick. O que quer que você e seu grupinho façam... Não importa o quê... Você não vai foder com a nova ordem mundial – Negan começou o discurso, caminhando entre nós com as mãos nas costas. – A nova ordem mundial é assim, é bem simples, e mesmo se você for a porra dum retardado... Que você pode muito bem ser... Dá pra entender. Preparado? – ele parou de frente para Rick, que levantou o rosto para encará-lo. – Aqui vai... Presta atenção: me dê suas coisas ou eu mato você. Você trabalha pra mim agora, se tiver alguma coisa... Você dá pra mim. Esse é seu trabalho. Sei que pode ser meio difícil de engolir, mas pode ter certeza que você vai engolir. Você comanda um grupo, constroi algo, acha que está em segurança, sei como é... Mas a palavra foi dada, você não está seguro... Nem um pouquinho de nada. De fato você tá ferrado. E vai ficar mais ferrado ainda se não me der as merdas que eu quero. E o que eu quero é a metade das suas coisas... Se for muito pra você, simplesmente crie, encontre, roube mais, que uma hora vocês conseguem. É assim que vocês vivem agora. Ou pelo menos iam viver... Eu dei a porra da chance, e tudo que vocês fizeram foi jogar a merda no ventilador, levando as outras comunidades junto. Tudo por causa de um filho da puta chamado Rick Grimes. Eu não sou burro, sei que se deixar você irem embora tenho grandes chances de perder, e eu não vou perder essa porra que vocês chamam de guerra. Estamos entendidos? – Negan aproximou uma mão do ouvido, aguardando uma resposta, entretanto ninguém ousou dizer nada. Olhei para os lados, todos estavam de cabeça baixa. Fred, ao meu lado, parecia pensativo. – Ponham eles em fila. De joelhos! E não tentem resistir.

– Não! – Fred disse se soltando do homem que o segurava para dar um passo à frente.

– É tarde de mais para ser covarde, não dá para voltar com o acordo – o líder dos Salvadores rebateu. Eu não sabia o que estava passando pela cabeça do meu irmão, aquilo ela loucura. Por mais que eu quisesse muito, ir até ele só pioraria tudo. – O que você quer contestar, cara? Você tem cinquenta homens te cercando, caralho. Cinquenta! Senta o rabo no chão agora!

– Eu não entendo. Você mesmo falou sobre uma nova ordem mundial, mas não consegue compreendê-la. Você quer encerrar essa guerra, não é? Vamos encerrar então. É só ficar esperto e fazer as coisas do jeito certo. Vamos trabalhar juntos.

– Não entendi. Está dizendo pra apertamos as mãos e cantarolarmos? É sério isso? Rapaz, você é mais maluco do que eu pensava.

– Estou dizendo para você parar de ferrar com tudo, para que todos nós possamos viver. Por que você está lutando? Nós estamos lutando contra um filho da mãe que ameaça nos matar se não dermos metade de tudo que temos. Nós estamos lutando por uma forma pacífica de viver... Após passarmos por um período pacífico. O ponto que quero levantar, Negan, é que já passamos por um monte de coisas e aprendemos a viver neste mundo... E você está ferrando com tudo. Os mortos são um problema... Mas aprendemos a lidar com esse problema. Eles sempre serão perigosos... Eles sempre viverão entre nós, mas nós somos capazes de lidar com isso... A longo prazo. Agora tudo que temos que nos preocupar é com você! Portanto, é por isso que estamos lutando, por um mundo sem Negan. E você?

– Certo... Vou entra no seu jogo, rapaz – eu compreendi onde meu irmão queria chegar, era algo que todos nós queríamos dizer, algo que colocasse luz na cabeça de Negan e fizesse-o ver a situação como realmente era. – Você quer falar sobre isso... Vai fazer com que se sinta melhor? Claro. Vamos falar sobre essa merda. Francamente... Eu estive apenas me defendendo de um bando de putos ingratos na maior parte do tempo. Mas, no fundo, estou tentando restaurar a ordem... Fazer as com que as coisas sejam como antes de vocês aparecerem e foder com a porra toda. Veja bem... Eu sei do que as pessoas precisam para sobreviver... Elas precisam de alguém como eu. Alguém pra manter todos na linha, para manter todos preocupados, para que eles não fiquem pensando em como são miseráveis. Estou salvando vidas.

– Você é tão retardado que acredita mesmo nisso, não é? – foi a vez de Rick entrar na conversa, se erguendo e ficando cara a cara com Negan assim como meu irmão estava. Desta vez todos se levantaram, até mesmo Carl, e os Salvadores ficaram em estado de alerta. – Posso te lembrar de algo que pelo visto você esqueceu? Nós temos o mundo inteiro para dividir! Não tem tanta gente sobrando. Não tem motivo para lutarmos. Nós temos um inimigo em comum, como Fred disse... Você sabe, aqueles que aparecem e nos matam enquanto não estamos matando uns aos outros.

– Cala a porra da sua boca, Grimes! Essa conversa é entre o rapaz e eu. Coloquem-no de volta no chão! – Negan ordenou e rapidamente alguns Salvadores apareceram e o jogaram brutalmente no chão ao meu lado. Eu era simplesmente uma espectadora, desejando ardentemente fazer alguma coisa, porém eu tinha certeza que o líder dos Salvadores não aceitaria mais uma interrupção. Eu pouco me importava com o que ele faria comigo, contudo meu irmão estava bem na linha do fogo cruzado.

– Rick está certo, e você sabe disso. Sabe o que estamos fazendo? O que estamos fazendo é ajudá-los a vencer, se continuarmos com essa guerra não vai sobrar nenhum de nós para vencer. Eu tenho uma ideia: você quer metade das nossas coisas? Então traga-nos alguns cobertores. Traga ferramentas, nos dê um pouco de gasolina, junte tecidos para fazermos novas roupas... Isso sim é uma parceria, cada um faz sua parte e você deve fazer algo do de produtivo!

– Você está propondo que a gente estabeleça um sistema de permutas?

– Sim... Exatamente isso. Simples assim.

– Você é muito sonhador, garoto. E sabe o que acontece com pessoas sonhadoras nesse mundo? Elas morrem.

Quando as últimas palavras foram ditas, tudo aconteceu muito rápido. Fred deu um passo para trás, porém não conseguiu ir muito longe. Negan se adiantou, erguendo seu taco de beisebol e acertou o peito do meu irmão. Ele cambaleou para trás, o sangue espirrou para todos os lados. O líder dos Salvadores repetiu o golpe, dessa vez com mais força, o que fez Fred cair no chão. Tudo que eu pude fazer nesses poucos segundos foi gritar o nome dele e cair no chão de joelhos, tonta depois daquelas imagens. Eu não me importava mais com o que estava acontecendo no Santuário, nem com a reação das pessoas à minha volta. Se olhasse para Negan, certamente faria algo ruim, por isso tentei voltar todas as minhas atenções para meu irmão.

Eu precisava fazer alguma coisa para ajudá-lo, no entanto não conseguia pensar em mais nada, não tinha como curar aquele ferimento. Fred estava no chão, ao meu lado, sangrando muito e respirando com dificuldade. Sua blusa estava rasgada e completamente suja de sangue, exibindo um corte profundo. Seu rosto perdia cor a cada segundo, assim como os lábios. Os olhos azuis pareciam perder o foco, e a única coisa que pude fazer foi pegar sua mão, que estava gelada, para que meu irmão se concentrasse em mim.

– Fred... Olhe para mim, está bem?

– Eu fui um idiota... – ele tossiu novamente, dessa vez fazendo com que mais sangue escorresse pela sua boca. – Eu só queria mostrar a coisa certa para ele...

– Você não é um idiota, pelo menos você tentou – tive raiva de mim mesma por não ter feito nada enquanto Fred tinha se arriscado para nos salvar. Eu queria poder trocar de lugar com ele, isso seria mais justo.

– Isso não é verdade. Agora eu estou morrendo... por causa dessa escolha. Eu tentei fazer do jeito certo. Eu não podia abaixar a cabeça sem tentar. E eu pensei que, se tentasse, poderia dar certo...

Balancei a cabeça negativamente, eu estava chorando desesperadamente. As lágrimas deixavam a minha visão embaçada, mesmo assim não tive forças para limpá-las. Minhas mãos estavam ensanguentadas, mesmo assim as mantive firmes segurando Fred, como se aquilo pudesse impedir que ele fosse embora. Meu coração ficava mais apertado conforme ouvia a respiração fraca do meu irmãozinho, sempre que ele tossia ou fechava os olhos demoradamente. Parte de mim queria ir até Negan e espancá-lo para que ele sofresse assim como Fred, contudo aquele homem não era a minha prioridade. Eu não podia perder meu irmão daquele jeito, ele precisava ficar comigo por mais tempo. Era minha obrigação protegê-lo, e eu havia falhado.

– Você não pode morrer, e não vai. Você prometeu que as nossas escolhas não nos separariam! – supliquei de forma quase infantil, como se fosse uma opção.

– Por isso eu preciso que você prometa que vai sempre se lembrar dos nossos momentos bons... Vai ser o único jeito de manter o que sobrou da promessa. Estamos nos separando aqui, mas eu sempre estarei nas suas memórias. Eu te amo e...

Fred não conseguiu terminar a frase, pois no mesmo instante Negan acertou sua cabeça com o taco de beisebol, repetindo o movimento outra vez, até que seu crânio se partisse, liberando massa cerebral para todos os lados. Não consegui pensar em mais nada, automaticamente me arrastei para trás, berrando o mais alto que eu podia. Depois do choque, fiquei observando minhas mãos, trêmulas e ensanguentadas, antes de voltar a chorar, dessa vez com mais força. Eu quase não conseguia respirar, tinha sido de mais para mim. O corpo de Fred estava lá, inerte, era possível ver um globo ocular jogado, próximo ao que restara de sua cabeça. Sua face estava irreconhecível. Havia muito sangue, misturado com os restos do crânio, cabelos e da maça cerebral tudo escorria do que havia poucos segundos fora uma cabeça.

Eu não sabia mais onde estava, só podia ouvir um zumbido forte, o local parecia ter ficado branco, eu estava sozinha. Fiquei observando o cadáver de meu irmão mais novo por algum tempo, completamente parada. Em seguida, simplesmente não pude mais olhar para aquilo, era terrível. Passei a fitar o chão, meu corpo tremia bastante. Fui caindo aos poucos, até que fui envolvida pelos braços de alguém. A pessoa sussurrou algumas palavras no meu ouvido, mas elas não faziam sentido algum para mim. A única coisa que significava algo era a segurança e o conforto que aqueles braços me traziam, por isso apenas o segurei com força e continuei a chorar.

– Sinto muito por isso, eu só queria acabar com o sofrimento do rapaz, era agonizante! – Negan quebrou o silêncio e seus homens fizeram com que todos os que ainda estavam de pé se ajoelhassem. – Droga! Eu queria ter apresentado ela antes de usar, não era pra matar alguém antes. Vamos apenas esquecer essa ceninha e fingir que nada aconteceu, OK? Eu não queria ter que matar nenhum de vocês... Vamos deixar isso bem claro desde o princípio. Queria que vocês trabalhassem pra mim, e não dava pra vocês fazerem isso direito se fossem uns merdas duns mortos, não dava, né? Eu não tô cultivando um jardim. Mas vocês mataram meus homens... Um tanto bom deles. Uma quantidade do caralho pra deixar por isso mesmo. Por isso... Vocês vão ter que pagar. Antes de todos morrerem, alguém vai receber uma puta porrada da porra fodida do caralho com meu bastão. O qual eu chamo carinhosamente de “Lucille”. A Lucille tem arame farpado enrolado na ponta dela. Legal pra caramba. Aí é só questão de escolher qual de vocês vai ter a honra – Negan caminhou até o início da fila, observando cada um de nós. – Cara, fui batizado cristão, não posso matar Jesus! O que minha mãezinha diria? O coreano não... Sou um monte de coisas, mas nunca vou ser chamado de racista, sem chance nenhuma. Você está fora da lista. Fiu, fiu... Tem muita coisa que eu gostaria de fazer contigo, e te matar está com certeza no final da lista. Embora continue nela. Você e seu namoradinho estão salvos, por enquanto. Mesma coisa, racismo. E pelo amor de Deus, te falta uma mão e você ainda está vivo! E você, gorducho, também não sei como aquelas merdas ainda não te comeram. Eu adoraria saber a sua história! Ei, não chore, loirinha, sua mãe deve estar acertando as coisas com seu pai, eles vão ser felizes. E qual a história desse serial killer do futuro? Puta merda, guri... Que cara é essa? Pelo menos chore um pouco, você foi baleado, deve estar uma dor do cacete isso aí! Não posso te matar antes que a sua história termine, vai ser interessante pra caralho. E você? Acha que eu sou estúpido a esse ponto? Você é o líder, o que as pessoas viram e você? Aposto que eles te veneram pra caralho. A regra do jogo é te desmoralizar na frente deles. Vou enfiar meu pau na sua garganta e te fazer me agradecer por isso... Aí, todos vocês caem em sequência. E, por último, essa deve ser a putinha do Rick. Mas não posso te matar, aquele garoto com os miolos abertos deve ser tipo seu irmão, a Lucille não pode dizimar sua família.

Negan começou a caminhar novamente, olhando para cada um de nós e avaliando a situação, como se fosse tomar a decisão mais difícil de sua vida. Enquanto isso, todos permaneceram em silêncio, ansiando por sua resposta, assim como os outros Salvadores presentes. Eu não me importava mais, nós iríamos morrer, eu iria morrer e preferia que fosse o mais rápido possível.

– Eu simplesmente não consigo me decidir, caralho! – o homem exclamou, parecendo contente com aquilo. Sua face se iluminou após aquela fala. – Tive uma ideia. Vamos na sorte. Uni... Duni... Tê... Salamê... Minguê... Um sorvete... Colorê... O... Escolhido... Foi... Você...

Depois de rondar cada um, Negan parou de cantarolar, apontando Lucille para o escolhido. Só então me dei conta de que era eu. Aquilo não importava muito, desde que eu não visse o rosto de Rick. Eu não podia olhar para o lado e vê-lo sofrendo, aquilo tiraria toda a minha coragem. Se alguém fosse ter aquela morte terrível, preferia que não fosse qualquer outra pessoa, eu já estava destruída, um pouco mais de dor não seria nada.

– Porra, a sorte não tá do meu lado hoje! Eu esqueci que vocês não são um só. Levantem o Rick! Espero que ninguém levante, ou a Lucille vai ter que matar mais gente. Todos vão morrer, mas há uma grande diferença entre levar um tiro na cabeça e ser desmembrado para sangrar até a morte.

Tentei segurar a mão de Rick e gritar seu nome, porém eu não tinha mais voz. Meu marido foi puxado pelos Salvadores e arrastado até o centro do pátio. Eu tinha aceitado a possibilidade de morrer de forma lenta e dolorosa, não seria tão ruim assim, contudo não podia ser Rick, eu não suportaria ver aquilo. Não podia deixá-lo ir, mas dessa vez eu não tinha forças para interferir. Eu só queria poder fechar os olhos e voltar para o Alto do Morro, sabendo que Fred, Grace e Rick estavam comigo, todos que eu amava estavam bem. Mas dessa vez eu não tinha mais nada, Negan tirara tudo o que eu tinha, minha filha, meu irmão, minha esperança, e estava prestes a matar meu marido.

– Você é um maníaco – ele disse antes de ser colocado de joelhos, avançando sobre o tirano. Negan bloqueou o golpe com seu taco, jogando Rick no chão. Então ele se aproximou largando Lucille em qualquer canto e segurou a perna direita dele com as mãos.

– Vai se foder – com um movimento rápido, o homem pressionou o membro, partindo os ossos da perna de meu marido em dois. Tudo o que eu consegui fazer foi fechar os olhos.

*Narrado por Daryl Dixon

O silêncio dominava o corredor escuro, de forma que eu só podia ouvir meus próprios passos, cada vez mais apressados. A ausência de som não era um bom sinal, já que eu havia escutado uma gritaria minutos antes. Isso poderia significar que todos já estavam mortos, e a tentativa que salvá-los viera tarde de mais, porém me concentrei em completar a missão. Fui em direção ao painel para pegar as chaves, enquanto isso Gabriela deveria estar desligando a energia.

Eu não tinha um plano concreto para derrotar Negan, mas a única coisa certa era que ele e Dwight deveriam ser mortos. De resto, eu não sabia como seria a reação dos Salvadores, entretanto Malcom afirmava que tinha pessoas boas lá, que ele já conhecia havia mais tempo. Mesmo que nem todos fossem a favor de Negan, ninguém tinha coragem de fazer algo contra ele. Talvez, com o líder morto, todo o sistema não seria mais nada.

Apesar de estar tudo vazio, me mantive em estado de alerta. Quando me separara de Gabriela, tinha julgado ouvir alguns passos, porém havia ignorado isso para prosseguir. Cheguei ao painel onde ficavam quase todas as chaves do Santuário, poucos tinham acesso ao local. No entanto, quando procurei pela chave A113, percebi que ela não estava mais lá. Havia alguma coisa errada lá, as chaves nunca sairiam do painel. Malcom e Rose eram prisioneiros importantes, Negan queria mantê-los na sala até que encontrasse uma forma de acabar com a raça deles e fazer com que isso fosse um exemplo para os outros. Ele era o único que entrava e saía do local, apenas para torturar e tentar conseguir informações do casal.

Apenas uma pessoa poderia ter feito aquilo, a pessoa que tinha me seguido desde a minha entrada para os Salvadores, e provavelmente a mesma que estivera atrás de mim depois que me encontrara com Gabriela. Mas, se ele não estava por perto, só poderia estar com ela.

Quando esse pensamento passou pela minha cabeça, fiz o caminho inverso até a sala onde ficava o quadro de distribuição do Santuário. Tudo que eu tinha eram uma faca e a minha besta, contudo tinha que ser o necessário para salvá-la. Se alguns minutos atrás eu estivera aliviado por saber que Gabriela estava bem e Negan não havia feito nada para machucá-la, assim como a notícia de que Sam e os outros estavam bem, naquele momento o desespero começava a se aproximar de mim.

Fiquei ainda mais preocupado quando me deparei com aquilo. Eu deveria ter percebido a demora de Gabriela para desligar os geradores, não poderia ser algo natural. Que ela tinha dificuldades com tecnologia, eu sempre soubera, porém Gabriela já havia feito isso antes. Ela estava estirada no chão, desacordada e completamente imóvel. Não havia sangue algum no local, assim como não pude constatar sinais de vida em seu corpo de longe.

Corri pelo corredor até me aproximar dela, deslizando de joelhos no chão para alcançá-la o mais rápido possível. Levantei sua cabeça delicadamente, constatando uma fraca respiração, o que já foi o suficiente para me deixar mais tranquilo.

– Gabriela – sussurrei a sacudindo-a levemente, sem obter resposta.

Ela precisava acordar naquele momento, não podíamos esperar mais. Só naquele instante pude perceber o quanto eu dependia daquela mulher, que eu não seria capaz de fazer muita coisa sem ela. Desde o início, na prisão, Gabriela despertara algo diferente em mim. Eu não me lembrava com clareza da primeira vez que nos víramos, apenas de uma mulher sentada no chão, ao lado de seu namorado febril e quase morto. Também recordava dela implorando para que o salvássemos, e do quanto eu achara aquela atitude fraca. Entretanto, naquele momento, segurando-a em meus braços e pedindo, em vão, que ela acordasse, consegui compreender perfeitamente que Gabriela sentira naquele dia, e o quanto eu tinha sido um idiota. Ainda me lembrava de seu choro, aquilo havia me incomodado um pouco. Quando ela já tinha superado parcialmente aquela perda, me tratara de forma hostil, como se eu tivesse sido o culpado. Gabriela era muito certinha e correta, como se nunca tivesse errado na vida, enquanto eu era o cara errado e desprezível. Eu acabara a irritando continuamente, para mostrar a ela o quanto era neurótica, e isso tinha me divertido bastante. No fim, eu havia ficado completamente dependente daquilo, e, no momento em que estivera prestes a perdê-la, tinha percebido isso.

Eu estava perdido nesses pensamentos quando ela começou a dar os primeiros sinais de melhora. Gabriela apertou a minha mão fracamente e abriu seus olhos castanhos, olhando para todos os lados antes de se acostumar com a claridade finalmente me fitar. Então ela se levantou, ficando sentada ao meu lado, sua expressão parecia confusa e assustada.

– Poncho indígena, você me deu um susto – disse com um pequeno sorriso.

– Você e seus apelidos ridículos... – Gabriela revirou os olhos, finalmente voltando a ser ela mesma, o que me fez sorrir novamente. Estava tudo dando errado, mesmo assim aquela mulher ainda conseguia bancar a correta.

– Eu sabia que você era um traidor – Dwight apareceu da parte escura do corredor, sua besta estava nas costas, enquanto o revólver apontava em nossa direção. – Eu sempre desconfiei, desde que você chegou, assim como eu sabia que Malcom e Rose não eram Salvadores de verdade.

– Por que não me mata de uma vez? – perguntei entrando na frente de Gabriela.

– Não, eu tenho que mostrar isso para os outros. Eu sabia de tudo, mas precisava de provas e bastou apagar essa sua mulherzinha para você vir correndo. Negan precisa ver que eu estava certo. Agora se levantem e venham comigo.

Dwight nos conduziu até o pátio, mirando a arma para nós dois, alternadamente. Quando chegamos lá, vi os Salvadores formando um semicírculo ao redor de Negan e do grupo. No canto direito havia um cadáver caído no chão, sua cabeça estava aberta e havia sangue para todos os lados. Mais ao centro, outra pessoa estava caída, e demorei a identificar. Reconheci Rick pelo casaco, naquele momento o sangue subiu à minha cabeça. Cerrei os punhos, eu queria ir até lá e tirar Negan de perto do meu amigo, porém eu não podia fazer nada com Gabriela sendo ameaçada.

– Desculpe por interromper – as atenções se voltaram para nós, especialmente para o interlocutor.

– Dwight, que merda você está fazendo? – Negan saiu de cima de Rick, suas mãos estavam sujas de sangue, assim como Lucille.

– Daryl nunca esteve do nosso lado, foi uma farsa. Não sei se ele nos comprometeu com informações, sabotagens ou algo do tipo, mas ele estava com Malcom e Rose, ia soltá-los. Não sei o que esse puto tinha na cabeça, mas pretendia ajudar esse grupinho fodido.

– Está me dizendo que ele nos traiu esse tempo todo, bem debaixo do meu nariz?

– Sim, eu vi o Dixon com essa vadia, eles queriam soltar os prisioneiros – dizendo isso, Dwight pegou minha mulher pelos cabelos e a jogou no chão. Negan não parecia acreditar muito, talvez pensasse que eu queria voltar com ela ou trazê-la para o Santuário, e o resto fosse imaginação de seu capanga.

Atrás de mim, Dwight deu um sorriso e destravou o revólver, se preparando para atirar. Ele só esperava pela permissão de seu líder para me matar. Tudo o que eu tinha eram duas armas brancas, talvez não fosse o suficiente, mas eu precisava tentar. Rapidamente, me abaixei para sair do alcance da arma. Involuntariamente, houve um disparo, e quase não prestei atenção no homem que foi atingido pela bala perdida. Com o braço esquerdo, empurrei o revólver de Dwight e segurei seu pulso, ao mesmo tempo em que pegava a faca com a mão esquerda e me virava para cortá-lo.

Dwight caiu no chão, saía bastante sangue pelo seu abdômen. Negan ficou surpreso com aquilo, se antes ele tinha dúvidas sobre mim, quando me viu fazendo aquilo teve certeza da traição O líder dos Salvadores veio até mim, enfurecido. Tentei esfaqueá-lo, entretanto ele me bloqueou com o braço, jogando a faca no chão. Antes que eu pudesse fazer algo, levei um soco no rosto, depois um chute, e então caí. Negan se jogou sobre mim, se preparando para me golpear novamente. Consegui desviar do primeiro soco, mas depois tudo foi muito rápido. Seu punho se chocou contra meu rosto outras vezes, até que eu não pude mais sentir nada. Minha visão foi se tornando turva, até que uma sombra se formou sobre nós. Inesperadamente, Negan parou de bater em mim e simplesmente caiu ao meu lado, seguido por outra pessoa.


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Notas finais do capítulo

Deixem a sua opinião, e até o epílogo! Ele ainda não ficou pronto, iremos escrevendo de acordo com os comentários.
Até mais!