Born to Die escrita por Agatha, Amélia


Capítulo 62
Necessário


Notas iniciais do capítulo

Existe apenas um motivo para estarmos adiantando a postagem.
Há um ano, exatamente às 12:59, tudo isso começou. Sim, já passou muito tempo. Hoje é o aniversário de 1 ano de Born to Die! Agora nós acreditamos quando as pessoas dizem que o tempo passa num piscar de olhos. Parece que foi há algumas semanas atrás, numa manhã de domingo, em que estávamos escrevendo o primeiro capítulo e, assim que ficou pronto, nós postamos. Na época, não imaginávamos que chegaríamos a esse tempo. Tudo isso é graças a vocês! Muito obrigada pelos 297 comentários, 78 acompanhamentos, 43 favoritos, 7 recomendações e 7512 visualizações que tivemos até agora! Não vejam isso como uma despedida, estamos apenas comemorando por essa data importante e única. Esse capítulo é dedicado a todos vocês, que nos aguentaram até aqui. Obrigada por terem sido leitores maravilhosos, dando elogios, críticas construtivas e sugestões!
Boa leitura!



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*Narrado por Avery Hopper

– Então... Acho que nossos assuntos estão acabando – falei por fim. Depois de tanto tempo conversando com Carl, era natural que isso acontecesse. Já havíamos falado sobre matérias de escola, esportes, músicas, medos, comidas, segredos, entre outros assuntos, e eu já sabia praticamente tudo sobre a vida dele. Eu me sentia de certa maneira especial, Carl sempre fora uma das pessoas mais reservadas que eu conhecia, e ele se abrir para mim daquela forma era um grande gesto de confiança.

Estávamos no meu quarto desde tarde, e o tempo parecia nem ter passado. Só notei que já era noite quando o local escureceu e eu precisei me levantar para acender a lâmpada. Aquela posição estava ótima, deitados na cama, minha cabeça apoiada no peito de Carl, que deixara as mãos ao redor do meu corpo. Provavelmente minha mãe reclamaria por estarmos de sapatos na cama, que, por sinal, era dela.

– Você não me disse por que começou a tocar violino – Carl sugeriu outro assunto. Já fazia algum tempo que eu não tocava, apesar de o instrumento continuar na minha mochila, junto com o caderno de músicas.

– Meu avô me deu quando eu tinha uns 6 anos. Eu não tinha muita coordenação motora, mas meu pai me cobrava muito e, com o tempo, acabei tomando gosto e me esforçando para tentar agradar, o que não era uma tarefa fácil... – entristeci um pouco ao lembrar daquilo, ele nunca ficava satisfeito, apesar de todas as minhas tentativas. Já fazia muito tempo que eu não pensava nele, e foi estranho chamá-lo de “pai”. Era como se aquele homem nunca tivesse existido.

– Parece que faz muito tempo... Quando eu ainda tinha minha mãe, e você, seus antigos pais.

– É, mas você tem seu pai e a Sarah – completei.

– Ela não é a minha mãe. Eu gosto da Sarah, ela é uma amiga pra mim, assim como Daryl era para você – ficamos por algum tempo em silêncio. Daryl também me trazia más lembranças. Lembrei-me de como costumava gostar dele, era como se Daryl sempre fosse estar lá.

– Vamos parar de falar sobre coisas passadas, certo? – mudei de assunto, destruindo completamente a áurea de melancolia. – Vamos falar do futuro, e do que poderíamos estar fazendo e não estamos. Então, a porta da frente está trancada, Sam está provavelmente brincando lá fora e parece que não vamos ser interrompidos – dei um pequeno sorriso malicioso. Voltei meu rosto para ele, enquanto corria os dedos por seu pescoço.

A maçaneta começou a girar, quebrando completamente o clima. Instantaneamente, saltei para o outro canto da cama e olhei para a porta, enquanto jogava as mãos sobre o criado-mudo para pegar uma revista. Carl pulou da cama e se sentou no chão, pegando uma outra revista que havíamos encontrado no balcão e lido um pouco no começo.

Minha mãe entrou e ficou parada nos olhando desconfiadamente. Enquanto eu tentava dar um sorriso para convencê-la de que estava tudo normal e tentava controlar minha respiração ofegante, torcia para que Carl não estivesse entregando tudo. Apesar da cama desarrumada, eu torcia para que ela não presumisse nada.

Eu não sabia por que, mas provavelmente estava com vergonha de estar no quarto dela com Carl. Eu ainda não contara para minha mãe, nem para qualquer outra pessoa, sobre o namoro, talvez por medo de desaprovação. Era estranho, já que eu sempre havia incentivado minha mãe a se relacionar, e, naquele momento, era eu quem estava se relacionando.

– Olá, senhora Hopper – Carl disse por fim, sendo bastante cordial.

– Olá, Carl. O que estão fazendo trancados nesse quarto? – ela se aproximou com uma expressão interrogativa e cínica e, por alguns instantes, pensei que minha mãe tinha descoberto. – Está uma noite linda lá fora, até parou de nevar. Todos estão lá ao redor da fogueira, e vocês aqui. Posso saber o motivo?

– Estamos... lendo! Encontrei essas revistas velhas e achei uma matéria super interessante sobre... – parei e olhei para a revista, que estava virada do lado contrário. Rapidamente a girei com as mãos trêmulas, e forcei um sorriso falso para ler a manchete da página. –... Botox! São os piores botox do mundo dos famosos, deveria ver como ficaram!

– Você anda lendo esse tipo de futilidade, Avery? – ela indagou com um olhar de desaprovação, mas fiquei feliz por ter desviado um pouco o assunto. – Adolescentes... É por isso que esse tipo de revista ainda circulava!

– Mas é engraçado! – exclamei rindo um pouco, talvez por nervosismo. – Carl, o que você está lendo?

– Uma reportagem sobre Nascar. Eu queria que meu tivesse me levado a uma corrida de Stock Car algum dia – ele foi bem mais convincente que eu.

– OK. Têm certeza que não querem ficar lá fora?

– Não, aqui está mais quentinho! – respondi torcendo para que ela saísse logo.

– Tudo bem. O jantar vai ser servido lá embaixo. Sam está com os amigos, Maggie está olhando eles pra mim, e Eugene está com Brianna no quarto. Sarah deve estar na enfermaria. Qualquer coisa, procurem alguém. Estou saindo por algumas horas, não sei quando vou voltar, então quero que não durma muito tarde. Vai se cuidar, não vai?

– Claro que sim, mãe! Devo ter uns 20 anos!

– Na verdade, duvido que tenha 18 – ela rebateu. Costumava dizer isso para tentar me deixar uma criança, e eu me sentia um bebê quando ouvia isso. – Carl, fique de olho nela, certo? – ele concordou com a cabeça. – Só vim buscar meu casaco mesmo. Até mais.

Minha mãe foi até o guarda-roupa. Todas as roupas estavam arrumadas de uma maneira que só ela parecia entender e, sem dificuldades, pegou um sobretudo negro e um cachecol ou xale com estampa de zebra. Enquanto ela se vestia, comecei a me perguntar para onde minha mãe iria, principalmente porque ela não era de sair e não gostava de não deixar sozinhos, como se vivesse em nossa função. Fiquei com um pouco de ciúmes ao constatar que ela estava nos abandonando por algo. Minha mãe parecia muito animada, e isso me assustou.

– Dona Gabriela, posso saber para onde e senhorita pensa que vai? – questionei quando ela terminou de se vestir.

– Jesus me chamou, ele precisa da minha ajuda. Alguns assuntos diplomáticos fora do Alto do Morro – minha mãe explicou rapidamente, e pensei que isso poderia ter a ver com o fato de ela ter feito Administração, ou pelo menos a desculpa que eles estavam usando.

– Jesus... Interessante! – eu sabia que ela estava escondendo algo. – Divirta-se!

– Está bem – ela sorriu e se voltou para a porta. – Avery, se quiser ficar na minha cama, é melhor tirar os sapatos.

Minha mãe saiu do quarto, nos deixando sozinhos novamente. Enquanto fiquei pensando nas possibilidades da saída dela com Jesus, Carl subiu na cama novamente e voltamos à nossa posição original, passando seus braços ao redor de mim.

– Minha mãe e Jesus... – falei ainda incrédula com a possibilidade. Era estranho vê-la com outra pessoa, mas ele era um cara legal e bastante bonito, eu tinha que admitir. Era um bom partido para qualquer mulher no Alto do Morro, e, se fizesse minha mãe feliz, estava tudo ótimo.

– Você acha que eles estão juntos ou qualquer coisa do tipo?

– Eu não acho nada, só tenho certeza de que fomos interrompidos, senhor Grimes – ele concordou com a cabeça e selou nossos lábios com um beijo que rapidamente se intensificou.

*Narrado por Gabriela Hopper

O silêncio predominava na colina que estávamos e, naquela altura, o frio parecia infinitamente maior. Havia um pouco de neblina, que se misturava com o ar condensado que se formava com as cinco respirações. Todos observavam atentamente a construção à nossa frente, mas eu parecia ser a única que não sabia o que fazer.

Estávamos enfrentando dias de calmaria no Alto do Morro. Negan provavelmente viria após a primeira Lua cheia, como Jesus me dissera que costumava fazer, e os moradores já começavam a colher, abater os animais e separar os industrializados que seriam recolhidos pelos Salvadores. Depois de a colheita ser arruinada pela nevasca inesperada, precisávamos agir rápido, antes do dia de coleta. Jesus havia me chamado para ir junto com ele, Daryl, Malcom e Rose. Eu dissera que não seria muito útil, porém o homem explicou que eu era a única que sabia do plano e, quanto mais pessoas, mais fácil seria a nossa tarefa.

Eles tinham o plano, mas eu ainda estava um pouco por fora, e ninguém se dera ao trabalho de me contar. O silêncio era essencial, e continuamos observando a edificação mais alta de uma pequena cidadezinha típica de estradas, rodeada por alguns guardas.

– O que vamos fazer? – sussurrei para Rose, que era a pessoa mais próxima.

– Temos que atacar o posto avançado sem deixar que eles nos vejam. Jesus acredita que, se atacarmos de todos os lados, os Salvadores não vão saber por onde estamos indo, e vão se perder – ela explicou. – Como esse é o posto mais próximo do Alto do Morro, o ataque pode atrasar a coleta e dar tempo a vocês.

Jesus já havia me situado sobre esses postos avançados de Negan. Eles eram os olhos e ouvidos do tirano sobre as comunidades, porém suas localizações não eram mais secretas desde que Jesus conhecera o casal que me assaltara no início do apocalipse. Seus melhores homens, exceto seus braços direitos, cuidavam daqueles locais. Sem dúvida, algum dos vigias havia visto a chegada do meu grupo no Alto do Morro. O que mais me intrigava era que Negan não fizera nada a respeito. Do mesmo jeito inesperado com que ele havia chegado, ou homem sumira.

– Vamos destruir tudo e desativar o lugar? – prossegui no mesmo tom baixo.

– Vamos queimar tudo e matar os que fugirem. Precisamos despachar esses seguidores de merda para o inferno– a frieza com que Rose respondeu me assustou. Em momento algum passara pela minha cabeça que eu teria que matar alguém. Poderia ter sido apenas a minha inocência que me impedira de ver isso. Rose era disposta a fazer qualquer coisa, antes e durante o apocalipse, ela já devia estar acostumada a passar dos limites quando necessário. A ideia de tirar a vida de alguém me assustava, mesmo que fossem pessoas ruins, e a mulher deveria ter notado isso. – Nunca matou ninguém?

– Não.

– Porque nunca foi necessário – fiquei paralisada com aquilo. Só saí do estado de choque quando Jesus começou a falar.

– Vocês já devem imaginar o que viemos fazer aqui, certo? – todos concordaram positivamente, até mesmo eu, que já tinha uma pequena noção do plano. – Isso me poupa alguns detalhes. A chave do plano é deixar o posto às escuras, para desnorteá-los. Para entrar precisamos de uma grande distração. Precisamos de bons atiradores do lado de fora, para garantir que ninguém saia. Alguém se oferece para entrar e desligar o quadro de distribuição?

– Eu – não pensei duas vezes para responder. Se ele precisava de bons atiradores do lado de fora, eu seria inútil lá. Mesmo que entrar no prédio fosse perigoso, era melhor do que arruinar o plano deles.

– Está bem. A sua parte é muito importante para o resto do plano. Uma parte da cerca está aberta, sei disso porque eu mesmo a cortei há algumas semanas. Entre por lá e suba as escadas até o segundo andar do prédio. Está na terceira porta à direita. É um pequeno depósito, não deve estar vigiado. O painel fica atrás da porta, você só precisa abrir e apertar os interruptores para o lado contrário. Pode fazer isso, não pode? – balancei a cabeça positivamente. Eu já havia precisado mexer no quadro de distribuição da minha casa algumas vezes, e o meu parecia ser bem mais complexo que aquele. Jesus se voltou para os outros e continuou. – Nós iremos antes dela para distraí-los. Primeiro abatemos os guardas, em seguida eu darei cobertura para Gabriela entrar enquanto avanço para dentro, começando a preparar o incêndio. Vocês precisam segurar os que saem e, antes de irmos embora, deixaremos tudo em chamas para eliminar o posto e dar um recado para o Negan.

– Até nós entrarmos a Gabriela já deve ter apagado as luzes. Quer dizer que nós vamos ter que atirar no escuro? Não tenho olhos felinos – Rose perguntou.

– Para isso eu trouxe as lanternas – Jesus abriu sua mochila, onde havia pistolas e armas grandes, munição, lanternas, gasolina e uma caixa de fósforos, que estavam com ele desde ele me trouxera do Alto do Morro até o posto avançado. O homem distribui as armas e lanternas. – Estamos entendidos?

– Para mim parece fácil – Malcom, que estivera calado durante todo aquele tempo, se manifestou dando de ombros.

– Teremos cinco minutos para preparação, depois disso botamos o plano em prática – ele finalizou.

Assenti sem dizer nada enquanto me levantava e afastava para sentar em algumas pedras. Eu tinha cinco minutos para pensar no que faria, mas fiquei parada observando a Lua. Desligar as luzes não parecia complicado, o difícil seria entra e sair. E se eu encontrasse alguém no caminho? Resolvi tentar me distrair e prestar atenção nos outros.

Jesus organizava a mochila, alheio a tudo que acontecia. O homem parecia muito concentrado naquilo, provavelmente estava refletindo. Rose, que parecia bastante nervosa, acendeu um cigarro e começou a fumar. Pelo visto, ela não perdera aquele péssimo hábito, só esperava que não estivesse influenciando Daryl, que estava começando a se distanciar do tabaco por causa de Sam e da minha insistência.

– Isso faz mal à sua saúde e pode chamar a atenção deles – Malcom falou se aproximando da esposa e puxando o cigarro de suas mãos.

– Vá para o inferno! Será que eu não posso relaxar um pouco?

– Como nosso filho está? – Daryl perguntou se aproximando, tirando minha atenção do casal.

– Ele está bem, pergunta sobre você o tempo inteiro. Você é o heroi dele.

– Mesmo assim não consegui impedir o ataque... O que houve depois? – abaixei a cabeça, me preparando para rever aquilo. Notei que, de certa forma, Daryl se sentia culpado.

– Na base perdemos Sasha e Abraham, ela foi atacada por walkers e ele levou um tiro. Quando chegamos ao Alto do Morro, Rosita estava baleada e entrou em trabalho de parto. Ela acabou se sacrificando para dar a luz a uma garotinha, Brianna. Agora ela está com Eugene. E também teve Patrick... Ele chegou lá muito ferido, e não teve como salvá-lo – resumi os acontecimentos dos últimos cinco dias. Era doloroso pensar naquilo. – Estamos em desvantagem no momento, mas é preciso ter esperança. Às vezes eu queria ser como a Sarah, ela parece estar certa de que tudo vai dar certo, mesmo nos piores momentos. Eu, por outro lado, não tenho mais certeza de nada... As coisas parecem tão obscuras!

– Entendo – ele pareceu ter se perdido quando comecei a falar das mortes, mas logo voltou a prestar atenção no que eu dizia. – Tem momentos em que dá vontade de jogar tudo pro alto e deixar como está, mas eu me lembro que tenho por quem lutar. Sei que você também tem, apenas se lembre disso.

– Precisamos ter fé que tudo vai dar certo, e as trevas darão lugar à luz – completei seu raciocínio com um pequeno sorriso. Daryl pareceu feliz, mas logo voltou a ficar sério.

– Gabriela, você vai precisar disso – ele se voltou para trás e pegou uma arma. Ela era preta, possuía um formato estranho, era curta e tinha dois locais de apoio: o gatilho e uma parte mais alongada atrás. Eu não sabia o que aquilo fazia, mas com certeza não era uma pistola. – Sei que você não gosta de atirar, mas vai ter que fazer isso se for necessário.

– OK – me limitei a responder pegando a arma com as mãos trêmulas. Ela era gelada e pareceu ser mais pesada do que deveria. Fechei os olhos por alguns instantes, pude ouvir claramente as palavras de meu pai e a promessa que fizera em tempos distantes. Eu não queria quebrá-la, de forma alguma, porém, naquele momento, havia muito mais em jogo. Aquela missão poderia não ser muito comparada à guerra, contudo, os homens que seriam eliminados naquela noite poderiam fazer a diferença no final, se olhássemos em longo prazo. Além do mais, o nosso ataque ajudaria o povo do Alto do Morro, daria mais tempo para eles se organizarem melhor.

Quando Josh me dera uma arma, anos atrás, minha reação não fora a mesma, simplesmente porque eu ainda não conhecia o mundo, não sabia o quanto as pessoas estavam mudadas. Na época, eu achava que não precisaria atirar, que apenas meu machado bastava para eliminar os errantes, e que estes eram meus únicos inimigos. Se ao menos eu soubesse o quanto estava equivocada...

Daryl se levantou assim que Jesus fez um gesto, estava na hora. Fui até eles sem tirar os olhos da arma, não prestei atenção no caminho, meu pai ocupava meus pensamentos. O que ele pensaria de mim se me visse? Desviei o olhar para o chão, minha mão direita suando por causa da arma. Nem percebi quando nos aproximamos da cerca. As luzes do prédio estavam ligadas, e isso deveria chamar a atenção dos caminhantes que viessem a passar por lá.

– Vamos começar – Jesus sussurrou e, logo em seguida, Malcom deu o primeiro tiro. Não vi para onde ele foi, apenas foquei em realizar a minha tarefa. – Gabriela, vai!

Passei pelo buraco da cerca sem dizer nada. Logo em seguida os Salvadores começaram a devolver os tiros, porém não me dei ao trabalho de virar para trás. Eu só precisava entrar naquele lugar rápido. O tiroteio foi se intensificando, e as luzes da entrada foram se acendendo. Eu seria alvo fácil se os outros não estivessem mirando no meu grupo que estava lá justamente para distraí-los. A grama estava molhada e escorregadia devido à neve que começava a derreter. Tentei apressar o passo, mesmo que as minhas botas afundavam na terra, enquanto a arma e a lanterna pareciam pesar cada vez mais, escorregando das minhas mãos.

Não era uma tarefa fácil. Desligar as luzes era fácil, entrar e sair do prédio não. A porta da frente estava aberta. Eu poderia ter parado e esperado para ver se estava sozinha, entretanto acabei entrando direto. Meus olhos não paravam de observar o local. Eu deveria ter sido mais prudente, contudo, na hora eu só quis acabar com aquilo o mais rápido possível. Logo comecei a ouvir vozes e uma marcha, aquilo não era nada bom.

Um grupo de seis homens foi em direção a saída. Corri para um canto e me pressionei meu corpo contra a parede que levava a outro corredor escuro. Os homens passaram por mim enquanto eu controlava a minha respiração para não ser notada. Quando eles se afastaram mais, finalmente pude sair. Junto com o alívio, veio a preocupação. Eram quatro pessoas contra todos aqueles homens, mas eu não queria pensar no pior. Depois daquilo, iríamos embora, todos nós.

Ao notar que estava parada no meio do corredor, sacudi a cabeça para tentar organizar meus pensamentos e centrar na missão. Eu era parte importante daquilo, o sucesso da tarefa dependia do que eu tinha que fazer. Subi pelas escadas, já ofegante, eu sabia que teria que refazer aquele trajeto na volta. “Terceira porta à direita” repeti diversas vezes na minha mente enquanto procurava a tal porta.

Empurrei-a lentamente, com medo que houvesse alguém lá dentro. Para a minha sorte, o cômodo estava vazio. Era um pequeno depósito, havia sacos de grãos, industrializados e caixas de madeira, provavelmente com mais comida. Tudo aquilo deveria ter vindo do Alto do Morro, eram os alimentos que eles roubavam.

Atrás da porta encontrei o quadro de distribuição. Havia uma placa cinza na frente, que eu abri com cuidado. Por trás daquilo estava a quadro, ele possuía duas colunas repletas de interruptores negros, cada um com uma numeração na cor branca. Abaixo das colunas havia outro interruptor, mais afastado dos outros. Cada um deles deveria representar uma área, e o de baixo deveria ser o exterior do prédio.

Suspirei e fechei os olhos, me concentrando no ambiente por alguns instantes. Os tiros persistiam, e era o som predominante. Além deles também era possível ouvir vozes e gritos de dor. Com certeza concentrar no ambiente não fora uma boa opção. Tornei a abrir os olhos e passei os dedos pelos interruptores, apertando cada um deles.

Instantaneamente, as vozes pararam. O depósito estava completamente escuro, então acendi a lanterna. Apertei a arma com mais força, como se fosse a minha salvação. Quando fizera a minha promessa, os tempos eram outros. Eu não precisava lutar pela sobrevivência, não tinha que chegar ao extremo, não precisava viver com medo, fugindo, batalhando e, acima de tudo, eu não precisava me preocupar com a possibilidade de perder as pessoas que amava a cada despedida. Por mais que fosse difícil de aceitar, eu quebraria a promessa se fosse necessário, talvez meu pai preferisse isso à minha morte. Eu não estava com a arma para matar pessoas, meu propósito único era a defesa. Não sabia o que ele faria no meu lugar, mas eu estava lá, não meu pai.

Sair do prédio seria mais difícil do que entrar. Talvez alguns homens fossem até o quadro de distribuição para ver o que ocorrera, talvez não. Eu não sabia o que realmente estava acontecendo, só torcia para que meu grupo estivesse bem do lado de fora. O silêncio indicava que algo estava errado, então eu apaguei a lanterna e saí do local lentamente.

Eu ainda estava no segundo andar, lá havia dois corredores laterais e, no centro, um buraco que parava no primeiro andar. Lá estavam Daryl, Jesus, Malcom e Rose. Não deu para ver direito, mas tinha uns cinco homens ao redor deles, apontando suas armas para eles. Por isso mesmo pude identificá-los pois, naquele momento, a luz do luar era a minha única iluminação.

– Vocês realmente foram estúpidos a ponto de fazerem um ataque com quatro pessoas? – um homem falou se aproximando deles.

– Cinco – retruquei e, logo em seguida, apertei o gatilho da arma, disparando uma rajada de tiros para o alto para atrair a atenção deles e, quem sabe, dar uma chance aos que estavam lá embaixo. Na hora, nada veio à minha cabaça, e era melhor assim. Já estava feito.

– Lá em cima! – outro homem gritou, e todas as atenções se voltaram para mim. Todos apontaram as lanternas em minha direção, e toda aquela luz doeu nos meus olhos. Não deu tempo de fazer mais nada. Quando notei que eles apontavam as armas para mim, joguei meu corpo no chão. No mesmo instante eles atiraram, porém os disparos passaram longe.

Fiquei deitada no chão com as mãos ao redor da cabeça, meu corpo doía um pouco devido ao choque, mas não era nada comparado a ser baleada, o que quase acontecera. O tiroteio pareceu continuar por mais algum tempo, até que cessou e tudo voltou a ficar silencioso. Permaneci estática, aguardando que algo acontecesse. Aquilo era muito estranho, se eles não tinham me encontrado, só poderiam estar mortos.

– Gabriela? – escutei a voz rouca de Daryl me chamar, algo que me aliviou por completo.

– Estou aqui.

– Está bem?

– Sim, e vocês?

– Estamos inteiros – Jesus respondeu por todos. – Agora vamos da um fim nesse lugar.

*Narrado por Sarah Grimes

Já era bem tarde, talvez tivesse passado de meia-noite. As crianças já estavam dormindo, as pessoas que estavam do lado de fora perto da fogueira haviam sido derrotadas pelo sono ou pelo frio, provavelmente uma mistura dos dois, e aos poucos o Alto do Morro pareceu adormecer, suas luzes se apagaram gradualmente e a movimentação cessou.

Ainda haviam pessoas acordadas, que trabalhavam para deixar o local de pé, protegendo os muros e o local. Rick estava com Gregory, tratando de assuntos importantes, como o possível retorno de Negan e a guerra. O líder do Alto do Morro parecia recusar completamente aquela ideia, como se tivesse feito um pacto com os Salvadores. Mas, no final, Jesus se saía melhor, ele conseguira convencer grande parte dos moradores de que Negan precisava ser derrotado.

Aos poucos, nosso grupo se adaptava ao novo lar. As mortes eram superadas e todos seguiam em frente. As pessoas do Alto do Morro eram bastante hospitaleiras, e isso contribuía para a rápida aceitação que o local nos proporcionara. Como havia mais de duzentos moradores, era natural que ainda não conhecêssemos todos eles. Os pequenos já começavam a entender que a comunidade seria nossa casa, porém ainda não se enturmavam com as demais crianças.

O aparente sossego tinha prazo de validade. Negan deveria retornar em uma semana, de acordo com Jesus. Ainda não sabíamos se ele nos atacaria ou simplesmente recolheria os produtos, e se deveríamos reagir ou não. Estávamos nos preparando para tudo, por isso a produção de balas estava sendo adiantada. Logo no dia seguinte eu revisaria os projetos, o que seria função de Eugene, entretanto, ele me pedira esse favor porque queria passar mais tempo com Brianna. Os dois estavam tendo um ótimo relacionamento, e o homem já a via como uma filha.

– Café? – Maggie perguntou estendendo uma xícara para mim, enquanto segurava a sua na outra mão. Aceitei enquanto ela se sentava ao meu lado. Eu estava acordada esperando que meu marido retornasse, e ela havia dito que não estava com sono. – Hoje o Hesh estava muito agitado, foi difícil colocá-lo na cama.

– Ele é um bom garoto – apesar de ser bagunceiro, todos gostavam do menino, isso era inegável.

– Sim, mas tenho medo que algo aconteça a mim ou ao pai dele. Parece que voltamos para o passado, aquela época que não era para crianças. Não posso nem imaginar o que aconteceria se ele ficasse sozinho...

– Não quero que nada disso aconteça com a minha família, é horrível! – a imagem da explosão voltou à minha cabeça. Fechei os olhos por alguns segundos, eu não queria mais pensar naquilo, faria qualquer coisa para mantê-los a salvo. – Acho que isso tem um lado bom, é a nossa motivação. Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance para que nada aconteça com eles.

– É isso que nos diferencia dos Salvadores. Eles lutam pelo controle, e nós, além da liberdade, estamos lutando pelas pessoas que amamos.

De repente, Jesus abriu a porta e Gabriela apareceu. Ela sorriu para ele e depois entrou no saguão, rindo. Maggie e eu ficamos estáticas, aguardando que ela se aproximasse. Era estranho vê-la daquele jeito. Depois de todos os acontecimentos com Daryl, Gabriela estava vivendo em função dos filhos e da guerra. Fiquei feliz ao constatar que ela estava se divertindo, e com mais alguém.

Depois de lançar um último olhar para Gabriela, Jesus saiu de lá bastante apressado. Apesar de não assumir, ele tomava conta do Alto do Morro. A mulher só pareceu notar a nossa presença quando parou de rir, e encontrou nossos olhares sérios.

– Vocês ainda estão acordadas?

– Estamos aproveitando o tempo livre – respondi. – Quando as crianças estão acordadas não dá tempo para fazer nada.

– Então, o que vocês dois estavam fazendo? – Maggie introduziu o assunto.

– Jesus me chamou para resolver alguns assuntos fora da comunidade.

– Resolver uns assuntos, sei... – ela retrucou com um olhar sugestivo. A mãe preocupada de minutos atrás dava lugar a outra pessoa, animada, descontraída. Era como se tivéssemos voltado no tempo, quando nós três conversávamos sobre a possível gravidez de Gabriela. Desde a perda de Daryl, ela ficara muito abalada. Porém, depois da ida de Aaron e Eric até a base, ela parecia diferente, mais animada, e aquilo coincidia com seu primeiro encontro com Jesus. Então a suspeita de Maggie fazia todo o sentido.

– O que você está insinuando? – Gabriela se sentou no sofá parecendo não entender do que estávamos falando. – Eu e Jesus? – ao invés de ficar irritada com o comentário, ela riu, e pareceu se divertir com aquilo. – Estávamos rindo exatamente por causa disso. Ele é gay. E mesmo que não fosse, somos apenas amigos.

– De qualquer maneira, é bom que você se distraia um pouco. Estava sentindo a falta do seu sorriso! – comentei. – Se importa de nos fazer companhia?


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Notas finais do capítulo

Então, o que acharam? Digno para representar 1 ano da fic? OK, vamos parar um pouco com isso.
Estamos meio nostálgicas agora, então alguns pontos antigos estão sendo relembrados. A promessa da Gabriela não dava para ser mantida por muito tempo. Não pensem que é frescura dela, deve ser bem difícil, e nós a entendemos.
A guerra deu um parada, mas já vai voltar. Apesar de não serem tantas batalhas quanto vocês devem estar esperando, vai ser uma guerra. Não morreram nem a metade ainda...
O próximo terá um grande acontecimento e o plano do primeiro ataque será formado.
É só isso. Já dissemos o quanto estamos felizes? Sim, estamos super, hiper, mega, ultra contentes por tudo isso. 365 dias, isso significa muito. Infelizmente, está quase acabando.
Novamente, muito obrigada para os que chegaram até aqui! Vamos esperar seus comentários para alcançarmos os 300, contamos com a sua participação!
Até o próximo!