Paralelo T. escrita por Tom


Capítulo 10
Capítulo 10 - O Fim


Notas iniciais do capítulo

"Tudo o que é bom dura pouco". Eu sei, é clichê, mas é o que exatamente descreve esse momento.



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E Torie nem acreditava que já estava no final da sua história. Tudo parecia ter sido tão rápido, mas tão lento... Tão intenso. Depois de dias escrevendo sobre Amerie, a própria garota começou a perceber que havia muito de si naquelas linhas. Era o seu subconsciente eliminando todas as frustrações que ela parecia passar na vida real.

Era por isso que Torie Ferwall gostava de escrever. Tudo o que ela sentia, ou possivelmente, gostaria de sentir ou fazer, estava ali. Suas qualidades, defeitos, pensamentos... Cada um deles integrava alguma parte da história. Mas assim como todas as outras, aquela já estava quase terminada

Seria intrigante, na verdade. O fato de aquele ter sido um de seus textos favoritos mas também o mais rápido deles. Por algum período, ela tinha certeza, Amerie faria uma imensa falta. Mas Torie sabia do seu fraco em despedidas, então o melhor era apenas escrever até suas últimas ideias se esgotarem.

Uma última vez, escrever sobre a sua assassina.

“Era possível isso? Possível que a maior rival, inimiga, desavença ou o que quer que seja era a chefe de Amerie? Era possível que Agnes era tão sangue frio a ponto de matar o seu próprio filho para atingir algum objetivo? Sim. Era possível. Era tão possível que a mulher ainda fitava Ame com um sorriso cínico no rosto.

– Surpresa em me ver, Amerie? – Perguntou a ruiva com uma voz doce. Ela cruzou as mãos por sob a mesa e se reclinou na cadeira, como se fosse uma rainha contemplando o seu reino. Aquilo não ajudou o ódio de Ame a diminuir e ela não abriu a boca para responder. Apenas apertou com a maior força que conseguiu a sua adaga. Amerie só pensava no quanto ela queria ter treinado o lançamento de sua arma.

Matthew se postava em pé atrás da cadeira de Agnes, fitando o nada acima da cabeça de Amerie. Seu semblante estava impenetrável. Ele havia conseguido enganar a assassina perfeitamente, sem nem sequer hesitar. Ele havia conseguido driblar a experiência de Ame e ele a estava fazendo ficar pior do que já estava naquele recinto.

Eram, possivelmente, os seus dois maiores inimigos na sua frente.

– Hmmm... Não vai me responder, não é? Orgulhosa como sempre. – Comentou Agnes com um toque sutil de reprovação na voz. Ela se levantou lentamente e começou a dar a volta na mesa, seguida pelo homem de jaqueta negra. – Acho que o seu pai, morto, te deu alguma educação. – Continuou a mulher com a voz calma, tentando fazer com que Amerie perdesse o seu controle. E sim, ela conseguia aquilo rapidamente.

– Meu pai me ensinou a ter educação com pessoas, não com animais. – Retrucou a assassina com a voz baixa. Agnes soltou um risinho de deboche, mas seus olhos estavam frios. Ela se encaminhou até parar a um metro e meio na frente de Ame. Ela ajeitou o cabelo, jogando-o para trás e colocou uma mão na cintura.

– É incrível como falar de um ente querido morto nos deixa com raiva, não é? Sorte minha que nunca me importei com os meus. Aqueles imbecis... – falou. Suas palavras soaram duras aos ouvidos de Amerie, o que a fez querer saber o motivo por Agnes ter querido isso. Pelo menos no ano em que elas se conheciam, a ruiva tinha medo até de formiga e adorava as pessoas que ainda conseguiam aguentar as suas chatices.

– Devo lhe perguntar. Por que matar todos? – Perguntou Ame relaxando o aperto da adaga. Ela suspirou profundamente e fitou os olhos castanhos barro de Agnes. Queria ter algumas respostas. Se possível, todas.

– Acho que para responder isso, devemos começar do início. – Disse a mulher. Ela estalou os dedos e prontamente Matthew foi até um canto da sala e pegou uma cadeira, colocando-a para Agnes sentar. Ame murmurou um ‘cachorrinho’ e se atreveu a soltar uma risadinha. O homem grunhiu, olhando-a com raiva. Aquele era o primeiro sentimento que a morena via passar pelo rosto do rapaz. Agnes fingiu que não escutou nada e voltou a fitar Amerie. – Onde parei? Ah, sim... O inicio.

Só que ao invés de começar a falar, Agnes se calou e ficou olhando para Amerie. O que ela queria?

– O nosso cachorrinho aqui tirou sua língua para lavar? – Debochou Ame enquanto ela trocava o peso do corpo de um pé para o outro. Agnes ergueu as sobrancelhas, olhando para a mulher que se postava em sua frente. Ela também se levantou e logo após um segundo depois daquele movimento, Amerie notou que o corpo de sua inimiga tremia com raiva.

– Não existe um início, pois você roubou-o de mim! – Gritou a ruiva. Seus olhos se esbugalharam e ela se adiantou mais alguns passos. – Você roubou as pessoas a minha volta! Quase roubou o meu namorado! – Continuou. Ela respirava de forma pesada enquanto erguia um dedo e apontava para o rosto de Ame. – FOI TUDO VOCÊ! – Exaltou-se novamente, tirando um pouco do cabelo que tendia a lhe cobrir a face. – Mas claro que isso me ajudou, no futuro. – Ela disse com a voz calma. Ame franziu as sobrancelhas, confusa. Era possível alguém ser tão bipolar assim?

‘Se você não tivesse feito isso, eu não teria aberto os olhos para o que eu poderia ter. Riquezas, poder, felicidade. As pessoas aos meus pés. Tudo o que uma pessoa como eu precisava ter e precisava ser. Mas claro, eu precisava de um plano. Deixa-me ver... Eu ainda era nova quando comecei a pensar nisso. Fiz com que o idiota do Antti parasse de te ver, disse que eu tinha visto o seu pai entrando na segunda mansão da família Charlisle antes de ela pegar fogo. Sim, eu fui a causa da morte de seu pai. Eu precisava que quem ganhasse a eleição fosse o Leroy. Para que a sua família continuasse rica, como sempre. Depois que os anos se passaram, eu comecei a desistir da minha ideia de planos, mas aí descobri que eu estava grávida e, pelas minhas fontes que eu sempre mantive, descobri que você voltava à cidade como assassina.

Se eu tivesse um filho, ele ficaria com a maior parte dos bens de Antti. Deus sabe o quanto ele amava aquela criança. E Deus sabe também o quanto eu precisaria ficar com a herança de toda a família do nosso querido prefeito. Então comecei a mandar que você matasse um por um. Os menos importantes primeiro e depois o resto, até chegar a Antti Charlisle. Esse sim era o que eu mais queria ver morto. Depois que ele se afastou de você, não parou um minuto de tocar em seu nome. Era Ame aquilo, Ame isso. Não havia coisa que me deixasse com mais raiva, mas o único fato que me mantinha firme com o meu plano era a questão de que você estava na minha mão e matando todas as pessoas para mim. Nem mesmo as sucessivas traições do meu marido me abalavam. E então, eu conheci Matthew. Foi ele desde o começo que entregou para você os envelopes com as vitimas. Era ele que sempre te seguia para ver se você faria tudo certo. Eu devo dizer que sempre acreditei que você falharia, mas quando você diz algo, você mantém esse algo.

Ele era o único que parecia me entender e que deu mais forças ao meu plano. Ele e apenas ele. Fico surpresa que Matthew não tenha te matado imediatamente assim que o mandei procurá-la hoje nos corredores da mansão. Ele sempre dizia que quando a visse pela primeira vez, não permitiria que você suspirasse nunca mais. ’

Amerie franziu as sobrancelhas. Então Matthew não havia contado para ela as duas outras vezes que eles já tinham se visto? Ela tentou não abrir um sorriso. Olhou de esguelha para o homem, mas ele não parecia estar prestando tanta atenção no monologo de Agnes. Talvez já tivesse se cansado da voz dela, o que era muito provável.

– Hum... Devo admitir que foi um bom plano. Totalmente idiota e infantil, mas bom. – Elogiou de maneira falsa a Agnes. A ruiva crispou os lábios, sua fúria voltando novamente. Ela ergueu a mão e Matthew foi rapidamente em direção a Amerie, segurando-a pelos braços para que ela não tivesse mais movimentos.

Isso fez com que sua adaga caísse.

Sua única arma naquele momento.

– Agora sem essa arminha você não tem como se defender, não é? – Zombou a mulher. Ela se adiantou mais um passo e estava tão perto que ambas já poderiam sentir a respiração uma da outra. – Você não é nada! Nada sem essa sua roupa, nada sem esse seu cabelo, nada sem sua arma, nada com ou sem ninguém. Você é só uma escória que acha que pode fugir dos problemas e depois se vingar como se fosse a rainha do pedaço. Você só é uma garotinha que teve uma desilusão do amor, que perdeu os pais e acha que chega ao direito de dizer e mandar em alguma coisa. – Agnes piscou rapidamente. – VOCÊ NÃO É NADA! – Berrou.

– Mas eu ainda sou mais do que você. – Retrucou Amerie Piktrius enraivecida. Antes mesmo de pensar em seus atos, ela cuspiu no rosto de Agnes. O mundo pareceu parar em volta das duas depois daquilo...

Na verdade, o mundo de Torie também pareceu parar. Tudo parou. Tudo começou a se diluir em nada.

*******

O consultório branco continham apenas três pessoas. Duas delas pareciam discutir. A outra estava mais afastada, em um canto daquele cômodo.

– Por favor, Dr. Fritz. Por favor. – Pedia uma mulher de quarenta e cinco anos de idade. Seus cabelos brancos já estavam começando a tomar conta de sua cabeleira loura. O doutor, de no máximo trinta anos, olhava-a com dó.

– Eu não posso fazer mais nada além de nosso tratamento atual. – Ele repetiu a mesma coisa que já tinha repetido umas dezenas de vezes para a mãe. Ela não conseguia entender. Ele ajustou os óculos em sua face, cruzando as pernas por debaixo da mesa e entrelaçando os dedos em cima do sólido. – Eu já te expliquei... – Terminou ele, mas novamente aquela resposta soara vaga.

– Você está me escondendo alguma coisa! Algum tratamento. Eu sei que está! – Afirmou a mãe. Ela apertou com força a sua bolsa, se desesperando. – Já pensou o quanto isso é vergonhoso para mim? Eu desejo um futuro para ela! Desejo que ela faça as coisas que planejei. Desejo que ela tenha uma vida de verdade. Tive de proibi-la de ver os amigos depois que isso aconteceu. Os pais deles me perguntaram o porquê e eu tive que mentir. ISSO NÃO É JUSTO! – Exaltou-se, inspirando e expirando com dificuldade.

– Se acalme senhora. Isso não está certo. Você tem que deixar que a menina viva a vida dela por mais que ela seja diferente. – Tentou acalmá-la o médico, mas não pareceu dar muito certo. Ele sabia que mais cedo ou mais tarde teria de contar aquilo para a mãe, apesar de ela saber o motivo "maior". – Sua filha é autista e você já sabe disso. – Ele afirmou e a mãe confirmou com a cabeça. – Muito pouco se sabe sobre essa doença, mas isso torna a garota especial. Só que no caso dela, é algo mais especial ainda.

“Depois de alguns anos de estudos, descobrimos que algumas crianças viviam mais afastadas, mais esquecidas desse mundo terreno do que todas as outras. Tudo o que elas pareciam fazer não se voltava para aqui, mas sim para outro lugar. Chamamos isso de Paralelo Teórico ou, como preferimos, Paralelo T. Como o próprio nome já diz, significa um mundo paralelo onde sua filha e pouquíssimas outras passam a maior parte do tempo.”

A mulher franziu as sobrancelhas, confusa. Como sua filha poderia viver em um mundo paralelo estando nesse mundo? No planeta Terra? Aquela informação só a fez se piorar.

– Mas... Mas isso é ridículo! Eu sei que os autistas tem um mundo próprio, mas viver totalmente em outro é ridículo! – Revoltou-se a mãe. O médico soltou um longo suspiro. Aquela era praticamente uma causa perdida.

– Por isso eu não quis te falar. Novamente, muito pouco se sabe sobre isso. Por isso o nome “Paralelo Teórico”. É só uma teoria. – Ele disse simplesmente. Arrumou novamente os óculos e voltou o olhar para a mãe. – Só nos resta esperar. – Finalizou o assunto. E então o médio desviou o olhar. A mãe fez o mesmo. Os dois olhando para o mesmo local.

Uma garota loura estava no canto da sala, olhando para o teto com os olhos desfocados. Seu corpo se movia lentamente para frente e para trás. Em sua mão direita pousava um lápis de cor azul e no chão havia um caderno. Enquanto os pensamentos do médico e da mãe vagavam entre preocupação e revolta, os pensamentos da menina estavam totalmente focados em seu desenho.

Na folha de papel haviam dois círculos. Na verdade, eram olhos. Perfeitos olhos azuis elétricos.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente, não o "Paralelo Teórico" foi algo inventado por mim para que a história tivesse um efeito legal. xD Então não vai encontrar essa referência em alguma informação sobre as pessoas autistas.E segundo, esse é o fim pessoal. Triste, não? Mas foi muito bom escrever para vocês. Posso dizer que foi a minha primeira fic e o sentimento é incrível. Espero que vocês acompanhem os meus próximos trabalhos -qE, pela última vez quando se trata de Torie e Amerie, espero que tenham gostado da leitura. :3