Heart By Heart escrita por Izzy Bane


Capítulo 21
The biggest scam in the world




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_ Fernanda?! - ouço a voz do meu pai algumas horas depois. - Sou eu, abre a porta e vamos conversar.
Minha mãe tinha desistido de me fazer abrir a porta, ela tinha tentado várias vezes conversar comigo e nas raras vezes que eu respondia, era para dizer "Vai embora, me deixa em paz". Me levanto e vou até a porta, abrindo uma pequena fresta.
_ Está sozinho? - pergunto baixinho.
_ Estou, pedi para sua mãe para sair e nos deixar a sós. Pode vim aqui para a sala se quiser, ou podemos conversar no seu quarto mesmo.
Abro o restante da porta e volto a deitar na minha cama, arrumo alguma bagunça que estava ali em cima para ter um lugar para que ele possa se sentar.
_ Ela me contou o que aconteceu. Não tiro a razão dela, você realmente tem passado bastante tempo com seus amigos. Mas eu também acho que ela se expressou mal.
_ Papai, ela colocou o Breno na conversa, em um assunto que não tinha nada a ver. Vocês sabem muito bem o quanto esse assunto machuca, demorei tempos para conseguir seguir em frente... - as lagrimas voltaram a se acumular nos olhos
_ Eu sei disso e ela também sabe. Ela não deveria ter tocado nesse assunto, ela exagerou e esta muito mal por isso. Ela quer te pedir desculpas. - ele diz secando uma lágrima minha que escapou.

_ Tudo o que eu mais queria era voltar no tempo e impedir aquilo de acontecer, mas é impossível então só me restou esquecer. E a mamãe agora me relembrando disso só fez voltar todo aquele sentimento de dor e culpa que senti por tanto tempo... - não aguento e já estou botando tudo para fora. - Quer dizer, ainda sinto. A diferença é que aprendi a conviver, e estar com vocês e com meus amigos, também ajuda.
_ Ô meu anjo. - ele diz e me abraça. Sinto o familiar e reconfortante perfume dele e choro ainda mais. Ele é o mesmo homem que me abraçou e me segurou no instante mais difícil da minha vida, e mesmo que estando do mesmo jeito que eu ou até pior, me deu forças para seguir. Eu tinha uma única regra desde criança, que era a de não chorar. Sempre achei ruim chorar, e não queria que ninguém me visse quando estivesse em um momento de fraqueza. Só que com meu pai era diferente, ele sempre fazia me sentir mais forte. Ele podia discordar das minhas decisões, mas nunca me julgou. Eu amo meus pais, mas a admiração e o orgulho que sinto por ele é sem limites.
_ Não queria que tivesse passado por isso tudo tão jovem, e nem queria que sentisse culpa. Não foi sua culpa que o Breno morreu. Foi uma fatalidade.
_ Eu não devia ter saído aquele dia, eu poderia ter evitado isso. Meu irmão ainda estaria aqui.
_ Talvez fosse a hora dele, não podemos dizer. Desde aquela época eu te falava, não foi sua culpa, pare de se julgar. Você estava levando tão bem esses anos, que pensei que tinha entendido isso, só me machuca mais saber que se sente assim. Por favor, minha linda, não se martirize, não faz nenhum bem para você. Já perdi um filho, se eu perder você não poderia continuar. - Sem duvidas foi o momento em que mais intimo que tive com ele, poucas foram as vezes que vi meu pai chorar, e sem saber muito que fazer, eu o abraço mais forte.
_ Me desculpa, pai. Me desculpa.
_ Não tem nada para desculpar, te amo e odeio te ver assim.
Ficamos desse jeito por um tempo, até que minha mãe bate na porta e coloca a cabeça para dentro do quarto.
_ Posso entrar? - ela pergunta baixinho.
_ Pode. - digo fungando e me endireitando.
Ela entra e encosta na parede ao lado da porta.
_ Me desculpa minha filha. Eu não devia ter me exaltado do jeito que fiz,só estava preocupada com você e não escolhi o melhor jeito de falar. Você é tão boa e generosa e eu confio muito em você, é o meu orgulho.
_ Vem cá mãe. - já estava de pé e fui ate ela jogando meus braços nela. - Me perdoe se tenho passando pouco tempo com vocês, nem tinha me dado conta disso. Vou conciliar melhor isso, e me desculpe também se tenho deixado você preocupada, não é por querer.
_ Não to dizendo que não e para ficar com seus amigos, é claro que pode, mas também quero um tempo com você e saber que você esta segura.
_ Pode deixar. - digo e meu pai vem e nos abraça também.
_ Agora chega do momento reconciliação, preciso urgentemente de um banho. - digo e vou procurar uma roupa para por. Meus pais riem e ouço meu pai dizendodemorou. Rio olhando para o guarda roupas e saio do meu quarto, paro na porta e olho para os dois que estão abraçados atrás de mim.
_ Amo vocês. - falo e corro para o banheiro.
Embaixo do chuveiro, penso em tudo o que aconteceu. Essa discussão, a lembrança de Breno. Meu irmão, eu era oito anos mais velha que ele, era o caçulinha. Implicávamos muito um com outro, mesmo ele tendo apenas 5 anos, mas no final do dia ele corria para a minha cama para dormir comigo. Ele era minha cara, e todo mundo dizia isso. Eu o amava e o que quase me quebrou foi saber que, por imprudência minha, ele morreu.
Me lembro dos mínimos detalhes, ele me pedindo para poder brincar com ele de bola, e eu falando para ele me deixar em paz, porque não queria parar olhar para um menino de quem era afim na época.

_ Por que você não quer brincar comigo? - Breno pergunta parando na minha frente. - Você falou para o papai que queria vir brincar comigo.
_ Não enche, Breno. Vai brincar para lá vai. - digo e continuo encarando o Edu. Ele era um garoto lindo da minha escola. Ele tinha 13 anos assim como eu e as meninas viviam falando que eu tinha uma queda por ele. Que nada, tinha era um abismo. Já tínhamos conversado algumas vezes e quase me derretia quando ele sorria para mim.Ele estava andando de skate com uns amigos, e eu só o admirava de longe.
_ Brinca comigo, Nan. Para de ficar olhando para ele. - ele puxa minha blusa e isso já estava me irritando. Queria saber por que chamei o pirralho para vir... É claro, porque senão meu pai não iria deixar sair agora, que era igual a perder o Edu andando de skate, olho no relógio e vejo que são quase 17h30min.
_ Ah ta bom, vamos brincar logo, mas só por 10 minutos.
Ele da um sorriso de orelha a orelha, e sai correndo para pegar a bola que estava ali perto.
Presto atenção em umas três jogadas, só que vejo que Edu está vindo para meu lado. Arrumo meu cabelo e nem vejo a bola passando.
_ Nan, a bola... - ele diz e nem presto atenção. Breno passa por mim pisando duro e mostra a língua, mas só o ignoro. Edu quando me vê, abre um sorriso e me dá um tchauzinho. Sorrio e ele vem na minha direção, mas para e seu rostoganha uma expressão de surpresa misturada com medo bem quando ouço um barulho forte de freada atrásde mim. Me viro e vejoum homem saindo correndo de um carro e se ajoelhando ao lado de um pequeno corpo que está no chão. Minha visão está embaçada enquanto corro até lá.
_ Não... Não... Breno! Acorda Breno. - chego perto dele e vejo sangue saindo da parte de trás da cabeça dele. Não... Não pode ser. Alguém tenta me puxar, mas não posso sair do lado dele. Sei que se tentar levanta vou cair novamente.
_ Alguém chama uma ambulância, RÁPIDO. Breno vai... Fica comigo, Breno. - minhas lágrimas molham o pequeno rosto dele.Passo minha mão pelo seu cabelo e passo a outra pelo seu corpo, o abraçando e fecho meus olhos rezando para que ele fique nem.
_ Abre os olhos, abre os olhos...Não me deixa maninho.
Fico assim por minutos ou poderiam ter sido horas, o tempo não passava e cada vez sentia que quanto mais demorasse, menor era a chance dele de sobreviver. E entre meu estado de topor, ouço o barulho da ambulância freando e os passos dos paramédicos abrindo passagem em meio à multidão. Sinto mãos me puxando e me deixo ser carregada, não tinha forças para lutar, só conseguia ver a imagem do meu irmão, imóvel e com uma poça de sangue a sua volta. Só depois percebi que quem me ajudou a levantar foi o Edu, ele me abraçou e ficava me falando que ia ficar tudo bem. Enfim tinha ganhado um abraço dele, mas não estava nem ligando. Sai de seu aperto e corri dali sem direção. Não sei para onde e nem como consegui a sustentação para poder correr, só corri. Minha mente estava a mil, só que em apenas um único pensamento. Por minha causa ele foi atropelado! Por eu ter ficado excitada com Edu, e ter negligenciado Breno, ele atravessou a rua sem olhar e foi acertado. De alguma forma eu sei que o choque foi fatal, não senti o pulso dele quando estava perto, não vi nem um levantar de peito. Rezo mais para que eu esteja errada e que quando eu voltar ele vai estar vivo, nos hospital se recuperando. Também é uma alternativa terrível, mas passaria o resto da vida agradecendo a Deus por isso.
Por minha culpa! Por minha culpa. Como e que poderia olhar para os meus pais agora? E como é que eu iria me perdoar? Essa dor que estou sentindo agora é a pior que já senti em todos esses anos, pior do que quando quebrei a perna caindo da arvore. Essa dor é lá no fundo da alma e não é uma dor física. A dor física passa depois de algumas horas, mas essa... Parece que falta uma parte de mim, uma parte importante. Quem é que me irritaria e logo depois me olharia com aquele olhar de menino pidão que fazia meu coração se aquecer? Quem me acordaria nas manhas de Natal me chamando de Nan? Nunca tinha dado tamanha importância a esses gestos dele, e agora tudo o que queria era poder reviver cada um. Não aguento e caio ali, perto de uma arvore. Estava desesperada e sem apoio. O que fiz não tinha perdão, perdi meu irmão.
_ AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHH! - só tenho vontade de gritar, gritar e gritar até essa dor passar. Sei que tenho que voltar e avisar meus pais, e ir para o hospital. Sei lá, deveria fazer algo e não ficar deitada chorando e gritando, mas é só isso que faço. Deito... e choro... E grito... E choro mais...

Me recomponho algum tempo depois, já está escuro. Pego meu celular e vejo que tenho 20 ligações não atendidas, todas dos meus pais. Mensagens lotavam meu celular deles querendo saber onde eu estava e me pedindo para ir para casa que a vovó estaria em esperando. Pego o caminho mais longo e começo a caminhada de volta. Chego em casa e olho ansiosamente para vovó em busca de notícias, ela só me olha e me abraça.

_ Querida, onde estava? – ela pergunta me sentando no sofá. – Seus pais saíram daqui correndo para o hospital atrás de seu irmão e pensaram que estava lá. Eles estão doidos por notícias suas.

_ Como ele tá vovó? – pergunto não prestando atenção no que ela fala. Só me importa saber como estava meu irmão.

_ Não sabemos, seu pai me falou que iria me ligar quando soubesse de algo. Mas como você tá? Por onde andou?

_ Só tinha que sair dali. Foi tudo minha culpa, minha culpa. - essa foi minha ladainha pelo resto da noite. Fui tomar banho e deixo a água cair em mim para ver se levava um pouco dessa dor. O tempo de espera por notícias é o pior de todos, você se sente imponente e inquieto. Saio do banho e escuto um choro vindo da sala, apareço na soleira e vejo minha vó sentada falando no telefone. Ela não precisa falar nada, já sei o que aconteceu. Encosto no batente e fico encarando o nada, dessa vez não chorei. Só fiquei ali, parada e sem ação. Era real, ele realmente morreu. Ouço minha vó tentando falar comigo, mas só prestei atenção em algo quando vejo meu pai entrando pela porta do apartamento. Vejo seu estado, suas roupas estão amassadas e seu rosto está vermelho, olho para ele com vergonha e em poucas passadas me alcança e me abraça. Não falamos nada, só choramos um no ombro do outro.

No enterro, só conseguia olhar para frente para evitar a todos, e saí correndo quando já não aguentava os olhares que recebia de algumas pessoas, a história de que ele estava comigo quando foi atropelado se espalhou, e os olhares que me davam só confirmavam o que já achava, era realmente minha culpa. É claro, também recebi olhares de pena, e se tem algo que eu odeio mais que chorar e que tenham pena de mim.

Os outros dias passaram num borrão, meus pais tentavam e tentavam me fazer falar, me levavam em médicos que insistiam que eu não tinha culpa, que o que aconteceu foi uma fatalidade. Eu passava os dias dentro no quarto e só saia para comer, e para ir até o parque, o último lugar em que fui com Breno. Guilherme, meu novo vizinho idiota, Maíra, uma amiga que acabado de conhecer, me encontravam sempre e conversavam comigo. Foram as primeiras pessoas com quem conversei de verdade sobre o assunto e os únicos, além dos meus pais, que sabem o que aconteceu de verdade.

Já estava sentada no chão do banheiro, só de me lembrar daquele dia e da agonia que foi já me sinto fraca. Prefiro deixar esse assunto de lado e desligo. Olho no celular e vejo que fiquei mais de 1 hora embaixo do chuveiro, coloco a toalha em volta e me surpreendo por ver Aline ali.

_ Demorou. Mais um pouco e iria te buscar lá dentro. – ela me diz com um sorriso.

_ Aline, o que faz aqui? – pergunto parada na porta enquanto enxugava o cabelo com a toalha.

_Estava no shopping com Gabe e encontrei sua mãe por lá. Ela estava mal e a parei para saber o que estava acontecendo, ela me contou que tinha brigado com você e tinha cometido um erro, mas não me disse qual. Só me disse para vir te encontrar, que você estaria precisando de um ombro amigo, e pela sua cara está mesmo – Ela se levanta e vejo que está segurando algo. É a única foto que guardei de Breno. Na foto ele estava sentado no meu colo com as mãos no meu rosto beijando a ponta do meu nariz, eu estava sorrindo e olhava diretamente nos olhos dele. Era a minha foto preferida e a tinha na cabeceira antes do acidente.

_ Você nunca me contou que tinha um irmão.

_ Bom, não é o meu assunto favorito. – digo deitando na cama e cruzando os braços atrás da cabeça.

_ É ele não é? – ela pergunta e eu a olho confusa. – A sua perda. Foi ele a morte difícil que teve que enfrentar.

_ Parabéns, você já pode virar vidente. Quem sabe dá certo?! – falo olhando para o teto.

_ Sabe que não precisa ser ignorante. – ela olha para a foto novamente. - Ele era sua cara. – Minha única reação é continuar olhando para o teto e um momento de silêncio se instala entre nós, posso ouvir a mente dela trabalhando em algo e percebo quando ela vem para perto de mim. Seu rosto entra na minha linha de visão e ela coloca os braços em cada lado da minha cabeça.

_ Não vou insistir para me contar, se quiser falar estou aqui.

Olho para seus olhos e ali vejo uma familiaridade, em pergunto quando ela chegou e quando se tornou tão grande entre nós. Penso mais uma vez e decido contar tudo para ela, quando dou por mim já estou com a cabeça em seu colo enquanto ela fazia cafuné e eu contava histórias sobre ele.

_ Ele adorava doces, me lembro de um dia acordar no meio da noite com um barulho, era umas 3h e desci para investigar. Pensei que poderia ser um rato ou sei lá, mas quando cheguei na cozinha era ele, sentado de frente pra geladeira, com a geladeira aberta, e traçando os ovos de chocolate que tínhamos ganhado na Páscoa. Me lembro queestava me preparando para brigar com ele, só que aí, ele se virou para mim com as mãos e a boca sujas de chocolate e falou:

“Nan, ainda tem mais. Quer?” Acabei sentada comendo os ovos junto com ele. – estava com lágrimas nos olhos e percebi que Aline também. Ela chega perto de mim e me dá um beijo.

_ Certa vez, eu ouvi uma citação muito bonita. Ela dizia mais ou menos assim: “Ha uma terra para os vivos e uma terra para os mortos; e a ponte é o amor, o único que sobrevive, o único significado”. Você o amava muito, ele sempre vai continuar aqui. – ela fala colocando a mão sobre meu coração. Depois completa. - Tenho certeza que ele era um garoto muito fofo, é uma pena que tenha ido tão cedo.

_ Todos os dias eu acordo e tenho uma sensação de que está tudo normal e que a qualquer momento ele vai entrar pela porta e pular na minha cama me acordando, só que ai, eu me lembro do que aconteceu e aquele vazio volta. Ele diminuiu nesses anos todos e eu sempre tento não deixar transparecer o que aconteceu.

_Você sempre quer ser a forte e não depender de ninguém, eu acho isso muito bonito, mas... Em um momento ou em outro, vai precisar de alguém e quero que saiba que quando esse momento chegar, eu vou estar aqui com você.

_ Eu sei. – digo e balanço o pulso em que a pulseira que ela me deu estava.

Ficamos juntas mais um momento e depois ela vai embora. Eu a acompanho até a porta e depois vou até minha mãe e a abraço por trás.

_ Obrigada por isso. – digo e me sento ao seu lado para assistir TV.

Quando vou dormir, faço o que fiz por anos. Coloco as lembranças de Breno onde sempre as deixei, dentro da memória e tento me concentrar no que a vida me reserva.


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