Katniss acordou naquele dia com os pensamentos e sentimentos bagunçando sua mente. Ela sabia que era o sétimo dia e sabia que ela já tinha outros planos, mas ela também sabia que não queria ir embora. O que não sabia era se Peeta queria que ela fosse ou ficasse. E nunca iria saber, pois passou a vida toda sendo egoísta, agora estava determinada a deixar seus sentimentos de lado e fazer o que há muito tempo já deveria ter feito: ir a Paris passar um tempo com a sua família.

Depois de algum tempo deitada, Katniss decidiu se levantar. Escovou os dentes e tomou banho rapidamente. Quando saiu do quarto encontrou Peeta sentado no chão da sala com uma caixa ao seu lado e diversas coisas espalhadas na mesa de centro. Katniss se sentou ao lado dele e por alguns momentos apenas o observou em silêncio já que ele parecia estar concentrado - e realmente interessado nas coisas em que estava mexendo. Havia um brilho um tanto quanto encantado em seu olhar.

– O que são essas coisas? – perguntou Katniss, mas antes que ele respondesse, ela se precipitou: - A terceira coleção? – indagou lembrando-se do que ele havia dito sobre ter uma coleção de objetos.

– Exatamente – confirmou Peeta – Eu lembrei de que você havia pedido para ver e peguei enquanto você dormia. Tem tantas lembranças aqui – ele parecia encantado enquanto mexia nos objetos, o que fez Katniss perceber que aquelas coisas tinham grande valor sentimental para ele.

Katniss pegou um elástico de amarrar cabelo. Havia alguns fios de cabelo loiros enrolados nele.

– O que é isso? – ela perguntou. Peeta riu e pegou o elástico que ela estava segurando.

– Pertencia a uma garota chamada Anne Harvey – ele disse – Meu primeiro beijo. Eu tinha doze anos.

– Não sei se me sinto confortável em saber dos seus antigos casos – Katniss brincou com um sorriso divertido que Peeta devolveu.

– Meu “caso” – ele fez aspas com os dedos – com Anne não foi muito além de alguns beijos – encerrando o assunto sobre Anne, Peeta pegou uma concha – O melhor verão da minha vida. Finnick e Annie me convidaram para passar o verão com eles nos Hamptons e eu hesitei, não queria ficar só com os dois lá, você sabe, é sempre desconfortável ficar entre um casal, mas acabei concordando em ir e foi ótimo.

Katniss pegou uma foto e a analisou. Era uma foto antiga e nela havia dois garotinhos abraçados, sendo que um deles segurava uma bola de futebol nas mãos. Katniss sorriu reconhecendo Peeta pelos cabelos claros. O outro ela deduziu que era Finnick.

– Finnick e eu gostávamos de jogar futebol – Peeta riu olhando a foto que Katniss segurava – Minha mãe ficava muito irritada com a gente porque nos sujávamos inteiros, mas valia a pena, era divertido.

– E isso? – Katniss perguntou segurando uma pena.

– Eu tive um pássaro quando eu era criança – ele sorriu – Quando ele morreu eu peguei uma pena que havia caído na gaiola em que ele costumava ficar.

– Então desde sempre você faz essa coleção? – indagou Katniss.

– Não exatamente. Eu pegava as coisas que queria guardar, então mais tarde, eu acho que eu tinha uns dez anos eu dei o título de coleção – explicou Peeta com um sorriso inocente estampado no rosto.

Katniss deu uma boa olhada nos objetos até que um par de brincos de ouro chamou sua atenção. Ela os pegou e antes que dissesse qualquer coisa apenas os olhou por alguns minutos para confirmar seus pensamentos.

– Peeta... – ela o chamou, mas não precisou perguntar para que ele compreendesse a pergunta que ela faria.

– Sim, são seus – ele confirmou – São do dia em que te levei àquela boate. Você começou a trocar as joias no carro, porque estava em duvida entre algumas e acabou deixando os brincos lá. Pensei em te devolver, mas você não merecia minha gentileza depois de me deixar sozinho na boate em que eu te coloquei e eu merecia mais coisas para a minha coleção – Peeta explicou sorrindo – Sinto muito se quiser os brincos de volta, depois de tanto tempo eles são meus agora.

Katniss riu enquanto tirava a pulseira em seu pulso.

– Pra você se lembrar da melhor semana da sua vida – ela sorriu e colocou a pulseira junto com as outras coisas.

– Não posso, Kat, não funciona assim – falou Peeta – Aqui não tem coisas dadas para a coleção. Essas coisas geralmente eu pego ou as pessoas simplesmente me dão e eu coloco aqui. Não era nem pra você saber da coleção.

– Ei! – ela exclamou – Eu sou a exceção então, mas fique com isso. Quero que você fique com isso. Você tem os meus brincos, mas são memórias ruins de mim. Quero que você tenha a pulseira para ter as memórias boas também – Peeta por fim assentiu, concordando. Ele entrelaçou seus dedos nos de Katniss, esperando que ela não fosse se afastar.

Katniss olhou suas mãos enquanto Peeta olhava para ela, tentando adivinhar no que ela estava pensando, mas por fim desistiu. Ela parecia ter uma guerra dentro de si – e realmente tinha. Cada vez mais ela ficava mais indecisa sobre que caminho teria seguir.

– Peeta, eu preciso arrumar as minhas coisas, você sabe... – ela queria garantir que ele se lembrava de que ela precisava ir. Ela queria que ele aceitasse isso e a deixasse ir, mas ao mesmo tempo queria que ele a pedisse para ficar. Mas se ele pedisse ela iria mesmo assim e se ele não pedisse, ela iria da mesma forma, mas iria magoada.

– Por que você vai embora? – Peeta perguntou, depois de algum tempo em silêncio.

– A aposta acaba hoje – Katniss respondeu sem o mínimo de convicção na voz.

Era uma resposta inválida àquele ponto. Katniss não passou a semana toda com ele por causa da aposta, era por outro motivo e os dois sabiam disso. Ela teve muitas chances de partir, mas não quis.

– Eu sei – falou Peeta, com mais firmeza que ela – Por que você vai embora? – ele insistiu.

Katniss não soube o que responder. Ela não queria tornar nada mais difícil para nenhum dos dois, mas pela primeira vez ela precisava – e queria – fazer a coisa certa. Queria poder consertar seus erros do passado e Peeta era um deles e agora já estava tudo bem entre eles, mas ainda havia tanto o que fazer.

– Eu vou a Paris, Peeta – falou Katniss – Eu vou ser uma boa filha para minha mãe enquanto ainda há tempo para isso. Eu vou cuidar da minha irmã mais nova que deve estar sentindo minha falta. E também tem meu pai, que deve se perguntar todo dia o que fez de errado para que eu sumisse desse jeito.

Peeta não respondeu. Ele sabia que ela precisava fazer essas coisas, mas ele queria que ela ficasse. Assim como ela não queria ser egoísta e ficar, ele também não queria ser egoísta e pedir para que ela ficasse. Mas mesmo que eles não dissessem o que realmente queriam, seus desejos eram os mesmos.

– Eles precisam de você, Katniss, eu entendo isso, mas eu também preciso – falou Peeta. Ele nunca teria imaginado que um dia teria Katniss Everdeen ao alcance de suas mãos e agora ele estava com medo de perdê-la. Se alguém tivesse dito a ele há algumas semanas que isso aconteceria ele não teria acreditado.

– Peeta, você sabe que eu preciso ir – Katniss não estava com muitas ideias sobre o que deveria dizer para convencê-lo de que ela deveria ir quando nem ela mesma estava convencida disso.

– Eu sei, mas eu não quero que vá – Peeta persistiu.

– Por quê? – perguntou-lhe Katniss, surpreendendo-o. Peeta entreabriu os lábios – Diga, Peeta. Tudo o que você fez até agora foi dificultar as coisas pra mim, dizer que eu não posso ir, que não quer que eu vá, me perguntar o motivo de eu ir. Muito bem, por quê?

– Katniss, depois dessa semana é evidente que algo mudou entre nós. Eu meio que me acostumei a ter você aqui.

– Algo mudou – ela fez uma péssima imitação de sua voz – Seja convincente, Peeta. Você me beijou no Central Park, você me abraçou ontem e tentou me confortar. Vou te perguntar de novo e espero uma resposta melhor: por quê? – ela o pressionou.

Peeta passou a mão no cabelo loiro. Aparentemente era difícil para todos falar sobre seus sentimentos.

– Porque eu te amo! – ele exclamou – Satisfeita? Essa resposta é boa o bastante? Depois de toda a raiva, todo o rancor, toda essa briga sem fundamente, essa aposta ridícula, depois de tudo eu te amo, Katniss. Mas e você? Que teve infinitas oportunidades de ir embora, mas não foi. Você, que me defendeu do meu pai. Você preferiu vir comigo “por honra” do que ficar com seu namoradinho, na verdade, estou começando a achar que ele não dá conta – Katniss sentiu o rosto esquentar e Peeta sorriu – É o sétimo dia e você está hesitante. Só fala sobre como precisa embora, mas não vai. Minha vez novamente e eu espero uma resposta convincente: por quê?

Ela revirou os olhos diante do sorriso vitorioso de Peeta.

– Porque eu te amo, seu estúpido – Katniss admitiu – Agora não me pergunte o porquê, porque eu não sei.

Ele riu e se sentou no sofá, puxando-a pela mão para que ela se sentasse em seu colo. Peeta colocou uma mecha do cabelo dela atrás de sua orelha.

– Não vá – ele pediu, depois de alguns segundos em que eles ficaram apenas se olhando, tentando decifrar um ao outro.

– Peeta... – Katniss começou, mas ele não deixou que ela terminasse:

– Vá, mas não amanhã, por favor – ele umedeceu os lábios – Eu vou tentar tirar alguns dias de férias do trabalho e eu vou com você. Assim não temos que ficar longe um do outro, assim todos os nossos problemas se resolvem.

Katniss ergueu as sobrancelhas, surpresa com a sugestão dele.

– Você tem certeza? Seu pai já está irritado, se você sumir desse jeito por mim você só vai conseguir ainda mais problemas com ele. E eu não sei quando volto. Talvez meus pais me segurem lá por mais tempo do que eu pretendo ficar, eu não quero ser um problema pra você.

– Você não vai ser um problema – ele garantiu a ela.

Por fim, Katniss sorriu, aceitando a sugestão. Ela colocou as mãos em sua nuca e se aproximou para beijá-lo. A sensação de amar alguém – e beijar alguém que amava – era estranha para os dois. Quando eles se separaram, Katniss se levantou sem dizer uma palavra e pegou seu celular. Digitou o número de Gale e aguardou.

– Ah, então agora já quer correr de volta pra mim? – perguntou a voz de Gale, que só de ouvi-la fez o estômago de Katniss revirar – Tarde demais.

– Não, Gale – ela respondeu. Peeta, que observava a cena, estreitou os olhos quando ouviu o nome de Gale – Só estou ligando para me certificar de que você não vai me procurar mais. Você se lembra de Peeta, certo? Então, nessa semana ele me fez descobrir algumas coisas e uma delas é que você não serve pra mim.

Gale forçou uma gargalhada, mas Katniss sabia que ele estava fervendo de raiva.

– Se você acha que depois de ter passado nas mãos desse desgraçado eu ainda iria querer você na minha cama então você não poderia estar mais enganada, lindinha.

– Ótimo – falou Katniss e então desligou.

Sentia-se melhor em saber que agora havia tirado Gale de sua vida pra sempre. Nunca mais teria que fingir estar se divertindo quando não estava, nunca mais iria precisar ficar com alguém de quem não gostava apenas para não se sentir sozinha.

– Eu tenho tanta sorte de ter você em minha vida – falou Katniss, achando que Peeta deveria saber disso.

Era inacreditável o quanto Katniss havia mudado em apenas uma semana. Ela mal conseguia se lembrar de quando havia transformado sua vida na confusão que era, de forma que ela estava feliz em saber que, finalmente, teria a chance de mudar tudo aquilo. Katniss sorriu para o nada, o que fez Peeta sorrir também.

– O que foi? – perguntou Peeta.

Ao invés de responder, Katniss tirou seu vestido, jogando-o no chão e, ainda sorrindo, e andou até Peeta, que murmurou antes de beijá-la:

– Seja lá o que for, continue.