Violentada escrita por C W Elliot


Capítulo 2
Excessivamente trágicas


Notas iniciais do capítulo

um lembrete de que o tempo pode ser degradante, mas tudo sempre passa e nós nos acostumamos com uma rachadura aqui ou uma vidraça quebrada ali



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A caminho da escola, tento não chorar. Eu tenho chorado toda noite, depois... que ele começou aquilo. Não posso chegar com os olhos vermelhos na escola, todos vão me olhar, e eu não preciso de mais olhares me mostrando que o eu faço é errado. O que ele faz. Mas eu sou a verdadeira culpada, o monstro sou eu. Eu não mereço o amor secreto de minha mãe, nem a amizade de Fernanda, nem os abraços do meu pai. Eu não mereço. Aquele monstro me transformou num monstro. E isso me faz sentir ainda pior.
O ônibus, de um amarelo vivo e desbotado, com várias camadas da tinta barata já saindo, numa tentativa ridícula de imitar os ônibus escolares americanos. Tudo aqui sofre influência do americanos do norte. Bem, o nome da cidade: Town. Cidade. Uma cidade chamada cidade. Belo trabalho brasileiro. Meu nome também é um caso a parte. Sophia Dandelion. Meu pai é escritor, não se podia esperar esperar menos, ele sempre quis que eu tivesse um nome diferente. Certa vez, me disse que teve um sonho em que, se ele tivesse uma filha, o nome dela deveria ser Sabedoria,mãe não aceitou e me chamou de Sophia, que em grego, significa Sabedoria. Confesso que hoje me sinto aliviada por não me chamar Sabedoria Dentes de Leão. Meu pai, não ficou muito contente, resolveu não reclamar, mas em seu livro resolveu chamar a personagem principal de Sabedoria, e isso foi um sucesso, pois todos achavam que era uma crítica a sabedoria, e os conceitos que temos de sabedoria e inteligência, que a menina era uma personificação de nossas qualidades e defeitos, e outras coisas, mas era apenas um nome. um nome como outro qualquer. Não sei por que nomes precisam de significados, mas eles tem. Meu sobrenome também foi meu pai que escolheu, ele era louco por dentes de leão, e queria por que queria, que eu tivesse dentes de leão no meu nome. Minha mãe, como boa morada de Town, resolveu usar o inglês no meu nome, colocando Dandelion, o que não foi muito melhor. Meu pai convenceu, com muita lábia e dinheiro, o rapaz do cartório a me aceitar como Sofia Dandelion, já que ele era Heitor Montenegro e minha mãe Mariah Vieira. Quando eu era mais jovem, pouco tempo atrás, vivia chorando por causa do meu nome. Na aula de inglês, quando os garotos descobriram o significado meu nome, ficaram me assoprando para ver se meus cabelos iam sair voando. Chegava em casa chorando e meu pai me contava essa história. E então passei a gostar do meu nome, por que era um legado do meu pai. Ele pode não o ter escolhido propriamente dito, mas meu nome é fruto do que ele queria. Meu pai escolheu. Meu pai. E eu amava meu nome por isso.
A escola, um prédio de dois andares feito de tijolos avermelhados (Town High School) parecia não querer ceder as modernas casas com placas de concreto ou então feitas com aço e vidro. Ela, a escola, parecia ser um lembrete de que o tempo pode ser degradante, mas tudo sempre passa e nós nos acostumamos com uma rachadura aqui ou uma vidraça quebrada ali. Mas no meu caso, isso nunca vai passar, as rachaduras são muito grandes e profundas para me acostumar com o tempo ou então serem curadas com um simples reforço de cimento. Não posso fugir, minha mãe ficaria muito decepcionada e eu não estou com notas muito boas. As aulas passam bem lentamente, e o relógio girava os ponteiros de forma tão demorada, que me pergunto se ele não estava querendo me dar ainda mais tempo para me sentir ainda mais culpada. Me mostrar que eu tenho que lembrar a toda hora do que eu faço. Mostrar que o tempo não vai apagar essas marcas.
Enquanto a professora ia falando sobre a Segunda Guerra Mundial, eu ia pensando, lembrando de antes... lembrando do tempo feliz.
Costumava sair muito com meu pai durante o tempo feliz. Nós íamos a sorveteria perto da Praça, e conversávamos sobre a escola sobre a cidade, sobre os textos que ele estava escrevendo. Eu gostava de ler e escrever desde muito cedo, e o senhor Heitor, sempre me incentivava. Meu pai, certa vez me perguntou:
– Sofi (ele me chamava assim), você acha que tudo vai ficar igual para sempre?
– Sim, papai, tudo é rotina, quando fazemos algo por muito tempo e nos acostumamos com ela, vira rotina e fica igual. Podemos crescer e envelhecer, mas sempre vamos cultivar os mesmo hábitos. Por exemplo, você mamãe e eu. Vamos ficar juntos para sempre, não é mesmo? - Eu confesso que tinhas ideias bem infantis e limitadas. Mesmo lendo muito, eu não absorvia muito dos livros. Eu ainda tinha a mentalidade de que tudo sempre será igual.
– Tá vendo essa maça aqui? - disse ele tirando uma maça do bolso, assenti com a cabeça - se eu a deixar aqui em cima desta mesa por muito tempo, ela vai continuar a mesma, ela vai ser sempre assim: vermelha e suculenta? - não entendia muito bem a pergunta, e por que ele estava dizendo aquilo, mas mesmo assim respondi:
– É claro que não,papai. Ela vai ficar velha e mofada, ela vai murchar e apodrecer. Não pode deixar ela aqui, ela vai estragar.
– É isso o que eu queria saber. Minha querida, assim como a maça é a vida. Ela nunca vai ficar igual, ele pode ser bonita, atrativa e "suculenta" às vezes, mas nunca será mesma. A vida um dia vai murchar. E assim são também as relações entre os humanos, elas também vão se desgastar e ficar velhas com o tempo. Elas mofam. A vida é cheia de mudanças.
– Papai, você tá me dizendo que você e a mamãe estão mofados?
– Sim e não,Sofi. Nós não estamos mofados, mas nossa relação está. Mamãe e eu vamos no separar. - finalizou ele, pesaroso.
Desatei a chorar. Não queria que meus pais se separassem, eu amava os dois não podia viver com eles separados. Mas papai tinha razão a vida é cheia de mudanças, e temos que nos adaptar a elas.
Algumas mudanças são boas, é claro. Algumas não muito desejáveis. Outras lamentáveis como a separação dos meus pais, mais algumas são excessivamente trágicas, como minha mãe ter conhecido Frederico Garcia, o Fred.


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Notas finais do capítulo

Agradeço a minha grande amiga Lanna por compartilhar seus devaneios comigo e me ajudar com a parte final das mudanças excessivamente trágicas.



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