Na Linha Da Vida escrita por Humphrey


Capítulo 32
Caro temor


Notas iniciais do capítulo

Oe, rê :B Tô postando na nota inicial para dizer que escrevi o capítulo ouvindo Echo - Jason Walker, então, pra quem quiser ouvir enquanto lê...
:3 Boa leitura!



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Cogitando sobre as palavras corretas a usar, o médico diria algo, porém Joana suspirou, levantou o dedo e calmamente pediu para que eu me sentasse em uma das poltronas ao meu lado.

– Obrigado – agradeci, talvez um tanto irônico, e fiquei observando a Anne, ansiando para que logo me contassem o que estava havendo.

– Ao decorrer da semana, estivemos testando várias formas de tratamento para ela, mas era notório que nada estava funcionando – afirmou. – Então, nós... eu pensei que a melhor maneira de tratá-la, nesta situação, é... fazendo um transplante cardíaco.

Os outros dois adultos se entreolharam, mais perplexos do que felizes por saberem que, sim, existira outra forma de tratamento. No entanto, eu os compreendia. Era um coração ou sua vida ia se despedaçar até não sobrar uma migalha. Eu estava abismado, sem conseguir olhar para a Anne ou sequer outra coisa a não ser meus braços e mãos entrelaçadas.

A tia da Anne apoiou-se na parede, colocando as mãos sobre o rosto e deixando somente os olhos esbugalhados à mostra.

– Mas ela... vai ficar bem. Com certeza há muitos doadores compatíveis e... e... – Sua respiração estava acelerada.

– É isso o que nós esperamos – respondeu o doutor. – E acho que agora vão querer falar com ela sobre...

– Prefiro ficar sozinha com o Brandon – Anne interrompeu, focando o chão como se estivesse pensando em algo.

Assentiram com a cabeça, direcionando-se até à porta. Antes de passar pela mesma, Philip sussurrou um “obrigado” para mim. Mesmo sem saber o porquê, tratei com indiferença, caminhando até à cama da Anne após o cômodo ficar vazio.

– Sente-se – ordenou ela, olhando-me nos olhos.

Fiquei atrás da poltrona a fim de empurrá-la para aproximá-la à Anne.

– Não, não. Aqui – explicou. Esboçou um sorriso limitado no rosto, pousando uma das mãos sobre o espaço vago na cama.

Corrigi a ação, me sentando no lugar onde ela propôs e colocando a ponta do meu queixo sobre o topo da sua cabeça, beijando-a em seguida. Ficamos assim durante um bom tempo, abraçados. Eu não sabia o que ela estava fazendo; se estava ponderando algo ou apenas tentando descansar. E foi quando ela respirou profundamente.

– Não quero falar sobre aquilo – sussurrou.

Sorri, balançando a cabeça positivamente.

– Lembra quando encenamos Romeu e Julieta? – indaguei, tentando dar outro rumo à conversa. Rimos juntos. – “Ah, eu nunca vou te beijar”, e blá-blá-blá. Éramos infantis.

– Demais. – Ela brincava com os meus dedos, porventura sorrindo assim como eu. – E quando você me viu de sutiã, no acampamento? Eu queria te esquartejar.

– Quem diria que, depois de um tempo, eu te veria sem ele? – gracejei.

Anne gargalhou, dando um leve tapa no meu braço.

– Era divertido ver você tendo inveja da minha habilidade superior à sua no vôlei – zombou, virando o rosto para ver o meu.

– Inveja? Você era metida, com todos aqueles eu-sou-um-zumbi-ávido-por-Anne te idolatrando. Mas até que era engraçado, eu admito.

– Ah, tá bom – ironizou, rindo e olhando novamente para frente. – Você... poderia dormir aqui comigo? Ficar sozinha é o que menos quero, hoje.

– Claro, claro que sim. – Apertei o abraço.

– Obrigada. Eu amo você.

Ela relaxou nos meus braços, quase deitando-se, portanto, me sentei no centro superior da cama, colocando um travesseiro em meu colo para que ela conseguisse descansar um pouco melhor. E então, apesar de que fosse apenas 08h13 da noite, eu também adormeci. Embora estivesse sentado e que no lugar do travesseiro fosse uma parede lisa, foi um bom sono. De fato, não lembro se sonhei, mas foi bom.

Acordei por volta das três horas da madrugada por conta da Anne, que levantara bruscamente pela dispnéia. Fiz com que se sentasse no meio da cama, mantendo-a ereta e calma, como havia lido num artigo de um site há alguns dias.

E assim as semanas se passaram, rapidamente. Como antes, eu a visitava em todos os finais de semana, ora com o carro emprestado do meu pai, ora de avião. Adentrava o quarto e Anne sempre me recebia com um “olá” ou “oi”, seguidos de um sorriso. E ao me despedir aos domingos, em vez de dizer adeus, eu a cumprimentava com um aceno, assim dizendo que voltaria em breve e que, também, sempre estaria ali com ela, porém ao mesmo tempo – paradoxalmente – em Vermont.

Todavia, ao decorrer das semanas, eu notara que ela ficava cada vez mais pálida e debilitada, aguardando pelo bendito doador. Os médicos já tinham conectado máquinas para ajudarem o coração da Anne, que ficava cada vez mais fraco por conta da falta de tratamento.

– Soube que você vem sempre para visitá-la – alguém disse, subitamente aparecendo ao meu lado, também fitando a janela à frente cuja dava vista à Anne, que era examinada por uma enfermeira.

– O que você veio fazer aqui? – Olhei para David, que retribuiu.

– Apenas porque queria vê-la.

Cerrei os olhos.

– E a você também – continuou. – Não virei gay, só... sabe, falar que eu estou arrependido. É sério. Minha mãe me pergunta sobre você e só posso responder que se mudou; que não sei de nada mais. Entende?

Ele se ajoelhou e esticou a mão para mim.

– Meu nome é David Morgan, prazer.

Eu ri.

– Cara, levanta. Sou hétero, então me desculpe, mas não vou aceitar o seu pedido de casamento – caçoei.

Rimos depois de David se erguer. O perdoei, porém a amizade não seria como a de sempre, até porque nós nunca mais nos veríamos. Minutos depois de uma conversa sobre a saúde da Anne e minha nova vida em Rutland, ele foi embora. Logo pude entrar no quarto.

Entretanto, no lugar do habitual “oi”, ela apenas sorriu, este representando o cansaço e a fraqueza que sentira.

– Estou horrível – afirmou, a voz baixa.

– Então eu estou péssimo – retruquei, andando até à cama.

– Péssimo é pior que horrível? Se sim, vou considerar como um grande elogio.

Abafei uma risada, passando a mão em seus cabelos.

– É, é sim. Bom, eu acho que sim.

Fiquei admirando o seu rosto pálido, a boca seca e os olhos quase fechados. De repente, meu corpo foi invadido pelo choque de realidade, e imaginei diversas coisas que poderiam acontecer dali em diante. E as piores. Mesmo esperançoso, eu temia todas as más ocorrências. Os momentos em que pensava nas mesmas eram terríveis.

– Vou pegar um copo d’água. Vai querer? – perguntei, ficando em pé e passando as mãos pela face, tentando me convencer de que nunca havia pensado em tais devaneios.

Anne moveu a cabeça em um gesto negatório.

Cruzei a porta e fui até o filtro, pegando um copo descartável e apertando um dos botões. Bebi o líquido em um gole, e talvez isso tivesse feito, mesmo que por segundos, a minha audição falhar.

Adentrei novamente o cômodo, um pouco aliviado. Provavelmente a sede estivesse me fazendo ter aquelas sensações de descrença. Provavelmente.

– Anne, eu estive pensando em te fazer uma surpresa – devagar, fechei a porta.

Olhei para ela, mas a mesma estava dormindo. A foquei ainda mais. O seu tórax parecia não estar se movimentando. Parecia... não estar... se movimentando...

– Anne? – me aproximei. – Ai, meu Deus, Anne!

Coloquei dois de meus dedos sobre a sua jugular. Talvez a posição estivesse errada, ou somente porque eu estivesse desesperado, mas não sentia pulsações.

– Anne, por favor! – exclamei.

Uma enfermeira entrou no quarto, igualmente nervosa. Esta me tirou de perto da Anne quase que em um empurro.

– O remédio para dormir! Ela está dormindo! – disse ela. – Saia!

Ofegante como se tivesse corrido por três quilômetros, corri ao banheiro masculino, trancando a porta em seguida. Me apoiei na pia, encarando o ralo. Eu não poderia ter essa atitude toda vez que a visse descansando, pensando que o que eu mais evitava havia chegado. Isso demonstrava minha falta de confiança, embora fosse mentira. Ou verdade. Minha mente estava muito mais confusa.

Ainda com a cabeça abaixada, olhei para o meu reflexo no espelho e dei um soco no mesmo, que rachou. Diversos Brandons, cada um representando um sentimento desconfortável. Me sentei sobre um vaso sanitário e, pela primeira vez em anos, eu chorei, dando muitos outros socos na parede ao lado. E gritei, depositando um último, pensando que talvez atenuasse a situação, o que não aconteceu, infelizmente.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? :B Hehe, me desculpem, caso eu tenha os assustado.
Ps: Postei o teaser da nova fic. -> http://youtu.be/ONcS1FnpQD4
Ps²: Esse é o antepenúltimo capítulo da Dear Enemy ;-;
Ah, quero agradecer à Mayy pela divina recomendação, mdsssss - E às outras pessoas também, cujas esqueci de agradecer anteriormente. Obrigadaaaa! *-*