"Filha, compramos um piano!"

" Você é a melhor aluna que eu já tive."

"Nossa Anna, como você toca bem."

"Querida, venha tocar para as visitas."

"Porque você não toca?"

"Pra que você faz aula se não toca?"

"Do que adianta saber se você não o faz?"

"Toque para as pessoas! Se apresente, vá aos recitais! Você faz o piano falar, não seja tímida."

"Do que você tem medo?"

– Vocês não entendem! - Grito e bato nas teclas.

Droga. Me descontrolei de novo. Apoio meus cotovelos nas teclas do piano, saiu um som horrível, porém não me importei. Eu não conseguia tocar quando ficava com raiva, ou quando um turbilhão de pensamentos me atingiam. Acabo errando as músicas. Começo a tocar forte e rápido, uma mão começa a tocar mais rápido do que a outra, a música fica um desastre. Mas de tempos em tempos os mesmos pensamentos voltam. "Tocar em público", todos me cobravam isso. Meus pais, meu professor, meus amigos. Eles não entediam que para mim isso não era fácil. Não é fácil.

– Tá tudo bem?

Tinha esquecido que ele vinha.

– Está, Loki - eu o encaro - você tá comendo pudim?

Ele olha para o prato em suas mãos e então sorri.

– Aham, Thomas tinha razão. É muito bom pudim.

Faço uma careta, não gosto de pudim.

– Como ele te convenceu a comer pudim? - questiono.

– Ele enfiou a colher na minha boca - pausa - literalmente.

– Não sei como você ainda não o matou.

– É, nem eu.

Era impressionante como Loki conseguia ser duas pessoas diferentes. Antes ele era frio, quieto, era meio do mal. Ele continua assim, mas não quando estamos juntos. Depois que começamos a nos encontrar no auditório ele começou a conversar, a sorrir. As vezes me fala sobre Asgard e sempre está me irritando. Ele parece uma criancinha. Quando estou tentando aprender uma nova música ele fica do meu lado e começa a tocar teclas diferentes; quando estou lendo, ele começa a ler em voz alta frases soltas do meu livro, o que não me deixa terminar a página; quando tenho alguma coisa na mão ele a toma de mim e a levanta, nem pulando eu consigo pegar já que ele é bem mais alto do que eu. Ele deveria se chamar "deus da chatice".

– Mas então, porque você estava gritando com o piano? - ele pergunta.

– Nade de mais.

Ele senta no banco.

– Sabe, vocês tem que parar de me dar esse tipo de comida. É muito bom! Primeiro vocês me fazem comer pipoca, e agora pudim. Vou ter que levar esses alimentos para Asgard - Loki comenta enquanto devora o pudim.

Saio do piano e sento do lado dele.

– Porque você não usa o anel? - pergunto enquanto olho para sua mão.

– Eu uso - ele abaixa a gola da camiseta - aqui.

Ele usava uma corrente no pescoço, e passou o anel ali.

Era bom que ele não usasse o anel na mão, iríamos parecer um casal.

Por mais que nem eu e ele admitíssemos, viramos bons amigos. Nunca imaginaria que viraria amiga de um deus por causa da música. No começo eu só tocava piano e ele só escutava. Depois começamos a conversar, e então virou isso.

– Ei! Vocês viram o Kaio? - Tom aparece de repente e pergunta.

– Não. Porque?

– Trabalho de matemática, esqueceu? - Tom me lembra e sai.

– Ai caramba - pego minhas coisas e corro para alcançar Tom - Loki, se quiser pode vir com a gente! - grito.

***

Passamos a tarde toda fazendo o trabalho, quase nos atrasamos para o jantar. Estou deitada na cama da Belle, ela está experimentando roupas para sair com seu novo namorado, Oscar. Ele é o capitão do time de basquete. Eu poderia pensar em como ela tem sorte por estar namorando com ele, mas na verdade é o contrário. Belle é uma das meninas mais bonitas do colégio, sem contar como ela é legal. Ela pode escolher com quem namorar, a maioria dos garotos gostam dela.

–Belle, não me deixe sozinha - choramingo - vou ficar entediada.

– Porque você não vai ficar com o Loki? - ela sugere - vocês não se desgrudam...

Sento na cama e cruzo os braços.

– Não quero falar com ele.

– Ué, vocês brigaram? Ou ele comeu sua pipoca? - ela pergunta e ri. Também rio da piada dela.

– Talvez, mas não é isso.

Belle vai para o encontro dela e eu volto para meu quarto. Me arrumo para dormir e deito na cama. Fico encarando o teto. Penso em tudo o que aconteceu, desde que eu entrei no colégio, em setembro. Os ataques; meus amigos, dois americanos loucos, um australiano gênio, um inglês viciado em Shakespeare; Um deus nórdico. Era difícil ter umas semana normal com os cinco reunidos.

Adormeço pensando em como tudo está ótimo.