The Last Chance escrita por theblackqueen, BloodyBunny


Capítulo 2
The Help.


Notas iniciais do capítulo

Eu quero agradecer a Maryana. Eu adorei a recomendação linda que ela mandou. Muito, muito obrigada mesmo pelo carinho. Juro, eu vomitei arco-íris montada em um unicórnio quando vi. Muito obrigada sua linda ♥
E também agradecer a AshleyBBenson que foi a primeira a comentar.
O capítulo é dedicado a vocês!



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Por um momento Marie ficou sem ação. Dean Winchester – que para a doutora se chamava Josh Douglas, um agente federal – estreitou o olhar ao constatar a expressão de surpresa da jovem legista, Marie Abancourt. Demonstrava mais que surpresa, aliás. Estava tensa.

— Sabem se os outros corpos também possuíam esse símbolo? — perguntou.

— Vamos checar isso no nosso material. — Sam pigarreou, mentiu a primeira coisa que lhe veio à cabeça.

De verdade não sabia se as outras vítimas tinham o símbolo, mas sabia que as figuras eram enoquiano. Isso confirmava suas suspeitas. Algumas pessoas que testemunharam um outro caso de longe relataram ter visto a vítima levitar. E isso faria sentido no caso de anjos. Eles ainda possuem poderes, embora bem limitados.

— Você reconhece o sinal? — a pergunta de Dean pegou os dois se surpresa.

Sam encarou imediatamente o mais velho, mas Dean continuava com o olhar fixo na legista. Marie tratou de manter o controle enquanto encarava Dean.

— Não. Claro que não. — tentou responder com naturalidade. — Por que?

— Me pareceu bastante surpresa ao vê-lo.

— Não é sempre que se vê uma coisa assim, agente. — ela disse. — E eu espero que não me levem a mal, mas eu vou ter que pedir para que voltem amanhã no fim da tarde. Eu não posso liberar o corpo para a análise dos federais sem ter o laudo pronto. — foi dizendo rapidamente, Dean estreitou o olhar. — Pensei que já soubessem disso.

— Claro. — Sam assentiu. — Nós só queríamos ter a certeza que a vítima pode ser parte do nosso caso.

— E é?

— Totalmente um dos nossos. — o tom da voz de Dean foi quase sarcástico.

Ele tinha absoluta certeza que algo estava errado ali.

— Agentes, se puderem me fazer um favor peçam para a minha secretaria vir aqui. — pediu Marie.

Sam assentiu.

Ela observou os dois saírem, fecharem a porta e arfou quando finalmente ficou sozinha. Sentiu suas mãos suarem enquanto observava o corpo na mesa. E não era para menos. A confusão na qual ela se encontrava era infinita. Não fazia sentido. Claro que não eram de fato anjos. Não poderiam ser. Era loucura. Mas como Annie poderia saber de algo assim?

— Doutora Abancourt? — a secretaria perguntou ao abrir a porta, acordando-a de seus pensamentos.

— Rose. — suspirou.

Rose Salinas era a secretaria de Marie. Eram da mesma altura, mas Rose tinha a pele bronzeada e os cabelos bem mais escuros. Era mais jovem também.

— Mandou me chamar?

— Eu preciso de tudo que puder achar sobre as mortes envolvendo esse caso, essas mortes de religiosos nas últimas semanas. — pediu. — Tudo. Teorias, as mais lógicas e as mais malucas. Testemunhas. Comentários. Laudos. Tudo que puder conseguir para já.

— Está bem. — assentiu a garota, estranhou um pouco o estado de Marie.



[...]






Dean dirigia o Impala inquieto. Ele estava com a tal pulga atrás da orelha nesse momento. Poderiam chamá-lo de louco se quisessem, mas Dean Winchester e o seu instinto não falhavam. Aquela doutora-legista-especialista, seja lá o que for, ela não o enganava. Escondia algo. Só não conseguia saber onde ela podia se encaixar na história.





— Eu nunca vi aquele símbolo antes. — comentou o mais novo no banco ao seu lado com os olhos presos na tela do computador. — Quer dizer, o lemniscata é conhecido desde a antiguidade como símbolo da morte e do nascimento. Mas o que isso se relaciona aos anjos?


— Droga Sammy, temos coisas mais importantes para investigar.

Sam encarou o irmão incrédulo.

— E o que seria?

— O que aquela doutora lá está escondendo. — disse o mais velho convicto, o mais novo revirou os olhos. — Tem algo estranho, Sam. A reação dela.

— Você está cismado.

— Não, eu não estou cismado. — bufou. — E quando chegarmos ao hotel, você vai ver que eu tenho razão. Vou revirar a rede de cabeça para baixo se precisar, mas que eu acho... Ah eu acho!

— Eu não estou acreditando no que estou ouvindo, Dean. Isso é cisma. — disse Sam. — Mas faça isso, enquanto você faz sua preciosa pesquisa eu vou tentar achar um significado para o símbolo e saber com o Garth detalhes dos outros casos.

— Era enoquiano?! — perguntou Dean. — Dentro do oito deitado.

— É lemniscata. — corrigiu. — E que surpresa você prestar atenção em alguma coisa que não seja a legista.

— Ok, engraçadinho. E o que dizia?

— Eu não falo enoquiano. — respondeu em tom óbvio.

— Talvez o Castiel possa nos ajudar.

— Talvez. — Sam deu de ombros. — E eu acho que devemos ir a Eugene, ver se descobrimos mais a respeito do pastor.

— Não antes de vasculharmos o lixo da tal Abancourt.

Sam respirou fundo. Dean era impressionantemente cabeça dura.


[...]




O relógio despertou às 10:00 da manhã. Annie abriu os olhos para vislumbrar o teto. Passou o olhar ao seu redor, mal podia acreditar que já não estava mais naquela clínica. Não que tivesse sido uma experiência traumática. Bem longe disso. Mas era bom não estar mais lá. O ar parecia estar mais leve agora. Annie demorou um pouco a se levantar – sabia que Marie não estava em casa e que não tinha nada para fazer – enquanto prestava atenção nos detalhes do quarto, as paredes em azul fraco pareciam ter sido pintadas a pouco tempo. Tinha um armário de duas portas no canto e algumas caixas sobre ele. A janela e a porta pintadas de branco. Ela se ergueu na cama, sentando-se. Encarou o carpete no chão, novo, branco como o algodão. Mas a cama em que estava não era nova. E por algum motivo ficou curiosa, algo lhe deixava curiosa naquela situação.




Ela só não sabia o quê.


Se levantou, pegando algumas roupas da mala ainda não desfeita. Ainda tinha que ver com Marie se podia usar o armário ou se ele estava ocupado. Ou talvez depois checaria isso. Mas agora ela queria tomar um banho. Só isso. Mas nem tinha chegado a porta do banheiro quando alguém bateu à porta. Ao abrir deu de cara com uma senhora bem fina, ossos grandes e nariz avantajado. Usava óculos e vestia um vestido de bolinhas, com um avental amarelo.

— Pois não?

— Queria saber se está tudo bem por aqui. — respondeu encarando-a por cima dos óculos.

Estranhando, Annie olhou para dentro do apartamento e voltou a encará-la.

— Eu acho que sim. — disse. — Por que?

— Sua irmã me pediu para verificar.

— E como sabia que eu estava acordada? — Annie franziu a testa.

— Ouvi seus passos. — respondeu a mulher em tom natural.

— A senhora tem super audição ou coisa assim? — tentou não soar irônica.

— Não, os quartos de vocês são pegados a minha sala.

— E a senhora ficou com o ouvido grudado na parede?

— O que está insinuando? — ela estreitou a testa encarando Annie.

— Oh, nada. Nada. — sorriu exageradamente. — A senhora pode ver que tudo está perfeitamente bem.

— Ok. — a vizinha disse azeda, encarando Annie com a cara fechada. — Caso você precise de algo, é só bater na porta.

— Claro. — assentiu, fechando a porta finalmente. — Fofoqueira. — disse em voz baixa botando a língua para fora.

Não que tivesse algo errado em querer ajudar. Até era bom. Era seu o primeiro dia naquele apartamento, naquele condomínio. Mas ficar atenta até aos passos já era demais. Ela podia apostar que a tal vizinha ouvia a conversa dos outros para ter assunto com as amigas. Fazia o tipo. Ou ela que era desconfiada.

Depois de um banho rápido e Annie vestiu um conjunto de moletom azul, fino e bastante confortável. Ligou a TV para ver o noticiário. Fez café, comeu alguns biscoitos. Por um momento se sentiu uma pessoa qualquer, normal. Como se nada tivesse acontecido. E não eram os sonhos que lhe perturbavam. Eram as antigas despedidas.

Logo acima da TV, em uma das prateleiras, uma foto lhe chamou a atenção. Ela nem lembrava de já ter visto a fotografia. Nela, quatro pessoas. Um homem de barba densa, escura, e cabelos encaracolados e também escuros. Olhos da cor do mel. Um sorriso alegre. Segurava um bebê – de talvez uns sete ou oito meses de idade – que usava uma roupinha rosa claro. Ao seu lado uma bela mulher de olhos azuis. Ela era linda. E pendurada no seu pescoço, uma garotinha de pouco mais de três anos, de dentes ralos, sorridente. Ao fundo o que parecia ser uma praça, cheia de arvores e flores. Ao ver aquela foto sentiu um aperto no coração. Era sua família e ela simplesmente foi desaparecendo aos poucos.


Miranda suspirou ao ver Adam atolado no meio daqueles papeis. Aquele período de fim de semestre era o mais cansativo para ele, um monte de provas e exames para corrigir e isso com certeza levaria a madrugada inteira. Ela se despediu de Adam e subiu as escadas para colocar as filhas na cama. A primeira porta era a do quarto de Marie, logo à esquerda no corredor. A mais velha já estava com 9 anos, era tranquila e estudiosa. Quando Miranda entrou no quarto rosa claro, a filha já estava com o pijama e ia em direção a cama.



— Já escovou os dentes, querida? — perguntou entrando no quarto.


— Escovei sim, mãe. — assentiu a garotinha se aconchegando nas cobertas.

Miranda sentou-se na beira da cama, inclinando-se sobre a filha.

— E acabou o dever?

— Não era muito, só algumas continhas. — comentou Miranda. — Eu já fiz.

— Então está pronta para os bons sonhos que o papai do céu escolheu para você hoje. — disse Miranda sorrindo, o que fez Marie sorrir também, ela cobriu a filha e depositou um beijo em sua testa. — Dorme com os anjos.

— Boa noite mãe.

— Boa noite meu amorzinho.

Marie fechou os olhos e Miranda se levantou, desligando a luz do quarto de modo que o quarto só fosse iluminado pela luz fraca do abajur. Semifechou a porta e estava de volta ao corredor. Mais alguns passos e entrou no quarto da pequena Annie, de 6 anos. Esse não tinha paredes rosas e sim brancas, com ursinhos desenhados e espalhados por todos os lados. A cama estava desarrumada, mas sem Annie. A testa de Miranda se enrugou ao ver a filha sair do banheiro com o cabelo cheio de nós e várias fitas mimosas enroladas nos fios.

— O que aconteceu com o seu cabelo?

— Eu queria fazê colinha que nem a menina no comercial da tevêlisão. — disse chorosa.

Miranda sabia do que a filha falava. Havia um comercial de sabonete onde uma garotinha aparecia na hora de dormir com o cabelo cheio de fitinhas azuis. O tal comercial passava toda a hora na televisão.

— Seu cabelo parece um ninho de passarinho, Annie. — Miranda reprimiu uma risada. — Onde está a escova?

A pequena encarou a mãe e correu até o banheiro, trazendo de lá uma escova de cabelo. Mas antes de entregar para a mãe, teve que perguntar:

— Será que se eu deixâ assim os passarinhos botam ovinho na minha cabeça?

Miranda teve que rir com a pergunta inocente da filha. Demorou um pouco para poder desfazer os nós – Annie uma vez ou outra reclamava, embora Miranda a penteasse o mais delicadamente possível – e enquanto isso, Annie contava mais detalhes do seu dia para a mãe. Adam a havia levado por alguns minutos em um parquinho onde estava acontecendo uma festa de cinco anos do filho da diretora da escola onde Adam dava aulas. Marie não pode ir, estava na escola. E também não ficaram muito tempo na festa devido a quantidade de trabalho acumulado que Adam tinha, mas os poucos segundos bastaram para que Annie voltasse com mil histórias para contar.

— Sabe o Ed? O filho da tia Nina? — se referiu ao aniversariante, Edmund. — Ele falô que todo armário ta cheio de monstro!

— Não é verdade. — Miranda tratou de dizer em tom calmo, ainda penteando o cabelo da filha. — Você sabe que monstros não existem.

— Eu não tenho medo.

— Não? — Miranda franziu a testa.

— Não! — Annie balançou a cabeça exageradamente. — Eu sou valente!

Miranda sorriu, abraçando a filha. Annie era sua pequena aventureira, sempre tinha uma solução para tudo. Era do tipo raro de menina que brincava em ser guerreira ou super heroína, não princesa.

— Então, minha pequenininha, é hora de ir para cama. — disse com a voz cheia de ternura enquanto acomodava a filha na cama, tapando-a com o edredom.

— Eu já sou grande, mãe. — protestou, a vozinha de Annie começava a ficar sonolenta.

— É claro que é. — Miranda levou a mão no interruptor da parede e desligou a luz, se inclinou sobre a filha e beijou sua testa. — Que os anjos velem seu sono.

Annie suspirou e o corpinho foi pesando na cama.

Miranda sorriu, não poderia pedir mais nada. Tinha ali, sua família, tudo o que lhe fazia feliz.


Annie despertou-se de seus pensamentos relacionados a tal fotografia. Se deu conta que nunca havia se perguntado sobre o paradeiro dos pais depois de ter crescido. As buscas na época não tinham dado resultado. Era como se tivessem sumido da face da Terra. E por todas as coisas que já sabia sobre os monstros que se escondiam na escuridão, no “fim do beco”, poderiam seus pais serem vítimas desses seres?



A morena balançou a cabeça se levantando. Desligou a televisão, não era uma boa distração, definitivamente. Começava a sentir tédio. Pelo menos na clínica tocava piano ou pintava. Queria desenhar. Gostava de desenhar. Infelizmente na gaveta da estante tinha apenas papel e caneta preta, mas talvez encontrasse caneta colorida em alguma parte da casa. Procurou pela sala, mas decidiu não entrar no quarto da irmã. Não achou nada, por isso decidiu ficar com o que já tinha. Voltou ao quarto onde havia dormido e sentou-se na cama, rabiscando coisas sem formas, só deixando a mente fluir. Ou tentando. Na verdade ela não estava totalmente concentrada.


Levantou o olhar ao armário e uma ponta de curiosidade surgiu. O que naquele armário lhe chamava tanto a atenção? Respirou fundo e ergueu-se, indo até o armário lentamente e abrindo-o. Se surpreendeu ao encontrar nada mais que uma capa-de-chuva amarela, alguns antigos livros da faculdade e uma caixa – quadrada e achatada como as que vem com chapéus – que embora hesitante, Annie tirou do armário e abriu.

Fotos. As duas pequenas na paroquia junto ao tio Jack e a uma senhora que ás vezes ia cozinhar para os mais necessitados, cujo nome Annie esforçou-se para lembrar sem sucesso. Uma foto de Marie na escola, uma foto daquelas que eles tiram como lembrança escolar e depois enviam em um cartão decorado. Annie tinha uma dessas, se lembra ter dado ao tio antes da segunda internação. Uma outra foto de Marie adolescente, com as amigas da faculdade. Duas delas, cujos nomes escritos atrás da foto eram “Britney Olsen” e “Kath Otto”. Outras fotos de Marie na faculdade, na formatura, viagens, até que encontrou algumas que estranhamente estavam cortadas. Marie havia cortado uma pessoa nas fotos, seja lá quem for. E em meio as fotos, um envelope apareceu. Era um envelope de um laboratório. “Marie Sangerman Abancourt” dizia do lado de fora. Annie abriu com medo de qualquer coisa. Marie podia ter uma doença. Ou talvez não passasse de um exame de rotina. A essa altura Annie já desconfiava de tudo.

Franziu a testa.

Nada. Não havia nada no envelope. Quer dizer, quase nada. Tudo que ela achou foi um minúsculo papelzinho comprido com uma palavra escrita a máquina:

Positive.

Annie sobressaltou de repente com o som do telefone tocando na sala.


[...]




Havia gastado horas lendo todos os artigos. Alguns deles ridículos. Ficou meio espantada com a rapidez de Rose para juntar todo aquele material. Mas no fim das contas, alguma coisa em tudo aquilo começou a perturbar Marie. Desde a terceira semana de maio vários assassinatos começaram a ocorrer. Todos com religiosos em partes diferentes do país. Os corpos em estados chocantes. Sem suspeitos. Sem ligações – além do fato de serem religiosos, claro. Saiu do IML depois do horário do almoço, atolada em pesquisas, tentando entender como Annie podia saber. Por fim, decidiu ligar.




— Annie, tudo bem por ai? — perguntou quando a irmã atendeu.


— Tudo sim. — respondeu. — E você?

— Aqui trabalhando. — mentiu. — E queria perguntar uma coisa.

— Fala.

— Onde viu aquele símbolo que desenhou?

Annie demorou, depois sua voz soou desconfiada.

— Em um sonho.

— Claro. — Marie engoliu a seco. — Mas que tipo de sonho?

— Eu vi anjos. — explicou. — Em mais de uma vez, na verdade. E nos sonhos os vejo atacar essas pessoas. Eles procuram alguma coisa e quando se dão conta que não encontraram, matam.

— Mais de uma vez? Mais de um sonho com as mortes e com esses símbolos?

— Sim. — continuou Annie sem entender o motivo do interesse. — Em vários locais. Igrejas, casas, ruas, estradas.

— E em algum sonho viu em que cidade ou estado aconteceu?

— Não. Marie, o que aconteceu?

Marie encarou a rua à sua frente onde tinha estacionado o carro. Bem perto de onde estava crianças brincavam alegremente. Ela tentou relaxar.

— Não. — mentiu mais uma vez. — Só curiosidade. E Annie, eu vou chegar mais tarde hoje.

— Onde vai?

— Visitar um amigo.

Dizendo isso, finalizou a ligação. Marie olhou para o lado, em direção a calçada onde tinha parado o carro próximo. Uma construção não muito preservada se erguia. Era simples, nada parecida com as outras igrejas cheias de vidraças. A garota respirou fundo antes de descer do compacto carro em direção a porta. Tinha dez anos quando fez aquele caminho pela primeira vez – ela lembrava bem - segurando sua irmãzinha da mão, assustada, se sentindo sozinha, com a saudade dos pais martelando. Era péssimo voltar ali. Mas seu tio Jack – o padre Jack – era a única pessoa que poderia ouvi-la sem pensar que ela estava louca.

Adentrou o salão da igreja. Igrejas sempre eram assustadoras, pelo menos na sua opinião. Caminhou observando os quadros espalhados pelas paredes. Ela conhecia a todos. A Última Ceia, a cena da ressurreição de cristo, alguns outros quadros com pinturas bíblicas, além do tradicional quadro onde o arcanjo São Miguel derrota a serpente. Era o único dos quadros com o tema angelical. E foi diante dele que Marie parou, observando-o e se perguntando se tinha certeza do que ia fazer ali.

— Sempre achei que você fosse protegida de São Miguel. — a voz surgiu logo às suas costas fazendo Marie girar nos calcanhares.

— Tio.

O homem à sua frente estava mais velho do que da última vez que Marie o viu – o que deveria fazer quase dois anos. Jack Abancourt já beirava aos oitenta e sua aparência refletia um homem frágil, de cabelos grisalhos, magro e esguio, olhos castanhos – um tom semelhante ao de terra molhada. Ele sorriu.

— Marie, que surpresa a sua visita. — disse ele. — Mas ela me deixa contente.

— Eu sei que faz muito tempo... — ela respirou fundo. — Muito trabalho, sabe como é.

— Eu sei. — assentiu. — Quer tomar alguma coisa?

— Não, eu não vou demorar. Podemos sentar aqui mesmo?!

— Claro!

Os dois sentaram-se em um dos bancos da igreja.

— E como vai a vida, tio?

— Bem. — respondeu ele com um fraco sorriso. — Você sabe... Ajudando...

— Acho que deveria descansar um pouco. — comentou ela percebendo a sua fragilidade.

— As pessoas precisam de alguém que se importe com elas. — disse ele. — E você, Marie? E sua irmã?

— Ela... — Marie pigarreou. — É sobre isso que eu queria falar.

— O que foi?

E Marie contou.

Contou sobre os sonhos, o símbolo e as mortes.

— Sua irmã tem um dom. — disse Jack assim que Marie terminou.

— Ela não é uma aberração, tio! — replicou incrédula. — Você fala como se isso fosse bom! Ela vê mortes que acontecem! Isso não é um filme, não ficção, a minha irmã... — se deteve, não sabia como continuar.

Era inacreditável. Marie relutava em cogitar que Annie realmente tivesse um sentido paranormal ou qualquer coisa assim.

— Se acalme, Marie. — pediu Jack com firmeza. — Sua irmã não é um monstro, essa é uma imagem que você mesmo faz quando hesita tanto em acreditar.

— Está errado. — cortou ríspida.

— Sua irmã sempre foi especial. — Jack ignorou o tom rude da sobrinha. — E eu sempre soube. Annie tem um dom. E você precisa entender isso.

— E tem algum manual na sua bíblia que me ajude com isso?

— Está beirando a blasfêmia.

— Estou é desesperada. — acrescentou. — Confusa. Eu preciso de uma razão, uma resposta lógica para tudo isso.

— Eu não sei se vai achar uma resposta lógica, mas eu posso te indicar alguém, um velho amigo que lida com esses assuntos. — disse o padre. — Nós fizemos um trabalho juntos uma vez. E ele é meio... Da Família...

— Família? — Marie estranhou.

— Não sei se seu pai algum dia mencionou um tio nosso, Eric. — Jack pausou e Marie balançou a cabeça negativamente, então Jack prosseguiu. — Eric Foster, irmão da nossa mãe. Ele era padrasto desse meu amigo. Se quiser, acho que é a pessoa mais indicada para ajudar.

Marie titubeou, mas assentiu.


[...]




No velho quarto de um motel barato os dois irmãos passavam a tarde em meio a pesquisa. Dean estava escorado na sua cama – uma das duas de solteiro que existiam no quarto – e sobre uma almofada, o seu laptop. Sam sentado à mesa com o laptop aberto. Os dois procuravam coisas distintas. O mais novo estava concentrado em pesquisas sobre as mortes e os símbolos, já o mais velho tinha mais curiosidade sobre a vida da legista esquisitona.




— Garth acabou de me mandar o e-mail com os relatórios dos outros casos que eu pedi. — Sam comentou. — Parece que o símbolo se repete. Todos feitos por ferro quente.


— E a parte em enoquiano?

— É a união de duas letras diferentes dos dois lados do lemniscata. — disse ao mais velho. — Mas ainda não encontrei o significado.

— E eu descobri algumas coisas sobre a tal especialista. — disse Dean.

Sam revirou os olhos.

— E ai? Ela é uma legista fantasma ou o quê?!

— Quase que vira. — respondeu o mais velho com os olhos grudados na tela do computador. — Há onze meses sofreu acidente grave. Não estava sozinha no carro. Estava com um homem, Charles Lancaster. Os dois foram internados em estado grave. Além disso descobri que ela nasceu em Portland e é de áries.

— O que? — Sam balançou a cabeça como se espantasse moscas imaginarias, confuso. — É só isso? Você ficou grilado atoa, eu disse!

— Cara, eu estou dizendo... — Dean colocou o laptop de lado e se levantou. — Tem algo nos olhos dela. Ela ficou espantada, mas não de um jeito profissional, de um jeito pessoal.

— Dean Winchester sensibilizado ao olhar nos olhos de uma garota? — a voz de Sam era de deboche. — Que tocante!

— Cala a boca! — resmungou Dean. — E eu não estou sensibilizado, eu estou é desconfiado.

— Claro.

Um telefone tocou chamando a atenção deles. O som era abafado, o que o fazia parecer distante. Um antigo toque polifônico. Tocou duas vezes e parou.

Sam e Dean se entreolharam.

— Não é o meu. — Sam avisou.

— Nem o meu. — disse o mais velho. — É o do papai.

— Do papai? — Sam repetiu um pouco pasmo.

— Depois que eu voltei do Purgatório carreguei todos os antigos celulares que eram dele. — respondeu Dean indo até uma mochila de onde tirou algumas de suas camisas e enfim, o celular. — Nunca se sabe. Da última vez que ele tocou ganhamos um irmão.

Sam franziu a testa quando a imagem do meio irmão Adam lhe veio à mente e também por isso se mexeu desconfortavel ao lembrar onde ele estava.

— Número desconhecido. — Dean comentou.

Mas imediatamente o telefone voltou a tocar. Dean novamente encarou Sam e atendeu, botando no viva voz.

— Alô. — disse a voz feminina do outro lado da linha. — É o John Winchester?

— Porque? — perguntou cuidadoso. — Quem quer saber?

— Um parente distante. — ela disse e Sam e Dean se encararam. — Acho que ele nem deve saber quem sou eu, mas eu preciso muito falar com ele.

— Parente? — Dean indagou. — Explica isso melhor...

— Não tenho tempo agora, eu só preciso falar com o John.

— Sinto muito, mas o John morreu há quase oito anos. — Dean disse. — Então se for realmente importante, é melhor explicar a situação.

— E como vou saber se você é confiável?

— Como eu vou saber se você é confiável? — Dean retrucou.

— Você também é caçador? — ela perguntou, sua voz soou hesitante.

— Você tem um caso, é isso?

— Pode se dizer que sim. — respondeu.

— Então é só dar o endereço e nós conversamos. — Dean fez sinal para que seu irmão anotasse.

— Simpson Street, 37, apartamento 12...

Sam anotou tudo correndo.

— Ok. Vamos até ai mais tarde.

Dean finalizou a ligação.

— E agora? — Sam indagou assimilando a novidade.

— Agora eu começo a achar que é melhor jogar esse celular fora. — resmungou Dean. — Cada vez que toca nosso clã familiar aumenta.

Sam riu. Dean tinha razão.


[...]




— Não me diz que chamou médicos aqui?! — Annie perguntou parada ao lado da porta do quarto de Marie.




A mais velha havia chegado em casa no final da tarde dizendo que um estranho viria conversar com Annie sobre o que estava acontecendo. Não só com Annie, com ela também. Mas sem dar maiores explicações, se trancou no quarto para mudar de roupa.


— Não! — respondeu lá de dentro. — É um caçador.

— E eu sou uma corça agora, é?

— Não esse tipo de caçador. — disse Marie. — Nem eu entendi o termo, esses paranormais que usam.

— E desde quando você acredita nisso?

— Depois eu explico o que aconteceu!

— Mas justo hoje? — bufou Annie. — Eu já tinha feito até pipoca para ver um filme!

— Filme?

A Era Do Gelo 4.

Alguém bateu na porta.

— Droga! — resmungou a mais nova cruzando a sala.

Ao abrir a porta se deparou com dois homens. O mais baixo sorriu automático quando a viu, o que a fez franzir a testa. Seu olhar cruzou com o do mais alto que também sorriu.

— Vocês devem ser os paranormais que a minha irmã chamou. — disse Annie abrindo a porta sem emoção. — Entrem.

— Espera... Paranormais? — o mais baixo parecia confuso.

Marie entrou na sala e encarou os dois sem entender. Eram os federais.


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