(POV Lily)

Chris lançou um olhar sem graça para Nico e eu entendi. Chris queria falar em particular.

– Já volto – disse para Nico, deixando um beijo em sua bochecha.

Eu me levantei e segui Chris. Ele começou a ir para bem longe de onde nosso acampamento estava montando.

– Onde você está indo? – Perguntei – Aqui não está longe o suficiente?

– Ah... Claro – ele respondeu.

Eu não tinha reparado, por não me molhar, mas onde estávamos não tinha nenhuma copa de árvore nos protegendo.

– Desculpa, assim vai pegar um resfriado. Vamos para um lugar mais protegido da chuva.

– Não, aqui está bom – ele falou se sentando num tronco de árvore.

Arquei uma sobrancelha. Ele era doido, só podia. Mas eu sabia que independente do que eu dissesse, ele iria continuar ali. Chris era teimoso demais.

Eu me sentei em frente a ele.

– Lily, tenho duas coisas que preciso falar para você. Uma importante, e outra nem tanto. Estava convencido que iria contar a importante primeiro, mas agora, vendo você aqui. Não tenho outra coisa para dizer.

Comecei a ficar nervosa. Não fazia ideia do que podia ser tão importante a ponto de ele ficar aqui, pegando chuva e ficando molhado até o osso.

– A verdade é, meu pai não gostava de mim, ele me odiava. Também odeio ele, não gostava de nada do lugar onde eu era obrigado a chamar de “casa”, odiava meu pai, ele me batia e bebia demais. Ele me treinou todos esses anos apenas por diversão. Antes de vir para o Acampamento, eu entrei em depressão, não tinha mais motivos para viver, entende? Não tinha nada nem ninguém que me prendesse aqui. Então eu fugi de casa. Atena me guiou até o Acampamento. E quando cheguei lá, queria apenas esquecer o meu passado. Então eu vi você examinando os livros de Harry Potter na estante do chalé de Atena, e eu vi em você o que eu nunca tinha visto em ninguém. Meu futuro. E foi simples assim, que você me prendeu nesse mundo. Eu quis me aproximar de você... mas tinha Nico. Não queria causar brigas. Então, quando você quis fugir sabia que não era o Acampamento que me deixou tão feliz. Era você. O Acampamento não seria o mesmo sem você, não podia deixar o único motivo para eu ainda viver ir embora. Lily, você é minha casa, meu futuro, minha vida. Eu te amo desde a primeira vez que te vi.

Eu estava chocada. Ele falou aquilo tudo muito rápido. Tudo foi muito rápido. Chris se aproximou de mim e me beijou. Eu estava tão impressionada, que, a princípio, correspondi o beijo. Mas logo vi o que eu estava fazendo e o empurrei para longe, me levantando logo em seguida.

– O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI? – Gritou Nico, com lágrimas nos olhos.

Corri até ele, tentando fazê-lo ter calma.

– Nico, não foi nada. Está tudo bem...

– TUDO BEM? Esse idiota te beija e está tudo bem? Você sempre soube que eu não gostava dele! Está vendo o motivo, agora?

Nico deu um grito de raiva e partiu para cima de Chris, ambos encharcados por causa da chuva. Antes que eles se machucassem, corri e fiquei entre eles.

– PAREM! Parem, por favor... apenas parem com isso – implorei.

Os dois baixaram seus olhares.

– Agora, quero suas armas – ordenei.

– O quê? – Perguntaram ao mesmo tempo.

– Vocês entenderam – insisti, esticando as duas mãos. Eles me deram as armas.

Nico deu meia volta e começou a andar de volta para o acampamento improvisado. Suspirei e sentei no chão. Precisava conversar com Chris, e isso seria muito difícil.

Porém, antes que qualquer um de nós dois pudesse falar algo, Nico para de andar e começa a correr em direção a Chris. Rapidamente me levanto e corro na direção deles, mas era tarde demais. Nico tinha dado um soco no nariz de Chris, que começou a sangrar muito.

– DESGRAÇADO! – Gritou Nico.

Chris reagiu e empurrou Nico, mas o filho de Hades logo se levantou e a briga começou de novo. Nem dava tempo de eu separá-los. Não conseguia tirá-los a força, e se eu me metesse no meio iria me machucar muito, além de eles se baterem tão rápido, que era impossível de acompanhar.

– Nico, para! – Gritei no mesmo momento que ele deu um soco no estômago de Chris – Para, por favor!

Chris deu um soco no rosto de Nico, mas eles continuaram a brigar. Não tinha escapatória. Fechei os olhos, e corri para o meio da briga. A única coisa que eu senti foi um soco na minha barriga.

Caí para trás e gemi de dor. Eles se ajoelharam, foi Nico quem me deu o soco.

– Ah meus deuses, Lily, me perdoa. Eu nunca quis... você está bem? – Ele perguntou desesperado.

– Está tudo bem, Nico. Apenas parem de brigar.

Eu me sentei no chão e olhei para os dois. Ambos estavam feridos, mas Chris estava ainda mais. Seu nariz ainda não parava de sangrar e era possível ver que ele estava bastante machucado.

– Chris, por que fez isso? Quero dizer, por que me beijou? – Perguntei, levantando-me, Nico e Chris seguiram meu exemplo. – Sabe que eu amo o Nico!

Ele fechou os olhos e abaixou a cabeça.

– Eu sei, Lily. Mas eu precisava fazer isso, você não entende? Parece que não escutou nada que eu falei! – Ele se aproximou de mim, automaticamente Nico ficou na minha frente. Chris soltou uma risada pelo nariz. – Acho que eu vou estuprá-la, di Angelo? – Perguntou, sarcástico – Não, não sou como você. Se Lily fosse minha, eu a trataria como se ela fosse única (porque ela é), nunca dormiria com ela tão cedo como você. Falaria que era melhor esperar, até porque nosso amor não iria acabar, então teríamos tempo. Sabia, di Angelo, que você nunca vai merecer a Lily?

Eu não sabia o que fazer, queria bater nele por falar mal de Nico, mas também queria cavar um buraco e me esconder, de tanta a vergonha. Porém, outro lado meu queria correr até Chris e abraçá-lo.

Mas eu não fiz nada, fiquei parada ali. Olhando uma lágrima cair pelo seu rosto e ele se virando para ir embora. Não o impedi, não o chamei. Não fiz nada, foi tudo muito rápido. Precisava processar aquilo tudo na minha mente.

Chris estava quase sumindo entre as árvores quando ele para, se vira para mim e, ignorando Nico, diz:

– Lily, só quero que você saiba que eu vou te amar para sempre. Para o resto da minha vida.

Então ele voltou a adentrar a floresta e sumiu.

Nico viu que eu precisava de um tempo sozinha, então ele me deu um beijo na testa, pegou sua arma de volta e voltou para o nosso acampamento.

Eu estava tão triste por dentro que meu poder foi embora. Minha roupa começou a ficar molhada e meu cabelo a grudar na nuca. Desabei no chão, abraçando minhas pernas e colocando a cabeça entre os joelhos.

Aquilo não podia estar acontecendo. Era coisa demais para mim. Percy, Travis e Connor sequestrados, Lena grávida e agora o Chris...

Levantei a cabeça e respirei fundo. Não podia chorar.

– Pai, se você estiver aí, em algum lugar, por favor, me ajude. Não posso fazer isso sozinha. Eu preciso de Percy, de Connor e de Travis. Preciso que tudo volte a ser como era antes.

Voltei a apoiar a cabeça nos meus joelhos. Deixei que algumas lágrimas caíssem pelo meu rosto. Então, minutos depois, alguém levanta a minha cabeça delicadamente.

Estou preparada para sorrir e fingir que está tudo bem, embora obviamente nada esteja bem, quando vejo Poseidon.

– Pai! – Exclamo, me levantando e limpando rapidamente as lágrimas do meu rosto.

– Não precisa ter vergonha por ter chorado, filha. Sua situação está muito complicada – Poseidon falou.

Se eu estivesse em outro lugar, em outra situação, minha reação seria completamente diferente. Mas não agora, estava confusa demais para manter o orgulho.

Abracei-o forte e ele logo retribuiu o abraço. Fiquei assim um tempo. Primeiro, lutei contra as lágrimas, mas deixei que elas caíssem mais tarde.

Depois de um tempo, Poseidon parte o abraço.

– Você tem que ser forte, Lily – aconselhou Poseidon.

– Eu sou forte – respondi, entre os dentes.

– Eu sei. Mas ainda tem muito mais coisa pela frente. Você não pode esquecer que seus amigos contam com você.

– Não é o que parece! Annabeth sempre é tão certinha, e sempre têm aqueles seus planos perfeitos.

– Minha filha, de que adiante fazer planos e planos se você não agir? Faço o que seu coração mandar, tudo bem?

– Claro, pai.

– Antes de ir – falou ele – o que foi aquilo com o filho de Hades? Filha, você sabe que eu não aprovo isso! Devia ter sido mais responsável.

– Eu fiz o que meu coração mandou, pai – respondi com um sorriso triunfante no rosto.

– Tudo bem, tudo bem... Agora eu tenho que ir. Coragem, filha.

Então ele começou a assumir sua forma divina e eu fechei meus olhos.

Quando ele já tinha ido embora, eu abri de novo meus olhos e sorri. O encontro com meu pai foi revigorante, agora eu não me sentia tão péssima assim. Estava disposta a voltar para nosso acampamento improvisado e conversar sobre tudo com Chris.

Sorri e comecei a caminhar de volta para o acampamento. Já estava quase chegando lá quando eu escuto um grito. Foi um dos sons mais horríveis que eu escutei na minha vida e imediatamente eu soube de quem era.

Comecei a correr para o local de onde veio o grito. Corri e não liguei para os galhos que arranhavam meu rosto, minha única preocupação era de chegar a tempo.

Outro grito, desta vez o som veio de um lugar mais perto do que na última vez. Minha velocidade aumenta e eu chego a tempo de ver o Manticore atirando um espinho na direção de Chris.

– CHRIS! – Eu gritei.

Mas não dava para ele desviar. Sua perna estava toda ensanguentada, e ele estava mancado. O espinho atingiu seu peito e eu gritei.

Corri na direção dele e me ajoelhei ao seu lado.

– Toma – dei ambrosia para ele e parti em direção ao monstro.

A raiva estava tomando conta de mim. Apesar de tudo, eu amava Chris, como um amigo. É claro, brigávamos às vezes, mas ele era como um irmão para mim. E que irmão não briga com o outro?

Pulei num tronco caído e o usei para subir no manticore. Cortei sua cabeça sem dificuldade e o monstro evaporou no ar.

Imediatamente eu corri para ver como Chris estava. Eu me ajoelhei ao seu lado e perguntei:

– O que aconteceu?

– Eu estava com raiva e triste, estava andando pela floresta sem cuidado e o monstro apareceu. No começo, consegui desviar, só que numa investida contra mim, ele atingiu minha perna e fez um corte feio – ele fez uma careta de dor, e depois continuou o relato – e aí eu comecei a mancar. Já estava muito ferido quando você apareceu.

Enquanto ele me contava, eu ia cuidando dos ferimentos dele, mas a ambrosia não estava adiantando. Nenhum ferimento estava melhorando. Por dentro, estava desesperada, mas queria que ele ficasse calmo, então fingi que estava tudo certo.

– E por que você não lutou? – Perguntei, tentando lavar o ferimento imenso na perna.

– Estava sem arma. Você confiscou a minha espada.

Então eu parei o que estava fazendo. Minhas mãos, que estavam indo cuidar da perna de Chris, ficaram paradas no ar, quase tremendo. Era minha culpa. Tudo era minha culpa. Era duas vezes minha culpa.

Chris começou a gemer de dor e tremer.

– Calma, vai ficar tudo bem, ok? – Perguntei, tentando tranquilizá-lo. – Vou cuidar de você.

Minhas mãos começaram a rasgar sua calça e pegar mais ambrosia e néctar. Precisava salvá-lo. Chris segurou minhas duas mãos, e olhei para ele, perguntando, com o olhar, o que ele estava fazendo.

– Lily... Pare. Sabe que não tem como me salvar.

– Não, Chris, eu não... não posso ficar aqui, sem fazer nada e te deixar morrer – falei, desesperada. Lágrimas começaram a surgir nos meus olhos e eu respirei fundo para contê-las.

– Você não vai ficar sem fazer nada. Apenas venha aqui, deite aqui comigo – ele, que estava deitado no gramado vermelho por causa do sangue, estendeu o braço e eu me deitei ao seu lado, apoiando a cabeça no braço que ele me ofereceu.

Por um momento, ficamos calados, mas ele respirou fundo e começou a falar:

– Lily, esses são meus últimos segundos de vida e não tinha pessoa melhor para eu passá-los do que você. Obrigada por tudo, eu te amo.

Levantei um pouco do chão para olhar para ele e falar que, em tão pouco tempo, ele tinha se tornado um irmão muito importante para mim e que eu queria ter tido mais tempo, porém apenas vejo seus olhos se encontrando nos meus, então os olhos azuis-acinzentados dele, tão diferente de seus meios-irmãos, olhos que eu tanto amava, se fecham para sempre.