Além das lembranças. escrita por Amanda Rodrigues


Capítulo 3
Capítulo III - Fique por você.




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Segui Jaken até ficar diante uma porta de correr. Eu estava feliz pelo meu amigo. Ele possuía uma posição respeitável naquele palácio, o que era completamente justo, pois Jaken era o servo mais fiel de senhor Sesshoumaru.

O meu quarto naquela imponente fortaleza ficava de frente para o jardim. Observei que havia alguns servos meio-youkais trabalhando nele.

— Jaken... — disse olhando em direção aos servos.

— Sim?

— Eu posso ajudar também na limpeza do palácio, afinal quase não vou ter trabalho por aqui como exterminadora. Não quero que o senhor Sesshoumaru pense que vim para cá só ter uma vida boa. Quero ser útil de alguma forma.

— Rin, ma-mas o que o mestre irá dizer? Você limpando o palácio como uma serva comum... — balbuciou Jaken desesperado.

— Mas que mal há nisso? — cruzei os braços contra o peito. — Não existem nem mesmo youkais para serem exterminados!

— Então, precisa falar com Aika, a youkai chefe da limpeza. É ela quem administra os servos responsáveis por limpar o palácio — informou Jaken inseguro.

— Onde eu a encontro?

— No jardim. Ela deve está auxiliando um grupo de limpeza naquela área. As folhas nessa época do ano são um horror! — disse Jaken.

Mordi o lábio, pensativa. Eu não conhecia o palácio por completo e o lugar era gigantesco. Na minha busca por Aika era provável que eu me perdesse nele.

Mas, não importava. Eu tinha que procurá-la. Senhor Sesshoumaru havia me aceitado ali como uma serva e era meu dever ajudar os outros nas tarefas diárias.

Sorri determinada e dei as costas dizendo:

— Muito bem, eu vou procurar Aika.

— Espere! Espere! Riiiiiin... — gritou Jaken.

Não dei ouvidos a ele. Se eu seguisse as recomendações de Jaken eu viraria uma boneca de porcelana e acabaria entediada.

Andei apressada pelo corredor ao lado do jardim e, enquanto o fazia, lembrei-me de que a localização do quarto de um indivíduo dentro de um palácio significava muita coisa. O meu, por exemplo, ficava numa posição um tanto que privilegiada, já que ficava próximo do jardim e do quarto do senhor Sesshoumaru.

Desci uma pequena escada que dava acesso ao jardim real e andei errante pelo local esverdeado, cheio de flores e vida. Por um instante, ocorreu-me o pensamento de que não seria má ideia me perder em meio a tanta beleza.

À medida que caminhava, observei os pássaros empoleirados nas faias, a grama verde vívida e, ao longe, uma raposa que corria pela mata.

Indaguei-me se os animais seriam capazes de atravessar a barreira que envolvia o palácio e logo cheguei à conclusão que sim. Os únicos que eram impedidos eram humanos e youkais.

Conforme fui adentrando no jardim, deparei-me com meio-youkais e youkais dotados de pouco poder varrendo as folhas caídas das árvores. Eles estavam tão concentrados na tarefa que sequer prestaram atenção em mim.

O que levava aquelas criaturas a se submeter à servidão? Perguntei-me enquanto os observava trabalhar.

A resposta não demorou a vir. Certamente, eles queriam viver em paz sob a proteção de um youkai mais poderoso. Nas terras de senhor Sesshoumaru, eles não teriam que lidar com ataques de seres humanos e nem de outros youkais. Porém, em troca teriam que trabalhar para o senhor daquela terra e zelar por ela.

Procurei pela youkai que estava no comando daquele grupo. No entanto, tudo o que eu vi foram servos aleatórios no imenso jardim. Continuei andando e avistei um pequeno lago. A única forma de atravessá-lo era por meio de uma ponte. Curiosa, eu aproximei-me da estrutura de madeira.

E antes que eu pusesse meus pés nela, uma voz autoritária me conteve:

— O que está fazendo?! Não ouse encostar nesta ponte, humana!

Girei o corpo para encarar quem havia dito isso. Tratava-se de uma youkai de cabelos negros compridos. Ela usava um kimono estampado e mantinha as mãos pousadas na cintura. Ela era muito bonita.

— E por que não? — questionei sem compreender.

— Argh! Era só o que me faltava! — murmurou a youkai meneando a cabeça com desaprovação. — É muito simples: só o senhor Sesshoumaru pode fazer isso. Somente ele pode atravessá-la, com exceção dos servos encarregados de limpá-la. É um lugar especial e exclusivamente do senhor deste palácio. Nada daqui deve ser tocado por uma humana como você.

"Mas, que bobagem", pensei enquanto me afastava da maldita ponte.

— Estou procurando Aika. Você por acaso a viu? — indaguei.

A arrogante youkai fechou os olhos e soltou uma risadinha desaprovadora.

— Eu sou Aika, humana. Jaken me disse quais são as suas pretensões. Quer se juntar aos outros youkais responsáveis pela limpeza? Bem, em primeiro lugar, você passará a usar este kimono — ela jogou em meu rosto um kimono cinza. — E hoje cuidará da limpeza do quarto do senhor Sesshoumaru.

Arregalei os olhos, surpresa.

— Ficarei responsável pelo quarto do senhor Sesshoumaru logo em meu primeiro dia? Mas, eu acabei de chegar e... Eu não sei nada sobre este lugar.

— Você não é a humana concedida a ficar? Vamos ver quanto tempo você vai aguentar aqui. Senhor Sesshoumaru está em audiência. Então, limpe tudo antes da audiência acabar. Ele certamente não gostará de encontrá-la em seus aposentos. Vá rápido!

Passei correndo por ela, pois não poderia perder tempo.

"Onde já se viu uma humana receber tantos privilégios neste palácio?! Quem ela pensa que é?!", escutei Aika resmungar enquanto me distanciava.

Assim que entrei no palácio, vesti o kimono cinza e sem graça semelhante aos dos youkais da limpeza e segui rumo aos aposentos do senhor Sesshoumaru. Quando cheguei lá, Jaken estava me esperando em frente a porta com os materiais que eu deveria usar na limpeza.

Eu os peguei de suas mãos e respirei fundo diante das grandes portas de correr. Quando as abri, senti o meu estômago revirar.

— Rin! Tenha cuidado com cada objeto, senhor Sesshoumaru é muito cuidadoso! — alertou-me Jaken.

"Rin, você já matou tantos youkais... Isso vai parecer brincadeirinha de criança", pensei, encorajando-me.

Pus as mãos na cintura e avaliei o ambiente.

"Isso vai ser fácil", pensei. "Mas... E se ele chegar antes de eu ter terminado?"

Fiquei levemente apavorada diante dessa possibilidade. Eu não queria falhar com senhor Sesshoumaru. Não queria desapontá-lo.

Girei o rosto para Jaken que estava postado ao meu lado com uma expressão angustiada.

— Não se preocupe, senhor Jaken — e sorri para ele no intuito de tranquilizá-lo. — Vai dar tudo certo.

Minhas palavras não pareceram surtir nenhum efeito em Jaken. Ainda com a expressão angustiada, ele retirou-se.

Peguei os materiais e adentrei nos aposentos de senhor Sesshoumaru.

Arregacei as mangas do kimono e decidi começar. A iluminação do local provinha unicamente da luz do sol que atravessava o shoji e banhava o quarto. Além de que possuía um agradável aroma de incenso.

Limpei cada brecha, cada espaço daquele cômodo. Fiquei encantada quando encontrei alguns pergaminhos guardados por senhor Sesshoumaru. Pelo visto, eram muito antigos, pois as folhas eram amareladas.

Vovó Kaede passou longos anos tentando me ensinar a ler e a escrever, visto que ela planejava me transformar em uma sacerdotisa. Inicialmente, eu não tive o menor interesse em aprender. Achava entediante passar horas e horas debruçada sobre papeis antigos. Quem conseguiu despertar o meu interesse foi Miroku, pois suas explicações eram engraçadas e envolventes. Quando ele não estava ajudando Sango a cuidar das crianças ou prestando algum serviço numa aldeia vizinha, ele passava as tardes ensinando os aldeãos a ler e a escrever. Kagome, muitas vezes, ajudava também. Na época, para mim, era tudo uma brincadeira, pois era assim que Miroku fazia parecer. Depois que cresci, compreendi a dimensão do que Miroku fizera por nós. Saber ler e escrever era algo que somente uma parcela insignificante de aldeãos sabia.

Mesmo sabendo que era errado bisbilhotar, abri um dos pergaminhos de senhor Sesshoumaru e fiz uma rápida leitura. Não era nada muito interessante. Eram apenas informações relacionadas ao clã dos Inu-Daiyoukai e isso estava longe de ser da minha conta. Com todo cuidado, eu os guardei de volta.

Passei mais alguns minutos terminando a limpeza, tomando o máximo de cuidado com qualquer objeto que havia ali. Por fim, revisei os mínimos lugares que já havia limpado, certificando-me de que estavam realmente limpos. Dei umas batidinhas no kimono cinza e estralei os dedos das mãos.

Finalmente havia terminado e fiz tudo antes da audiência terminar. Orgulhosa de mim mesma, caminhei até a porta e a abri.

"Espero que senhor Sesshoumaru goste do meu trabalho", pensei dando uma última olhada no cômodo.

Quando dei o primeiro passo no corredor, surpreendi-me ao dar de cara com Katso.

— O que pensa que está fazendo?! Você me assustou! — exclamei enraivecida.

youkai, que emanava uma energia maligna inquietante, soltou uma risadinha e cruzou os braços contra o peito.

Ao observá-lo de perto, fiquei impressionada com o quanto ele se parecia com senhor Sesshoumaru.

— Ora, ora então quer dizer que a humana conseguiu uma acomodação estratégica neste palácio. Deve haver alguma explicação para isso, imagino — provocou Katso sorrindo. — Uma explicação um tanto voluptuosa.

Não demonstrei abalo diante daquelas provocações sem sentido e logo rebati:

— Me chamo Rin, entendeu? R-I-N! Por que todos aqui insistem em me chamar de "humana"? Por acaso ninguém percebeu que humanos também possuem nomes?! — questionei furiosa.

Passei por ele deixando-o para trás. Ele sorria pelo canto dos lábios, cínico. Parecia gostar do comportamento que eu apresentava. Geralmente, eu gostava de tratar bem as pessoas. Contudo, existia algo de estranho emanando daquele youkai e, por isso, eu preferia adotar tal postura.

De repente, senti um aperto em meu braço. Era Katso. Ele girou meu corpo e voltei a ficar cara a cara com ele. Dessa vez, o seu rosto estava muito próximo do meu.

— Quem é você? Por que Sesshoumaru a deixou ficar? — questionou ele enquanto me analisava com os seus olhos escarlates.

— Não é da sua conta! — rebati tentando me soltar.

— Isso não faz nenhum sentido para mim. Sesshoumaru nunca teve interesse na sua espécie inferior. Qual a sua relação com ele?

— Por que você mesmo não pergunta a ele já que está tão interessado?!

Subitamente a expressão séria e analítica do youkai se desfez e ele revelou um sorriso.

— Ah... Estou entendendo — disse o Inu-Daiyoukai. — Você é a garota humana. A garota que ele salvou da morte. Ouvi histórias sobre você. Mas, nunca dei ouvidos a elas. Sesshoumaru, ao contrário do pai, nunca gostou de humanos. Isso é... Interessante — Katso ergueu um dedo e o deslizou suavemente pela minha face. — Você é bela. Tem um cheiro agradável. Sua pele é macia como uma pétala de uma rosa. Entendo porque ele a deixou ficar. Sesshoumaru é tão previsível!

A insinuação promíscua de Katso em relação as intenções de senhor Sesshoumaru, por alguma razão, deixou-me envergonhada. Com um puxão, soltei o meu braço de sua mão e encarei-o com raiva.

— Não ouse encostar em mim outra vez! Não estou aqui pelas razões pervertidas que você está pensando! — vociferei. — Você era o youkai da floresta. Você apareceu para mim, disse algumas palavras e depois desapareceu. Se existe alguém no direito de fazer perguntas aqui esse alguém sou eu.

Katso balançou a cabeça.

— Discordo totalmente. Você quer respostas sobre mim e eu quero respostas sobre você. Estamos quites, não acha? Se você responder o que eu quero, eu respondo as suas perguntas. E então? O que me diz?

Estreitei os olhos para ele.

— Não confio em você.

— Eu também não confiaria — disse o Inu-Daiyoukai. — Mas, você tem a minha palavra e nela você pode confiar.

— Muito bem, eu sou Rin. Sou a garota humana que senhor Sesshoumaru salvou. A primeira vez que o fez foi após o ataque dos youkais-lobos. Eles atacaram a aldeia em que eu vivia e mataram todos, incluindo a mim. Senhor Sesshoumaru encontrou o meu corpo e o fez voltar a vida com a Tenseiga. Depois disso, eu passei a segui-lo.

— Por que ele a salvou? — questionou Katso. — Que tipo de poder existe em você?

— Nenhum!

Katso sorriu.

— Interessante. E onde você esteve todo esse tempo?

— Estive vivendo numa aldeia humana.

— A aldeia em que vive InuYasha, eu imagino — disse ele e abriu novamente um sorriso. — Então você se cansou dos humanos e decidiu voltar a viver com as feras. Tem muita coragem, devo admitir.

— Agora que você sabe de tudo responda-me quem é você e o que estava fazendo a floresta naquela noite.

— Eu sou Katso. Sou um youkai imortal.

Franzi o cenho, confusa.

— Imortal?

— Sim, imortal. Como você já deve saber, os youkais possuem uma expectativa de vida maior que a dos humanos. Porém, são mortais. No meu caso é diferente, eu posso viver através dos séculos. Para sempre — ele revirou os olhos ao notar minha expressão estupefaça. — Não é nada demais. É uma questão familiar. O meu ancestral, Tatsuo, obteve a magia da imortalidade e passou-a para os seus filhos. Eu a recebi de meu pai.

— Deve ser ruim viver para sempre — falei pensativa. — Ver o mundo inteiro mudar enquanto você continua o mesmo.

— Nada que a adaptação não resolva — argumentou Katso. — Mas, se quer saber, o mundo não mudou tanto assim. Há mais de setecentos anos que youkais guerreiam contra humanos e humanos guerreiam contra outros humanos. Tudo continua igual.

— Agora diga-me o que estava fazendo na floresta naquela noite.

— Quanto a isso eu não posso dizer muita coisa. Estava a serviço de Sesshoumaru. Não posso revelar detalhes.

— Por que você não lutou comigo? Por que simplesmente foi embora?

— Não era interessante — respondeu Katso. — Uma humana como você não teria a mínima chance contra mim. Seria fácil demais derrotá-la e até tedioso. Por isso eu a deixei escapar. Além do mais, eu precisava regressar ao palácio rapidamente, pois havia cumprido a missão designada por Sesshoumaru.

Refleti as palavras dele.

— Está desapontada? — perguntou o youkai com diversão. — Eu entendo. A vida é, por vezes, decepcionante.

Katso passou por mim e deixou o corredor. Logo depois eu fiz o mesmo, pois precisava comunicar a Aika que havia concluído a tarefa.

* * *

Aika curvou-se diante de Sesshoumaru que havia lhe chamado aos seus aposentos. Ele estava lendo alguns de seus pergaminhos e parecia concentrado.

— Sim, senhor Sesshoumaru? — Aika manteve o olhar fixo no chão num gesto de respeito.

— Você está responsável pelo grupo de limpeza, estou correto? — perguntou ele sem olhá-la.

— Sim, meu senhor.

— Quem limpou este aposento em minha ausência? Fiquei satisfeito com o resultado — disse Sesshoumaru agora movendo seus pares de olhos dourados para a youkai de cabelos negros.

O silêncio predominou naquele cômodo e Aika não soube o que dizer. Por fim, os lábios vermelhos da youkai se abriram para uma resposta:

— Fui eu mesma que limpei e organizei, meu senhor.

— Hum — murmurou ele dispensando a presença dela.

Aika deu as costas e seguiu raivosa até a porta.

Aquilo só podia ser um pesadelo! Ela vivia naquele palácio há anos e, desde que chegou, esforçou-se ao máximo para conquistar o apreço do príncipe e essa maldita humana, logo em seu primeiro, conseguiu conquistá-lo! Não era justo!

Aika sentia que a sua posição naquele palácio estava ameaçada.

— Espere — disse Sesshoumaru.

— Sim? — indagou Aika a meio caminho da porta, rangendo os dentes.

Dentro da youkai um sentimento aflorava. Que sentimento era esse?

Inveja.

Sim. Ela sentia inveja da humana.

— Soube que Rin está no grupo de limpeza. Como ela está se saindo? — perguntou o príncipe.

Aika arregalou os olhos. Não estava acreditando que estava presenciando senhor Sesshoumaru se preocupar com a garota!

— É um desastre! Não sei como o senhor deixou que uma menina tão atrapalhada ficasse neste palácio, não sei como o senhor admitiu que...!

— Basta, Aika. Está dispensada. Parta daqui — interrompeu Sesshoumaru.

Aika fechou a porta sem bater.

Sozinho, Sesshoumaru pensou nas palavras de Aika em relação à Rin. Ela havia sido mesmo um desastre como a youkai informara? Havia um cheiro peculiar impregnado na atmosfera daquele quarto, observou o Inu-Daiyoukai. Era um cheiro de rosas que lembrava a primavera e o jardim que ele tanto apreciava. Sem dúvidas, aquele não era o cheiro de Aika.

Do lado de fora dos aposentos de Sesshoumaru, Aika ainda tentava conter a raiva que sentia. Após recuperar a compostura, ela percebeu a silhueta de alguém parado nas sombras do palácio como um fantasma.

Katso.

O maldito desgraçado. Aika o detestava, embora o tratasse com respeito por conta do parentesco que ele possuía com Sesshoumaru.

Ele sorriu cumprimentando-a. Ela o ignorou e seguiu indiferente pelo corredor.

— Rin chegou há tão pouco tempo no palácio de Sesshoumaru e já tem tantos inimigos. O que acha disso, Aika? — provocou ele logo atrás.

Os olhos negros da youkai arregalaram-se. Katso havia escutado toda conversa e provavelmente se contasse a Sesshoumaru sobre a sua mentira ela estaria em apuros.

— O que você quer? — perguntou Aika severamente freando os seus passos.

— Rin, pobrezinha... Esforçou-se tanto para agradar o senhor Sesshoumaru — disse ele suavemente. — Uma pena todo o seu esforço não ter valido de nada.

Aika soltou uma respiração e virou-se para ele.

— Desgraçado! O que está querendo?! — vociferou.

Como já esperava, Katso não disse nada. Continuou mantendo aquele sorrisinho prepotente no rosto e saiu do seu campo de visão.

Droga. Agora o youkai imortal sabia um segredo seu. Isso era um problema. Katso era inconstante demais. Era difícil adivinhar as suas pretensões. Ela não fazia ideia se ele revelaria o seu segredo ou se só queria provocá-la. Além da humana ameaçando a sua posição no palácio ela teria que lidar com Katso também. Ótimo.

Aika respirou fundo. Desde que havia chegado no palácio ela havia vivido em paz. Agora aquela paz estava desmoronando e tudo por culpa da humana.

Maldita era aquela espécie!

* * *

A noite caiu. Aos poucos, todos os youkais e meio-youkais foram cessando as suas atividades e seguiram para os seus alojamentos.

As terras do palácio de senhor Sesshoumaru, no fim das contas, funcionavam como feudo comum. Os servos possuíam pequenas casinhas no manso servil onde passavam a noite e viviam como quisessem.

Após ter realizado a minha tarefa daquele dia, preparei-me para dormir.

Ao deitar em meu futon fiquei pensando que, por mais que eu e senhor Sesshoumaru estivéssemos vivendo sob o mesmo teto, era como se estivéssemos a um abismo de distância. Era muito diferente de quando eu, ele e senhor Jaken viajávamos juntos. Não que eu esperasse que as coisas fossem as mesmas depois de tantos anos, mas eu não esperava que fossem tão diferentes. Até o seguinte momento eu sequer pude ter uma conversa com ele!

O inverno estava cada vez mais próximo. Eu podia ouvir lá fora o uivo da brisa invernal. Como eu odiava essa estação!

Dispensei as divagações e fechei os olhos para dormir. Felizmente, o sono veio rápido e logo um sonho começou a se materializar.

Não. Não era um sonho. Era uma lembrança. Há anos eu tentava fugir dela. Porém, nunca obtive sucesso.

* * *

Diante dos meus olhos surgiu uma casa que era tão familiar para mim. Eu morei nela até os oito anos de idade. Era a casa de meus pais.

Nessa noite enregelada, mamãe fazia o jantar e o aroma fazia meu estômago roncar. Papai estava conversando algo sem importância com o meu irmão embora estivesse exausto demais para isso. Enquanto isso, eu brincava com a gatinha de pelos brancos chamada Ume que rolava pelo chão pedindo carinho.

Era uma noite comum.

Ume entrara na nossa família há dois dias. Eu havia a encontrado abandonada próximo ao rio. Ela sofria maus tratos. Então eu a resgatei e a alimentei.

Sempre que eu visualizava o rosto de minha mãe por meio dessa lembrança eu constatava que havia herdado todas as características físicas dela, enquanto meu irmão, Hitoshi, era uma mistura equilibrada de nossos genitores.Tínhamos dois anos de diferença.

Éramos uma família simples. Não tínhamos riquezas materiais e a fome, por vezes, era um empecilho. Mas, ainda sim, éramos felizes.

Uma leve garoa caia das nuvens naquele exato momento, o que preocupava mamãe, pois a nossa horta poderia ser arrasada.

Repentinamente, Ume levantou-se do chão e correu até a porta. O felino miava de modo estranho. Quase em tom de alerta.

— Ume, o que houve? — indaguei indo até ela.

— Acho que ela só está com fome, Rin — falou mamãe. — Espere só uns minutinhos, Ume. Logo, logo você terá as suas sobras.

— Não, mamãe. Acho que ela quer sair.

— Se ela sair agora vai se molhar. Está começando a chover.

Papai sorriu para mim.

Era um sorriso jubiloso, porém cansado. Típico de um trabalhador rural. Havia rugas no canto de seus olhos e as suas mãos eram naturalmente ásperas devido o árduo trabalho de lenhador. O semblante de Hitoshi era alegre também. Os cabelos do garoto eram de tonalidade castanha como os de Kohaku. Aliás, os dois eram bastante parecidos.

E Ume continuava inquieta.

— Não pode sair agora, Ume — falou mamãe. — Está começando a chover. Depois do jantar nós vamos te dar comida. Espere só mais pouco.

Os minutos se passaram e então ouvimos gritos.

Mamãe cessou o que estava fazendo. Papai, assim como eu e meu irmão, ficou atento. Ele aproximou-se da porta para ouvir o que estava acontecendo. Quando nos aproximamos, ele fez um gesto para que nos afastássemos.

Agora podíamos ouvir claramente: em meio aos gritos desesperados dos aldeões era possível ouvir o som de cascos de cavalo. E o pior de tudo: o som dos galopes parecia cada vez mais próximos de nossa casa.

Mamãe e papai se entreolharam, aflitos.

— Fiquem aqui, crianças. Eu vou ver o que está acontecendo — disse papai abrindo a porta e mamãe o seguiu.

Olhei perturbada para o meu irmão.

— Hitoshi, o que você acha que está acontecendo?

— Eu não sei, Rin — respondeu Hitoshi sem tirar os olhos da porta.

Escutamos vozes enfurecidas. Por um momento, achei que fossem youkais. Mas, não. Aquelas vozes eram humanas.

Hitoshi não suportou mais ficar dentro de casa. Ele queria saber o que estava acontecendo lá fora. Quando fiz menção de segui-lo, ele me disse para ficar dentro de casa. Então, abriu a porta e saiu.

Eu estava com muito medo e decidi me esconder no quarto que eu dividia com o meu irmão. Fechei a porta e me encolhi no canto da parede, atormentada.

Por todo o tempo em que fiquei ali, grunhi uma ou duas vezes. Minhas mãos tremiam de medo e meu coração martelava forte no peito. Alguma coisa ruim acontecia lá fora. Eu sabia disso. Podia sentir.

Então, eu ouvi:

"Não! O que você está fazendo! Por favor, pare...!", era a voz de minha mãe. A sua frase foi interrompida de forma perturbadora.

"Maldito! O que você fez com... Não!", em seguida ouvi um grunhido estrangulado. Aquela era a voz de meu pai.

"Papai! Mamãe! Não... Me solta! Socorro!...", era a voz de Hitoshi.

As lágrimas logo vieram aos meus olhos. O que aquelas pessoas estavam fazendo com a minha família?! Indaguei-me trêmula e paralisada de medo.

"Vamos, peguem tudo de valor que há nesta casa, vamos! Rápido!", ordenou alguém dono de uma voz autoritária.

Então eu compreendi: eram bandoleiros. Haviam atacado a aldeia para roubar.

Ouvi a porta da casa se abrir. Nesse momento, consegui reunir forças para sair de onde estava e me escondi dentro do armário velho que tínhamos.

De dentro do meu esconderijo, ouvi os passos pesados dos invasores ecoando pela casa e os escutei revirar cada objeto que encontravam.

As batidas do meu coração estavam descompassadas e eu senti meu sangue inteiro gelar quando ouvi os miados desesperados de Ume.

Não sabia dizer ao certo quanto tempo eles ficaram dentro de minha casa. Para a minha sorte, eles não foram até o quarto onde eu estava. Certamente, ficaram muito ocupados se banqueteando com o jantar que minha mãe preparara com tanto amor.

Quando terminaram a refeição, ouvi novamente os seus passos pesados ecoando pela casa e quando um deles estava prestes a abrir a porta do quarto onde eu estava, uma voz salvou a minha vida:

"Esses pobretões não têm nada a nos oferecer, vamos embora daqui!"

E foram embora. Simplesmente foram embora. Partiram como se não tivessem feito nada de errado.

Quando escutei o som dos cascos dos cavalos soando distante, eu abri o armário e corri para encontrar os meus familiares.

Assim que saí do cômodo, dei de cara com o corpinho branco de Ume estendido no meio de uma poça de sangue.

— Ume! — gritei.

Com lágrimas nos olhos, eu notei horrorizada que a casa estava inteiramente revirada. Mamãe jamais permitiria uma desorganização dessas.

"Mamãe!", pensei correndo até a porta da frente que tinha sido deixada aberta.

Eu tinha esperanças de que os meus familiares tivessem tido um destino diferente do de Ume, pois eles eram a minha família. Eles eram a única coisa que eu tinha. Eu não podia perdê-los.

Então eu vi os corpos deles estendidos no chão.

Por um instante, eu não soube como reagir. O choque foi grande demais. Fiquei encarando aquela cena terrível, imobilizada.

Papai estava afogado no próprio sangue que transbordava de um ferimento na garganta. Mamãe estava caída de bruscos e as suas costas estavam manchadas de sangue. Hitoshi, meu irmão, estava deitado sobre o braço em um ângulo impossível e possuía um ferimento no estômago.

Eu estava incrédula. Meu cérebro não processava o que os meus olhos viam. Eu não sentia que estava chorando. As lágrimas simplesmente caíam.

Quando me recuperei do baque inicial, corri até os corpos deles. Sentei na relva sacudindo o corpo de meu pai e agarrei-me a ele chorando. Depois engatinhei até a minha mãe e a sacudi. Gritei por ela. Porém, ela estava morta assim como Hitoshi. Todos estavam mortos.

Chorei. Em determinado momento, olhei para o céu. Eu queria que alguém, em algum lugar, me respondesse por que aquelas pessoas más tiveram que me tirar tudo o que eu tinha. Mas, não obtive resposta.

— Mamãe... Nós nos esquecemos de alimentar Ume. Ela está com fome. Era só alguns minutos, lembra? — sussurrei abraçada ao corpo inerte de minha mãe. — Por favor, eu não quero ficar sozinha para sempre. Mamãe...

O céu, de algum modo, viu o meu sofrimento. A garoa se transformou numa chuva de verdade com direito a relâmpagos e a trovões.

O céu e a pequena Rin se conectaram. Os dois se lamentaram da forma que podiam ou sabiam.

* * *

À medida que aquelas imagens desfilavam diante dos meus olhos, eu tentava a todo custo despertar.

Uma parte de mim tentava me dizer que tudo isso não passava de uma reminiscência e que eu jamais ficaria sozinha para sempre.

Lembre-se deles, aconselhou a minha parte consciente, lembre-se de seus amigos.

Devido a essa corrente de pensamentos, eu consegui abrir os olhos. Sentei-me no futon com o peito arfando e o coração a mil. Em seguida, disse a mim mesma que estava tudo bem e que tinha sido só um sonho ruim.

Já fazia algum tempo que essa terrível lembrança não me incomodava. Por que agora?

Então, para o meu horror, um relâmpago clareou o quarto. Estava chovendo. Esse era o motivo pelo qual eu detestava tempestades, pois fora uma delas que selou a morte da minha família.

Abracei os meus joelhos e fechei os olhos. Quando um trovão retumbou, eu cobri as orelhas com as mãos.

Naquele momento, enquanto eu estava de olhos fechados, uma sensação terrível me acometeu. Por um momento, eu tive certeza de que, caso eu abrisse os olhos, eu daria de cara com a minha família morta.

— Mamãe, papai, Ume, Hitoshi, eu senti tantas saudades — sussurrei ainda de olhos fechados e abraçando os joelhos.

E senti mesmo. Depois da morte de meus pais, em decorrência do trauma, eu perdi a capacidade de falar. Fui maltratada pelos aldeãos. Cresci solitária e vestia-me com farrapos. Minha vida foi destruída após aquela noite. Até que numa manhã qualquer eu conheci senhor Sesshoumaru que me salvou do inferno que eu vivia. Após ser salva por ele, eu renasci.

Ao me lembrar disso, eu decidi abrir os olhos. Outro relâmpago clareou o quarto. Então, eu vi. As minhas mãos. Elas estavam ensanguentadas como na minha lembrança.

Gritei alto ao ver aquilo e dei um salto do futon.

Com as costas grudadas na parede, eu encarei as palmas das minhas mãos sem compreender a razão pela qual elas estavam sujas de sangue.

Outro relâmpago clareou o quarto, permitindo-me enxergar o que havia estendido no chão do quarto.

Eram corpos. Corpos da minha família e eles estavam posicionados exatamente como na noite em que morreram.

Talvez, eu tenha gritado. Talvez, não. Tudo o que eu sei foi que eu fiquei olhando para aquela cena apavorante com os olhos arregalados.

Por um segundo, pensei que estivesse presa em mais um pesadelo, mas não. O que eu estava vendo era real!

Eu senti meu corpo inteiro tremer. Então algo mais horrível aconteceu: o corpo inerte de minha mãe se moveu. Ainda de bruscos, ela girou a cabeça na minha direção e eu vi estampado em sua expressão o rancor.

— Você nos deixou morrer Rin — disse a minha genitora.

Perplexa e assustada, eu vociferei de volta:

— Não! Eu era uma criança!

— Você se escondeu e nos deixou morrer. Você se acovardou.

— Por favor, mãe! — supliquei sentindo as lágrimas escorrerem por minhas bochechas. — Eu nunca quis que nada disso tivesse acontecido. Eu sinto muito...

Então foi a vez de meu irmão e de meu pai.

Hitoshi sentou-se empertigado no chão, assim como meu pai. O corpo de ambos era rígido. O sangue viscoso escorria da garganta de meu pai, assim como na noite em que ele fora assassinado.

Era uma cena terrível. Eu mantive as costas pressionadas contra a parede sem saber o que fazer. Eu queria fugir daquele quarto e ao mesmo tempo queria ajudar os meus familiares.

Eles aparentavam sentir mágoa. Rancor. Sofrimento. Além disso, eles me culpavam. Eu queria fazê-los entender que eu os amava e que eu lamentava profundamente o destino que eles tiveram. Mas, o choque e o pânico me paralisavam.

— No final, o sangue de sua família está em suas mãos! — afirmou o meu irmão.

Sem conseguir suportar mais aquilo, corri em direção a porta e abri.

Assim que sai do quarto, corri desvairada pelo corredor sem saber para onde estava indo. Tudo o que eu queria era ficar o mais distante possível daquele quarto. Daquela visão.

Enquanto eu corria desesperada e sem rumo, choquei-me em uma superfície firme e quente.

Ao me recuperar do baque, surpreendi-me ao constatar que a tal superfície era senhor Sesshoumaru. Eu havia esbarrado nele!

Quando os meus olhos focalizaram o rosto dele, senhor Sesshoumaru lançou-me um olhar indefinido.

Movida por um impulso repentino, eu o abracei.

No instante em que fiz, senti que isso o surpreendeu, mas mesmo assim ele não se afastou. Apenas manteve-se estático.

Com aquele abraço, senti-me embalada por uma sensação de proteção. De alguma forma, eu sabia que agora estava tudo bem e que nada, absolutamente nada, ousaria tentar me fazer mal.

Então as lágrimas vieram seguidas pela lembrança dos corpos dos meus familiares estendidos no chão do meu quarto.

— Rin, o que aconteceu com você? — perguntou ele sem parecer preocupado.

— Eu fui uma covarde e agora eles voltaram para dizer isso para mim! Por favor, não me deixe voltar para lá!

— Para onde?

— Para o meu quarto! — exclamei. — Os corpos deles estão espalhados pelo chão... Não está vendo minhas mãos sujas de sangue?!

Desfiz o abraço e ergui as palmas das mãos para o Inu-Daiyoukai. Na claridade dourada das tochas, eu pude ver que elas não estavam sujas. Não havia nem mesmo uma gotícula de sangue em minha pele.

Girei o rosto em direção ao jardim e, para o meu espanto, não estava chovendo. Era uma noite estrelada e sem nuvens.

Não era possível... Tudo o que eu tinha visto não poderia ter sido um sonho!

Sesshoumaru estreitou os olhos dourados para mim e uma brisa gélida moveu a franja prateada dele.

Por um segundo, ocorreu-me o pensamento de que ele era mesmo bonito e isso me deixou horrorizada. O que eu estava pensando?!

— Quem estava no seu quarto?

— Meus pais e meu irmão.

Sesshoumaru olhou brevemente em direção ao meu quarto e depois voltou o olhar para mim.

— Tudo o que você acabou de ver foi fruto de uma ilusão. Não foi real — disse o Inu-Daiyoukai. — Isso parece ter sido obra de algum youkai. O seu quarto estava sob o feitiço de uma bruxa ou de um bruxo.

— Bru-bruxo youkai? — ecoei impressionada.

— Alguém esteve usando magia negra.

"Mas, que burra, Rin! Você se deixou levar pelas emoções e se esqueceu de avaliar a situação de maneira racional!", pensei dando uma batidinha na minha testa.

— O senhor tem razão. Não era real e nem poderia ser, afinal minha família está morta — e soltei uma risada. — Chega até ser irônico: a exterminadora acaba sendo salva por quem ela presta serviços.

— Isso prova que ainda é apenas uma criança.

Ao ouvir aquilo, eu não pude deixar de me sentir um tanto incomodada.

— Eu não sou criança! — rebati. — Tenho dezoito anos. Para a minha espécie, eu já sou adulta!

— Alguém planeja o seu declínio e vê-la assustada — afirmou senhor Sesshoumaru seguindo adiante e me deixando para trás.

Mesmo sabendo que tudo o que eu vi não passara de uma ilusão, nada me faria retornar para aquele quarto.

— Senhor Sesshoumaru, espere! — exclamei apressando os passos para acompanhá-lo.

Ele nem mesmo olhou para trás. O seu orgulho jamais permitiria tal coisa. Porém, eu não me importava. Eu sabia que senhor Sesshoumaru possuía sentimentos por trás daquela máscara de frieza. Talvez, algum dia até tenha se apaixonado por alguém. Paixões? Por que eu estava pensando nisso?

— Então... — falei postando-me ao lado dele. — Alguém quer me ver morta?

— Não acho que esses feitiços tenham sido para matar e sim para assustar. — respondeu o Inu-Daiyoukai com o olhar voltado para frente.

— Ah, senhor Sesshoumaru... Se me permite perguntar... Onde o senhor está indo? É que o senhor Jaken não está aqui para informar.

— O horário apropriado para fortalecer a barreira é durante o crepúsculo — informou ele.

Senhor Sesshoumaru e eu deixamos o palácio e entramos no jardim. Observei o céu e constatei que no horizonte os primeiros raios de sol já começavam a anunciar a chegada do dia. Acompanhei o youkai pela mata que era iluminada pelo esplendor da lua.

Enquanto caminhávamos, eu evitei falar, pois sabia o quanto senhor Sesshoumaru apreciava o silêncio.

A presença dele era reconfortante e, por mais que eu soubesse me defender sozinha, eu gostava da sensação protetora que ele me repassava. Era como na infância.

Conforme eu caminhava pela relva baixa, fitei novamente o céu. A noite findava-se apesar da lua ainda estar ali, bem como as estrelas. Aquele sonho ruim durou uma madrugada inteira. Quem havia lançado esse feitiço contra mim?

Nós nos aproximamos então da muralha de pedras que protegia o palácio, os youkais que faziam a segurança durante a noite curvaram-se diante do Inu-Daiyoukai. Senhor Sesshoumaru sequer olhou para eles. Simplesmente esperou que os portões se abrissem para nós e assim foi feito.

Quando atravessamos os portões, a vegetação tornou-se mais selvagem e o percurso tornou-se mais pedregoso. Porém, ainda sim, era uma bela visão. Examinei o orvalho nas folhas das árvores e ouvi com atenção o murmúrio dos insetos.

— Este lugar é maravilhoso — comentei.

Como esperado, o Inu-Daiyoukai não respondeu. Mas, eu sabia que ele estava escutando.

A caminhada prosseguiu e, como naquela área as árvores frondosas impediam a propagação da luz, eu sempre procurava encontrar senhor Sesshoumaru com as mãos para não me perder e ele, para evitar que isso acontecesse, mantinha-se por perto.

Por fim, ele cessou os passos em um ponto da floresta. De onde estávamos, era possível avistar os youkais que buscavam atravessar a barreira que protegia o palácio.

Senhor Sesshoumaru semicerrou os olhos dourados sem dar muita importância para aqueles seres. A atenção dele estava voltada para algum ponto no céu.

O Inu-Daiyoukai desembainhou a espada que trazia consigo e a ergueu para cima lançando uma bomba de poder em direção a poderosa barreira que protegia aquelas terras.

O poder lançado alimentou as ramificações, as quais existiam por todo o campo de proteção. No decorrer do dia, essas ramificações eram impossíveis de serem vistas. Porém, naquele momento, eu as vi. Elas transportavam o poder recebido por todo o campo, mantendo-o funcionando.

Contudo, o mais chocante para mim foi o que aconteceu em seguida: milhares de faíscas de poder caíram do céu como uma chuva de vaga-lumes. Eram inofensivas. E eu acompanhei-as riscar a escuridão e cair sobre as árvores, deslumbrada.

— Que coisa linda — falei sorrindo.

— O poder é, de fato, algo extraordinário — concordou senhor Sesshoumaru encarando com soberania os youkais que rugiam para ele.

— Não! Não estou falando disso! — agarrei o braço do Inu-Daiyoukai para chamar a sua atenção e apontei para cima. — Estou falando dessas pequenas partículas luminosas que estão caindo sobre nós! São como pequenos vaga-lumes!

Houve um instante de silêncio. Assim como eu, senhor Sesshoumaru também ficou observando aquele fenômeno como se nunca tivesse se dado conta dele antes.

Eu estava feliz por não ter voltado para o quarto. Estava feliz por tê-lo seguido até ali. Sem dúvidas, essa caminhada me proporcionou uma magnífica lembrança, pois eu jamais me esqueceria dessa visão.

"O poder é, de fato, algo extraordinário, senhor Sesshoumaru", pensei sorrindo para o céu.

— Senhor Sesshoumaru — chamei-o sem olhá-lo.

— Sim?

— Eu senti saudades. — confessei. — Agora o senhor não precisa se preocupar comigo. Embora eu tenha caído numa armadilha de algum youkai, eu estou bem. Não quero ser um fardo para o senhor. Eu treinei durante anos para nunca mais precisar aborrecê-lo. Kohaku me ensinou tudo o que sabia.

— Kohaku? — indagou o Inu-Daiyoukai.

— Sim, ele e Sango me treinaram. Se não fosse eles, eu nunca teria me tornado uma exterminadora de youkais. Sei que isso pode não agradá-lo, mas foi a única maneira que eu encontrei de ficar forte o suficiente para voltar a segui-lo sem atrapalhá-lo — observei por um segundo um resquício de surpresa na face de senhor Sesshoumaru. No entanto, ele não disse nada e eu prossegui: — Mas, ao que parece não há youkais para serem exterminados neste palácio. Então, eu pensei que eu poderia ajudar na limpeza. Quero ajudar. Quero exercer alguma função aqui porque não quero ser um fardo. Quero retribuir tudo o que fez por mim.

— Rin.

— O quê?

— Se quer ficar neste palácio, fique por você. 


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Notas finais do capítulo

O Sesshy e a Rin são muito bonitinhos, né gente? Morro de amores! hahaha. Espero que tenham gostado do capítulo!! Beijos e até o próximo!

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