Catarse escrita por RafahAmorim


Capítulo 1
Estranhos




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George Weasley olhava ao redor. Toda sua família estava reunida nos jardins da Toca para mais um almoço de domingo. Dessa vez, a reunião celebraria a vitória do time de Quidditch de sua irmã Ginny. Harpies de Holydead havia ganhado o campeonato nacional com uma excelente campanha. A caçula dos Weasley traria algumas de suas companheiras de equipe para o almoço.

George estava apático. Sorria uma vez ou outra, mas seu semblante continuava sério, triste, como se preferisse estar em qualquer outro lugar que não aquele. E, na verdade, ele preferia. Recolher-se dentro do seu flat em cima de sua loja era sua opção mais tentadora,contudo, não faria isso. Ginny insistira para que ele comparecesse. Desde que ela entrara para equipe, há quase dois anos, ele nunca assistira sequer um jogo da irmã.“Pelo menos, celebrar a nossa vitória, George.” Fora o que ela dissera na carta que lhe enviara naquela manhã. Não estava em discussão decepcionar sua irmã.

Três anos passaram desde a Batalha de Hogwarts. O início tinha sido o momento mais difícil para toda família Weasley. Lidar com a dor de perder um ente amado não era fácil. Todos estavam derrotados, destruídos, não havia vestígios de alegria pelo fim da guerra, o máximo que podiam sentir era alívio. Viver o seu luto em paz era tudo o que podiam pedir.

A família, aos poucos, fora se erguendo. Trabalhando, ocupando a mente. Alguns momentos eram mais duros, porém outros eram um pouco melhores. Arthur e Molly apegavam-se ao fato de que tinham outros seis filhos para cuidar. Sabiam que eles precisavam dos pais.

Os irmãos Weasleys, com muita força de vontade, conseguiram tocar suas vidas. Bill e Fleur tinham tido uma filha, Victoire, que nascera exatamente dois anos depois da Batalha. O primogênito dos Weasleys conseguira um cargo ainda melhor em Gringotts, o que lhe permitiu expandir o Chalé das Conchas.

Charlie voltara para Romênia, e fora promovido a supervisor geral. Não era um cargo que matinha muito contato com os dragões, por isso, recusou a promoção. Aparecia na Toca algumas vezes, e, de tempos e tempos, levava uma namorada diferente. Nenhum relacionamento fora realmente sério e duradouro. Todos sabiam que sua verdadeira paixão eram aquelas criaturas enormes que soltavam fogo pela boca.

Percy mudara drasticamente. As marcas da guerra o fizeram abrir os olhos. Permanecia sendo pomposo, todavia agora, era muito mais humildade, e estava mais próximo da família do que nunca. Presenciar a morte de seu irmão o deixara muito mais carinhoso e amável com seus parentes, principalmente com seus pais. Continuava no Ministério, trabalhando arduamente ao lado de Kingsley Shacklebolt. Lá, ele conhecera Audrey, umas das novas funcionárias recrutadas. Os dois estavam noivos e casariam em setembro próximo.

Ron agora trabalhava junto com Harry no Departamento de Aurores. Por um tempo, logo após a guerra, ajudara nas Gemialidades Weasley. Finalmente assumira seus sentimentos por Hermione, e os dois estavam juntos desde o fim da Batalha.

Ginny, por sua vez, logo após se formar em Hogwarts , fizera um teste para as Harpies e passara, se tornando, em pouco tempo, titular. Ela e Harry retomaram seu relacionamento e não mais se separaram.

No início, fora complicado para todos, exceto para George. Para ele, três anos foram embora e tudo se mantinha igualmente doloroso. Permanecera isolado em seu apartamento, número 93, Beco Diagonal. Nas primeiras semanas, recusara-se a sair do flat. Não comia, não dormia, e ficava por horas a fio olhando para a parede. Afundara-se na bebida. Queria esquecer. O entorpecimento e a ressaca do dia seguinte causavam alívio temporário.

Ficou assim até perceber o mal que estava causando a sua família, já era bastante difícil seguir em frente sem ele comportando-se daquela maneira. A partir daí, continuara imensamente infeliz, entretanto fazia um pequeno esforço para visitá-los de vez em quando. Preferia evitar os olhares de piedade e compaixão, não suportava o modo cauteloso com o qual as pessoas o tratavam.

Evitando tudo isso, passou a fingir. Fingir que estava tudo bem; fingir que estava recomeçando. Seu teatro funcionava uma vez ou outra. Tentando parecer mais real, voltou ao trabalho. Não tinha ânimo no começo, mas logo descobriu que ali, no meio do entra e sai de pessoas e mercadorias, era mais fácil sobreviver. Distrair a mente, não pensar em nada além de logros e brincadeiras. E mesmo que a loja funcionasse como uma espécie de bálsamo, não havia mais diversão, não havia mais risos. Eram só trabalhos e obrigações.

A verdade era que ele não queria seguir em frente, não sem Fred do lado. Não queria viver se o seu irmão também não podia. Às vezes, quando conseguia dormir, sonhava com seu gêmeo. Acordava chamando por ele, para só então se lembrar que ele se fora e nunca mais voltaria. Essas eram as piores noites. Nesses momentos, ele voltava a beber. E não parava até desmaiar de tanta embriaguez.

“Ginny!” ouviu sua mãe dizer, retirando-o de seus devaneios. A caçula dos Weasleys finalmente chegara, trazia um sorriso enorme no rosto. George permaneceu sentado e de cabeça baixa enquanto todos levantavam para cumprimentar a ruiva e suas convidadas.

Quando finalmente se ergueu, sua irmã veio abraçá-lo.

“Fico feliz que você tenha vindo.” disse Ginny sorrindo, e logo em seguida, virou-se para os outros. George cumprimentou as meninas da equipe até que a viu.

Angelina Johnson. Ex-namorada de Fred. Companheira de equipe de Ginny. Uma velha amiga.

Seus olhares se encontraram por um instante. Há também quase três anos não se viam. A última vez que a encontrara fora no funeral de Fred. Depois disso, ela voltara ao Quidditch. George sabia que ela jogava junto de Ginny , mas estava surpreso com a sua vinda. Não era a primeira vez que sua irmã trazia suas colegas de time para a Toca, mas Angelina nunca comparecia.

Ela estava igual e diferente ao mesmo tempo. Os cabelos cacheados e volumosos já não eram mais trançados, ao invés disso, corriam soltos por suas costas. O corpo permanecia praticamente o mesmo, à exceção de algumas curvas que não estavam ali nos tempos de escola. Sua pele marrom agora ganhava um tom de dourado que refletia ao sol. O rosto era o mesmo, sua expressão continuava compenetrada; só os olhos haviam mudado. Já não traziam aquele brilho juvenil. Agora, transmitiam um vazio infinito. George pensou que deviam parecer com os seus próprios.

“George.”, ela cumprimentou, esticando o braço.

“Angelina.”, ele devolveu, segurando sua mão. Pareciam dois estranhos.

Soltaram as mãos e ela, com um último olhar em sua direção, acomodou-se em seu lugar e logo um divertido almoço começou. George não estava interessado em saber como tinha sido o campeonato, ou quais dificuldades o Ministério estava enfrentando. Comia em silêncio. De vez em quando olhava para Angelina para descobrir que ela o fitava também. Rapidamente, os dois desviavam o olhar.

Ao fim da refeição, as pessoas dispersaram-se, formando grupos. George observou Charlie afastar-se da Toca junto de umas das colegas de Ginny. Você não perde tempo, pensou.

Ele continuou sentado à mesa. Analisou os pratos a sua frente e viu a oportunidade perfeita de escapar de qualquer tentativa de conversa. Levantou-se rapidamente e começou a juntá-los.

“Não precisa, querido. Eu posso fazer isso apenas com um floreio.”, disse Molly com bondade, aproximando-se do filho.

“Eu não duvido de sua capacidade doméstica, mamãe, mas não há problema."

“George...", lamentou a matriarca da família.

“Está tudo bem.”, garantiu enquanto terminava de recolher os pratos e depositava um beijo na testa de sua mãe.

Entrou na cozinha e depositou os pratos na pia. Começou a lavá-los até que ouviu a porta sendo aberta novamente. Levantou os olhos e viu uma surpresa Angelina parada à porta. “ Eu...er, vou ao banheiro...”

George parou com as mãos molhadas de sabão.

“Ah...tudo bem.”, disse, por fim, ao ver que ela permanecia parada, como se estivesse esperando uma autorização. Ela partiu em direção ao cômodo, e ele continuou a lavar.

Angelina retornou alguns segundos depois, passando por ele rapidamente. Estava quase saindo, quando virou-se.

"George."

“Sim?”, ele disse terminando sua tarefa e olhando-a em seguida.

“Você tem visto alguém do nosso ano?”

“ Não muito.”

“ Ah, sim.”

Um silêncio constrangedor pairou no ar.

“Vou indo.”, ela quebrou o clima tenso após alguns segundos. “Nos vemos por aí.”, estava com a mão na maçaneta quando ele falou.

“Na verdade, nós estávamos, eu e Lee, marcando de nos encontrar no Três Vassouras, no próximo sábado, às oito. Oliver, Katie e Alicia também vão. Se você quiser vir...”

Ela virou-se lentamente e, com um sorriso fraco, respondeu.

“Eu adoraria.", ficaram em silêncio por alguns segundos. "Então, eu já vou, até sábado.”

“Até.”

Ela saiu, e ele, através da janela, observou-a cumprimentar os presentes e afastar-se, logo em seguida, para então aparatar. Assim que Angelina desapareceu, George arrependeu-se de tê-la convidado. Não porque não queria sua presença, mas, sim, porque ele não queria se fazer presente.

Depois da Batalha, Lee foi o único amigo com o qual George manteve um pouco de contato. A amizade deles não era a mesma. O locutor parecia não saber lidar com o ruivo e ainda assim o convidava constantemente para reuniões com os velhos amigos. George vivia recusando os convites e dessa vez não fora diferente.

Não sabia exatamente porque a convidara. Talvez, fosse o clima constrangedor do momento, ou um desejo inconsciente de manter contato com uma antiga amiga que tornara-se uma desconhecida. Seja qual fosse o motivo, ele não poderia voltar atrás.

Foi até a sala e procurou tinta, pergaminho e pena. Quando achou tudo o que precisava, sentou-se numa poltrona e começou a escrever.

“Lee,

O encontro de sábado ainda está de pé? Mudei de ideia, talvez seja bom rever os amigos.

Até lá.

George

P.S.: Angelina virá.”


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