Nicest Thing escrita por Nina Spim


Capítulo 12
Chapter Twelve


Notas iniciais do capítulo

Olá, Cherries!
A fanfic está terminando (de acordo com a minha escrita, claro; existirão 20 capítulos, ao todo), já está me dando saudades! Espero que gostem deste capítulo, eu o adorei escrevê-lo! Obrigada, mais uma vez, pelo feedback! ;)



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– Você precisa levantar, sério – digo, sentando-me ao lado dela, no pequeno espaço que ainda resta em sua cama. É impressionante; mesmo que ela seja apenas um pouco maior que eu, Lucy é muito mais espaçosa. Normalmente, eu durmo tão encolhida que um bebê elefante poderia dividir minha cama comigo. Mas não ela.

Lucy resmunga alguma coisa inteligível, daí abre os olhos, focando o teto. Pisca por tempo suficiente até que se acostume com a claridade primaveril, então afasta o lençol do corpo, relevando seu pijama de coraçõezinhos de duas peças bastante pequenas. A mão clara dela resvala pelo colchão e encontra meu corpo impedindo-a de me chutar para fora de sua cama, porém, mesmo assim, ela empurra meu braço para longe, numa tentativa de me repelir dali. Não me movo, porque sua força é mínima. Ela, então, recolhe sua mão de mim para que possa passá-la pelo rosto um pouco marcado, mas ainda gracioso.

É incrível. Acho absolutamente incrível essas pessoas que acordam já lindas, sem precisar de nem um tipo de artifício para realçar a própria beleza. Lucy é uma dessas pessoas. É quase um soco no estômago vê-la tão linda logo nos primeiros segundos de seu dia. Eu, por exemplo, mais pareço um alien atropelado do que com uma atriz encenando que está acabando de levantar assim que saio da cama. Mas ela, oh! Lucy é sempre tão bonita, sempre!

– Sei que já a abracei logo depois da meia-noite, mas quero abraçá-la de novo, para dar sorte! – acabo dizendo, pois agora sei que ela está mais desperta e pode compreender melhor minhas palavras.

– Ahn, tudo bem – ela resmunga, alongando o pescoço.

– Yay! – digo e a abraço novamente. Nossas peles se tocam com gentileza, e eu a aperto no abraço. O aroma de seu sabonete floral impregna minhas narinas, mas não me incomoda. É reconfortante. Mesmo que nós duas estejamos ainda vestidas de pijamas não há como negar que não somos pegas pelo desconforto, ou algo assim. Existe incutida tanta intimidade neste gesto, mas não consigo me desvencilhar. Sinto falta deste tipo de contato, daqueles que me tomam por inteira, que me deixam sem fôlego apenas pela aproximação e que, acima de tudo, me fazem sentir eu mesma; sem arrependimentos e com uma dose extra de aceitação – Preciso buscar seu presente, espere aí!

– Cadê Kurt e Blaine? Também quero ser abraçada por eles! – ela reclama com a voz divertida e faz exatamente o que pedi: me espera retornar.

– Deixaram um beijo e disseram que voltam logo para abraçá-la de novo.

Eu escondi seu presente debaixo de algumas roupas na minha bancada para que ela não o descobrisse. Pego-o e ajeito melhor o laço da caixa. Quando o estendo para ela, Lucy faz uma cara de quem não acha que merece tanta dedicação.

– Abra, abra, abra! – comando, sentindo-me tão animada quanto se eu mesma fosse a aniversariante – Modéstia à parte, sei que vai adorar!

– Oh, Deus. Não me diga que é um ingresso para assistir A Princesinha? – Lucy está repentinamente afobada, por isso ela agarra a caixa com ansiedade – É pesado! Droga, não é um ingresso da Broadway! Você sabe que eu ficaria feliz com um in...

Sua voz morre, porque seus olhos estão encarando o que a caixa armazena. Lucy retira o objeto lá de dentro com a feição maravilhada.

– Oh, meu Deus! – ela praticamente berra. Desato a rir. – Tipo assim, sério? – seus olhos me encaram surpresos enquanto sua boca está entreaberta num gesto chocado – Como... Como você conseguiu isso?

– Brody me vendeu por um bom preço. Era da avó dele, meio que uma relíquia familiar, porém ele disse que já estava pensando em colocá-la no Ebay. E como eu disse que você iria cuidar dela direitinho, ele concordou em vendê-la para mim.

– É uma FishEye e... – Lucy parece incapaz de domar sua empolgação arrebatadora – Toda colorida! Nunca tive uma câmera analógica tão linda, Rachel! – ela deposita a câmera vintage no colchão, se levanta e, no segundo seguinte, está me apertando com seus braços com intensidade. A parte frontal de seu corpo está colada na minha de um modo que me deixa prensada nela. – Muito, muito obrigada! Obrigada por ser minha amiga também!

Nós nos afastamos, e seus olhos encontram os meus. Eles transbordam excitação, estão elétricos.

– Não precisa me agradecer por isso – eu digo, rindo. Nossos rostos estão tão próximos que sou capaz de enxergar os pontinhos verdes em seus olhos castanhos – Além do mais, você é especial demais para não ganhar um presente à altura. Ainda bem que gostou da câmera, pensei em você no mesmo segundo quando a vi.

– E onde você a viu, posso saber? – ela está usando seu tom provocador, e isso me faz rir mais ainda. Ela se separa de mim para dar atenção ao presente. Toma-o nas mãos e analisa cada centímetro dele.

– Bom – engulo minha saliva com força, porque não sei bem se quero confessar isso; não sei muito bem como ela pode reagir, mesmo que, neste momento, esteja mergulhada num relacionamento instável nutrido por piedade – Fui ao apartamento dele na semana passada – finjo estar ocupada demais retirando o papel manteiga de dentro da caixa o qual embrulhei a câmera com esmero para que não a danificasse para que ela não confira meu rosto avermelhado.

Ela eleva o rosto com rapidez para mim. Está sorrindo e seus olhos estão apertados transparecendo devassidão.

– Não, não mesmo. Sei que está pensando – trato de deixar claro, muito embora saiba que o calor que ainda sinto no rosto não se dissipará com tanta rapidez – Ele me convidou para jantar no pub onde é garçom e, como seu apartamento é justamente em cima do pub, nós só demos uma subidinha. Ele queria me mostrar uns LPS do Elvis. Aliás, tentei comprá-los para você, antes de ver a câmera, mas ele não quis se desfazer deles, e acho que fico feliz por isso. A câmera é bem mais a sua cara – começo a falar sem parar, tentando impedir que haja uma brecha para que ela comente algo que possa me envergonhar ainda mais.

Lucy ainda está com seu olhar que dizer “Você não vai me enganar”. Por isso, mudo de assunto na mesma hora.

– Como estão os preparativos para a festa?

– Esquisitos. Ainda preciso dar uma passada na Party City para averiguar se conseguiram retirar todas as araras antigas do local.

Foi surpreendente saber que a festa de comemoração de seu aniversário será na Party City. Bem, mais ou menos. Será no porão da loja, onde ficam os estoques. A supervisora dela é que cedeu a ela esta surpresa, porque, aparentemente, Lucy é a melhor vendedora da loja e merece uma recompensa. A decoração, portanto, está por conta da loja também. Tudo que Lucy precisou fazer foi lidar com as comidas e as bebidas. Apenas espero que o tema da decoração não seja As Princesas da Disney. Porque eu não sei qual Princesa podia ser. Ela, com certeza, é a Rapunzel, apesar de seus cabelos não estarem mais longos. Há duas semanas, ela me pediu para cortá-los até os ombros e, uma hora depois, saiu do banheiro loira. Aquele tipo de loira natural, aliás. Porém, quando lhe questionei a respeito, ela me disse que, na verdade, é loira, não ruiva. Não que eu já não supunha, já que a tinta avermelhada de seus cabelos estava parecendo meio desbotada, mas não sabia que ela poderia ficar realmente bem loira. Não uma loira maléfica, mas uma loira afável.

Quatro horas depois, Kurt chega de suas aulas extras de dança. Blaine, segundo ele, está no Rainbow – loja de doces na qual trabalha – tentando negociar com a gerente alguns pacotes de cupcakes coloridos para a festa de Lucy. Quando Kurt a abraça e a presenteia, ela solta um gritinho, e posso constatar o porquê: acabou de ganhar o ingresso que tanto desejava para assistir A Princesinha.

– Você precisa ir comigo! – ela me diz na mesma hora – Você subirá naquele palco um dia, precisa me mostrar como tudo funciona!

– Você nunca assistiu a uma peça da Broadway? – meu tom está chocado.

– Digamos que eu não seja muito fã de musicais, porém... Quem é que não leu A Princesinha?

– Não me lembro de ler. Apenas li O Pequeno Príncipe – comento.

– Mais um motivo! E por ser musical, você amará ainda mais a história! – Lucy está pulando na minha frente e, então, me abraça mais uma vez tamanha a empolgação.

– Oh, Deus. Amor demais, meu coração não vai aguentar – Kurt brinca, perto de nós.

– Receba amor também! – Lucy o agarra e o abraça igualmente.

Às 18h estamos prontos para sair do loft. Blaine acaba de chegar, porque teve de cobrir o turno de um colega, portanto nós o esperamos tomar banho e se arrumar. Lucy não para de bater o pé no assoalho, impaciente.

– E o seu namorado? – inquiro.

– Nem venha com essa! – ela rebate.

– Você não o convidou? – Kurt está chocado.

– Não, justamente porque ele não é meu namorado – Lucy explica com rudez.

– O que acontece com vocês meninas? – Blaine sai do banheiro secando o cabelo com uma toalha enquanto tem outra na cintura – Por que não podem sair com um cara legal e se aquietarem?

– Porque esse dito “cara legal” não parece fazer questão de aparecer nas nossas vidas – Rachel diz com sarcasmo.

– Que se dane! – ele replica, indo para seu armário para escolher uma camisa social que não tenha muitos floreios – Não o esperem aparecer, vão atrás dele! Não é isso que o feminismo prega? Vocês são feministas, certo? Ou ainda acham que uma mulher não pode sustentar um homem?

– Isso não vem ao caso – Lucy fala – Quero dizer, eu realmente não quero sustentar um cara. Quem quer? A menos que ele fosse um escritor pobretão, e eu fosse muito apaixonada por ele a ponto de não ligar por vê-lo dormir o dia inteiro e arrancar meu dinheiro para comprar cervejas.

– Pelo que sei vocês já têm os caras nas vidas de vocês – Kurt menciona.

– Quem? Brody? – eu solto uma gargalhada – Jesus, Kurt, você não consegue usar seu gaydar? Ele usa mais maquiagem que eu! Ele parece o Ken, tenho certeza de que evita churrasqueiras e sempre se senta perto de alarmes de fogo.

– O quê, ele é gay? – Lucy desata a rir.

– Não sei, na verdade. Mas ele não é o tipo de cara que eu goste, sabe? Não iria apreciar sair com ele para ouvi-lo dizer que deveria me vestir melhor.

– Você deveria se vestir melhor – Kurt diz.

Faço uma careta para ele.

Blaine retorna do banheiro devidamente vestido e com uma generosa quantidade de gel no cabelo.

– Não estou tão ruim, estou? – sussurro para Lucy, que confere meu vestido cinza chumbo de paetês brilhantes.

– Sinceramente, acho que Kurt quer que saiamos apenas de calcinha e sutiã e cantemos sobre como nós temos o poder feminino e não o utilizamos com bom-senso. Você está ótima, não se preocupe – ela acaba dizendo, me oferecendo um sorriso.

Sorrio para ela também e averiguo seu vestido rosa bebê rodado com decote quadrado e lacinhos nas alças. Agora, aquele pensamento sobre ela ser uma Princesa me ocorre de novo. Com seu cabelo curto loiro, com o vestido gracioso e com os saltos altos prateados Lucy está a menina mais linda que já vi. Mais linda que a Anne Hathaway no final do filme O Diário da Princesa.

– Você também está linda – revelo e acabo percebendo que não editei corretamente a frase na minha mente, pois não pretendia deixar escapar a palavra “linda”. Queria usar “muito bem” ou “bonita”, mas a palavra simplesmente escapuliu de meus lábios antes que eu me desse conta – Quero dizer, ahn, você está legal.

Oh, Deus. Legal. Por que eu não calei a boca?

Lucy não diz nada, apenas volta a sorrir, mas parece distraída demais para se atear ao que eu disse de fato. Ela está preocupada, porque Santana a comunicou, há uns quinze minutos, que ainda está a caminho de casa para se ajeitar e pode ser que chegue um pouco atrasada para a comemoração, levando em conta, especialmente, que Brittany ainda está correndo atrás de um presente que não tenha gatos estampados ou miando, ou algo assim.

Finalmente, deixamos o loft e partimos para a Party City.

O local está iluminado mesmo por fora e posso enxergar pisca-piscas por toda a entrada.

– Uau, parece que vamos entrar no universo dos filmes coloridos do Tim Burton! – Kurt comenta, quando Lucy estaciona seu carro.

– Apenas espero que não tenham contratado nenhum Oompa-Loompa – ela diz, rindo e parecendo impressionada com a produção que vê.

– Quê, está brincando? – Kurt rebate, animado demais – Seria o máximo!

– É meu aniversário, não uma festa de criança!

– É, mas você poderia ser uma das Princesas na ala infantil de um hospital – eu digo, soando bem mais idiota que o normal. Eu preciso calar a boca. Espero que haja muitos cupcakes durante a festa para que, assim, eu fique com a minha boca ocupada e não fique falando coisas insanas para as pessoas. Em especial para a Lucy, porque isso é bem esquisito.

No entanto, não faz diferença. Lucy, mais uma vez, não se importa com o que digo, embora Kurt tenha me lançado um olhar inquisidor – que eu, de bom grado, ignorei, claro. Saímos do carro, e Lucy pega de novo seu celular para conferir se há mensagens de Santana ou de Brittany. Não há e isso a deixa impaciente.

– Eu vou matar essas duas! – ela comenta, andando mais rápido para dentro da loja – Juro que se elas não chegarem em meia hora, vou buscá-las em pessoa!

– Hey, calma. É claro que elas não vão deixar de vir, elas são suas primeiras melhores amigas. – tento atenuar seu ânimo irrequieto.

– É, a Santana prometeu. Quer dizer, eu já me meti em cada fria por causa dela, então é o mínimo que ela precisa fazer, aparecer no meu aniversário não é tão difícil, certo?

– Elas apenas estão atrasadas. E a festa nem começou!

– Repito: vou matá-las se não vierem.

E então ela sai andando de novo, para longe.

– Alguém precisa de uma bebida alcóolica com urgência – Kurt diz para mim, também observando Lucy ir conferir os equipamentos de som. Noto que há um palquinho onde a mesa que sustenta os equipamentos estão.

– Com certeza – respondo.

Ando pelo local para analisar a decoração. Está tudo tão doce, tão bonitinho, tão Lucy! Os coraçõezinhos coloridos caindo do teto e as flores enfeitando as mesas e o globo espelhado lançando cores para todos os lados...

Parece o Dia dos Namorados, mas sem os namorados e sem o chocolate. É uma festa à altura da graciosidade de Lucy, se quer saber.

Aos poucos, a festa vai começando a acontecer. Colegas próximas de Lucy aparecem, trazendo-lhe caixas de variados tamanhos para depois atacarem o champagne e os coquetéis coloridos. Vejo a própria Lucy fazer a mesma coisa. Abastecer-se cada vez mais de bebidas, digo. Arqueio as sobrancelhas diversas vezes, porque a cena não me agrada. Por ter tido uma péssima experiência com este tipo de coisa no colégio, prefiro ficar o mais longe possível de qualquer taça que ofereça álcool e tento policiá-la mesmo à distância. Mas nada surte efeito, pois a ausência de Santana e Brittany a faz ficar impaciente e muito necessitada dos líquidos coloridos.

Enfim, quando as duas chegam, Lucy já está bêbada o suficiente para não conseguir discernir o que deve ou não pronunciar em voz alta. Está alegre demais, saltitante e aborda todo mundo com abraços apertados.

Passa-se algum tempo e minha paciência atinge o limite no momento que vejo Brittany fazendo um strip-tease em cima de uma das mesas e absolutamente ninguém é capaz de refreá-la. Todo mundo apenas fica ao seu redor observando o show. Fico imediatamente horrorizada. Tudo está saindo do controle numa velocidade alarmante.

Estou perto do palquinho, analisando tudo ao meu redor quando alguém me dá uma cotovelada suave nas costas. Fico surpresa assim que encaro a pessoa. É a Santana.

– Parece que alguém não consegue se conter de felicidade – ela diz, indicando uma Lucy rindo alto com um grupo de pessoas.

– Faça sua bruxaria, por favor – peço, aflita.

– Não sou mais a melhor amiga dela, faça isso você.

Imito um som semelhante a um gato raivoso. Estou impaciente demais com a situação para sequer me importar com o tom rude de Santana.

– Pare com essa idiotice. Nunca quis exclusividade, mas espero que entenda o quanto ela também é especial para mim. Por isso mesmo que você precisa fazer alguma coisa!

– Minha namorada está se exibindo de calcinha e sutiã. Acha mesmo que tenho algum controle perante este tipo de circunstância? Deixa-as aprontar, oras! Quem está ligando, além de você? – ela zomba de mim como se estivesse dizendo o quão careta eu sou.

E, certo, isso pode ser verdade, mas quem pode me culpar? Eu sou controladora, não posso permitir que o álcool reflita nas ações ousadas de ninguém! E o que dizer de Lucy? Qual é o problema dela? Nunca a considerei tão... Volúvel! Cadê aquela garota que, há semanas, repele um garoto que a perturba constantemente?

Tudo bem. Se não quer cooperar a sanar este problema...

– Apenas você acha que isto é um problema, Srta. Eu Sou Certinha Demais Para Ter Uma Vida Sexual Ativa – Santana não deixa o momento passar e pontua mais um comentário irritante.

–... Ao menos não o incite ainda mais! – termino minha frase, ignorando sua interrupção – Claramente, todo mundo está descontrolado demais!

– Você deveria se descontrolar também, talvez é disso que precisa. Sair da sua zona de conforto. Entende o que quero dizer?

– Não me importa o que você tem a dizer. Apenas, por favor, me ajude com isso! Tenho certeza de que ela não vai apreciar, amanhã, os relatos do que fez!

– Você sabe, ao menos, por que as pessoas ficam bêbadas? Existem três razões.

Rolo os olhos, incapaz de conter a minha ira. Não acredito que ela vai continuar a falar enquanto Lucy está... Oh, Deus. Ela está subindo no palquinho! Espero que ela não copie a Brittany. Por favor, não tire a roupa também!

– Razão número um: para mergulhar num mundo desconhecido. Geralmente, são as pessoas reprimidas, como você, que se utilizam dele. Razão número dois: para esquecer o mundo no qual vivem, por ser monótono e entediante demais. Pessoas estressadas ficam bêbadas por esta razão. E, enfim, razão número três: para se divertir. E este é o caso que está vendo. Divertir-se é um modo muito corriqueiro em festas, caso não saiba.

– Argh, Santana! – exclamo depois de seu falatório – Não me importo com tudo isso! Apenas... Olhe só! – aponto para Lucy.

Ela, agora, está dançando enlouquecida Girls Just Want Have Fun numa versão remix. Todos estão em frente ao palco aplaudindo. Alguns garotos estão... Bem, sendo garotos. Melhor não mencionar o que estão pedindo.

– Junte-se a ela – Santana sugere – A menos que alguém esteja gravando isso, ninguém irá se recordar amanhã.

Comprimo meus lábios e deixo-a sozinha ali. Rumo em direção ao palco.

– É DISSO QUE ESTOU FALANDO, BERRY! SEJA SEXY E SELVAGEM! – ouço Santana berrar ao longe, mas não tenho tempo para retroceder e dar na cara dela.

Subo no palco e fico frente a frente com Lucy.

– Venha, vamos descer.

– O quê? Por quê? Ah, meu Deus, eu amo tanto você! – de repente, ela me abraça com tudo na frente de todos, sem se importar com nada. Sinto-me esmagada e sufocada – Eu já disse isso hoje?

– Já – afirmo, porque é verdade. A última vez que me agarrou inesperadamente foi há vinte minutos e não parou de dizer o quanto me amava, enquanto eu não pude fazer nada além de tentar afastá-la de mim, sem sucesso algum. Descemos as escadinhas e ouço vaias da plateia porque finalizei o “show” de Lucy – Ao menos você não está quase pelada. Agora, venha. Por favor.

Ela vem comigo, sustentando um enorme sorriso.

– O quê? Você quer que eu tire a roupa? Porque eu posso totalm...

– NÃO! – praticamente grito na orelha dela, desesperada. Oh, Deus. Não permita que alguém esteja filmando isto! Seria humilhante demais! – Você está ótima assim, vestida de Princesa.

– Você me acha uma Princesa? Awn, você é um amor, Rachel! – ela tenta investir contra mim de novo, mas mantenho distância dela.

– É, é. Venha, sente-se um pouco – já estamos perto das mesas desocupadas e a empurro para uma das cadeiras – Fique aqui, ok? Vou procurar algum copo d’água.

Lucy assente, mas acho que não sabe com o que está, de fato, concordando. Finalmente, minutos depois, Santana me encontra e, rolando os olhos, empurra para a minha mão uma taça de algo que ela jura não conter álcool. Cheiro o líquido e constato que é suco de maçã. Não faço ideia de como ela arranjou isso, pois tudo o que percebi nas últimas horas foram garrafas e mais garrafas de vinho, champanhe, saquê e batidas alcóolicas. Agradeço e, quando estou retornando, tropeço na Lucy. O suco salta da taça e boa parte de seu conteúdo banha o chão.

– Lucy! – exclamo, incapaz de conter a minha impaciência. Droga! E agora, o que vou oferecer a ela?

Mas Lucy não parece se importar com nada, mais uma vez. Ela retira a taça da minha mão e a deposita numa mesa próxima.

– Você precisa dançar comigo! – ela agarra inesperadamente minha cintura com uma intensidade sobre-humana para alguém que está bêbada demais para conseguir encontrar os próprios sapatos, sozinha – Você prometeu que dançaria comigo!

Em vão, tento desvencilhá-la de mim ao mesmo tempo em que tento me recordar quando é que prometi algo parecido a ela. Não me lembro de prometer uma dança a ninguém, muito menos a ela. Lucy está blefando completamente. Porém para não irritá-la, ou fazê-la chorar – muitas pessoas bêbadas ficam choronas, e não quero correr o risco de Lucy fazer parte deste grupo e eu, desavisada, acabar com a sua felicidade bêbada – desisto de lutar contra suas mãos e cedo a dança a ela. Percebo que está tocando Always On My Mind.

– Você não adora esta música? Eu adoro esta música – Lucy comenta no meu pescoço. Sinto como se estivesse sustentando todo o seu peso em mim.

Concordo com ela, murmurando baixo. Lucy suspira profundamente, e posso sentir seu tórax subir e descer de encontro ao meu. Ela maneia a cabeça para o outro lado, em direção aos convidados que ainda prestam atenção nela, mas sem demonstrar muita empolgação. Claro que preferiam que ela tirasse a roupa. Insano.

Ainda balançando junto a ela, vejo Kurt e Blaine. Kurt ri para mim, como se estivesse confirmando que me enfiei em uma grande enrascada. Quando encontro Santana perto de Brittany, em uma das mesas, ela me lança uma piscadela bem ao seu estilo.

A canção termina, mas Lucy parece ter adormecido. Afasto-a gentilmente de mim e percebo que seu rosto está evidenciando todo o seu cansaço.

– Hora de ir para casa.

~*~

Péssima ideia.

Droga.

Por que fui abrir os olhos? Fecho-os de novo.

Maldita dor de cabeça, maldita dor no corpo, maldito cansaço. Meu cabelo está com um cheiro péssimo e minha pele parece áspera demais. Minha boca está morrendo por um copo d’água.

Luto para manter meus olhos abertos mais uma vez. Procuro alguma pista sobre quanto tempo estou desmaiada na cama.

1/MAIO, DOM, 11:43H.

A luz vermelha do radio-relógio que me mostra que dia é hoje incomoda meus olhos sensíveis. Preciso tanto me arrastar para fora daqui e buscar um copo d’água! Não acredito que estou sozinha neste loft! Não dá para acreditar que todo mundo tem mais a fazer, além de esperar que eu desperte e vomite o que quer que eu tenha consumido na noite passada.

Estou me sentindo tão mal. Levanto a cabeça do travesseiro para averiguar algum movimento do outro lado da minha cama, onde revela a maior parte do loft.

Oh. Não estou sozinha! Graças a Deus. Porque eu não saberia como sair da cama por conta própria e jogar uma água no rosto. Os três estão ilhados na bancada da cozinha, e percebo que Kurt se inclina para Rachel e diz algo, notando que me movi. Rachel, ao contrário do que pensei, não me oferece um copo d’água, somente caminha até mim de mãos vazias. Umedeço meus lábios, esperando que minha saliva suprima a minha vontade de água.

– E aí, Bela Adormecida? – ela me pergunta, tomando liberdade de se aconchegar no colchão junto a mim – Melhor?

– Defina “melhor” – minha voz sai com dificuldade e bastante rouca. Rachel me lança um sorriso.

– Fiz o melhor que pude, ouviu?

Sento-me na cama, segurando minha cabeça numa tentativa de minimizar a dor que a consome. É aí que percebo que, afinal, não estou vestida. Não muito vestida, quero dizer. Apenas uso uma blusa antiga de alças grossas, mas que gruda demais em mim, e a minha calcinha. Nada de calça, ou de sutiã. Ainda bem que estava coberta com o lençol, assim não devo ter passado tanta vergonha. Apesar de que uma pessoa tão bêbada quanto eu estava não deve sentir vergonha de dormir quase sem roupas. Além do mais, tudo bem. Moro com uma garota e dois caras gays. Não é nada de mais. Certo?

Ah, meu Deus. É, sim. Estou me sentindo perdida e acanhada. Por ter bebido demais, por ter dado trabalho a quem quer que tenha me ajeitado para dormir, por estar acordando com uma cara péssima e por estar quase nua na frente de todos eles.

– Você lutou bastante e quase me afogou na banheira – Rachel está dizendo, e pesco suas palavras com horror – E depois se recusou a se vestir com o pijama que separei e... Bom, acabou assim – ela diz, meio rindo, se referindo à minha blusa e à minha calcinha – Não quis discutir, porque você estava berrando um monte e ameaçou jogar um sapato em mim – seu riso de avoluma, e eu tenho vontade de me enfiar de volta para debaixo do lençol e ficar dormindo até o momento que todos eles varrerem esses episódios de suas mentes – Mas, como eu disse, fiz o melhor que pude.

– Ahn, obrigada. E desculpe – murmuro sem forças.

– Não me importo – ela dá de ombros e com a energia renovada pergunta – Vai querer comer alguma coisa? Você consegue? Não vai vomitar?

– Eu vomitei muito?

– Mais ou menos. Ao menos, acertou boa parte na privada. Vou fazer um chá. Ok? Acho que é melhor, já que seu estômago deve estar meio fraco.

– Obrigada, mesmo.

Rachel não responde e anda até a cozinha novamente. Os meninos sussurram com ela, mas estou dispersa demais para me concentrar na conversa deles. Minha cabeça precisa de mais descanso. Não consigo me livrar da vergonha, porque não imaginava ter de passar por isso. Sempre fui eu quem cuidei de Santana e Brittany quando essas coisas aconteciam enquanto morávamos juntas. Eu gostava de saber que podia me manter sóbria, mas agora? Agora, apenas parece que sou muito irresponsável. Apenas espero que ninguém tenha filmado nada. Porém... E se eu fiz algo bem pior do que minha mente insiste em imaginar? Tenho o direito de saber, certo?

Ok, deixa para lá. Não quero saber. Não quero saber se vomitei em alguém, ou pior, se tirei a roupa e cantei Hot in Here. Não preciso conviver com este vexame. E se alguém souber de algum, realmente, desejo que não venha me relatar.

Não quero esperar pelo chá. Decido que preciso tomar banho, um de verdade. Meu cabelo está necessitando muito de uma boa lavada para retirar este aroma nada agradável. Levanto-me da cama e, mesmo de blusa e calcinha, ando até o pijama que Rachel me disponibilizou na noite passada. Encaminho-me para o banheiro sem dizer nada, apenas com a sensação de que não deveria ter nascido ontem. Ou que, ao menos, deveria ter agido com um pouco mais de prudência.

Após o banho, com direito a sais de banho e muito xampu, sinto-me revigorada. Não cem por cento, mas uns 75. Melhor do que nada, penso. Meu cabelo ainda está úmido e pretendo deixá-lo assim, porque me dá a impressão de que estou muito mais limpa do que realmente estou. Agora estou fedendo a aromas deliciosos de pêssego e menta e erva doce. Nada de vômito, ou álcool. Maravilha. Posso respirar de novo e encarar todo mundo – ainda que me incomode encarar a Rachel, já que agora ela tem a ciência de que, na verdade, sou bem mais complicada do que já presumia. Não acredito que cogitei arremessar um sapato nela! Ela apenas estava me ajudando! E muito menos dá para acreditar que quase a afoguei na banheira! Isso significa o quê, que entrou na banheira comigo? Não, não vou me atear a isso... Vou parar de pensar sobre isso agora mesmo! A vergonha está triplicando depois deste pensamento. Olho-me no espelho e noto que estou corada. Droga!

Rachel, assim que apresento o meu novo estado a eles, me oferece chá de alecrim com boldo. E diz que vai fazer café, mesmo que eu não seja tão adepta deste vício, pois a glicose, segundo ela, ajuda a filtrar o álcool do sangue. Eu concordo com tudo e aceito suas boas intenções.

A tarde é preenchida com musicais. Não reclamo, pois, na verdade, gosto de toda essa atmosfera acolhedora deles. Posso enxergar que estão mesmo preocupados comigo e que não pretendem me deixar sozinha. No entanto, não posso evitar pensar que não quero ficar sozinha com Rachel. Quer dizer, gosto do silêncio das nossas noites juntas – geralmente com ela estudando, e eu tentando compreender a coleção de seus filmes franceses –, mas, agora... Não sei, agora há uma inconstância. Quero fugir dela apenas porque não consigo suportar ver em seus olhos a confirmação sobre sua vaga decepção comigo. Ela pode estar se mostrando risonha e divertida, entretanto eu sinto que está atuando tudo isso, de fato. Por um momento, chego a pensar que ela, tal como eu, não quer se ver a sós comigo.

Blaine é chamado para “dar uma saída” com Kurt, algumas horas depois. Noto que já está despontando estrelas. Devo ter dormido durante algum musical, pois não tive ciência de que o tempo correu tão ligeiro. Permaneço encolhida no meu lado do sofá, com a cabeça pendente no braço. Observo Rachel de esguelha: ela está se espreguiçando, mas mantém o travesseiro sob a cabeça. Nem eu nem ela nos atrevemos invadir o espaço uma da outra. Há muito silêncio; bem mais do que o habitual. Ela se pronuncia primeiro:

– Vou preparar uma lasanha vegetariana, quer me ajudar, ou ainda está preguiçosa demais? – ela usa seu tom brincalhão, e percebo que seus olhos estão cravados em mim. Não há nenhum constrangimento nela. Parece, portanto, que ela não quer escapar de mim tanto quanto quero escapar dela.

– Nós iremos... Fingir que está tudo bem? – ao invés de lhe dar alguma confirmação, sem me dar conta, as palavras escapam da minha boca mais rápido do que previ.

Está tudo bem – Rachel afirma – Não está? – sua expressão muda e, mesmo que não eu possa enxergar direito por conta de sua franja, sei que uma de suas sobrancelhas está suspensa, inquisidora.

– Bem, eu quase a afoguei e quase quebrei seu nariz.

– Não quebrou meu nariz.

– Poderia ter quebrado, caso tivesse jogado o sapato em você – replico.

– Mas você não fez nada! Você apenas disse que o faria. É completamente diferente!

– E o quase afogamento? Como isso se sucedeu? – é doentio que eu queria maiores informações sobre isto, mas não posso negar que o que mais me atormenta é justamente este episódio. A banheira. Eu, Rachel e a banheira, para ser mais precisa.

Rachel abraça seu travesseiro como se ele servisse de escudo conta mim.

– Você apenas me puxou. Eu estava fora da banheira, e você, dentro. Você agarrou a saia do meu vestido, basicamente. E eu quase voei para dentro da banheira com você.

– E?

– E ambas levamos um baita susto, e você pediu desculpas. Foi isso. E antes que você pergunte, sim, você tomou banho e se vestiu sozinha. Eu apenas tratei de abrir o zíper do seu vestido para que você não tomasse banho com ele junto.

– Hum. Entendi.

– Por que tudo isso é tão importante? – Rachel quer saber, expressando seriedade demais.

Sinto-me desconfortável diante dela, porque eu não sei a resposta. Porque, de fato, estou encarando tudo isso como se... Não sei, como se, na verdade, ela não fosse uma garota e não devesse ter me auxiliado.

Oh, meu Deus. Não. Não é nada disso.

A única explicação que me vem na mente é que há exposição em demasiado e que o banho e o meu pijama improvisado envolve muita sexualidade. Não consigo lidar com essas coisas o suficiente para permitir me livrar do constrangimento. O estrago não seria menor se ela fosse um cara e tivesse dito: “Pode tirar a roupa, não estou vendo nada”, mas na verdade estivesse vendo tudo.

Porque, inconscientemente, a circunstância mudou as coisas a nossa volta.

E mudou muito mais do que eu gostaria.

Não há como negar: mudou tudo.


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Notas finais do capítulo

Perdoem-me pelo tamanho deste capítulo, ele realmente ficou maior que o habitual, sei disso. Mas espero que o tenham apreciado! ;) Mereço reviews? Beijos e até o Chapter Thirteen!



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