A Elfa Escarlate escrita por Koda Kill


Capítulo 1
Tietes o caramba.


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.



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Minha cabeça martelava insistentemente. Minhas veias pulsavam de maneira dolorosa. Com a cabeça encostada no vidro gelado soltei um longo suspiro. Vai chover, pensei segundos antes das primeiras gotas deslizarem contra o vidro. Eu estou com tanta raiva que os nós dos meus dedos provavelmente estão brancos e a luva de couro faz barulhos esquisitos. E Isso me irrita profundamente.

Sabe aquele eterno clichê imbecil que todo mundo acha que com eles vai ser diferente. Pois é, troque todo mundo por Eu e você vai entender o que aconteceu. Quer dizer, porque todo mundo acha que elfos são animais de estimação? Não no sentido literal claro. Mas é como se todos fossem uma espécie superior a nós. Tá eu sei que como elfa e adolescente tenho sérios descontroles emocionais. Nós sentimos as coisas muito mais profundamente que o resto das espécies, mas isso não é motivo para nos tratarem como um bebê idiota.

Claro que muitas elfas fazem por merecer. Não é a toa que somos conhecidas como Tietes dos espadachins. Ok, esse é o momento que a ficha cai e você percebe o quão idiota eu sou. É isso ai, uma elfa e um Espadachim... Dá pra ser mais clichê? Impossível. Se um humano ler isso provavelmente não vai entender, então por via das dúvidas eu explico. Espadachins são os seres mais convencidos e arrogantes já existentes na face da terra. E nada melhor do que um troféu fofinho de orelhas pontudas para se exibir por ai. Entendeu agora?

O problema é que somos fofinhas só quando estamos felizes. Eu, em especial, não sou nada fofinha. Na verdade o oposto. Ando sempre com a cara fechada, sou meio mal educada e má humorada confesso, não sou tão bonita quanto às outras... E se você nunca me viu com raiva acredite, não é nada fofo. Então eu inocentemente, leia-se idiotamente, acreditei que poderia dobrar um Espadachim, que eu o faria se apaixonar de verdade. Por algumas poucas semanas pensei ter funcionado, mas isso foi só até eu pega-lo com uma maga cretina. Só de me lembrar da cena uma fúria assassina se apoderava de mim. Agarro um vaso de flores que está perigosamente posicionado ao meu lado e o arremesso do outro lado do quarto, fazendo-o se espatifar contra a parede.

— Luna... – Minhas orelhas captaram o som e se moveram sutilmente.

— Vá embora Cadman. – Falei com a mandíbula travada de ódio. Mais pareceu que eu cuspi seu nome.

— Mas…

—Vá embora! – Grito de maneira perturbadora. – Você é surdo? – Pergunto ríspida. Ele não responde, apenas balança a cabeça negativamente. Até o modo como ele está parado aponta claramente para a sua arrogância. Ele murmurou algo que eu não entendi direito. Apenas compreendo a palavra Elfas. Foi o suficiente para eu surtar. Expulsei-o do local praticamente a pauladas. E sabe o que me deixa mais irritada falando de elfas. É que elfos são sábios, lindos, perigosos e idolatrados e as elfas a porra de tietes? Fala sério! Isso é sacanagem. E ainda mais com espadachins!

Eles são tão cheios de si! “Oh! Você me pegou com outra! Mas eu sei que vai me perdoar... Você não pode viver sem mim! O que queria mesmo querida? Estou meio ocupado no momento.” Que ódio! Acredite a cena seguinte não foi nada bonita. A única coisa que eu digo a respeito é que foi uma grande sorte a garota ser uma maga e se curar rápido. Mas se você se zangar eles usam a desculpa deles para quase tudo. “Elfas elas são tão instáveis!” Instáveis o caramba!

Elfos são conhecidos por serem sábios, mas isso leva tempo. Aqui vai uma dica se quiser poupar um pouco do seu: Espadachins são fúteis, convencidos e não vale a pena sofrer por ele. O que ironicamente é o que estou fazendo no momento. Eu sei perda de tempo. Mas eu dificilmente sigo meus próprios conselhos. Eu tenho a sorte desgraçada de ficar entre duas opções e sempre escolher a errada. Meu carma.

De qualquer jeito ainda sou muito nova para saber realmente de qualquer coisa. Comparada a alguns elfos, sou um bebê. Mas apenas comparada a eles. Quer dizer eu pensei que Cadman fosse diferente, mas ele acabou colocando suas asinhas do lado de fora. O fato é que por mais que eu odeie isso, eu sou só mais uma elfa patética. Arremesso uma adaga contra a parede, mirando em alguns insetos que andavam distraidamente contra a pintura. Eles mereciam morrer por não se juntar e tentar matar Cadman em seu sono. Tá, exagerei um pouco. Mas eu não podia simplesmente pular pra parte legal da vida?

Peguei meu arco prateado e, após lustra-lo como uma louca enforcando um porco atacado, levei-o de volta para o meu quarto. Tirei a pesada armadura que usava, deixando-a cair em um canto isolado, juntamente com o arco e liguei a torneira esperando que uma água no rosto espantasse um pouco a raiva e a frustração. Estava atrasada para minha aula favorita, a de técnicas de combate com o professor Hans. O lado bom era que eu poderia descontar toda a minha raiva no saco de pancadas. Coloquei uma roupa confortável e corri pelo corredor ao mesmo tempo que tentava amarrar meus enormes cabelos desgrenhados.

Provavelmente levaria uma bronca, se duvidar até uma surra no tatame em compensação. Não que eu me importasse muito, eu adorava tudo aquilo. E o professor Hans... Bem ele era meio que meu héroi e eu o adorava. Abri a porta do ginásio devagar, tentando não chamar muita atenção. Mas ninguém estava prestando atenção, mal notarão a minha chegada. A turma estava toda aglomerada no meio da sala e não de um jeito normal quando o professor passava a parte téorica.

De um jeito totalmente “alguma coisa está errada”. E definitivamente estava. Normalmente eu já estaria dando voltas de punição ao redor da sala. Algumas ninfas choravam e o restante da turma parecia meio fora de órbita. Encarei o professor, meu amor totalmente platônico, e seus olhos pareciam triste e cansados.

— Está atrasada Luna. – Seu tom era uma tentativa meio frustrada de repreensão, mas não tinha graça.

— O que está acontecendo? – Me aproximei meio desconfiada e confusa.

— Estou saindo da escola.

— O que? Mas porque? – Aquilo definitivamente havia me pegado de surpresa. Primeiro o problema com Cadman, agora isso? O que diabos estava acontecendo?

— Tive alguns problemas. Mas não se preocupem, amanhã mesmo outro professor virá me substituir. – Minha admiração por ele não era exatamente um segredo, por isso a turma inteira me encarava disfarçadamente. Fechei a cara rapidamente e tentei assumir novamente o controle sem esboçar nenhuma reação.

— Entendo. – O silêncio desconfortável se estendeu. Hans evitava meu olhar e a informação parecia ter chocado a todos.

— Classe dispensada, aproveitem o tempo livre. – Seu sorriso não chegava aos olhos e parecia falso. Ava, minha melhor amiga, agarrou o meu braço e me arrastou para fora.

— Não me olhe assim. – Falei firme, a ultima coisa que eu precisava era de pena.

— Vamos comer algo sim? – Já estávamos perto da cantina de qualquer forma então apenas concordei. – Como ficou a questão do Cadman?

— Argh, nem quero pensar nisso agora. – Revirei os olhos frustrada.

— Ambrosia ou salada? – Perguntou levantando os dois pacotes na minha frente. Agarrei o depósito com salada e me sentei no refeitório.

— É só que isso não faz o menor sentido! Que tipo de problemas o Hans poderia ter? – Não fazia mesmo. Ava começou a evitar meu olhar e ficou estranhamente calada. O que era muito estranho para a pessoa mais tagarela que eu conhecia. – Você sabe de alguma coisa? – Ela apenas enfiou uma grande porção na sua boca. – Você sabe!

Os alunos se espalhavam pelas mesas. As ninfas já haviam parado de chorar e tentavam consertar a vermelhidão com pó de fada, ou sei lá o que era aquilo. O refeitório era um dos lugares mais frequentados do instituto, afinal, não é como se tivéssemos muitas opções. Isso mesmo, pode imaginar grandes jantares românticos rodeados pela escola inteira. Todo mundo aparecia por ali uma hora ou outra.

O clima parecia ainda mais triste apenas com a nossa sala espalhada pelo grandioso saguão. Hans era querido por todos, sem grandes exceções. Fico imaginando que tipo de problemas ele poderia ter tido com a direção. Não poderia ser tão sério, ele era quase perfeito. Milhões de teorias passavam pela minha cabeça.

— Luna? – Chamou Ava abanando a mão na frente do meu rosto. Tirei os olhos do reboco da parede e a encarei.

— Sim?

— Você escutou o que eu disse? – Neguei com a cabeça e enfiei um tomate na boca só para ter algo para fazer.

— Eu ouvi dizer que ele... – Ela se aproximou conspirativamente e abaixou a voz. – se apaixonou por uma humana! – Gelei e engasguei com o tomate. Tossi freneticamente tentado retomar o controle do meu corpo. Demorou alguns momentos até eu conseguir recuperar me fôlego.

— Não acredito nisso Ava, pelo amor dos Deuses é absurdo. Deve ser só fofoca de alguma ninfa dramática. – Eu estava convencida, ou quase. Afastei o prato totalmente sem apetite para continuar. Mesmo sabendo que eu provavelmente me arrependeria depois quando precisasse daquelas calorias.

— Não é fofoca! - Ava levava essa coisa de fofoca muito a sério, ela tinha todo um código de conduta estruturado sobre disseminação de informação. Mas na verdade ela sabia mais fofocas que qualquer um. Qualquer coisa que estivesse acontecendo na escola, pode ter certeza que ela sabia. O que era ate bom, já que eu tinha praticamente zero de ação na minha vida e precisava me entreter com a vida alheia. Ela abaixou tanto o tom de voz que eu quase tive que ler seus lábios. – Eu ouvi uma conversa entre o diretor e o professor substituto. – Olhei ao redor para ter certeza de que ninguém estava escutando. – Ele é amigo do diretor, algum tipo de prodígio ou algo assim e veio o mais rápido possível.

— Espera você já viu o substituto? Onde? Você estava fazendo alguma coisa contra as regras não estava?

— Não tem nada sobre escutar conversas alheias no estatuto Luna. – Falou irônica.

— Ava... – Ela apenas me ignorou com um abano de mão como se aquilo não fosse importante. Nunca era mesmo com ela. Eu não sabia como ela sempre escapava ilesa dessas situações e eu sempre acabava pagando o pato.

— E falando no substituto... Achei ele bem gatinho. – Ela sorriu com malícia.

— Não estou nem ai para esse cara! O problema é como faremos para ter o Hans de volta. – Eu me recusava a aceitar aquilo.

— Luna, acorda! – Falou ela com certa piedade na voz. – Ele se apaixonou por uma humana, está no corredor da morte esperando o julgamento do conselho. Você sabe que essa é praticamente a principal lei do nosso mundo. “Não se apaixonar por humanos”. – Ela deu de ombros. Era muito estranho imaginar isso. Hans era o cara mais correto que eu conhecia.

— Não! – Eu negava firmemente a possibilidade de aquilo ser verdade. – Ele não pode ter sido tão descuidado, além disso ele tem um histórico perfeito, sempre foi um professor incrível... Talvez eles amenizem a sentença. – Ava apenas mexia no seu prato de comida meio distraída. – Você não se importa? – Abaixei o tom de voz. – Ele vai morrer, Ava.

— Eu sei Luna, mas a lei é a lei. Não tem nada que nós podemos fazer. Nós somos apenas estudantes. Ele que foi tolo. Mas tente ver pelo lado bom, pelo menos vamos ter a oportunidade de aprender coisas novas, ou pelo menos de um ponto de vista diferente. E o cara parece ser alguém bem importante isso pode ser bom para a sua carreira. – A verdade é que a coisa toda perdia um pouco o sentido. Isso não era nada bom. Talvez ela apenas tivesse escutado errado. Isso poderia muito bem ter acontecido. Ava 0, negação 1. Levantei rispidamente da cadeira.

— Tenho que ir. – Dei as costas para Ava e a salada que eu mal havia tocado e sai dali sob os olhares curiosos dos meus colegas. Apesar de que eu tinha certeza de que eles já estavam esperando por algo assim. Fui para o meu quarto e depois de trancar a porta tive um pequeno ataque de fúria silenciosa. Eram muitas emoções borbulhando e manter o controle estava difícil, pelo menos ninguém estava vendo.


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Notas finais do capítulo

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