Os médicos e enfermeiros cochichavam em um canto.

"Um dia ela acordou, e saiu perambulando por aí. No outro ela já estava falando e sujando o hospital com sangue!"

"Isso é impossivel!"

"Isso é um milagre!"

"Você já contatou a familia Thompson? O que eles disseram?"

"Infelizmente, ninguém atendeu ainda. Mandarei alguém até a casa deles, mais tarde."

"O que aconteceu hoje? Você pode me dizer?"

"Encontrei-a saindo do jardim novamente. Ela disse estar se sentindo estranha, e notei uma trilha de sangue no chão."

"Sim, e depois?"

"Depois um medico que estava passando naquele momento percebeu que o sangue saia de seus pés. Haviam cacos de vidro espalhado por seus pés. Não sei como ela estava aguentando!"

"Ela não estava sentindo nada? Tinha vidro enfiado em seus pés, e ela não sentiu nada?"

"Tentei levá-la para o quarto, mas ela resistiu. Começou a gritar e a se debater."

"Tivemos que sedá-la. Agora ela está dormindo."

"E os seus pés?"

"Estão enfaixados. Tiramos todos os cacos visiveis, limpamos e enfaixamos. Creio que vá ficar tudo bem."

"Trate de encontrar seus pais. Não é todo dia que alguém desperta de um coma tão longo."

"Sim senhor."

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"Oh, olá, Charlotte! Por que não veio me ver?"

Light Stark irrompeu da janela, adentrando o quarto de uma vez.

"O que está fazendo aqui? Como conseguiu chegar aqui?"

"Huh? Eu só escalei até aqui."

Charlotte continuou muda, fitando-o. Obviamente, continuava surda.

"O que aconteceu com você, hein? Por que seus pés estão enfaixados?" ele apontou para os pés, com uma expressão curiosa.

"Eu os machuquei ontem, depois que conversei com você." ela respondeu, sem muita emoção "Não sei como. A enfermeira parecia estar brava comigo. Eu me assustei e tentei fugir, mas me fizeram dormir e eu acordei em meu quarto." ela tomou um pouco de folego "Você tem algo a ver com isso?"

Ele meneou a cabeça, fitando seus pés. Pousou uma de suas mãos e aperto-os, bem na sola. "Ai... Está doendo." ela reagiu.

"Parece que você recuperou seu tato." ele constatou, mirando-a em seguida "Diga, como gostaria de ser chamada? Senhorita Thompson? Charlie? Lotti?"

"Por que insiste em falar, se sabe que não lhe ouço?"

"Porque é divertido ver seus olhos tentando encontrar uma resposta, mas sem se dar ao luxo de procurá-la."

A garota bufou, como se houvesse entendido. Virou seu rosto em direção a janela. Era estranho finalmente sentir. Sentia o tecido da camisola hospitalar. O cabelo pinicando no pescoço, o colchão nem tão macio nem tão duro, os cortes na sola do pé que latejavam. Se perguntou o que havia acontecido.

Se perguntou quando foi que sua vida havia virado um jogo de questionamentos.

Agora, se perguntou se podia chamar aquilo de vida. Podia sentir, mas não se sentia viva.

"Os medicos disseram que não puderam achar seus pais ainda. Não atendem o telefone, e mandaram alguém até a casa deles. Alguns vizinhos disseram que eles se mudaram."

Charlotte, ainda fitando a janela, cerrou o punho sobre o lençol. Queria entender o que estava acontecendo.

"Thompson... Caso eles tenham desistido de você... Saiba que não vai ficar sozinha. Você não vai ficar, nem está sozinha. Quando o dia em que você se recuperar por completo chegar, e eles não estiverem aqui, eu vou estar."

Ela se virou para Stark. Ele estava sorrindo.

"Tudo bem?"

Ela nada respondeu. Stark não se importou, e acenou para ela, caminhando para a porta.

"Melhor eu ir embora. Você precisa de um longe descanso." antes de fechar a porta, espichou a cabeça para dentro, ainda sorrindo "Tente não quebrar mais nenhum vidro!" e se foi, assim como entrou.

Charlotte deitou-se na cama novamente, contemplando a branca luz da manhã.