Fomos para o fundo, numa esquina de rua, e a noite estava meio congelante. Jade tentou várias chamadas sem sucesso e eu fiquei andando pelos lados. Até que haviam se passado cinco minutos e notei-a tremendo de frio. Tirei meu casaco e estendi para ela.

- Toma, aqui realmente está frio.  – Ela iria negar. – Eu não preciso dele.

- Eu não preciso também. – Jade era bastante cabeça dura. Eu apenas ignorei suas palavras e coloquei o casaco por cima de seus ombros. Sentindo o seu cheiro de baunilha e café. Meu Deus.

Jade me deu um olhar estranho e raivoso. Era como se me dissesse que se eu encostasse nela iria morrer. Tentei sorrir para amenizar a tensão, mas ela continuou fria.

Limpei a garganta. – Para quem tá tentando ligar?

- Minha mãe... – Jade olhou para o celular. – Queria ver se tá tudo bem com ela.

- Algum motivo especial?

- Sim...  Ela e o meu pai brigaram feio antes de eu ter saído de casa e eu tenho certeza que foi todo culpa minha... Ugh, afinal, por que eu to falando isto com um idiota como você?

Feriu meus sentimentos. – Idiota?

- É idiota.

- Por que idiota? Você nem me conhece, Jade.

- Não é preciso conhecer você. – Ela colocou a mão na cintura.  – Você é canadense.

Fiquei quieto. E ela surpresa.

- Ué? Não vai defender sua pátria?

Dei de ombros. – Não... Nunca fui um cidadão muito patriarca. Nunca gostei muito do Canadá, na verdade. Só de hockey.

- Hockey? – Ela perguntou, pareceu animada. – Eu adoro hockey! É uma das poucas coisas que eu realmente gosto.

Começamos a caminhar pela extensão da rua. Ela ainda usava o meu casaco e pareceu ter se esquecido de ligar para mãe.

- E do que mais você gosta?

Jade olhou para o lado, pareceu meio contente de eu ter feito esta pergunta. – Hm... Eu amo tesouras e café preto com dois açucares, eu adoro sangue e filmes de terror, e gosto de dores do tipo bom... – Dores do tipo bom, nossa! -... E acho que é só isto mesmo.

- Uau... – Olhei para os olhos azuis e brilhantes dela na escuridão. – Você parece bastante...

- Assustadora? Inacreditável? Horrível?

- Não! Você parece bastante surpreendente... Por que seria assustadora ou horrível?

- É a maneira em que as pessoas me chamam. – Ela deu de ombros, não ligando muito. Depois disto nos ficamos em silêncio, já que não sabia o que dizer e ela pareceu vagar em seus pensamentos. Tori tinha razão, ela não era tão fria assim.  

- Sinto muito.

- Pelo o que?

- Por seus pais terem brigado um com o outro hoje mais cedo.

Ela sorriu. – Eles brigam o tempo inteiro. É normal.

- Ah.

Logo voltamos para dentro por causa do frio e encontramos as meninas dançando por perto da nossa mesa, com outros dois caras desconhecidos. Jade me devolveu o casaco e sentou-se na mesa.

- Quer dançar? – Apontei para as garotas se divertindo tanto que nem ligaram para a nossa presença.

- Eu não danço.

- Ah vamos lá... Jadey. – Brinquei com um apelido enquanto sentia o cheiro de baunilha em meu casaco.

- NUNCA mais me chame assim. – Ela foi tão fria que eu senti medo. Assenti e olhei mais uma vez para ela, fazendo cara de cachorrinho pidão. – Ugh, tudo bem. Mas é só esta música.

Sorri e a ajudei a levantar, embora Jade tenha me olhado feio e eu imaginei que ela não gostava de gentilezas.

Eu nunca fui um bom dançarino, mas ela não havia percebido isto. Estava muito ocupada com a própria dança. Então Tori largou o seu garoto-dançarino e entrou no meio da gente, se mexendo muito bizarramente. Eu ri dela e então ela voltou a nos dar espaço, rindo de si mesma também.

Logo depois de dançar mais duas músicas fomos para casa porque Cat estava caindo de sono. Infelizmente Jade levou Cat no carro dela e eu fui para casa com Tori.

No meio do caminho, enquanto passávamos pelas ruas escuras, ela me perguntou.

- E o que achou da Jade, maninho?

Hesitei em falar. - Ela é bem diferente das outras garotas.

Tentei ser indiferente em relação a isto, pois Tori era amiga dela e poderia contar a Jade que eu gostava dela e rolaria um clima estranho, já que ela parecia ser uma daquelas pessoas que se afastam de quem gosta dela.

- Gamou nela, não foi? – Tori riu alto, ainda olhando para a rua. – Eu vi o jeito em que você passou a noite inteira olhando para ela. O que aconteceu quando vocês saíram?

- Uh, nada. Ela me contou um pouco sobre o que gostava e logo voltamos para dentro. Você sabe... Ela é muito fechada.

- É eu sei. – Tori ficou em silencio e então voltou a falar. – Viu o gatinho que pediu para dançar comigo?

Assenti meio pensativo e todo o resto do caminho foi passado com Tori falando desse cara.

Eu só sabia que estava louco para ver Jade mais uma vez.

POV Beck.

As férias são minhas e não de Tori. De modo que hoje de manhã ela acordou cedo e foi para a escola, juntamente com minha mãe e o meu padrasto, que saíram para trabalhar. Eu fiquei a manhã inteira em casa, mas poderia sair para algum lugar que desejasse. Desde que não falasse com estranhos (minha mãe pensa que eu ainda tenho 5 anos de idade).

Tori chegou em casa no horário marcado, mas o melhor foi que ela trouxe Jade consigo. Eu tentei esconder o sorriso em meu rosto.

- E ai Beck? – Tori me cumprimentou e mais uma vez, Jade apenas acenou friamente. Pareceu que nem nos conhecemos ontem.

- Oi Tori, oi Jade. Como foi a aula? – Fechei a revista que estava lendo. Tanto Tori quanto Jade jogaram suas bolsas ao meu lado no sofá.

- Ruim demais. – Jade proferiu desanimadamente.

- Boa demais. – Tori disse no mesmo tempo e eu sorri. – Temos que fazer um trabalho em dupla e pensamos que você pudesse nos ajudar.

- Uh, claro. É sobre o que?

- A genética que envolve futuros relacionamentos conjugais. – Jade disse em um tom de desgosto.

- Quer dizer sobre a influencia que os pais tendem sobre os relacionamentos dos filhos? – Tentei ser inteligente.  

- É isto mesmo. A gente precisa gravar um curta mostrando um relacionamento de brigas entre os pais e falar sobre as influências que vão ter no futuro dos filhos. – Tori disse, indo até uma estante e pegando uma filmadora. – Quem sabe você e Jade possam ser os nossos pais?

Eu olhei para Jade. – É, tanto faz. – Ela deu de ombros.

- Tudo bem por mim.

- Ótimo! – Tori deu pulinhos animados.

Estávamos vestidos com as mesmas roupas, embora Tori colocou em Jade um avental florido de minha mãe que ela odiou. Mas tirando isto, ela ainda continuava sexy como sempre foi.

Tori nos disse que éramos para agir no improviso, seguindo uma linha para contar uma história que havia acontecido com a ‘nossa filha’. Era algo sobre o namorado novo dela e o jeito em que ela estava sendo má com a gente.

- Olha só, eu não a entendo! Simplesmente não. A gente botou tanta fé, tanta criação nela... Oh, querido... Eu a ensinei tudo! E ela faz exatamente o que sabia que era errado. Ela só vem para casa para dormir de madrugada e sai antes que o sol nasça, e eu não faço ideia se ela está indo para a escola ou não... – Jade atuava muito bem, ela colocou uma mão na frente do rosto mostrando alarme e fazia uma careta de choro. Tori estava nos gravando num canto. Fiz uma cara mais preocupada ainda.

- Tudo bem, amor. – A puxei para o sofá e a fiz sentar-se lá. – Vai ficar tudo bem com ela, deve ser só uma fase adolescente. Ela está saindo com aquele garoto novo e ele pode ter mudado a sua cabeça, só precisamos fazer com que terminem o namoro.

- Eu não sei a onde eu errei! – Ela gritou, desesperada. Jade era incrível nisto. – É claro que teve tempos onde eu não estava em casa, mas eu sempre a deixei com a babá e ainda que não tenhamos conversado muito, eu a amo e sempre disse isto para ela. Sempre que podia. Eu não sei onde errei... – Ela se inclinou e encostou a cabeça em meu peito. Afaguei seus cabelos.

- Vai dá tudo certo. Eu sei que não fui um pai presente, mas voce sempre esteve lá para ela. É só uma questão de tempo...

- E CORTA! É isto! – Tori levantou a mão no ar. – Parabéns pessoal, foi certinho.

- Ótimo. Agora eu posso tirar este avental ridículo. – Jade meio que arrancou-o e o jogou no sofá. – Só precisa editar, né?

- É. E adicionar um texto sobre isto. Venha me ajudar Jade, lá em cima. – Tori ordenou e já estava subindo as escadas quando percebeu que ela não estava nem um pouco a fim de ir.  – Jaaaaaaaade... O que é agora?

- Eu não quero editar qualquer vídeo. Voce que vai fazer isto. Eu e Beck fizemos a maior parte de todo o trabalho, é com voce agora. Vega. – Ela anunciou indiferentemente.

Tori abriu a boca. – M-M-Mas o que? Jade? Eu fiquei aqui gravando a cena inteira e levei horas para fazer voce aceitar usar o avental. Eu fiz um monte de coisas sim, tá legal? Agora voce precisa me ajudar porque eu não sei muito mexer num editor.

E a garota deitada no sofá apenas riu, e riu alto.

- Parece que voce vai ter um longo trabalho... Querida.

- Uuuuuugh!  - Minha irmã se enfureceu e subiu as escadas batendo o pé com força. Eu achei um pouco malvado da parte da Jade, já que o trabalho é das duas. Mas ela pode estar certa, pois Tori só ficou gravando. E aparecer sendo uma mãe desesperada usando um avental ridículo para a classe inteira já era meio desesperante.

- E aí? Voce que algo? – Perguntei para ela enquanto chegava perto de si.

Jade assentiu. – Sua mãe cultiva flores?

Achei estranha a pergunta. – Sim... Ela deve cultivar.

- Ela tem um vaso de flores por aqui? Que não sentiria muita falta?

- Ela tem vários. – Levantei uma sobrancelha quando vi Jade alargando seu sorriso.

Logo ela estava deitada num dos sofás, com um jarro pequeno de plantas em cima e cortando suas flores com uma tesoura grande. Ela tinha um sorriso lindo e feliz em seu rosto.

- Devo perguntar o porquê está fazendo isto? – Abaixei o volume da TV, esperando desta vez receber uma resposta dela.

- Porque eu gosto.

- É, mas porque você gosta?

- Porque é bom. – Ela deu de ombros e voltou a cortar as flores. Eu tive que revirar os olhos, Jade pode ser tão impossível...

Tori logo voltou lá de cima e perguntou o porque que Jade estava cortando as flores de nossa mãe. Eu dei de ombros e olhei para ela, pedindo explicação. Jade manteu seu silencio e sorriso.

- Bom... De qualquer forma... Jade, voce ficaria feliz em saber que eu já acabei de editar o nosso vídeo?

- Já? – Ela se levantou do sofá surpresa. – Como? Voce nem sabe ligar o computador direito!

Tori fez um careta feia e eu ri. – Mas eu consegui! Sem sua ajuda.

- Ótimo. Quero ver. Coloque para rodar aqui. – Ela se inclinou até a mesa de centro e pegou meu notebook, sem permissão. Tori sentou-se ao lado dela e a entregou o pen drive. – Hmmm... – Jade foi murmurrando enquanto abria o vídeo.

As duas ficaram em silencio enquanto assistiam. Tori olhava tudo muito contente e Jade parecia querer vomitar de raiva.

-  O que é isto? – Ela gritou zangada. Vish.

- É o nosso vídeo. – Tori deu de ombros ainda sorrindo. Jade se enfurieceu mais ainda.

- Não! Não é o nosso vídeo. É o seu vídeo ridículo! – A garota se irritou cada vez mais. – Como voce pode ter feito isto? Que brilhinho de purpurina rosa é este que aparece nos cortes das cenas e porque minha voz tá fininha?

Tori revirou os olhos. – Eu editei, dã.

- Uuugh. – Jade olhou para cima com raiva e eu juro que ela poderia explodir. – Certo, Tori, eu vou editar esta merda de vídeo! Ouviu agora?

- Sim. – Minha irmã assentiu. Eu descobri mais tarde que ela tinha feito isto apenas para irritar Jade e conseguir que ela faça a edição do vídeo ficar boa.

-  E eu vou fazer isto em minha casa. – Jade pegou o pen drive e sua bolsa. Acenando brevemente para a gente e já saindo. Tori ainda estava no sofá.

- Não quer que eu te leve de carro? – Me levantei rapidamente, chamando a atenção dela.

- Não precisa, eu vou a pé. – Ela disse orgulhosa demais. Estava ventando muito e a casa dela poderia ser longe, não queria que fosse sozinha.

- Eu vou com você! – Insisti sem ouvir a resposta final dela. Pegando minhas chaves e o meu casaco, saindo de casa e deixando Tori no sofá.