O Castelo Dos Meninos escrita por Lady Padackles


Capítulo 8
Capítulo 8




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/365628/chapter/8

Os dias foram passando e as atividades dos quatro amigos se normalizaram. Além de roubar merendas, os meninos não fizeram muita coisa além de estudar e passar tempo conversando. Por um tempo até se esqueceram da aposta, principalmente depois do insucesso das duas primeiras tentativas. Mas finalmente o dia de visitas chegara, e com ele o plano de Sam seria posto em prática. O menino começou a se animar novamente, torcendo pelo sucesso da sua empreitada.

Sam correu emocionado em direção aos seus pais e irmã quando os viu adentrar o "Castelo", como a escola era chamada pelos meninos. Deu-lhes um forte abraço, e, feliz, recebeu das mãos de sua mãe uma sacola de guloseimas de todos os tipos.

– Mas guarde para comer mais tarde, filho – Recomendou ela – e sem esganação! - Sei que hoje teremos um almoço especial aqui na escola.

O menino recebeu de sua irmã o embrulho tão esperado, comprado no taxidermista. Piscou para ela e agradeceu o presente. Não abriu, pois não queria que seus pais descobrissem o que era, e correu para deixar o apetrecho assustador, assim como os doces, em cima da mesa de seu quarto. Teria que dar um jeito de colocar aquela caveira no quarto de Dean mais tarde. Agora iria aproveitar a visita de seus familiares.

Os meninos novatos corriam por toda a escola mostrando tudo a seus pais e irmãos. Sam não foi diferente. Queria mostrar cada cantinho do Castelo, que era de fato muito bonito. Pouco viu seus amigos por ali, que também estavam ocupados demais com as visitas. O almoço comemorativo foi oferecido em um imponente salão de festas, onde todos puderam se deliciar com iguarias dos mais diversos tipos. Para acompanhar, um show de música e dança. O tempo passou depressa.

Quando finalmente seus pais e irmã se foram, o menino correu para o quarto e abriu o embrulho macabro. Era a caveira de um burro, não muito grande. A irmã incluíra, de brinde, uma vela preta enorme. Sam gostou do que viu.

Enfiou os dois dentro de uma sacola, pegou uma caixa de fósforos e saiu dali correndo para o quarto de Dean. Quando lá chegou, o menino enfiou o ouvido na porta para se certificar de que estava vazio. O silêncio reinava. Tinha aprendido um jeito de destrancar a porta com um grampo, e foi isso que fez. Entrou sorrateiramente e montou seu ritual macabro na pia do banheiro: a caveira com a vela preta em cima. Acendeu a vela, que era tão grande que provavelmente levaria alguns dias para se queimar por completo. Já estava se retirando quando começou a ouvir passos no corredor.

Os passos se aproximavam, e Sam, instintivamente, se enfiou em baixo da cama de Dean. Estava completamente escondido quando bateram na porta.

– Vallery, esse é o quarto do Dean – Sam ouviu uma voz feminina dizer. Sam reconheceu a voz da professora de Química, Mrs White.

– Dean, querido! – disse a professora batendo novamente.

Sam então ouviu a porta se abrindo.

– Ele deixou a porta destrancada. Esses meninos as vezes são muito distraídos. Pode entrar, Vallery, eu vou levar apenas um minuto.

Miss Vallery Porter era a nova professora de Francês, e Sam imaginou que Mrs White devia estar aproveitando aquele dia para lhe apresentar a escola. O menino manteve-se imóvel, respirando lentamente. Se fosse pego ali estaria encrencado, principalmente depois que descobrissem a caveira.

Sam então voltou a prestar atenção no que as mulheres falavam.

– O Dean é um ótimo menino, Vallery. É muito comportado e estudioso. Você tem que ver como é bonito também... O pobrezinho perdeu a mãe há uns quatro anos, e no ano passado perdeu também o irmão, que era um pouco mais velho que ele. Veio para essa escola logo em seguida.

– Nossa, que trágico, pobre garoto! – respondeu Vallery com uma voz piedosa.

– O pior de tudo é que o pai não o visitou desde então, e o menino não tem mais ninguém além dele.

– Nossa, e por que isso?

– Eu realmente não sei, agora que eles só tem um ao outro deveriam ficar unidos...

– Nossa, deve ser muito difícil para o garoto – suspirou a professora novata.

–Com certeza. Eu fico com pena... Então vim deixar uns docinhos aqui para ele. Vou deixar um bilhete, acho que ele vai gostar de receber alguma coisa.

As professoras ficaram em silêncio por alguns segundos, enquanto Mrs White escrevia o bilhete. Sam sentiu seu coração apertar. Lembrou daquela melodia tão triste que ouvira Dean tocar dias atrás. Devia ser muito difícil para ele ver os outros garotos receberem visitas, e doloroso se lembrar da mãe e do irmão mortos.

– Vou deixar em cima do piano – disse a professora. – Engraçado, não vi o Dean hoje – continuou ela a dizer, pensativa. – Onde será que esse menino se enfiou?

Sam gelou. Ele então se tocou que também não havia visto Dean o dia todo. Não o vira pela escola, não o vira na hora do almoço, em momento algum... Onde estaria? Ele sabia. Só podia estar na praia, seu cantinho especial.

As professoras então se retiraram. Sam olhou no relógio: eram quatro e meia da tarde. Dali a pouco tempo o sol estaria se pondo. Dean deveria estar voltando... Será? Sem pensar em mais nada Sam saiu dali e foi correndo em direção ao murinho que dava acesso à praia. Nem sinal do colega. Então Sam pulou, e, determinado, foi descendo despenhadeiro abaixo. Não deixaria ele ali embaixo sozinho. Fora o próprio Dean quem lhe dissera como era perigoso subir aquilo tudo no escuro. Na verdade, era quase impossível, pois mesmo com claridade era uma caminhada difícil de se fazer.

Enquanto descia, Sam pensava em Dean. Ele nem podia imaginar como deveria ser doloroso perder a mãe com tão pouca idade. E em seguida o irmão... Sentiu uma profunda tristeza ao pensar o quanto Dean era solitário. Por baixo daquela camada protetora, da atitude de superioridade, o louro era provavelmente apenas um menino assustado e triste. E onde estava o pai dele? Por que o deixava sozinho? Sam sentiu raiva. Ele deveria ser obrigado a ir até a escola ver o filho, pensou.

Quando Sam finalmente chegou à praia, estava cansado, mas não parou nem um segundo para respirar. Seguiu em direção à gruta, e sua certeza de ver Dean por ali era tão grande que não demonstrou nenhuma surpresa quando o encontrou sentado na areia. Dean estava rodeado por três ou quatro telas de pintura, e parecia muito pensativo. Ouvindo os passos do colega, Dean pareceu despertar e olhou para ele surpreso. O louro tinha um semblante cansado, e pareceu a Sam que ele estava ali há horas.

Então Sam olhou Dean nos olhos e enxergou toda a dor, fragilidade e humanidade que nunca havia percebido antes. Tudo o que procurara desesperadamente estivera ali o tempo todo, estampado naquele olhar. Sam podia enxergar a alma de Dean através dos seus olhos agora, seus olhos úmidos e avermelhados.

– Venha, eu vim te buscar. Já vai escurecer – Sam então disse docemente.

Dean olhou para ele assustado, e em seguida olhou em direção às próprias mãos. Foi então que Sam percebeu que Dean não estava só. Entre seus dedos o menino segurava um pequeno ratinho cinzento.

Sam se espantou quando viu o roedor e deu um pulinho para trás. Dean se explicou.

– Eu o encontrei no meu quarto, e estou cuidando dele. Por favor, não conte a ninguém. Eles não permitem mascotes na escola.

Sam assentiu, sorrindo por dentro. Então aquele tinha sido o destino do rato sortudo. Não contaria sobre ele a ninguém.

Talvez Dean devesse ter achado a atitude de Sam estranha. Por que o moreno haveria de perder seu tempo indo procurá-lo lá embaixo? Por que se preocupava com ele? O fato é que o louro, sem dizer mais nada, simplesmente pôs-se a guardar os quadros dentro de um baú que tinha escondido na gruta. Em seguida pôs o ratinho no bolso e seguiu atrás de Sam na escalada.

Dessa vez, apesar da difícil caminhada que tinha pela frente, Sam subiu determinado e incansável. Ele percebia, entretanto, que Dean estava esgotado, e por vezes achava que ele poderia desistir. Por mais de uma vez Sam virou-se para trás e segurou a mão de Dean ajudando-o a subir quando o caminho tornava-se exigente demais. Fizeram todo o percurso em silêncio. Não era preciso dizer nada.

Quando alcançaram o topo, ainda sem nada a dizer, seguiram em direção ao dormitório. O quarto de Dean ficava no caminho do de Sam, então passaram pelo quarto do louro primeiro.

Dean parou em frente a porta de seu quarto e pegou a chave para destrancá-lo. E foi aí que Sam se lembrou da caveira no banheiro. Sentiu um arrepio subindo por todo seu corpo. Dean estava fragilizado e cansado, a última coisa que precisava era dar de cara com uma caveira de burro rindo para ele. Não, ele não podia ver aquela caveira!

– Dean, me dá licença, eu preciso ir ao banheiro – pediu Sam sem graça e com a voz trêmula.

Dean deixou o colega entrar no quarto, porém antes que Sam pudesse fazer alguma coisa, enxergou uma luminosidade estranha vindo do cômodo. O louro olhou para dentro e viu a caveira iluminada pelas chamas da vela acesa.

Dean então olhou para a caveira e depois para Sam, que estava em estado de pânico. Ascendeu a luz para ver melhor do que se tratava e então, inesperadamente, começou a rir.

– Você pensou que eu ia me assustar com isso? Como você é bobo, Sam! – o louro disse entre risadas. E depois começou a rir ainda mais. Seus olhos verdes agora brilhavam, mostrando uma diversão contagiante. E Sam pôs-se a rir com ele. E os dois meninos riram juntos por algum tempo, que pareceu a Sam uma eternidade. Só então Dean falou, sorrindo e de forma amigável.

– Vai! Recolhe esse troço daqui! Eu não quero essa caveira de burro no meu banheiro. – e entregou uma sacola plástica nas mãos de Sam.

O moreno então apagou a vela e guardou os objetos na sacola. Dean o acompanhou até a porta. Despediram-se em silêncio, através de olhares cúmplices.

Andando pelo corredor em direção ao seu quarto, Sam não conseguia conter um sorriso. E naquela noite não pensou em outra coisa senão nos olhos de Dean e em tudo que eles revelavam.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Pois é, eu queria fazer um video com a música "The Lonely Man", aquela que o Dean tocou no piano. E aqui vai o link para o video que fiz, espero que consigam entender a história que o "tentei" passar. Adoro essa música! www.youtube.com/watch?v=Brdl3-k4VIM&hd=1