Diários escrita por Tai Bluerose


Capítulo 5
Diários de Ciel 4: Quando a Amizade Vai Além


Notas iniciais do capítulo

Como prometido, estou de volta e não demorei um ano.
Espero que gostem ^w^
Boa leitura



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Diários de Ciel 4: Quando a Amizade Vai Além

Como podemos perceber, a doce amizade do dono do nosso precioso e antigo diário com o jovem rapaz, Sebastian, vai ficando cada vez mais próxima. Nós, que lemos hoje, podemos perceber que as nuances dos sentimentos do jovem Ciel aqui registrados, vão além do que ele mesmo compreendia. Mas é simplesmente encantador ler como as coisas vão crescendo e se desenvolvendo.

Nessa parte do diário que colocarei a sua disposição, Ciel começa, ainda que lentamente, a sair de sua ostra de ingenuidade.

Em algum momento entre os últimos relatos que mostrei a você e estes que apresentarei agora, Ciel deve ter reatado sua amizade com Alois Trancy, pois o loirinho volta a ser frequentemente mencionado no diário. E acredito que essa reaproximação foi crucial não só para Ciel, mas para Sebastian também.

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3 de Março de 1889

Hoje, quando fui abrir meu livro para estudar, encontrei uma carta dentro dele. Fiquei surpreso, porque ainda não tinha falado com meu amigo naquele dia, nem sei em que momento ele colocou a carta ali. Havia muitos alunos na biblioteca, então, levantei e fui até uma das estantes mais afastadas, como se fosse procurar algum livro. Em privacidade, abri o envelope e li a carta.

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Meu caro amigo Ciel,

Estou escrevendo para você esta carta apenas para falar-lhe bobagens. Simplesmente acordei esta manhã, desejoso de escrever algo. Mas, como bem sabe, no Instituto não acontecem grandes coisas, e o pouco que acontece, todos ficamos sabendo de imediato. Não há novidades. Então, o que eu iria te contar? Sobre o que escrever?

Eu sei que é meio inusitado, mas... Deve ter notado, assim como eu, que recentemente não tivemos tempo para nos ver tão frequentemente como antes. Devido aos estudos, estamos sempre indo para lá e para cá, nos desencontrando. Pena não estarmos na mesma sala.

Suas histórias sobre a Índia, sinto a falta delas! Adorava ouvi-lo contar as lendas daquela terra exótica, suas aventuras com seu amigo, o Príncipe Soma. Como vê, eu estava realmente prestando atenção a cada palavra sua.

Você é uma pessoa tímida, e sei que não gosta de escrever, mas, eu realmente gostaria de conhecer-te melhor, assim como gostaria que você me conhecesse melhor. Então tive a ideia de escrever sobre nossas vidas fora daqui.

Vai ser ainda mais divertido se você participar dessa brincadeira que lhe proponho. Não terá graça se apenas eu escrever. Não quero forçá-lo a nada. Escreva apenas quando desejar e se desejar. Mas, lembrei-me de como fiquei feliz quando recebi sua carta nas férias, e pensei como seria maravilhoso sentir isso novamente. Acho que estou sendo egoísta. Mas seria um ótimo exercício de escrita para nós dois.

Além disso, o importante é mantermos contato sempre. Então, não importa o que vai escrever, apenas escreva.

Escrevi tudo isso para dizer-te outra coisa, mas acho que acabei me perdendo. O sol ainda nem nasceu e ainda estou meio sonolento. Mas tive essa ideia maluca. O que me diz?

Saiba que por mim, está tudo bem se não quiser escrever, contanto que eu possa escrever para você.

Seu sempre amigo, Sebastian

4ª/parágrafo

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Ele colocou uma nota estranha na ponta da folha, mas não entendi o que significava. Achei que ele quisesse que eu lesse o 4º parágrafo novamente, mas não percebi nada além do que já estava escrito.

Os professores dos alunos mais velhos estão realmente deixando-os muito ocupados, só consegui conversar com Sebastian no finalzinho do dia.

– Você escreveu uma carta para mim? – perguntei a ele.

– Sim. Não gostou?

– Gostei, mas... Você poderia ter vindo falar comigo.

– Eu senti vontade de escrever. Além disso, há coisas que eu não consigo dizer com palavras, escrever é mais fácil. Mas se te incomoda, eu paro... – ele acrescentou subitamente preocupado.

– Não! Eu adorei! – falei energético demais. Eu havia adorado a ideia de escrever sobre nós. Só depois daquela carta, é que eu percebi que não sabia muitas coisas sobre o meu amigo. Eu sabia alguns detalhes, como o nome dos pais e das irmãs dele, o que ele gostava de ler, mas queria saber mais. Gostaria de conhecer melhor o Sebastian como pessoa. Sentia que a escola podava um pouco nossa relação. – Eu só... Não sei se conseguirei respondê-lo, não sou tão bom com as palavras como você. Mas eu adoraria receber cartas suas.

– Não precisa responder. Apenas me diga depois o que achou – ele falou.

Mas é claro que eu me esforçarei para escrever algo para ele. Afinal, ele é um idiota bajulador, sei que se eu não fizer isso, ele ficará sentido. E eu odiaria vê-lo triste.

– Oh, sim. Você anotou no canto da carta “4ª/parágrafo”, o que significa – quase me esquecia de perguntar.

– Nada importante, apenas uma nota sem sentido.

Podia jurar que ele ficou um tanto corado.

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7 de Março de 1889

Eu dormia profundamente quando fui despertado por alguém sacudindo o meu ombro de leve. Abri os olhos assustado, eu não conseguia distinguir o rosto da pessoa, pois estava muito escuro. Tudo o que eu via era o seu contorno. Senti minha boca ser coberta por uma mão, que me impediu de fazer qualquer barulho e uma voz coxixou bem baixinho perto do meu ouvido.

– Ciel, sou eu, Sebastian – ele falou tão perto do meu rosto, que eu podia sentir sua respiração. Ao saber que era ele, meu coração se acalmou imediatamente. – Vem comigo. Quero te mostrar uma coisa.

Eu sei que sair do dormitório a noite é proibido, mas naquele momento eu nem pensei duas vezes. Levantei-me com todo o cuidado para a cama não ranger, nem calcei os sapatos, sai descalço mesmo. Ele segurou a minha mão e sussurrou para que eu ficasse bem perto dele. Fiquei muito agradecido, porque eu não conseguia ver nada. Eu segurei no braço dele e ele me guiou para fora do quarto sem nem esbarrar em cama ou qualquer objeto deixado no caminho pelos alunos menores.

No corredor, eu já conseguia ver alguma coisa, pois a luz da lua atravessava as cortinas. E o Sebastian começou a rir. Zombando por eu ter me assustado quando ele me acordou. Eu dei uma bronca nele, ele também se assustaria se fosse acordado assim.

– Trouxe-me aqui apenas para rir de mim? – cruzei os braços, irritado. Sebastian apenas sorriu para mim, um sorriso e um olhar diferentes, quase contemplativo. Tive a estranha sensação de que ele gostava de me ver irritado.

– Desculpe, não fique bravo. Eu não arriscaria colocar nós dois de castigo apenas para fazer uma brincadeira idiota. Quero mostrar-lhe algo. Venha!

Ele estendeu a mão para mim, e eu a segurei. É estranho como me sinto perto dele. Sinto-me forte, como se pudéssemos vencer o mundo juntos; e ao mesmo tempo, me sinto vulnerável, como se precisasse ser amparado por ele.

Caminhamos até uma sala que eu nunca havia entrado. Ele tirou uma chave de dentro da calça do pijama e abriu a porta enquanto me contava como fizera para conseguir uma cópia da chave sem que ninguém descobrisse. Ele queria me mostrar uma luneta, que nosso antiquado professor, jamais apresentou para qualquer turma.

– Consegue acreditar nisso? Uma preciosidade dessas ao nosso alcance, e os professores deixando esquecido aqui, entre as teias de aranha e a poeira – ele abriu uma das janelas da sala, com cuidado para não fazer barulho, embora eu duvidasse que alguém pudesse ouvir qualquer barulho dali, estávamos muito longe dos dormitórios.

Ele colocou a luneta sobre o tripé, ajustou a posição para o céu e me chamou para que eu olhasse. Era incrível a quantidade de estrelas que conseguia ver! Milhares e milhares de pontos brilhantes. Sebastian começou a falar o nome de várias estrelas e constelações, que agora nem lembro mais. Ele ajustava a luneta para as posições corretas, para que eu pudesse ver cada uma. Achei incrível a empolgação dele me explicando tudo, e como ele é inteligente por saber todas essas coisas.

– Você já veio aqui antes? – eu perguntei.

– Descobri esse lugar há dois anos. Você é a primeira pessoa que eu trouxe até aqui – ele confessou.

– Devo me sentir especial por isso? – perguntei animado. Ele levantou os olhos da lente da luneta para mim, e me olhando com certa surpresa, falou:

– Sim, muito.

Eu senti meu rosto corar. Ele desviou os olhos de mim, e foi colocar a luneta de volta no lugar.

– Precisamos voltar. Você vai acabar ficando resfriado andando descalço – ele falou. Confesso que tinha até esquecido desse detalhe.

Voltamos para o dormitório. Ele ia à frente para conferir se não havia ninguém pelo caminho. Em certo ponto, onde o corredor fazia uma curva para a direita, Sebastian parou, e tentou me impedir de seguir.

– Vamos ter que dar a volta, Ciel – Sebastian falou, quase gaguejando. Não tenho certeza, pois estava um tanto escuro, mas acho que ele estava vermelho.

– Eu sei que você nos viu Sebastian, quem está aí com você?

Era a voz do Alois. Eu contornei Sebastian e vi Alois e aquele garoto mais velho, Claude. Pensei que Alois odiasse aquele garoto, eles viviam discutindo, mas ali estavam os dois, juntos. Embora Claude estivesse com uma expressão de aborrecimento.

– Ora, ora... Pelo visto, nós não somos os únicos que saímos para brincar – Alois falou sorrindo.

– Brincar? – indaguei confuso.

– É claro que não. Ciel não é como você – Sebastian falou.

Alois riu.

– Tem razão, o Ciel não é.

Sebastian olhou furioso para os dois.

– Não pode nos denunciar, Michaelis, ou contamos que vocês também estavam aqui – Claude falou pela primeira vez.

– Não pretendia dizer nada a ninguém – Sebastian falou entre dentes.

– Sabemos que não – Alois disse.

Sebastian e eu seguimos para o dormitório. Ele continuava em silêncio, eu percebi que ele tinha ficado muito incomodado. O que quer que Alois e Claude estivessem aprontando, deixou Sebastian perturbado, e nunca imaginei ver Sebastian daquele jeito.

– Sebastian... o que eles estavam fazendo?

– Nada. Não importa.

– Ei, está tudo bem? – perguntei segurando a mão dele. Ele olhou para mim, e senti pesar naquele olhar.

– Sim, meu amigo – ele se esforçou para sorrir. – Volte para sua cama, amanhã nós conversamos.

Foi só o que ele disse, e seguiu para o seu próprio dormitório. Confesso que fiquei tentado a voltar para espiar Claude e Alois, mas não queria me meter em encrenca. Minha pequena aventura com o Sebastian tinha começado tão bem e ele estava tão feliz, agora ele parecia tão perturbado. Senti que eu tinha que fazer algo para mudar aquilo, mas eu simplesmente não sabia o quê.

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09 de março de 1889

Hoje, eu quase discuti com o Alois na sala de banho. Todos os alunos tomam banho e se trocam naquela sala. Eu acabava de sair da ducha enrolado numa toalha, Alois estava ao meu lado. Pegamos nossas roupas secas no armário e ficamos ali, ainda molhados, participando da conversa de alguns alunos. Falávamos do jogo de críquete daquela tarde.

– Vai abrir um buraco se continuar olhando desse jeito, Michaelis – Alois falou repentinamente com um sorriso maldoso, pegando a todos de surpresa. Alguns alunos riram.

Virei-me, e meus olhos cruzaram com os de Sebastian. Ele estava sentado num banco mais a frente, perto do roupeiro dos alunos mais velhos, cabelo molhado e a camisa ainda por fechar os botões. O rosto dele estava levemente vermelho, não sei se de vergonha ou de raiva do Alois.

– Ficou doido, Trancy? Eu não estava olhando para você – Sebastian falou irritado.

– Eu sei que não era pra mim – Alois respondeu com um visível tom de ironia, todo brincalhão.

Sebastian trincou os dentes, olhou furioso para o loiro e para mim. Ele resmungou alguma coisa, pegou sua toalha, os sapatos e se retirou da sala de banho.

Depois que estávamos vestidos e saíamos do quarto de banho, fui falar com o Alois.

– Por que você fica importunando o Sebastian?

– É divertido – ele gargalhou, depois olhou-me de um jeito malicioso, e sussurrou em meu ouvido. – Ou vai dizer que nunca reparou que ele sempre fica olhando para você?

– Ele cuida de mim. Não quer que os alunos encrenqueiros me incomodem.

– “Cuida”, pois sim. Sabe quais as regras da escola sobre aceitar protetores, não sabe? Ninguém aqui vê com bons olhos os alunos que se submetem a outros.

– Eu não estou me submetendo a ninguém!

Acabei falando um tanto alto, os outros em volta olharam para nós. Alois fez sinal para eu fazer silêncio. No pouco tempo em que eu estava naquela escola, já havia aprendido que todos ali associavam a submissão ao sexo feminino. Um professor explicara que nenhum menino deve se submeter a outro, pois aquele que se submete é tão franco quanto uma mulher, e isso é vergonhoso para um cavalheiro. Quando o professor explicou aquilo, primeiro, achei um pouco injusto com as mulheres, acho que quem criou essas regras não conhecia minha tia Frances e minha prima Elizabeth, que são muito fortes, muito menos Abhilasha, uma jovem de 16 anos que conheci na Índia, que domou sozinha um elefante bravo. De qualquer forma, aqui na Inglaterra, ser comparado a uma menina é uma ofensa, por isso, em segundo, percebi porque todos ali tratavam tão mal o Alois. Trancy age como menina, mas é o jeito dele, ele não se importa com isso, e eu achava que não tinha problema, afinal é o jeito dele. Só acho um pouco irritante ele ser tão grudento e falador, como Lizzy. Mas todos aqui não aprovam o comportamento dele. Em resumo, ser chamado de submisso é ser chamado de fraco e efeminado, se alguém te chamar disso, você deve ficar irritado. Se você não se irritar é porque você concorda com aquilo.

– Não se preocupe, não estou te julgando. Além disso, não é vergonha e não há nada de errado em ser submisso , se for por alguém que você realmente... “admira”. Você admira o Sebastian, não é mesmo?

– Bom, sim.

– Imagino que ele seja um bom amigo.

– Claro que sim. Mas...

– Então que mal haveria em agradar um bom amigo?

– Agradar como? – perguntei intrigado, pois tinha a estranha impressão que Alois falava uma coisa, mas insinuava outra.

– Ele está sempre fazendo coisas para você, faça algo para ele também. Meninos gostam de ser bajulados. Se você não fizer nada para recompensá-lo, ele pode achar que você é um amigo egoísta, que só está com ele porque ele te protege.

Depois que Alois me disse aquilo, fiquei pensando se eu não estava realmente sendo egoísta com o Sebastian. Ele está sempre tentando me agradar, às vezes até de mais, e tudo o que eu faço é dizer obrigado. Ele me pede para escrever para ele, e nem isso eu consigo fazer. Não sou muito bom em demonstrar ou falar o que eu sinto. Será que ele espera mais de mim?

Mas fazer coisas para ele não seria justamente ir contra as regras, me submeter, como uma menina? Será que já não estou fazendo isso, o deixando segurar minha mão? Mas não é só para agradá-lo, eu gosto da sensação. Eu sinto... Mas nós somos amigos, qual o problema? Mas... Se não é errado, porque fazemos aquilo escondido?

Estou tão confuso.

Não sei o que fazer ou o que pensar, nem como me sentir.

Achei que estava começando a me adaptar a esse país, as pessoas e as regras, mas está tudo confuso novamente. Não consigo entender as pessoas, não consigo me entender. Quem me dera poder conversar com minha mãe ou com meu pai. Talvez eles saberiam como me ajudar.

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10 de março de 1889

Hoje conversei com o Sebastian sobre o incidente de ontem. Desde aquele momento, não nos falamos e tive medo de que ele estivesse zangado comigo. Ele estava sentado sob uma árvore, me aproximei e sentei ao lado dele. E perguntei se ele estava ressentido comigo por causa da brincadeira do Alois, disse para ele não dar importância para as provocações do Trancy. Alois importuna todo mundo.

– Não estou bravo com você, Ciel. Precisava apenas de um tempo para pensar.

– Pensar em quê? – eu perguntei.

– Coisas sem importância – ele falou como se não fosse nada, mas ele parecia distraído. – Quer ler um livro comigo?

Ele mostrou um exemplar de Vinte Mil Léguas Submarinas.

– Sim. Eu leio – falei pegando o livro das mãos dele e começando a ler em voz alta.

Geralmente é ele quem lê para eu escutar, mas hoje o achei meio cabisbaixo. Depois de meia hora, ele pediu para continuar a leitura. E entreguei o livro para ele. Gosto de ouvir a voz dele quando lê.

Dessa vez, eu tomei a iniciativa de segurar a mão dele. Ele gaguejou um pouco em sua leitura, apertou mais minha mão e continuou a ler. Por um milagre, conseguimos ficar ali sozinhos por duas horas sem ninguém nos incomodar.


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Notas finais do capítulo

GOstaram?

A carta do Sebastian contém um segredo, um sorvete e uma medalha de detetive honorário pra quem descobrir.
Pode até não parecer, mas Alois será o salvador da pátria XD.

Logo responderei os comentário. Desculpe por demorar tanto para respondê-los.

Obrigada a todos que comentaram.
Beijos da Tai



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