A colheita foi rápida para mim, porque depois de terminarmos nosso percurso num piscar de olhos, Ian deu um jeito para que pudêssemos escapar sem ninguém perceber. E isso tinha acontecido logo depois de ele trombar com Jared, e eu esperar por uma briga, que não veio porque novamente Jeb interviu. Então logo depois, ele veio para perto de mim e me puxou para seu quarto.

Seu rosto estava calmo, mas eu sabia que ele estava escondendo algo e só esperaria a hora certa para interrogá-lo sobre isso. Sentei em sua cama e em seguida ele deitou sua cabeça em meu colo. Pude perceber que sua expressão passiva estava sumindo e que suas sobrancelhas estavam se juntando no centro de sua testa, passei meus dedos por lá e comecei.

- O que está acontecendo?

- Nada. - Ele arqueou os ombros, sem levantar os olhos para me encarar. Mas eu insisti, sabia que algo o incomodava e queria saber o que era, para quem sabe, poder ajudar.

- Eu sei que está acontecendo algo. - Murmurei, passando meus dedos pelo seus cabelos. - Vi Jeb falar com você e Jared, agora pouco.

- Ele só veio falar sobre a colheita.

- Não me pareceu isso. - Rebati. - Porque não quer me falar?

- Porque não é importante. - Devolveu, puxando uma de minhas mãos para perto da sua, e a apertando.

- Parece importante para você. - Murmurei. - Então acho que é importante para mim também.

- Você não desiste nunca, não é? - Ele riu. Não uma risada alegre, uma risada de derrota. - Jared acha que viu Buscadores pela região, hoje mais cedo. 

Senti meu coração falhar uma batida, mas procurei não demonstrar meu nervosismo, respirando profundamente antes de perguntar.

- O que eles podem querer?

- Boa pergunta. Pensei que eles tinham desistido. - Murmurou, dando de ombros novamente. 

- O que Jared acha?

O rosto de Ian se tornou rígido antes mesmo que sua boca se abrisse para responder. Acariciei o contorno de sua mão com os dedos, numa tentativa boba de acalmá-lo.

- Não importa o que Jared acha. - Resmungou em seguida, se sentando na cama.

Naquele instante eu poderia ter me sentindo negada, se não fosse a gravidade do problema. Ian pensava que eu queria saber, porque Jared tinha dito, mas não era verdade. Eu só queria saber o que estava acontecendo, queria saber a opinião de qualquer um que fosse.

- Ian, eu estou preocupada. - Toquei seu rosto, ele não se encolheu ou se afastou, o que levou todo aquele sentimento negativo embora. - Só quero saber o que está acontecendo.

Essa foi a minha deixa. Ian suspirou se rendendo e murmurou, pouco mais alto que um sussurro.

- Ele acha que... - Mais um suspiro. - Que estão atrás de você. - Seus olhos se voltaram para mim e antes mesmo que eu pudesse absorver sua resposta, ele continuou de forma desesperada. - Mas nós, Jeb e eu, sabemos que não é isso. Eles já vinham rondando a região antes mesmo da sua chegada. Não estão atrás de você, Peg. Não precisa se preocupar.

Mas eu me preocuparia. Já estava me preocupando. No fundo, principalmente depois da revelação de Jared, eu sabia que eles ainda estava atrás de mim. Eles não desistiriam, porque sabiam que quando me encontrassem, encontrariam os humanos que estavam comigo e eu não poderia fazer nada para impedir.

- Jared pode ter razão. - Respondi segundos depois, tentando manter minha voz calma e minha respiração normalizada. Era quase uma tarefa impossível.

- Jared não tem razão. Ele nunca tem. 

- Ian...

- E mesmo que tivesse. - Continuou, me ignorando. - Eu os mataria antes que chegassem até você.

Eu sabia que não era só forma de falar, sabia que Ian faria qualquer coisa por mim, assim como eu faria por ele. Mas não podia permitir mais mortes, simplesmente não podia. Mas também, não poderia falar nada sobre o que eu pensava disso tudo, com ele, porque sabia que ele não entenderia. Talvez Jeb entendesse.

- Ninguém vai nos separar, Peg. - Ele se aproximou, seu rosto próximo do meu, eu podia sentir sua respiração ofegante. - Jamais.

Toquei seu rosto, os segurando entre minhas duas mãos, juntando nossos lábios em seguida. Num beijo doce, numa forma de resposta para sua frase. Ninguém nunca nos separaria. Eu sempre voltaria.

Pude sentir sua resistência sumir quando sua língua encontrou a minha, se movendo em sincronia, de uma forma gostosa. Já estava sentindo falta de seu beijo, já estava sentindo fala do calor e da explosão que se formava dentro de mim, quando eu o beijava. Era uma coisa magnífica, uma coisa que eu nunca imaginei sentir antes, mas que eu queria sentir para sempre.

Me curvei para trás, deixando que minhas costas encontrassem o colchão e o puxei para cima de mim, usando minhas mãos em sua nuca. Nossos lábios não se separaram nem para buscar ar, talvez não fosse necessário oxigênio naquele momento. Apertei meus dedos em seus cabelos, o puxando para mim, dessa vez eu queria fundi-lo em mim, exatamente como na noite anterior. Ian apertou suas mãos em minha cintura, descendo seus lábios até meu pescoço enquanto depositava leves beijos em seu trajeto, me arrepiando da cabeça aos pés. 

Eu sabia que a conversa não estava acabada, não para mim, mas queria deixar Ian em paz, não queria atormentá-lo com as minhas dúvidas, não queria que ele se preocupasse comigo e se esquecesse dele mesmo. Não seria justo.

Qualquer decisão que eu tomasse sobre tudo isso, seria bem pensada e bem calculada. Para o bem de todos. Eu não tinha uma ideia em mente ainda, mas sabia que poderia contar com Jeb, sabia que ele me entenderia e me ajudaria, seja lá o que fosse que eu decidisse. 

Procurei afastar esses pensamento da minha cabeça, e agradeci mentalmente quando Ian voltou seus lábios para os meus, me fazendo ofegar e depois suspirar. Eu poderia beijá-lo para sempre, pelo resto de meus dias. 

Separei brevemente meus lábios dos seus, para lhe lembrar do que eu sentia, para que todas suas dúvidas morressem.

- Eu amo você.

Seus olhos sorriam, eu podia vê-los brilhar, sabia que eram tão felizes quando os meus. Ele acariciou meu rosto, sem quebrar o contato de nossos olhos e sussurrou de volta, antes de juntar nossos lábios.

- Eu também amo você, Peg. - Um selinho e depois uma nova frase. - Mais do que tudo, mais do que a mim mesmo.

Toquei seus lábios com meu dedo indicador, e sorri.

- Me pergunto todos os dias, como pude pensar em deixá-lo para sempre.

Ian devolveu meu sorriso, suas mãos ainda acariciavam meu rosto e as minhas eram firmes, em sua nuca.

- Eu não viveria um dia à mais que você. O universo seria um lugar escuro sem você.

Eu já tinha ouvido aquela frase antes, mas naquele momento, com Ian a dizendo, eu senti meu coração se apertar e lágrimas quentes escorrerem de meus olhos. Ele as secou com as pontas dos dedos, sem deixar de sorrir por nenhum minuto e murmurou.

- Espero que essas lágrimas sejam de felicidade.

- E são. - Sorri, ainda com os olhos lagrimados, procurei por um de suas mãos e as apertei entre as minhas. - Nunca fui tão feliz, em todas as minhas vidas. No começo eu pensava que era porque nunca havia tido tantos sentimentos. - Pausei, fungando brevemente. - Mas depois pude perceber que, aonde quer que eu vivesse, fosse o que eu fosse, eu seria feliz se você existisse no mesmo universo que eu.

O sorriso de Ian se alargou, eu sabia que agora suas dúvidas tinham desaparecido. Suas dúvidas sobre Jared, tinham partido, porque nunca tinha tido tanta certeza em minha voz e ele pode notá-las.

Mas também, de uma forma ou de outra, dentro de mim, aquilo tudo parecia ter sido uma forma de  despedida.