Revirava-me na cama, quase suplicando para que o sono viesse. Quatro horas da manhã e ela não saia de meus pensamentos. Como pude me deixar envolver assim? Com um simples caminhar ela me ganhou.

  Minúsculas horas, que juntas não somam um dia foi o tempo que passei com ela, e assim, de uma hora pra outra, já quase me entreguei. Mas eu sou mais forte que isso, que esse sentimento. Não posso me enganar, dizer que já me senti assim antes e que passou, pois tenho uma leve desconfiança de que dessa vez é diferente.

  Sempre senti atração física pelas garotas, sempre achei que gostava delas. Mas nunca, nenhuma realmente mexeu comigo e com meus sentimentos. Tornei-me um cara frio e um quanto insensível em relação a outras pessoas, especialmente às meninas. (pelo menos é como demonstro ser.) Isso nasceu em mim de uma hora pra outra, sem explicação óbvia ou lógica.

   Cansei de tentar entender meus sentimentos, mas algo nesse, novo e inusitado afastava o sono de mim. Percebi que minha garganta estava completamente seca, precisava de um copo d’água. Saltei da cama em direção à cozinha.

  - Emanuel?!- tamanha foi minha surpresa ao ver o cara mais dorminhoco da face da terra ali, sentado na cozinha à essa hora, que quase caí pra trás.

   -Fala baixo Nic, quer acordar o pai?

  - Tá, desculpa. Mas o que você faz acordado a essa hora? Seu sono nunca te dá liberdade.

  - Aah não é nada, você não vai querer saber. Mas e você está aqui por quê?

  - Vim pegar um copo d’água, mas fala o que está acontecendo.

  - Promete não rir?

  - Claro né, bobão.

  - Sabe a Charlotte?

  - Sei. – droga, droga, droga. – O que tem ela?

  -Então, pode parecer estranho, mas eu estou super afim dela. Eu sei que só falei com ela duas ou três vezes, e que já levei um fora também, mas ela não sai da cabeça. Aquela franja combinando com os alhos azuis céu, aquelas bochechas rosadas, não sei, talvez seja só atração física, como sempre, e logo passa.

  Tomara que passe! Eu e meu irmão temos gostos completamente diferentes, nunca achamos as mesmas meninas bonitas, e seria ótimo se tudo continuasse do jeito que estava, mas não, eu, otário, me apaixonei pela mesma menina que ele está “afim”.

  Ele se apaixonou por ela primeiro. Então não posso ser fura olho e acabar com o menino. Das duas uma: ou ele desencana dela, ou eu.

  - Você me ouviu Nicolas?

  -Ãhn? Que?

 - Eu estava falando que preciso esquecer essa menina.

 - Ah, Emanuel, eu sinceramente acho que você podia tentar algo com ela, mas tem que tomar cuidado  pra não ir rápido demais.

  Burro, Asno, idiota!! O que eu estou fazendo? Antes que ele dissesse algo, complementei:

   - Ou então, você tenta esquecê-la mesmo. Mas vamos dormir pirralho, amanhã a gente tem aula.

   - Pirralho? Sou só dois anos mais novo. Além disso, sou muito mais maduro.

   - Ah, claro, o senhor professor de maturidade precisa me dar umas aulinhas. –sempre sou irônico com ele.

   - Estou precisando mesmo criança.

  - Ah cala essa boca! E vai dormir, agora.

  - E se eu não for?

  - O sono vem e te arrasta.

  - Tem razão. Boa noite.

  - Boa noite.

  Esqueci-me completamente da água que tinha ido buscar. Saber que meu irmão também estava pensando nela foi um golpe duro. Ele não vai saber que gosto dela, muito menos ela. Aliás, ninguém jamais saberá, pois tenho que tratar de esquecê-la. E o mais rápido possível.