Jogo Da Amizade escrita por Diego Ryder


Capítulo 2
Elvis




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Nando deu uma olhadinha básica no mapa impresso da internet, só para ter certeza de que não estava indo para o Piauí, em vez de São José dos Campos, que já era caminho para o Rio. O banco de trás estava todo carregado com uma mala de roupas, uma mala para os tênis e o chinelo reserva, uma sacola grande de praia cheio de comidas não saudáveis – bolachas recheadas de diversos sabores, biscoito salgado, chocolates em barra, em caixa, panetone, pão caseiro do mercado, bolinho recheado, dunnet’s, dois sonhos de creme de leite, pacotinhos de amendoim e algumas balas perdidas na sacola – e uma caixa térmica vermelha que tomava metade do chão da parte de trás, cheia de latinhas de refrigerante e energéticos.

Som ligado, tanque abastecido e óculos de sol posicionado: tudo pronto para seguir viagem. Era o segundo posto de combustível que Fernando parara, provavelmente pela grande quantidade de líquidos que ingeria em tão pouco tempo. Ele sentia que nada era melhor que o vento esvoaçando e bagunçando o cabelo claro, causando um penteado um tanto particular. Não vejo a hora de tirar a capota dessa bagaça, pensou o rapaz suspirando fundo de impaciência, pois o destino nunca chegava.

O celular estava conectado na cara do rádio, portanto quando uma ligação era recebida, o toque da chamada se expandia imensamente por todos os autofalantes do automóvel. Infelizmente para ele, a parte mais emocionante da música foi interrompida pelo toque de uma chamada: “Power Rangers tem a força! Power Rangers são dema” – Alô! – disse ele meio constrangido por ser puxado de volta para a realidade abruptamente.

– Cadê você? Já são quase duas da tarde! – indagou Elvis pelo celular. Era possível ouvir barulho de carros e caminhões atrás da voz dele.

– Eu achei que não quisesse que eu fosse correndo – observou Fernando enquanto visualizava uma placa de ‘Bem Vindo’ à cidade do amigo.

– Esquece o que eu disse, estou esperando na beira da rodovia – exclamava ele um tanto exaltado – Não demore, dois caminhoneiros já me perguntaram quanto estava o programa!

Fernando ria até falar chega com o nervosismo do amigo.

– Me diga exatamente onde você está que...

– Fernando Roncolato!!! VOCÊ ACABOU DE PASSAR POR MIM!

– Mas o que...! – ele tentava enxergar algo pelo retrovisor, mas não viu nada.

– Vooolta! Estou embaixo do pontilhão!

Então ele desligou o telefone e dirigiu até a próxima entrada para fazer o retorno. Enquanto fazia a curva, pela primeira vez, Nando se deu conta de que veria o amigo pela primeira vez em quase dois anos de conferência via internet. O estômago dele afundou diante da situação e ele teve que se concentrar na estrada para não pegar a entrada errada.

Foi então que o viu, estendendo o braço longamente para ser visto. O Troller esverdeado encostou alguns metros antes de chegar ao rapaz moreno claro, alto, sorridente e cheio de bolsas à sua volta. Sua camiseta branca refletia à luz do sol, ele pegou a última mala do chão e colocou o que parecia ser um colchonete nas costas, como uma mochila. Ele levou mesmo à sério quando especulei de acampar, pensou Fernando.

Elvis se aproximou com uma expressão de extrema felicidade estampada no rosto, chegou ao lado da porta do passageiro e encarou o amigo sentado no banco do motorista olhando estranhamente para ele.

Uma pausa sinistra se passou por alguns segundos até Fernando voltar à Terra. Ele puxou a alavanca para abrir o porta-malas e saiu do carro: Elvis indo de um lado do carro e Nando pelo lado do motorista até os dois se encontrarem frente à frente.

– Quê? – Elvis disse sobre risos diante do silêncio que tomou o amigo.

– Véi, é que... Eu não tinha pensado em como reagir quando te visse – confessou ele desajeitado, sem saber como proceder.

– Me dá um abraço – respondeu Elvis de braços abertos agarrando Fernando, que era ligeiramente menor que ele.

Os dois se divertiam em finalmente ver um ao outro além da tela do computador. Com as malas colocadas no banco de trás pela porta traseira, entraram no jipe animados, tagarelando como nunca.

– Por que não aceitou a proposta dos caminhoneiros? A gente não está esbanjando dinheiro ainda, qualquer ajuda seria bem vinda...

Mas antes que terminasse, Elvis fingiu uma carranca no rosto que fez o amigo não terminar a frase.

– Acho que eles pagariam melhor pra você, seu gay de olho azul.

– Você está mais malhadinho que eu, senhor bombado. E são verdes.

– Sinceramente? Você parecia mais branco na cam – comentou Elvis para pirraçar, mas estava sendo sincero de verdade.

– E você é mais preto que aparentava – completou Fernando, apenas para não ficar atrás.

– Seu racista imoral – riu Elvis dando um soco no ombro do companheiro.

– Não me bata, senão vou ter que descontar também, aí você vai querer recorrer à lei Maria da Penha.

– Maria da Penha é o caralho! – retrucou rindo.

– Opaaa, não vamos começar com palavras de baixo calão... – depois continuou – seu boiola.

– Baitola.

– Biscatinha.

– Putinha nossega.

– Nega do suvaco cabeludo...

– ...‘Vem ni mim’ – completou Elvis aos berros.

As conversas iniciais eram inevitáveis. Coisas do tipo: aparência real comparada a fotos e vídeos, voz diferente e altura enganosa.

– Fala sério, sou mais bonito pessoalmente, fala aí.

– Não acho nem meu pai bonito, vou achar você? Coloque-se no seu lugar, Fernando.


Faltava pouco mais que uma hora para chegarem ao Rio. A pista estava um pouco movimentada, e isso fazia com que Elvis se autonomeasse copiloto da expedição. Redundantemente, ele fraseava coisas como: “Olha a moto”, “Cuidado com a camionete”, “Venha para a direita”, “Olha a seta”. Mas o que mais se repetia era na hora de ultrapassagens: “Nando, não vai dar tempo... Não vai, não”, “Fernando, espere um pouco”, “Roncolato, quer nos matar?”, “Ave Maria, faz isso nãããão, caraio”... Contudo, todos esses últimos termos eram seguidos por risadas de alívio por parte dos dois.

– Você é pior que minha mãe no banco do passageiro – reclamou Nando.

– Ei, não deveríamos ligar pra Kyara? – lembrou Elvis olhando a hora no celular. Mas neste momento, o carro freou bruscamente, fazendo-o ir para frente em reação à freada, então fora jogado para o encosto do banco novamente quando o carro começou a rodar em velocidade, quase que instantaneamente. Elvis olhou para o amigo no volante com séria expressão de susto no rosto.

– O que houve?

– Eu esqueci completamente! – respondeu Nando, batendo de leve na cabeça – Deveria ter ligado pra ela assim que te pegasse!

– E precisava frear desse jeito, homem? – exclamou o amigo com olhos arregalados – Nunca, mas nunca mais faça isso de novo!

– Okay! Desculpa, não foi minha intenção – disse o motorista curtindo com a situação, soltando as mãos do volante.

– FERNANDO! – alterou Elvis, sob as risadas do amigo.

– Certo, parei! – e pegou de volta a direção – Ligue pra ela do meu aparelho. Diga que estamos chegando, e que quero muito ver o corpo gostoso dela.

Elvis olhou para o companheiro por um segundo.

– Mentira, não diga isso, não. – Corrigiu, escondendo um sorriso.

A perspectiva de encontrar com Kyara, era embaraçosa. Ela era alguns anos mais velha que os dois, e ainda estaria se casando no próximo sábado. Eles sabiam que não teriam toda atenção dela. Era um dia especial para a carioca, um dia onde ela seria a estrela, o centro das atenções; os rapazes fariam apenas parte da plateia que admiraria e paparicaria a noiva durante todo o tempo.


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