Já estavam no meio da floresta quando Katherine ouviu passos em sua direção. Ela já tinha se acostumado a ficar no completo silêncio quando estivesse naquela floresta, e por isso se assustou ao ouvir um ruído.

Ela se virou para trás assim como Niah, as duas encararam o vazio por um bom tempo até Katherine perguntar:

- Você ouviu alguma coisa?

Ela fez que sim com a cabeça - Você ouviu?

Katherine assentiu. Elas passaram alguns minutos assim, encarando a escuridão, até Niah empurrar Katherine com força na direção de um árvore, praguejando.

- Suba, suba - ordenou ela.

- O que?

- Suba na porcaria da árvore, tem alguma coisa vindo.

- O que está vindo?

- Eu vou saber? - a outra disse com a voz rouca - Suba logo!

Katherine obedeceu, mas teve algumas dificuldades no caminho. Ela não subia em árvores com muita frequência, talvez, a última vez que ela tinha feito isso antes de ir com Blake naquele imenso jardim, tinha sido quando ela tinha seis anos de idade, em um passeio da escola. Por incrível que pareça, Katherine conseguiu escalar a árvore sem se desequilibrar uma vez ou escorregar. Ela olhou triunfante para baixo quando achou um galho relativamente seguro e se esgueirou sobre ele, mas Niah não estava mais lá. Ela estava bem atrás de Katherine, se equilibrando em um galho a um metro de Katherine.

Os ruídos ficaram mais altos e próximos, e Katherine conseguiu identificá-los como vozes, vozes de duas pessoas conversando.

- ... não acha que há algo errado? - perguntou a primeira voz. Katherine conseguia reconhecê-la: Blake.

- Pra mim ela parece ótima - disse uma outra voz, que provocou um arrepio em Katherine quando ela percebeu que era de Finn.

- Ela não pode estar! - os dois pararam exatamente embaixo da árvore onde Katherine e Niah estavam se equilibrando. Naquele silêncio profundo, as vozes mais se pareciam com gritos, gritos que ecoavam no vazio.

- Olha, Blake, ela foi comigo hoje na biblioteca e pelo que eu soube, ela e Niah saíram e foram pro Beco comprar roupas! - disse Finn - Ela não vai cair morta, prometo.

Katherine sentiu seu pé começar a escorregar um pouco quando percebeu que era dela que estavam falando, ela teve que se segurar com os braços com mais força para não cair.

- Nós a conhecemos a menos de uma semana, Finn - disse ele - E a única coisa que eu tenho certeza, é que ela não é de se entregar para a dor.

- Bom, isso não é exatamente um opção, é?

- O que eu quero dizer - Blake o ignorou - É que aquilo devia tê-la matado. Sangue de Dilige é um dos venonos mais mortais que existem. Só de olhar para um eles um mortal pode acabar morto, você sabe disso.

- É claro que eu sei - exclamou Finn - Eu te contei isso.

- Então porque você não consegue entender?

- Entender o que?

- Ninguém sobrevive a veneno de Diliges!

- Okay - gritou Finn - Um milagre aconteceu, e dai?

- Não é só um milagre, Finn - ele aprecia desesperado - Ela deveria estar morta!

- Você queria que ela estivesse morta?

- Claro que não - Blake gritou, assustando Katherine - Eu acho que ela está machucada, muito machucada e está fingindo que está bem.

- Você mesmo disse que ela deveria estar morta. Ninguém consegue fingir tão bem assim.

- Isso é impossível... - murmurou Blake, cansado.

- Blake, da para você, por favor, aceitar que ela está bem?

- Você não se importa com ela?

- Sim... - ele hesitou - Quer dizer, sim, é claro que eu me importo com ela, mas eu também confio nela, e tenho certeza que ela está bem - ele engoliu em seco - Eu espero que ela esteja bem, e confio nisso.

- Vocês não acham que perguntar para mim seria a coisa mais fácil de se fazer?

Os dois olharam para cima, surpresos com a voz que veio de cima de seus cabeças e de onde ela vinha.

- Kath? - questionou Blake.

Niah lançou um olhar mortal em direção a Katherine e pulou de seu galho, aterrissando graciosamente no lado deles.

- Olá garotos - cumprimentou Niah com seu sorriso vazio de sempre - Algum problema?

Nenhum dos dois conseguiu responder a pergunta, abrindo e fechando a boca completamente surpresos com a chegada repentina das irmãs.

- Ótimo - declarou Niah.

Katherine decidiu sair da árvore também, e começou a descer, tomando ainda mais cuidado do que antes para cair. Ela não percebeu de início, mas suas mãos estavam tremendo, e isso só piorava a situação.

- O que é veneno de Dilige? - perguntou ela ao chegar a terra, cruzando os braços de frente para os dois garotos, ela tentou não perceber o modo que o olhar de Finn recaia sobre ela.

- É exatamente o que você disse - Niah respondeu - Um veneno.

- E eu deveria... Bom, estar... você sabe...

- Se você está me perguntando se você deveria estar morta - disse Finn - Então sim, você deveria.

- Então porque não estou?

- Quando eu descobrir, prometo que você vai ser a primeira a saber - disse ele - E aliás, o que te faz pensar que eu sei o que está acontecendo?

- Você acabou de dizer que eu deveria estar morta, então você sabe o que está acontecendo aqui.

- Não tem nenhuma cura para aquele veneno - gritou ele - E você está aqui, viva. Você nem ao menos está sentindo dor!

- A culpa não é minha - disse ela - Eu não fiz nada para estar viva, eu desmaiei, só isso.

- Você não teve nenhum sonho, ou nada do tipo - perguntou Blake.

Katherine tentou se lembrar. Aqueles dois dias que ela ficara desacordada tinham sido um borrão em sua vida. Ela apenas se lembrava de bater a cabeça e fechar os olhos, e como se tivessem se passado apenas segundos, ela abrira os olhos, e estava na sua cama no Forte novamente.

- Se eu tive eu não me lembro - ela coçou sua cabeça - Tudo o que aconteceu depois que eu desmaiei é um mistério tanto para mim quanto para vocês.

- Bom - exclamou Finn - Então temos que descobrir.

- E como pretende fazer isso? - perguntou Niah com uma gargalhada.

- Tem o monstro - Katherine disse. Todos olharam para ela - O monstro que me salvou. Eu poderia tentar encontrá-lo e perguntar o que aconteceu.

- De jeito nenhum - Finn se enrijeceu - Eu não vou deixar você chegar perto daquela coisa de novo.

- Por que não?

- Você está com o veneno dele correndo em suas veias, você quase morreu, isso não é razão suficiente?

- Ela está certa Finn - Niah recebeu um olhar ameaçador por esse comentário - Se o veneno era dele, ele deve saber o que aconteceu. E aliás, ele te salvou.

- Se ele ainda não estiver morto você quer dizer - disse Blake - Porque você não faz a mínima ideia de onde ele pode estar, ou como ele pode estar.

- Se ele estiver machucado eu quero ajudar.

- O que?

- Ele salvou minha vida - disse Katherine - Eu vou salvar a dele.

- Se você não se lembra - recordou Finn - Você me empediu de matá-lo, já pagou sua dívida.

- Isso não é uma dívida - Katherine disse decidida - É gratidão. Alguém deveria começar a te ensinar esse tipo de coisa.

- Eu também salvei sua vida, se você não se lembra - Finn já estava começando a ficar vermelho - Não te vi me agradecendo hora alguma.

Katherine se calou. Ela estava com muita raiva para que conseguisse pedir perdão para ele. Seu corpo fervia por dentro. Deus, como ela odiava aquele garoto. Como ele sempre conseguia que ela perdesse o controle? Porque se aquela discussão não parasse, era isso que iria  acontecer, e ela não daria esse gostinho a ele.

- Eu vou - declarou ela - Ponto final. Você não pode me amarrar ao pé da cama e me impedir.

- Não posso?

- Não - Niah se pôs no meio dos dois - Chega. Ela vai e pronto. Se você quiser, pode ir com ela para se certificar de que ela estará à salvo, ou ela irá sozinha.

- Porque eu tenho que ir sozinha?

- Para encontrar esse monstro, você vai ter que entrar em uma parte do Inferno que nenhuma criatura não mágica deveria entrar - explicou ela - Com um de nós lá, já vai causar muito problema, se formos em grande quantidade...

- Eu posso acompanhá-la - se ofereceu Blake.

- Não - Niah declarou - Tenho um assunto para resolver com você - ela apontou o dedo para o rosto dele, acusadoramente - Finn? - ela se virou para ele - Você vai com ela.

- Você disse que eu iria se eu quisesse.

- Mudei de ideia - Niah disse com um sorriso frio - Agora você vai.

Ele se virou com um suspiro irritado e desapareceu na escuridão da floresta.

- Vocês partem pela manhã - decidiu Niah - E por favor, tentem não se matar.