Piper acordou em um lugar estranho, que ela nunca tinha visto antes. Suas roupas estavam molhadas. Não dava para distinguir muito bem as coisas. Tudo estava escuro, e ela sentia cheiro de sangue vindo de algum lugar. Passou a mão pela testa e percebeu que o sangue era dela. Ouviu vozes desconhecidas mencionando algo sobre “erguer-se da criança de Afrodite”, e desmaiou novamente.

[...]

–Ela não está em lugar nenhum! Como ela pode ter sumido do navio assim? –Leo estava ficando desesperado. –Nós ficamos tão preocupados em bater naquela porcaria de lula que nos esquecemos dela! Deuses, como eu pude ser tão idiota?

–Calma Leo, vamos encontrá-la. Jason está sobrevoando as proximidades, é impossível que já tenham levado ela pra longe em tão pouco tempo.  – Frank tentou tranqüilizar o amigo.

–E se quando ele encontrar for tarde demais? O que vamos fazer se ela estiver morta? Como Nico disse não dá pra ter garantia de nada!

–Realmente, enquanto não soubermos quem a pegou não teremos garantias de que ela continuará viva. Mas por enquanto ela ainda está, sei disso. – disse Nico.

Leo sentia como se tivessem lhe arrancado um braço à força. Tanto pela dor quanto pela perda. Ele não ia agüentar ficar parado por muito mais tempo, não enquanto todas as coisas ruins poderiam acontecer à Piper e ele não podia fazer nada para ajudar.

–Precisamos pensar... quem iria seqüestrar Piper, porque, e para quê? Eu tenho um palpite que podem ser as forças de Gaia. Eles usaram meu poder para erguer Alcioneu, podem estar querendo Piper para erguer algum outro gigante. Ou quem sabe...–Hazel  não queria falar isso –...Gaia mencionou que precisaria derramar o sangue de uma semideusa e de um semideus para se despertar completamente. Precisamos considerar o pior.

–Acredito que o Kraken não a seqüestrou, só foi enviado para nos distrair. – comentou Frank.

–Bem, isso é óbvio, já que com certeza não foi para que a gente pudesse petiscar. Mas talvez eles estejam petiscando Piper agora, e não estamos fazendo nada para ajudar!

–Leo, se acalma! E vê se para com essas chamas antes que faça um incêndio no navio! – Frank se afastava, puxando Hazel consigo.

Jason chegou.  Ele estava suado e com uma aparência horrível, mas não por ter esbarrado em monstros no caminho, e sim pela preocupação.

–É, bem... Uh, não trago boas notícias. Hazel terá que rastreá-la à seu modo.

–Ah, tudo bem... Mas você sabe que podemos cair em uma armadilha como da outra vez. Ainda mais se Piper foi pega por Gaia.

Hazel se concentrou. Pensou em Katoptris, a adaga de Piper, e tentou rastreá-la. No início não sentiu nada, mas após um tempo ela conseguiu encontrar. Pediu a Leo que levasse o Argo II para uma ilha a uns 200 quilômetros ao norte de onde estavam. Leo colocou a velocidade máxima para funcionar, mas ainda assim demoraram uns 40 minutos para chegar lá. Ele estava tremendo de medo. Medo de que fosse tarde demais.

Tiveram que ancorar o navio a uns 500 metros da ilha, pegaram o bote e foram todos (tirando Hedge). Estavam tão desesperados e com medo de perder mais um de seus amigos que nem calcularam os riscos de navegar em um bote naquelas águas traiçoeiras. Grande erro: quando pensavam estar quase chegando, o bote virou.

Nadaram desesperadamente tentando chegar a superfície, mas sentiam algo os puxando para o fundo e agarrando seus pescoços. Leo tentava se agarrar ao bote como se agarra à vida, mas os outros estavam já indo em direção ao fundo. Até que ele não resistiu mais, perdeu o fôlego e afundou nas águas escuras.

[...]

Leo acordou, olhou para os lados, e como não conseguia enxergar nada, acendeu uma chama na mão. Estava todo molhado e machucado. Com a luz, conseguiu enxergar à sua direita Hazel, Frank, e Nico no mesmo estado que ele, ou piores. Leo tentou se locomover para chegar até eles, que estavam separados um dos outros, quando percebeu que suas pernas estavam acorrentadas no chão. Ele tentou desesperadamente soltar as correntes, quebrá-las, ou derretê-las com fogo, mas não conseguiu. Talvez fosse por estar cansado e acabado demais.

Olhou para cima, numa tentativa de se localizar. Mas tudo estava tão escuro que ele não conseguiu nem mesmo enxergar onde era o teto.  Recapitulou os pensamentos: Piper, seqüestrada. Entramos no bote. O bote virou. Fomos puxados para o fundo do mar. Acordamos aqui. Hum, isso deve ser uma caverna submarina.

Estamos todos aqui? Ele se perguntou. Mas não estavam. Os únicos ali eram ele, Hazel, Frank e Nico. Porque Jason também sumiu? Ele não teve tempo de tentar responder essa pergunta, pois sua atenção e a de todos os outros se voltou para os gritos agonizantes vindos de algum lugar acima deles.

[...]

Jason se sentia totalmente quebrado. Ele não agüentava mais ser surrado por sabe-se lá quem. Com certeza algum covarde, que o acorrentou para que não pudesse lutar. Jason também não agüentava mais ouvir os gritos desesperados de Piper, implorando para que parassem de machucá-lo.

Ele rezava para que ela calasse a boca, porque se parassem de bater nele, a próxima seria ela. Jason estava totalmente confuso. Ele não lembrava porque acordou ali, sendo esmurrado, e quem fez isso com ele. Estava escuro demais, só havia luz suficiente para ele ver o sofrimento estampado no rosto de sua namorada, que continuava gritando seu nome.

Até que parou. Os gritos pararam, a surra também. Ele não sabia se isso era bom ou ruim. Ele ouviu passos apertados vindo em sua direção, e sentiu corpos sendo jogados à seus pés. Logo percebeu que aqueles eram seus amigos, felizmente não mortos, apenas desacordados. A Luz sobre Piper aumentou, e ele viu que ela estava dez vezes mais machucada que ele.

Algo grande perto de Piper começou a borbulhar. Ele não sabia se era um caldeirão, banheira, ou piscina. Lá dentro uma espuma branca brilhava tão intensamente que iluminou todo o lugar.  Dessa espuma ergueu-se um gigante, diferente de todos os outros que Jason já viu. Os gigantes em geral eram horrendos e assustadores. Mas esse parecia ter sido criado para impressionar. Como um gigante conseguia ser bonito? Jason reparou que esse tinha forma um tanto feminina. Estava todo arrumado, com roupas estonteantes. Jason percebeu que olhar para ele fazia com que ficasse hipnotizado, e que todos os outros também estavam.

Piper olhou para aquilo com grande desdém. Abriu a boca para falar alguma coisa, mas não conseguiu. Acabada com o esforço, desmaiou.

–Vejo que sua amiga foi o suficiente. Minha mãe escolheu bem aquela que iria me reerguer. – disse o gigante. Mas todos olharam para Piper, porque quando ele falou, a voz que ouviram foi da semideusa.

– Com-como você...? – murmurou alguém do grupo.

–Como tenho a voz de Piper? Simples, eu me reergui com ela. Sou Grátion, anti- Ártemis. Gaia escolheu a mais poderosa filha de Afrodite para que eu pudesse usar seu poder. Devem ter percebido que Afrodite é a anti-Ártemis, que as duas são opostas. Para vencer Ártemis, que despreza o amor e a beleza, que são armas tão poderosas, porque não usá-las contra ela? Essa menina não tem idéia do quanto é poderosa! Sua voz poderia colocar multidões para lutar por ela! Mas combinada ao meu poder, pode enlouquecer os deuses para que matem Ártemis. A deusa aprenderá que não se deve ignorar o poder que consegue do desejo de alguém. Quantas guerras não foram iniciadas em nome do amor?

Jason se levantou. Ele não agüentava mais ser o inútil. Agora ele iria matar Grátion com suas próprias mãos. Não importava se ele não conseguisse, ele morreria tentando. Ele precisava salvar seus amigos e vingar Piper.

Leo e os outros estavam conscientes, ouvindo as palavras de Grátion, fingindo estarem desacordados. Jason gritou para o gigante:

–Como ousa fazer isso com Piper? Afrodite matará você, por sua filha e por ter usado seus poderes para derrubar Ártemis! Você os sugou de Piper, seus poderes nem ao menos são seus. Devia se envergonhar por ser um completo fracassado!

Enquanto Jason o distraia, sem combinar nada, Leo foi resgatar Piper. Ele sabia o que Jason estava fazendo, e porque estava fazendo. Apesar de clássico, o plano da distração sempre é uma boa pedida.

– Belas palavras pra um filho de Júpiter que nem ao menos consegue se soltar de estúpidas correntes! Sabe Jason, você deveria ser um líder, como seu pai. Mas quanto mais tenta, mais inútil você é. Não passa de um fardo para seus amigos. Piper não o ama de verdade, ela só quer de volta algo que foi ilusório, tudo por conta da Névoa. Você foi arrancado de suas responsabilidades como romano para que talvez se saísse melhor como grego. Porém é tão inútil que até de saco de pancadas você deixa a desejar. – Grátion disse num tom de provocação. Piper o ouviu com sua voz e logo percebeu o que ele estava tentando fazer com Jason. Ela tentou gritar mas não conseguiu. Ela puxou Leo, apontando para Jason. Piper o olhou nos olhos, mas aquele não era mais o Jason que conhecia. Grátion estava apenas mostrando o que podia fazer. E da forma mais dolorosa possível.

– Agora vá, filho de Júpiter. Prove que não é um inútil. Dê um fim naquele que quer roubar Piper de você. É culpa dele que você tenha perdido sua namorada e sido espancado. – Grátion o persuadia como se ele fosse uma marionete. Piper se espantou com o tamanho poder que sua voz podia ter.

O gigante soltou Jason de suas correntes, e voltou-se para Leo:

–Garoto levado. Quem disse que você podia soltar a oferenda de Gaia? O sangue dessa menina vai lavar todos os empecilhos do retorno de minha mãe. Ela foi extremamente útil, foi tão fácil extrair sua voz... Ela gritava como uma louca. Para tirar o sangue também não será difícil. Depois dela, podemos usar o seu.  Jason, por favor.

E Jason foi em direção à Piper, pegou Katoptris que estava largada no chão, e se preparava para dar o golpe. E ele teria conseguido se Leo não pulasse para cima dele.

Os dois estavam em um combate mortal. Se Gaia queria mesmo usar o sangue de algum deles para se erguer não precisaria ter muito trabalho, já que eles mesmos já estavam tirando um do outro. Piper, Hazel, Frank, e Nico, assistiam tudo boquiabertos e paralisados, sem conseguir piscar. Já Grátion gargalhava se divertindo com o show.Até o momento que Jason convocou seus raios, e todos viram Leo caído imóvel no chão.