Audaciosos - Interativa escrita por Norrie


Capítulo 19
Reboque Humano


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/338299/chapter/19

Carl tinha os olhos lubrificados pelo marejo. Acabara de ver uma quase morte e antes que pudesse contê-lo, um grito estrangulado escapou do fundo de sua garganta.

Seu coração só veio se conter quando Quatro entrou no ringue com uma arma de choque que pescou em uma gaveta de armamento, no canto da sala, e desacordou Alex com um tiro certeiro na nuca.

As pessoas correram para o círculo, alguns na intenção de ajudar e outros de apenas curiosos. Carl, por outro lado, ficou sentada onde estava, assombrada. Os iniciandos abriram caminho para Quatro, que carregava o careta em um dos ombros. Owen, apoiado em Eric, vinha logo atrás.

Pensou que passaria despercebida, porém Quatro parou ao seu lado, olhando para Eric logo atrás.

– Pode levar ele para enfermaria por mim? - Perguntou, apontando com a cabeça para Owen, que repousava o braço livre na cintura dolorida e o outro passado pelos ombros do líder que praticamente o arrastava - Não confio que Eric o fará.

– E com razão - O próprio os alcançou, chegando por trás - Tenho coisas mais importantes para fazer, como ligar para a Erudição e...

– Para quê ligar para a Erudição? - Quatro perguntou, impassível.

– Pro caso de precisarmos de clínicos e cientistas para as análises desse careta aí.

– Acho que está nos dependendo demais da Erudição - disse - Mas se acha necessário, vá em frente.

– Mas eu... - Carl tentou se infiltrar na conversa, mas sem sucesso.

– Eu estou bem - Owen protestou, com a voz rala. As marcas dos dedos longos de Alex ainda se ressaltavam em seu pescoço - Não preciso ir para a enfermaria.

– Me poupe de seu orgulho - Eric disse, passando o braço que o apoiava para Carl que o recebeu desajeitada. - Suas costelas já eram, cara. Se você não precisa da enfermaria, não consigo imaginar seu estado quando precisasse.

– Sério, estou bem. - Tentou se soltar de Carl para demonstrar a eles, mas no primeiro momento cedeu. - Ok, talvez não.

– Certo, podem ir agora. - Eric falou com a voz elevada, servindo para todos os outros na sala ouvirem - As lutas acabaram por hoje, pessoal, continuamos amanhã!

E os dois saíram na frente, com Alex chacoalhando nas costas de Quatro como se não pesasse quase nada.

– Mas eu não... - Carl gritou, mas os ouvidos que deveriam ouví-la já estavam longe - ... sei onde a enfermaria fica. - Continuou, abaixando a voz até o mínimo possível, constrangida.

Estava ali, apoiado em seu ombro, o cara que ela tinha pensado o tempo inteiro desde que a Iniciação tinha começado. Owen se acomodou.

– Eu sei onde fica. Já fui muito lá quando muleque - Ele sussurrou, talvez por estar fraco e com falta de ar ou apenas para provocá-la com aquela voz rouca e masculina, atraente até o hálito tão perto de seu ouvido - É só ir me arrastando que eu te guio.

Carl assentiu, dando os primeiros passos, logo atrás da última leva de iniciandos que saiam cuchichando entre si e se espalhando pelo Fosso. No começo, o peso dele nem era tão incômodo. Era só andar com os pés mais pressionados e saber onde por as mãos em suas costas para apoiá-lo melhor. Mas depois, cada passada parecia como arrastar uma caminhonete de mãos nuas.

– Dobra aqui - Owen indicou, e ela o fez. Já ofegava, mas teria que carregá-lo querendo ou não. Teve a chance de protestar, mas ao invés disso ficou encarando Quatro e Eric, embasbacada. Agora serviria de reboque.

Bela tacada, Carl - reclamava para si mesma mentalmente.

Depois de contornarem o Fosso inteiro - Sem nenhuma alma solidária que se oferecesse a ajudá-la, devo constar - eles entraram em um corredor de concreto mal iluminado, com cheiro de mofo e videiras em decomposição. Owen a fez adentrar cada vez mais naquele labirinto, até que não sabiam mais o caminho de volta. Carl franziu o cenho.

– Tem certeza que é aqui? - Perguntou.

Owen reprimiu um sorriso malicioso, fingindo-se de confuso.

– Não sei - Disse - Acho que nos perdemos.

Carl o encarou, perplexa.

– Sério? Eu te carrego por todo esse complexo e você me diz que estamos perdidos?

– Queria que eu mentisse? - rebateu.

– Já mentiu - Bufou - Dizendo que sabia onde ficava.

– Não menti totalmente - Ele deslizou a mão que o sustentava por entre os cabelos de Carl que ficou em estado de choque, sem reação.

Ele a empurrou, ignorando o latejo de suas costelas, em direção a parede. Os lábios estavam entreeabertos e tão próximos um do outro que o ar que respiravam era o mesmo. Owen inclinou levemente a cabeça, como se fosse beijá-la, com um sorriso perverso. Carl sentiu o calor subir ao seu rosto quando ele passou a mão em suas costas, a apalpando.

Estou ferrada. - Era tudo que pensava naquele momento, quando a mão atrás de si achou uma âncora. Sentiu o hálito do loiro lamber seu rosto e fechou os olhos, temendo o que viria a seguir.

Ao invés do que esperava, uma porta se destrancou ás suas costas, empurrando seu corpo para dentro de um salão imenso que ao contrário do corredor anterior, era extremamente iluminado. Owen olhou desconfiado para os lados do corredor e depois de se certificar que não havia mais ninguém ali, a seguiu. Carl se virou, e o seu queixo caiu. Audaciosos - crianças, jovens, adultos e idosos - estavam espalhados em momentos de lazer. Notou um homem gorducho, raspado e tatuado em um jaleco branco se aproximar deles, saindo de um outro salão, onde outras pessoas com o mesmo uniforme zanzavam.

Owen se apoiou novamente em Carl, descontraído, como se o que tivesse feito á pouco nem passasse por sua cabeça.

O homem os alcançou e encaminhou o rapaz até o outro salão de onde veio, que se assemelhava á um hospital em miniatura.

– Bem-vinda á minha enfermaria - Owen disse, satisfeito. - Viu? Eu não menti.

– Você...? Onde...? - Carl tentava perguntar algo, mas as perguntas eram tantas que acabavam atropelando umas as outras. Respirou fundo, organizando os pontos - Como você conhece esse lugar?

Owen sorriu, já esperando a pergunta.

– Eu moro aqui.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!