- Como você pode dizer que terei que ignorar tudo o que ele fez!

Gritando, as mãos pousadas sobre a mesa do chefe, com os olhos apertados de ira e uma expressão de profunda insatisfação. Kougami virou de costas, indignado de tal maneira que nenhuma palavra ou ofensa diminuiria sua raiva. Puxou um cigarro do bolso do paletó.

- É proibido fumar aqui - alertou com frieza o outro, antes mesmo que o objeto pudesse descansar nos lábios dele. 

Kougami ignorou-o e saiu da sala, acendendo-o e tragando profundamente. No mesmo instante, enquanto caminhava, passou por um espelho e fitou-se: Mais magro, com olheiras e nos olhos azuis, um buraco.

Voltou-se para frente e decidiu visitar Tsunemori. Kougami estava irritado e sentindo-se traído. A presença da Inspetora fazia-o melhorar, mesmo que em seu coração não existisse nenhum sentimento afetivo pela moça, a não ser amizade e admiração.

Talvez ela o deixasse mais leve com seu jeito desajeitado. Talvez Kagari o fizesse rir, caso estivesse na sala.

Akane visualizava uns papéis de certo caso aleatório sem animação. Os gritos de Kougami podiam ser escutados de sua sala. Ela acreditava nele: Makishima, o qual matou o melhor amigo do homem, o qual criou monstros, o qual poderia ser uma ameaça para a sociedade estava livre. Invisível. Ela mesma poderia ser atacada a qualquer instante. Esse pensamento a fez tremer.

Kougami entrou na sala, com a cara meio fechada, Puxou uma cadeira e sentou-se próximo à Akane, o que a fez sentir-se apreensiva. Não queria ouvir ele falar mais de Makishima...

- O que está vendo aí?

Ela assustou-se. Sem um pouco de agilidade, mexeu os papéis pousados em seu colo e apressou-se para ver o que eles diziam. Não se lembrava realmente de nada que lera...

- Cuidado, uma folha caiu.

Kougami abaixou-se e pegou uma folha solitária que voara do amontoado no momento que Akane o mexera, sem jeito. Quase riu do momento, ela realmente era uma distração.

Devolveu-a. Seus dedos não se tocaram.

Distraída com a função de arrumar seu punhado de papel e realmente prestar atenção nele, Akane não percebeu o olhar divertido e furtivo de Kagari para os dois. Kougami fuzilou o amigo com os olhos, e a resposta do outro foi rir silenciosamente, debochado, fazendo um coração com as mãos e virando-se rapidamente para seu computador quando uma ameaça verdadeira surgiu nos olhos de Shinya.

Yayoi entrou na sala e foi direto para sua mesa. Trazia uma sacolinha de papel, branca, meio manchada e ficou encarando Kagari quando este a olhou, meio desconfiado.

Mazaoka entrou no local com um raio, e foi diretamente para Kougami, que o olhou surpreso.

- Novidades! A internet está bombando e se divertindo muito com o mais novo escândalo!

Todos o fitaram.

- O aniversário de Ko está chegando!

Kagari rompeu em risadas, Yayoi olhou-o divertido, Akane sorriu, Mazaoka abriu um grande sorriso e Kougami, como esperado, ficou impassível.

- 29 anos Ko! Sabe quanto é isso? Ainda é jovem, tem muito a aproveitar! 

- Não se preocupe que a festa é por nossa conta - sorriu Kagari.

Kougami fechou os olhos.

- Não é realmente apropriado...

- Deixe de ser chato Ko! - Kagari correu até ele e o abraçou pelo ombro, cauteloso o bastante para poder desviar de qualquer ataque que o outro pudesse tentar - É o primeiro aniversário com a Akane aqui! Vamos mostrar pra ela como somos divertidos e animados!

Enquanto Kagari ria-se faceiro, Kougami olhou para Akane pedindo uma opinião. A moça, porém, sorria abertamente e o homem viu que qualquer maneira de escapar estava longe de seu alcance.

Balançou os ombros, e Kagari viu a vitória.

- Isso aí!

- Não precisa ficar tenso, Kougami - disse Yayoi, levantando-se. O turno acabara para todos, e era hora de ir embora.

- Uma comemoraçãozinha antecipada pela velhice de Ko? - virou-se Kagari, olhando esperançoso para todos - Uma bebida num bar comum, precisamos de uma folga hoje em dia! Que tal?

Mazaoka balançou a cabeça.

- O velho aqui precisa do seu remédio das nove e de uma cama.

Yayoi olhou para seu relógio.

- Estou atrasada para um compromisso. Até mais!

- Ei, que compromisso? - indagou Kagari surpreso, mas a mulher já saíra na direção oposta e já estava longe - Suspeito.

Olhou então para os dois restantes, sorrindo.

Com pena de estragar a animação do outro, para a surpresa de todos, Akane fez que sim. E com medo que Kagari arranjasse alguma confusão para os dois, Kougami foi junto.

- Só não ficaremos até muito tarde. Amanhã ainda trabalhamos - ditou, rígido. 

Kagari riu.

- Tudo bem, Ko!

Já há muito bêbado, Kagari trovava um trio de mulheres mais próximas, as quais olhavam ora divertida para ele, ora enojada.

Akane estava bêbada também. Kougami estava irado.

- Moleque irresponsável! - exclamou, trincando os dentes, sentado numa mesa próxima do bar - E você também, inspetora!

Rindo soltamente, Akane puxou um copo de bebida para si, mas o outro foi mais rápido e tirou-o de sua mão, puxando um resmungo da outra.

- Já chega, Tsunemori!

A mulher, então, apoiou seu rosto nas mãos.

- Me chame de Akane, Kougami.

Sua voz fez o outro arregalar os olhos. Estava com um pingo de sensualidade. 

Os olhos meio vermelhos da mulher brilhavam para ele. Seus lábios meio entreabertos estavam avermelhados e puxados num curto sorriso. Ela o fitava de um jeito que jamais havia feito: Havia interesse.

Então, ela levantou-se e foi na direção dele. Segurou um lado de seu rosto e beijou-o nos lábios.

Mas antes que o outro pudesse esboçar qualquer resposta, a pista da boate explodiu em um grito.

Nas luzes piscantes e multicoloridas do local, Kougami jurou ter visto uma cabeleira branca, já há muito conhecida.