Código Negro escrita por Monica Romero


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Ps: repostando a história



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4

Acordo muito contente, ontem foi o último dia de aula e para melhorar as coisas, o inverno finalmente chegou. A temperatura não é tão baixa quanto na Rússia, mas mesmo assim ver a neve me revigora.

Desde as últimas duas semanas tento pegar a caixa de Haralda, mas infelizmente não consegui.

Levanto-me e vou até a janela. Hoje o tempo será de nevasca.

Visto um vestido antigo de minha mãe, suficientemente quente para que eu o use durante o resto da manhã.

Sinto saudades de minha mãe. Ela era uma comunista muito influente, corajosa, amorosa e educada. Tudo que eu gostaria de ser. Acho que quando visto uma de suas roupas ela fica mais próxima de mim. E se tinha uma coisa que ela amasse mais do que a neve eu desconhecia. Fazíamos guerra de neve, esquiávamos, era muito bom. Eu daria qualquer coisa para ter uma tarde daquelas novamente...

Sinto uma lagrima escorrer pelo meu rosto. É triste lembrar-se dela, estar tão longe...

Em duas semanas minha mãe, Emma, completaria trinta e nove anos.

Lembro-me da noite em que eu descobri sobre sua morte, minha tia tinha me acordado de madrugada falando para fazer as malas. Era uma noite fria de inverno, eu estava assustada. Fomos até a estação sem que eu entendesse nada.

“-Vai ficar tudo bem.”- Disse ela. Depois ela depositou um beijo em minha testa.

Lembro que ela olhava para todos os lugares enquanto segurava minha mão. Eu estava confusa, e pedia para ela esperar meus pais. Fui com ela, pois confiava nela, mesmo tendo visto ela somente nos natais em minha casa. Minha tia me levou até o trem e disse que era para eu dormir, pois a viagem seria longa. Lembro-me de antes de dormir ter perguntado mais uma vez sobre meus pais, ela não me respondeu apenas deu um sorriso triste.

Na época eu não entendia o que era a morte.

Olho para o outro lado do quarto e vejo o retrato de minha família. Minha mãe sempre sorridente, sempre o inverso de meu pai. Meu pai sempre foi sério e exigente, como Russell. Os dois são muito parecidos.

Ouço batidas na porta.

–Quem é?

–Hanna sou eu. -Diz a voz abafada de Russell.

Abro a porta para ele.

–Bom dia. -Digo abraçando-o.

–Bom dia. Eu gostaria de conversar com você.

Seus cabelos escuros já estão penteados. Seu bigode está bem aparado e sinto a essência de seu perfume. Seus olhos verdes me encaram sorrindo.

Tem muitas pessoas que desconfiam sobre sermos irmãos, afinal não somos nem um pouco parecidos. Minha mãe tinha o cabelo escuro assim como os olhos e meu pai era ruivo de olhos verdes. Mas Emma não era mãe de Russell, foi à segunda mulher de nosso pai, ainda assim, ela o criou como se fosse seu próprio filho.

–Estou à escuta.

–Bonito o vestido.

Olho para o vestido.

–Era o preferido de mamãe. - Digo de cabeça baixa.

Ficamos um tempo em silêncio.

–Precisamos conversar. –Diz ele.

Eu concordo com a cabeça.

–O que quer falar? -Digo me sentando em minha cama.

–Sabe Hanna você esta ficando mais velha, e não tem mais de agir como uma criança.

–O que eu fiz? –Pergunto um tanto na defensiva.

Eu sempre obedeço a Russell e se o desobedeci fico preocupada. Sempre fui muito submissa a ele para discutir ou desobedecer a suas ordens.

– Nada – diz ele pacientemente tentando me acalmar. - A questão é que tem que agir como uma moça de sua idade, isso inclui se vestir como uma. - Ele se senta ao meu lado. - Sei que você pode não gostar de saias, mas vai ter que se acostumar.

Ele tem razão, não posso ser assim o resto da vida por mais que eu queira.

–Hoje é o dia da minha viagem com Haralda, e como havíamos combinado você vai ficar na casa de Anne. Sabe que Haralda tem um grande papel na negociação.

Tenho medo de ficar sozinha. A Alemanha está ficando pior desde 1933, recebo insultos de muitas pessoas por ser estrangeira. Mesmo assim eu dou um sorriso. A Sra. Beck é uma ótima companhia, principalmente por ser mãe de Klara. O único problema é o Sr. Beck.

Acaba sendo irônico e incompreensível uma estrangeira ficar hospedada na casa de um oficial. Mas acho que isso é mais um segredo de Russell, de como ele consegue convencer as pessoas a fazerem isso.

Ele planejava essa viagem á meses.

–Tudo bem Russell.

–Arrume suas malas. Partimos essa noite. E se apronte porque quero treinar com você antes de irmos.

Não entendo como Haralda pode ser tão importante, geralmente mulheres não negociam. Isso está estranho.

Ele dá um beijo em minha testa e sai de meu quarto. Faço o que ele pediu. Logo tudo esta pronto.

Essa vai ser a oportunidade que eu esperava, Haralda estará longe o suficiente para descobrir o conteúdo das cartas. Mas tenho que pegar uma das chaves, só de garantia.

Eu desço as escadas e me deparo com Haralda. Ela está arrumando seu chapéu. Está com seu casaco de pele e um vestido marrom, pelo jeito ela está com frio.

–Hanna, esta pronta para treinar? –Pergunta ela quando me vê.

–Ainda não. Eu só preciso pegar uma coisa.

–O que?

Droga Haralda, saia da minha frente.

–Um broche que comprei para Klara. Eu o perdi e quero deixar tudo pronto.

–Eu te ajudo a procurar, assim seremos mais rápidas.

Ela termina de arrumar o casaco e eu termino de descer as escadas.

–Lembra onde colocou?- Pergunta ela me olhando.

–Acho que perto do piano.

–Eu vou ver. - Diz ela se virando.

Olho para ela com escárnio me perguntando se ela realmente está acreditando nessa mentira. E aproveito a oportunidade para pegar do chaveiro de meu irmão as chaves dos fundos. E guardo em uma costura do vestido.

–Encontrei Haralda. Obrigada.

–Que bom. Seu irmão já está te esperando.

Ótimo, agora terei que comprar um broche para Klara. Deveria ter dito que era apenas uma fita.

Depois do café da manhã vou para meu quarto e coloco a roupa de treinamento para encontrar com Russell e prendo meu cabelo em um rabo de cavalo. Ele estava me esperando na entrada na floresta.

–O que vamos fazer hoje? –Pergunto assim que me aproximo.

Vejo que ele segura duas espadas e sei o que terei de fazer.

–Vamos treinar um pouco com espadas. Quero ver se você consegue me vencer hoje, da última vez não teve tempo suficiente. Mas antes vamos fazer um aquecimento, uma corrida de dez minutos. Depois quero ver seus saltos.

–Tudo bem.

Fazemos o alongamento e apostamos a corrida. Ultimamente eu tenho corrido cada vez mais rápido e vencido várias vezes Russell. Os galhos fazem alguns cortes em meu rosto e eu sorrio assim que alcanço meu irmão.

–Pronto para perder? –Grito para ele sorrindo.

–Nem pensar, eu vou ganhar! –Responde ele sorrindo também.

Mordo o lábio e me endireito para ganhar mais velocidade e depois de pegar o folego eu corro o mais rápido que consigo. Assim que eu consigo passar chegamos à nossa linha de chegada, a maior arvore com uma faixa de tecido vermelho preso ao redor do tronco.

E como eu esperava eu ganhei dele.

Terminamos a corrida sem folego e eu sorrio.

–Ganhei.

–Agora quero ver seus saltos. Vamos voltar.

Subo em uma arvore e vou entre saltos que Russell me ensinou e outros eu arrisco para que sejam mais altos e perigosos.

–Vá mais rápido! –Ordena ele.

Obedeço fazendo com que eu quase atinja vários galhos e tendo uma dificuldade maior para realizar os saltos. Faço algumas manobras que Emma me ensinou nas aulas de ginástica artística. E finalizo com um mortal me equilibrando nos dois pés firmes no chão.

–Ótimo, mas tem como melhorar. Você precisa se esquivar mais rápido. Vamos ver agora se melhorou na espada.

Ele me entrega uma espada e eu a posiciono. Essa é mais pesada do que as que eu geralmente uso e a de Russell é maior.

–Pronta? –Pergunta ele.

–Sim.

Ele começa tentando me atacar na área do abdome, mas eu evito e nossas espadas fazem barulho ao se encontrarem. Então ele tenta me acertar novamente, mas dessa vez perto do rosto e eu defendo a tempo.

Eu sei que se eu falhar eu posso até mesmo morrer, pois essas espadas que usamos são verdadeiras.

Ainda com nossas espadas juntas dou um giro e me livro de sua espada e ataco, paro antes da espada acerta-lo.

–Um a zero. Paramos no quarto ponto. –Anuncia ele.

Então ele tenta me atacar e com os braços levantados e curvados para proteger meu rosto as espadas fazem barulho novamente. Ele tenta acertar-me novamente, mas eu jogo meu corpo para a esquerda e abaixo, com um salto levanto e ataco. Dessa vez quem gira para se soltar é ele e assim que tem oportunidade me ataca, nossas espadas se chocam várias vezes até ele desviar do meu ataque e pontuar.

–Um a um – falo.

Eu ataco primeiro e ele defende, eu ataco novamente e ele desvia, quando ele me ataca faço o mesmo. Ele tenta me atacar e assim que desvio e dou um salto mortal ficando atrás dele a tempo de dizer:

–Dois a um.

Nossas espadas se chocam várias vezes até ele pontuar quase atingindo meu coração.

–Não vai ganhar tão fácil. –Anuncia ele.

Ataco várias vezes até pontuar da mesma maneira que ele.

–Três a dois.

Ele começa tentando me atacar, mas nossas espadas se chocam e eu arrasto a minha até perto de sua mão fazendo um barulho agudo, então rapidamente jogo minha espada contra a dele, tão rápido que ele a solta.

–Quatro a dois – digo sorrindo.

Ele me olha orgulhoso.

–Parabéns Hanna. Você está ficando mais forte.

O sorriso toma conta de meu rosto enquanto ele prepara os instrumentos para nosso próximo exercício.

Como eu já esperava Russell não deixou nenhuma chave comigo, ainda bem que garanti isso.

Depois de conversar um pouco com a Sra. Beck e dar os presentes, eu subo com Klara.

–Você trouxe, de novo, vodca pro meu pai. Eu lhe avisei. –Diz ela assim que entramos.

–O que ele tem contra vodca? – pergunto desentendida.

Então logo me lembro da conversa que tivemos há algumas semanas, sobre seu pai odiar vodca.

–Ah, desculpe Klara, eu realmente me esqueci – digo sincera.

Limpo minha mão suada no vestido.

–Eu mesma sabia que não iria se lembrar. Não se preocupe – ela faz um sinal de desprezo para não me importar.

–Russell ama vodca – ainda tento argumentar o porquê trouxe e desculpar-me porque esqueci.

Enquanto não escurece, eu e Klara conversamos. Algumas conversas bobas e risadas. Depois eu a ajudo arrumar a cama para mim. Vamos dormir no quarto de hóspedes onde tem duas camas. Arrumo minhas roupas no armário e nas gavetas.

–Klara, tenho uma surpresa. - Peguei as chaves da costura do vestido e chaqualhei.

–Hanna! Eu quero morrer sua amiga.

Eu dou uma risada.

–Vamos?

–Primeiro temos de esperar minha mãe dormir. - Diz Klara.

O pai de Klara é um general do exercito. Ele sempre esta em missões, como hoje. Klara nem Anne sabem aonde ele vai, é tudo secreto.

Quando a nevasca para, decidimos ir.

Descemos as escadas com todo cuidado para não fazer barulho. E vamos para minha casa.

A neve no chão está muito alta. É engraçado o barulho de nossas botas, e muito difícil de andar. Vamos "correndo" brincado de guerra de bolas de neve. Klara sempre teve uma mira melhor que a minha, mas tenho bons reflexos, isso acaba deixando a brincadeira interminável.

Quando chegamos a minha casa vamos até os fundos. Depois de quase meia hora tirando a neve na porta, finalmente entramos.

Vamos até o quarto de Haralda.

Coloco as mãos na fechadura da porta. Trancada.

–Está, trancada!

Eu dou um tapa na porta, uma rachadura se forma. Olho atônita para a rachadura, nem bati tão forte assim.

–Deus Hanna, o que foi isso?

–Eu não sei. -Digo.

–Deixe-me tentar.

Ela pega um grampo de seu penteado.

Eu nunca poderia fazer uma coisa dessas, primeiro porque não tenho a mesma habilidade de Klara. E segundo, por eu nunca arrumar meu cabelo então nunca tenho grampos.

Depois de um tempo ela consegue abrir. Entramos no quarto. Logo eu me aproximo da cama para pegar a caixa. Procuro, mas não encontro.

–Não encontro.

Desgraçada! Escondeu a maldita caixa.

–Procure novamente. – Ordena Klara.

Eu obedeço, logo adentro para de baixo da cama. Vejo sapatos, alguns objetos perdidos, mas nenhum sinal da caixa.

–Não encontro Klara.

Ela fica um tempo em silêncio.

–Hanna, você derrubou a caixa.

–Sim.

–Deve ter caído alguma coisa que tenha caído.

Eu procuro. Por um tempo somente fuço, mas então encontro um papel amassado. Pego o papel e entrego para Klara ao sair.

Com cuidado ela desamassa o papel.

–Parece que estava molhada. -Diz ela concentrada e calma.

–Vamos para sua casa, esta ficando muito tarde. Amanhã voltamos.

Ela assentiu.

Guardamos o papel e saímos do quarto. Klara tem um pequeno problema ao trancar a porta, depois de uns vinte minutos finalmente conseguimos.

–Acho que essa porta nunca abrirá novamente. -Brinco.

Ela ri.

Depois de uma caminhada rápida, chegamos à casa de Klara.

Ao entrar em seu quarto, eu literalmente, esvaziei a sua mesa de maquiagem deixando se espalhar algumas coisas pelo chão.

–Minha maquiagem!- Protesta Klara.

Mas eu a ignoro.

–Sua bruta! Tome mais cuidado Hanna. E tente ser silenciosa.

–Onde esta o papel?

–Aqui.

Ela pegou o papel do bolso de seu casaco. Com cuidado ela o arruma na mesa.

–Tente desamassar. - Ordeno.

–Calma, se for com muita presa ele pode desmanchar.

Ela tinha razão. O papel estava em péssimo estado. Deixo Klara abri-lo. Ela é muito mais cuidadosa. Klara possui uma calma que eu nunca vou ter.

Concentrada Klara vai desamassando, parte por parte.

–Acho que ele foi molhado e tentaram secar. - Diz ela concentrada.

–Será que da para ler?- Pergunto.

–Eu não, mas você pode.

–Eu? Por quê?

–É russo não é? - Ela aponta para a primeira linha.

É verdade. Uma caligrafia muito delicada, mesmo estando nessas condições percebe-se.

Tento me concentrar para ler. "Traição"

–O que esta escrito?- Pergunta Klara curiosa.

–Traição. Continue.

Ela obedece, continua desamassando o papel.

Depois de quase quinze minutos, ela termina. Algumas partes do papel foram desfeitas, o que torna muitas frases incompletas. Também teve partes em que a tinta manchou grande parte do conteúdo.

–Uma fêmea traiu os... Alguma coisa. Alto nível, perigo... Acusada de... Condenada por... Morte.

–Isso foi... Confuso. - Diz Klara.

Eu concordo.

Quem seria essa fêmea? Quem ela traiu? O que Haralda tem a ver? Isso esta ficando cada vez mais interessante.

Ela encara o papel por um bom tempo.

–Elas foram acusadas por traição. Mas traição a que?- Pergunta ela.

Eu dou um sorriso.

–Isso nós vamos descobrir.

–Acho melhor dormimos. Antes que amanheça.

–É verdade.

Nos meus sonhos volto novamente para o trem que me trouxe para a Alemanha. Vejo o desespero no rosto de minha tia, ela olhava para a janela assustada, aterrorizada para ser exata, e tentava me acalmar e dizendo que tudo ficaria bem, embora eu tenha quase certeza que ela dizia mais para si mesma do que para mim.

Acordo com alguém tirando minha coberta.

Klara!

Eu jogo uma almofada nela.

–Acorde Hanna!

–Quero dormir! Hoje não tem aula.

Ela tampa minha boca.

–Exatamente. - Diz ela sorrindo maliciosamente.

O que ela tem em mente?

–Tenho uma surpresa. Agora se arrume!

Eu pego minhas coisas e vou para o lavatório. Arrumo-me o mais rápido possível. Faço minha higiene matinal. Coloco um vestido amarelo. Deveria ter pegado as calças. Coloco o casaco e as botas.

Saio do lavatório e encontro Klara na frente do espelho, fazendo algum penteado.

–Agora me conte. -Ordeno cruzando os braços.

Fico de pé atrás dela. Ela me vê pelo espelho.

–O que? Que você fica linda de vestido? -Diz ela com um sorriso sarcástico.

Pego um Ushanka que eu mesma trouxe e arrumo em minha cabeça, lançando um olhar mortal para Klara.

–Sabe do que estou falando. -Estou começando a ficar nervosa com ela.

–Pois eu não sei do que esta falando. -Diz ela voltando às atenções para o penteado.

–Ora Klara! Diga por favor!

–Esta bem eu digo. Só aguarde um pouco, sim?

Depois de esperar pela eternidade para Klara terminar, finalmente descemos.

–Não vão tomar café garotas?- Diz Anne.

Ela esta na sala. Paramos ao ouvir sua voz.

–Não mãe, obrigada.

–Aonde vão?

–Biblioteca.

Ela quer invadir a biblioteca? Estou gostando da ideia.

–Cheguem para o almoço.

–Sim mamãe.

–Obrigada Anne. -Digo.

Quando saímos, olho de um lado para o outro para garantir que não tem ninguém, viro-me e pergunto a Klara:

–Vai mesmo invadir a biblioteca? Como você é má. - Digo com um sorriso.

–Não seja boba. Ainda não é hora. Tem uma coisa muito mais interessante para você.

–Mas aqui é caminho para biblioteca. –Protesto na esperança de que ela tenha mudado de ideia.

–Primeiro vamos para o café Grim, tomar um café, então te mostro a surpresa.

Eu suspiro. Ela ri.

–Vamos Srta. Curiosidade. -Brinca ela.

–Não tem graça. -Protesto.

Paramos no café Grim. Sentamos em uma mesa próxima a janela. A mesa é de madeira e com uma toalha verde sobre ela. A atendente se aproxima me olhando com a sobrancelha erguida, vejo o símbolo nazista no seu broche. Mecho-me um pouco desconfortável na cadeira. Não sou bem vinda aqui. Acho que ainda não fui expulsa por estar com ‘a filha do general’.

Eu tomo um chocolate quente, com ovos mexidos e pão. Klara como de costume toma somente café. Ela é simplesmente viciada em café. Todas as tardes, Klara vem aqui tomar café, segundo ela é o melhor da cidade. Eu, particularmente, nunca gostei, sempre achei amargo.

Amanhã será 1938, o inverno esta ficando vigoroso. Sinto um friozinho.

Klara e eu conversamos algumas coisas alheias, sempre rimos muito. Vejo pelo canto do olho a atendente me observar e cochichar algo com o outro cliente. Sinto-me desconfortável, mas não conto nada a Klara.

Então vejo Marco de longe.

Quando ele chega perto da nossa mesa sorri.

Não posso mentir, ele tem um sorriso bonito.

–Posso me juntar às senhoritas?

Galanteador...

Observo Klara corando com um sorriso. Será que eu seria uma má amiga se os deixasse ás sós?

Apoio meu rosto em minha mão e apoiando meu cotovelo na mesa – Haralda teria um enfarte se me visse sentada dessa maneira - e vejo Klara timidamente concordar.

–Claro. - Klara sussurra.

É agora, tenho que dar essa oportunidade á ela, mesmo que signifique sem surpresa por hoje. O que não fazemos por uma amiga?

Levanto-me e me apronto para ir.

–Infelizmente, Hoyer, já estou de partida. Klara pode lhe fazer companhia, se for conveniente. Com sua licença.

Pelo menos não terei de me preocupar em pagar a conta também.

–Senhorita. -Diz Marco me dando passagem.

Klara esta atônita.

Pisco para ela. E mecho os lábios dizendo: 'estarei na biblioteca'. Agradeço a ele com um leve movimento com a cabeça.

Ela fica vermelha. Marco, educadamente, sorri.

Vou até o balcão e com um sorriso aceno para atendente, somente para provocar. E saio.

Entro na biblioteca. Mesmo grande, ela é bem quente.

Vou vendo às prateleiras a procura de um livro.

–Foi muito esperto de sua parte. -Diz uma voz masculina muito perto de mim. E que por sinal, eu a conheço muito bem.

–Aonde esta Kutner? –Pergunto, ainda encarando a prateleira a minha frente.

– Como soube?

–Tenho meus truques.

A verdade é que vi pelo canto do olho, seu reflexo na janela a minha esquerda.

Eu continuo minha atenção nos livros. Logo ouço ir, olho para o espelho, só para garantir. Continuo procurando algum livro.

Tenho uma enorme sensação de estar sendo observada.

Sempre tive sensações parecidas desde que cheguei à Alemanha, mas agora está mais intensa.

Pego um livro e deparo-me com um par de olhos verdes. Ele está do outro lado da prateleira.

–Kutner, o que esta fazendo? –Pergunto assustada.

Ele sorri.

–Escolhendo um livro. Pode me passar o de sua mão, por favor?

Olho-o desconfiada.

–Pois procure outro, este é de meu interesse.

Ele apenas sorri e sai. Não sei o que ele pretende com esses joguinhos, mas abro o livro e finjo estar concentrada nele, embora eu esteja esperando seu próximo movimento.

–A senhorita não vai me fazer esse favor?

Levo um susto e quase solto o livro no chão, não estava preparada o suficiente para ouvir sua voz suave. Fecho os olhos tentando recuperar a calma que não tenho – e provavelmente nunca tive.

–Kutner, que isso não se repita! –Digo irritada.

Ele ri.

–Me encontre na floresta hoje?- Pergunta ele.

–Você é louco?!

Pergunto mais assustada pelo convite do que pela sua naturalidade.

–Talvez. - Ele sorri. - No pôr do sol.

E vai embora.


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