O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 13
Capítulo 12 - Coração Negro




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Eruwin não conseguia entender por que seus planos nunca davam certo. O que a vida tinha contra ela, afinal? Talvez aquelas malditas pernas humanas tenham lhe dado alguma espécie de azar. Agora ela nunca conseguia o que queria. A pobre sereia, meus queridos companheiros, estava em pedaços. Seu pobre coração (e eu afirmo que sereias têm coração) queimava em fúria.

Adry observava a bela criatura destruir boa parte da mobília de sua casa com aparente tranquilidade. Estava em um canto parcialmente seguro das investidas dela. Vários vasos quebrados, quadros e até mesmo uma pequena mesa. Somente quando a sereia fez menção de pegar o tinteiro o homem resolveu intervir.

— Por favor, isso não. — O homem chegou silenciosamente por trás do ser raivoso e segurou delicadamente a mão da sereia que sustentava o objeto. Ela pareceu se acalmar e devolveu-lhe o tinteiro. Eruwin encarava o chão com um olhar envergonhado, mas irritado. Adry, após se assegurar que o tinteiro estaria seguro, levou sua mão direita ao queixo de Eruwin. — Você irá conseguir se vingar, princesa…

Seus dedos subiram delicadamente pelo rosto dela, até que chegaram à venda escondida pelos cabelos ruivos da sereia. Ele a fitava tristemente, sua mente formulando diversas cenas de como o humano a cegou. Teria sido proposital? Que arma usou? Toda a informação que ela lhe passara era vaga… porém aquilo não lhe incomodava, possuía imaginação o suficiente para distrair sua curiosidade.

O aparecimento dela foi como tudo em sua vida, repentino e violento. Uma criatura monstruosa e mortal que se tornou bela como se fosse mágica. Ele conhecia a forma do ódio da sereia. Era feio, triste… e graças a ele, Adry podia entender como ela estava machucada.

 Ela lhe pareceu no início como um daqueles pássaros que perderam suas asas para algum humano cruel, mas Eruwin era uma sereia e era muito mais perigosa que um pássaro machucado.

— Aquela maldita… ela o tirou de mim bem quando ele estava em minhas mãos! — E quando Eruwin ia castigá-la… ele a salvou! A surpresa daquele momento… os dedos de Adry ainda acariciavam seu rosto, tentando lhe passar alguma calma. Ele jamais conseguiria… nada poderia acalmá-la. Nada poderia consertar seu coração despedaçado. O olho verde da sereia fitou os olhos cor de carvão de seu ajudante. Adry estava longe de ser feio, ao menos facialmente… e em nada se parecia com Henry. Aquilo a entristecia… porque para ela Henry era o humano mais belo que já encontrara. Como aquilo podia ser possível? Ela, uma sereia, ter se apaixonado por um humano? Certamente que não. Aquele humano Adry era bom para ela… sim, muito melhor do que Henry jamais fora. Afinal, Henry era muito teimoso… e se recusava a amá-la.

A sereia jogou o humano na poltrona, atacando-o em seguida com seus lábios. Aquela era a segunda vez que beijara Adry, a primeira fora para enfeitiçá-lo. Ambos se beijavam com uma intensidade assustadora, era um beijo agressivo carregado de raiva e frustração… a tristeza era o único elemento delicado. Eruwin afastou sua boca da do humano quando o desconforto tornou-se forte demais. Desceu do colo de Adry e afastou-se, talvez devesse dormir um pouco, quem sabe?

— Eruwin. — A sereia encolheu-se um pouco. Se tudo houvesse ocorrido conforme os planos, Adry jamais saberia seu nome. Ele aproximou-se dela outra vez, segurando-a pelos ombros e aproximando os lábios de sua orelha. — Eu sei que não posso concorrer com ele. Sei que você ainda o ama e que isso a machuca mais do que qualquer faca. Sei também que irá fraquejar... que não conseguirá matá-lo. Mas eu sempre estarei aqui, princesa, mesmo que você jamais venha a me amar… eu desempenharei qualquer papel por você… incluindo o do assassino. Quando você não tiver forças, eu irei vingá-la. Nem que isso te faça me odiar.

Em qualquer outra situação, Eruwin teria discordado. Claro que Adry não conseguia ver o coração negro de uma sereia. Provavelmente essa era a razão para que ele duvidasse de sua capacidade assassina. No entanto… estava cansada demais para se vangloriar. Sem uma única palavra, a sereia se dirigiu ao seu quarto e trancou a porta. Deixou-se cair na cama e passou a contemplar o teto, lembrando-se dos acontecimentos de horas atrás…

Logo após a dita princesa levar Henry embora, Adry e Eruwin os acompanharam. Fora um trabalho difícil, pois o velho olhava constantemente para trás e por isso eram obrigados a se esconder frequentemente. Em dado momento perderam o rastro, contudo encontraram Henry e o velho acidentalmente logo depois. Adry deduziu que eles deixaram a princesa em um lugar seguro e foram encontrar Leharuin sozinhos. Na hora a sereia acreditou que a sorte estava ao seu lado, mesmo que encontrar o refúgio tenha oferecido algum desafio. Adry não poderia dizer, com certeza, de onde os dois saíram e só conseguiram encontrar a garota quando a avistaram na janela de uma simplória estalagem. Eruwin entrou no lugar imediatamente e estava subindo as escadas quando foi impedida por uma mulher rechonchuda.

— Não me lembro de você ter pagado por um quarto, senho… — Adry apontou seu revólver para a boca da mulher, impedindo que ela terminasse sua frase. Ela abriu passagem e os dois subiram. Entraram em dois quartos errados, mas quando entraram no certo… Ah, como Eruwin sorriu! Os olhos prateados da princesa arregalaram-se de espanto e então se comprimiram, demonstrando irritação.

— Ele não está aqui, sereia. A senhorita nunca irá pegá-lo. Tampouco conseguirá matá-lo. — Aquela humana era irritantemente audaciosa. O ódio de Eruwin apenas crescia.

— Eu não estou aqui por ele, querida. — O mais belo dos sorrisos demoníacos se alastrou pelo rosto da criatura. — Estou aqui por você. Para lhe ensinar a não frustrar meus planos. Adry…

A humana tentava disfarçar o medo que sentia com uma coragem inútil. Com o vaso de flores, tentou acertar a cabeça de Adry, porém teve o vaso retirado de sua mão. O homem segurava os braços da garota por trás dela, deixando-a parcialmente indefesa. Eruwin aproximou-se lentamente da humana, com uma expressão divertida no olhar.

— Eu posso ver em seus olhos… sim, posso ver que você não ama Henry. Muito menos o tal Leharuin. Se não é por amor, diga-me… Quais são seus motivos?

— Precisamos de motivos para salvar a vida de alguém inocente? — Em tentativas inúteis, a princesa buscava se soltar. Ela tinha energia, Eruwin tinha que admitir. — Você não tem o direito de matar uma pessoa só porque ela não retribuiu seu amor.

— Eu não irei matá-lo porque ele não retribuiu meu amor. Vou matá-lo porque ele escolheu um cadáver! Fui vencida por alguém que nem ao menos pode amá-lo! — Aquela dor a humana jamais entenderia. Humano algum entenderia. Ainda mais aquela humana em particular… a princesa podia não saber, entretanto Eruwin via… sim, Eruwin sabia. — Você não pode entender porque não há amor em você.

— Não entendo aonde a senhorita quer chegar.

— Eu posso não saber muitas coisas, princesa, mas uma coisa uma sereia pode entender e essa coisa é o amor. Ele não muda, ele sempre é o mesmo. Tanto para mim quanto para você. — A felicidade que a vingança por vezes trazia invadia a alma de Eruwin. O que ela não sabia, meus amigos, é como ela parecia um monstro naquele momento e talvez nunca possa entender a expressão de horror que pouco a pouco se formava no rosto de Analiese. — Por isso eu posso dizer… você não consegue amar. Não tente negar, eu sei. Nunca irá se apaixonar por alguém, o máximo que conseguirá é se enganar a ponto de acreditar estar apaixonada. Sua existência é vazia e dispensável. Diga-me, por que você ainda insiste em viver?

— Não é verdade. Está mentindo, eu amo meu irmão e meu pai… eu amava minha mãe. — O desespero das palavras da humana apenas divertia ainda mais a sereia. Sim, aquele sentimento tão palpável… como a humana devia estar arrependida de ter entrado em seu caminho!

— E quando eles se forem, quem restará para você amar? E talvez você nem mesmo os ame… — A cabeça da humana balançava de um lado para o outro veementemente, como se dessa forma as palavras de Eruwin não pudessem atingi-la. — Você chorou quando sua mãe morreu? Sim? Não? Diga a verdade, princesa. Diga…

— Pare! Eu imploro, pare com isso! — Eruwin finalmente conseguira fazer aqueles olhos prateados derreterem na forma de lágrimas. Iria despedaçá-la, colocá-la em cacos e talvez só assim ela pudesse entender a intensidade do amor de uma sereia.

— Como pode não chorar na morte de sua tão amada mãe? Talvez porque ela não fosse tão amada assim. — Veja só! Conseguira levar aquela humana aos soluços! Era incrível como aquilo lhe arrancasse lágrimas e a morte de um ente querido, no entanto… — Meu coração é negro e ainda assim é capaz de amar. Mas você, princesinha, você não tem um coração. Adry, acha que ela sofreu o suficiente?

— Não. — Sempre dono de curtas palavras, apesar de todo o talento de contador de histórias que possuía, era como se as guardasse… não poderia desperdiçá-las com respostas tão triviais. 

A princesa não sofrera quase nada. Era necessário causar ainda mais dor.

— Por favor, Adry, quero que ela prove um dos maiores pesadelos que uma mulher poderia experimentar. E não seja gentil. — Claro que a princesa estava confusa. Até mesmo Eruwin entendia mais sobre o mundo e suas dores que aquela humana. Lembrava-se das histórias, histórias do que os homens por vezes faziam com suas irmãs... como aquilo era engraçado! E agora, Henry? Quem nada entendia? Quem não poderia sobreviver em seu mundo? Adry empurrou a humana agressivamente para a cama e o tormento dela teria começado… teria começado, mas…

— Eruwin! — Mesmo a mais simples recordação era capaz de fazer o todo o ser da sereia gelar. Ninguém deveria saber seu nome. Henry não deveria saber seu nome! Adry ficou parado, olhando para ela, maravilhado agora por ter conhecimento sobre o nome da criatura que o enfeitiçara. Quase não notou quando a princesa fugiu e correu para os braços do velho que a trouxe até ali.

— Henry… — Aquele tão pequeno nome era tão pesado agora. O olhar frio do humano fez com que ela desse um passo para trás. Ele quebrou o feitiço… ele não a amava mais. E tudo que ela podia ver em seus olhos era um sentimento de nojo. O que ela fizera de errado? A culpa de tudo aquilo era dele! Ele poderia tê-la amado, Eruwin via no rosto dele… e então ele mudou repentinamente. Tinha medo, por que ele tinha medo dela? Humanos eram tão mais cruéis! Eles poderiam ter se amado para sempre e ela não precisaria matá-lo agora. E eles não estavam mais lá. Fugiram, ela deixou que eles escapassem… Talvez esse fosse o motivo que levou Adry a duvidar dela. Duvidar que ela fosse capaz de matar Henry.

Ela era capaz e o mataria. Então morreria logo depois. Porque era desse modo que o amor funcionava para o coração negro de uma sereia. Sempre fora desse modo e sempre seria. Não poderia haver misericórdia, não poderia haver perdão.


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Notas finais do capítulo

Queridos, peço perdão pelo tamanho do capítulo. Eu gostaria que ele fosse bem maior, porém tenho certos problemas para traduzir os sentimentos da Eruwin, haha. Bom, peço desculpas também pela demora e prometo que irei compensar escrevendo um capítulo e postando o quanto antes, talvez até mesmo hoje se eu conseguir. Espero que possam me perdoar. Gostaria de agradecer também os comentários e recomendações, eles são maravilhosos e fazem com que eu me sinta especial! É isso, espero que gostem do capítulo. Qualquer erro podem me comunicar que irei corrigi-lo o mais rápido possível! Beijinhos!