Last Letters escrita por AnyBnight


Capítulo 4
IV: Mãe e Filha.




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"Eu não mereço ter um nome. Não desde que deixei meu maior tesouro, minha pequena Collina, cair nas mãos daquele demônio. Éramos apenas nós duas, pobres camponesas a beira da falência. Collina tinha apenas 5 anos, uma criança de saúde fraca que precisava estar sempre recebendo cuidados médicos, e o único médico em nossa região era o doutor Drevis.

Desde o começo era estranho como ele atendia Collina, parecia demasiadamente interessado nela. Por isso, nunca deixei que ele a visse sem eu estar perto. Ele também não nos cobrava muito e atendia diretamente em nossa pequena cabana.

E então aquele dia finalmente havia chegado. Já não tínhamos mais nada e até nossa casa fora tomada para cobrir dívidas. Coincidentemente, era um dia de consulta. O doutor Drevis veio junto com sua assistente, Maria, no exato momento em que o banco havia nos enxotado de casa.

Depois de uma conversa curta, ele nos ofereceu moradia em sua mansão. Eu só não sabia em que parte da mansão ficaríamos.

Aquele subsolo terrível... E me foi uma surpresa haverem outros na nossa situação. Não entendia o porquê quando cheguei, mas fui perguntar aos meus "vizinhos". Nem todos tinham sido levados pra lá pelo mesmo motivo. Alguns eram só mendigos que o doutor acolheu, outros eram pacientes de verdade. Não dava mesmo para entender aquilo.

Apesar de alguns caras agressivos batendo nas portas de metal das celas, foi uma vivência bem tranquila no pouco tempo em que estivemos lá. Collina ainda podia ter seus cuidados de sempre, e logo faria aniversário. Uma das poucas coisas que o banco não nos tomou foi o que dei à ela como presente: um pendente.

No 6º aniversário da minha filha foi quando tudo aconteceu.

O doutor veio até a nossa ala do dormitório como de costume. "Ora, ora, que pendente bonito, Collina." nos cumprimentou com um sorriso, um sorriso no qual eu não conseguia confiar. "Pronta para a consulta de hoje?"

Collina hesitava em responder, não era de agora que ela parecia ter medo do doutor Drevis, e ficou pior desde que viemos pra cá. O doutor continuava sorrido paternal "Sabe, eu tenho uma filha também. Se você for boazinha, eu deixo você brincar com ela." A última frase fez Collina mudar sua expressão. Não haviam crianças pequenas ou brinquedos onde estávamos, isso realmente animava ela.

Ainda hesitante, ela aceitou ir. Eu fui também, mas ao chegar na passagem do dormitório, Maria não me deixou passar. "Desculpe, mas como a menina está ficando mais velha, receberá um tratamento especial. A senhora não pode ir." Claro que discuti com a assistente, não deixaria de jeito nenhum minha filha sozinha com aquele homem que ficava cada dia mais estranho. "Entendo sua preocupação, senhora, mas é um procedimento que recusa a presença de estranhos. Por favor, espere aqui, logo Collina estará de volta".

Me arrependo tanto de ter cedido...

Voltei para meu dormitório com um forte aperto no peito e sentei-me na cama, estava com um péssimo pressentimento. Impaciente, comecei a andar pelo espaço, sem tirar os olhos da porta. Jurava que estava ouvindo a voz de Collina gritando "Mama!" num desespero inimaginável..

Depois de um tempo, que pra mim pareceu ser muito, a porta estava sendo aberta. Corri pra lá com o coração na garganta, mas era apenas Maria, sem nenhum sinal de Collina. Perguntei para ela sobre minha filha, mas ela falava como se não a conhecesse. Maria estava estranha e tinha algumas manchas avermelhadas no avental. Parecia...

Sem pensar duas vezes, empurrei ela e corri pela porta. Buscava pelo consultório onde o doutor normalmente atendia Collina, mas meus instintos me guiaram para um caminho diferente do habitual. Eu só conseguia pensar o pior, podia ouvir Collina gritando em minha cabeça.

"Collina! Collina! Collina!"

Por fim cheguei à porta final, sem prestar atenção em nenhum detalhe macabro do caminho que me levou até lá. Abri aquela porta com força, chamando por minha filha. O que encontrei não poderia ser pior.

Vi o doutor de costas - ele olhou para trás com o barulho da minha chegada - e havia um leito na sua frente. Não dava pra ver bem o corpo sobre o leito, mas meus olhos não me enganavam quando àquilo. O braço de cor estranha pendulando fora do colchão era de uma criança. Era... Collina...

"Seu monstro! O que você fez com e--"

Algo havia me atingido com força na cabeça. Acabei mordendo forte minha língua antes de cair tonta no chão. O golpe viera com tal força que eu estava a sangrar, rastejando no chão esperando que ele homem me respondesse.

"Eu prometi à Collina que a levaria para brincar com a minha filha, não? Pois bem, elas irão brincar. Collina será uma ótima boneca."

A tontura e o sangue me fugindo não me deixava reagir, estava perdendo a consciência aos poucos. Um último surto de adrenalina me permitiu apenas tremer em ódio enquanto me levantava. Tentei avançar contra o doutor, mas outro golpe me atingiu, agora nas costas.

"Sua pontaria é admirável, Maria."

"Doutor, me perdoe por deixá-la escapar."

"Ora, teríamos de dar algum destino pra ela alguma hora. Mesmo que só a menina seja útil. Ponha-a com o resto dos corpos."

"Co...lli...na..."

Esticava meus braços, tentando tocar o de minha filha, e então novas facas trataram de me ceifar de uma vez.


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