"Tudo é milagre.

Tudo menos a morte...

— Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres"

Manuel Bandeira

Gritos ouço gritos.

Estou no mesmo corredor escuro, empoeirado e sombrio que possui várias portas.

Há uma mulher gritando. Quero ajudá-la.

Começo a correr na direção dos gritos.

No final do corredor há uma porta, encosto o ouvido nela e constato que é de lá dentro que vem os gritos.

Tento abrir a porta, mas ela está trancada, por algum motivo desconhecido não estou com minha varinha.

Tento arrombar a porta dou alguns passos para trás, volto correndo e bato o ombro na porta mas ela não abre, após algumas tentativas finalmente consigo. Os gritos cessaram.

Quando entro no cômodo percebo que preferia não ter entrado,

Vejo pessoas que conheço, as que mais amo no mundo.

Meus pais estão caídos no chão em ângulos estranhos, com os olhos arregalados e a boca aberta, mas o que mais me choca não é isso, e sim porque eles estão com as mesmas roupas que usavam da última vez que eu os vi.

Há um ser medonho em um canto escuro da sala, meio chorando, meio uivando. Por um momento consigo vislumbrá-lo e vejo que ele é metade homem metade lobo, metade um monstro peludo de olhos amarelos e metade o meu grande amigo Remo Lupin.

Há um rato guinchando, um barulho insuportável, ele recebe um chute e cai desmaiado. Quem o fez foi a criatura metade homem metade lobo com as mãos tampando os ouvidos.

Tenho medo de continuar observando o local, mas algo mais forte que minha vontade de sair correndo me obriga a fazê-lo.

A direita do cômodo há duas pessoas, uma é meu melhor amigo Sirius Black. Ele está caído no chão agonizando, ele está cheio de cortes pelo corpo de onde o sangue sai como em uma mina d’água, o sangue escorre de sua boca, seus olhos azul-acinzentados estão saltados de dor mas não de medo.

Debruçada sobre ele está uma linda jovem de cabelos cor de fogo e tristes olhos verdes. Ela está usando um vestido de verão branco que agora tem manchas vermelhas, pois ela está toda, pois ela está toda suja pelo sangue de Sirius. Ela chora compulsivamente. Lílian é a única de branco, todos os ouros usam roupas em tons escuros. Por algum motivo isso faz todo o sentido.

Com um último tremor Sirius morre, lágrimas escorrem pelo rosto de Lílian, lágrimas copiosas escorrem pelo meu rosto. Dou um passo na direção dela, percebendo o movimento Lílian olha para mim, então consigo ver o tamanho de sua tristeza.

Ela me olha de forma acusatória, como se eu fosse o culpado, como se eu tivesse matado Sirius. A atitude me assusta, mas então percebo com alívio não está olhando para mim e sim para algo atrás de mim.

Ouço uma gargalhada fria e cruel de arrepiar, me viro e dou de cara com um ser terrível a minha frente. Ele tem forma de homem e alma de monstro, isto é se ele tiver alma. Sua pele é branca como a neve, mas seu coração é negro como o ônix, seus olhos brilham e sua felicidade é tão grande quanto a dor e a tristeza que ele infringe.

Voldemort.

Ele dá outra gargalhada, instintivamente me aproximo mais de Lílian em uma posição protetora. Um sorriso de desdém se forma nos lábios de Voldemort.

A raiva queima em minhas veias.

Lílian se levanta, vejo em seus olhos desprezo, a raiva, o ódio e o orgulho, um olhar tão terrível, tão frio que ela nunca destinou a mim. Seu queixo está erguido em sinal de orgulho e sua expressão é arrogante.

Ele ouviu novamente aquela gargalhada horrível, mas ele não tinha medo, percebeu que Lílian também não tinha e aquilo lhe deu forças.

Ele ouviu uma voz tão terrível quanto sua risada.

— Avada Kedavra.

Ele se preparou para receber a maldição, para se sacrificar no lugar de Lílian, viu a maldição vindo como em câmera lenta. Mas para sua surpresa não morreu. Como se ele fosse um fantasma, como se ele não existisse. A maldição o atravessou atingindo Lílian.

Ele a viu caindo no chão lentamente, seus cabelos se agitando, seus olhos perdendo o brilho, seu rosto perdendo a pouca cor que lhe restava, seus olhos se fechando para sempre. Havia um tipo de beleza terrível na morte, era terrível, mas Lílian estava lindíssima.

Os olhos de Tiago ficaram embaçados quando novas lágrimas caíram de seus olhos e a dor que ele sentiu foi muito maior do que todas as outras que ele já havia sentido.

A dor da perda. A dor de ver a pessoa que mais amava no mundo morrer sem poder fazer nada para impedir ou mesmo para morrer junto com ela.

Pela última vez ele ouviu aquela horrível gargalhada e sentiu o ódio se apoderar dele.