O Feiticeiro Parte III - O Medalhão de Mu escrita por André Tornado


Capítulo 31
IV.4 Um recanto do paraíso.


Notas iniciais do capítulo

Capítulo narrado na primeira pessoa.



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Atrás de uns arbustos cerrados, que formavam uma muralha verde natural, escondia-se a lagoa. As suas águas eram tão transparentes que se via o fundo de seixos coloridos. Uma cascata alimentava a lagoa, numa torrente límpida proveniente de uma depressão rochosa mais acima, transbordando adiante para um ribeiro que descia pelas montanhas. Nas margens da lagoa havia rochas lisas como plataformas e plantas aquáticas viçosas nascendo entre os pedregulhos onde havia terra escura. Em redor, árvores antigas, gigantes mudos que filtravam a luz do sol e espalhavam uma sombra fresca.

- Que sítio lindíssimo! – Exclamei.

Son Goten sorriu.

- Era aqui que vinha nadar com o meu pai e com Ubo.

- Bem, já devias ter contado que este sítio existia – censurou Trunks. – Há dois dias que preciso de um banho!

- Estamos cá há dois dias, Trunks-kun…

- Exatamente!

Era a manhã do segundo dia nas montanhas e fazia calor. Estávamos todos necessitados de um encontro demorado com a água, concordei.

O primeiro dia decorrera modorrento. Trunks e Goten sentiam demasiada falta um do outro e estiveram juntos praticamente todas as horas. Quisera compreender, lembrando-me das lágrimas de Trunks na minha dimensão. Acabara por compreender, admitira-o com relutância. Mas ser relegada para segundo plano magoava-me e irritava-me. Estava roída de ciúmes.

No entanto, inesperadamente, as coisas emendaram-se.

Adormecera dentro da cabana, entediada e sozinha. Goten fora buscar-me, quando a tarde descaía para o fim. Dissera-me que estavam a preparar um banquete, que haviam caçado um par de javalis, mas que tínhamos de os comer longe. Tinham acendido uma fogueira que podia denunciar a nossa presença nas montanhas e, por isso, o local era afastado da cabana. Perguntara-me por que razão era Goten que me vinha buscar e não Trunks, mas aceitei a boleia. Encavalitara-me nas costas dele e voáramos pela floresta, rodeando as árvores, tão velozmente que fechei os olhos pois afligia-me parecer estar quase a chocar com os troncos.

Sentara-me numa das três pedras que se dispunham em redor da fogueira. A carne a assar cheirava maravilhosamente bem, estava cheia de fome. Os dois rapazes tinham tratado de tudo. Para além dos dois javalis havia amoras, maçãs e uns frutos estranhos, como cabaças listadas.

Goten ficara a tratar do fogo e Trunks sentara-se na pedra junto à minha. Dera-me a mão. Olhara-o espantada com o gesto. Ele sorria-me com ternura, um brilho incandescente nos olhos azuis. Derretera-me, rendera-me, quisera chorar de felicidade. Sorrira-lhe de volta. Dera-me um beijo na cara, singelo e doce. Estávamos a fazer as pazes, ou, pelo menos, eu com ele. Perdoara-lhe toda a indiferença, percebera que se continha pois Son Goten estava ali connosco. Percebera que entre ele e Goten nunca haveria de existir interferências.

Enquanto se servia o repasto, entre piadas e risadas, Trunks provocando Goten, Goten respondendo a Trunks, tomara a decisão de não forçar nada – estava na dimensão dele, as regras era ele que mas ditaria.

***

A água da lagoa parecia-me fria, mas tentadora. A manhã prometia mais um dia de calor nas montanhas e não suportaria continuar sem me lavar. Já bastava não ter roupa decente com que me vestir.

Trunks disse:

- Quem vai primeiro?

- Podemos ir ao mesmo tempo – argumentou Goten.

E sem esperar réplica, como se fossem apenas um só, com um pensamento único perfeitamente sintonizado, Trunks e Goten saltaram para a lagoa. Os dois afundaram-se, lançando uma potente vaga de água que salpicou o sítio onde eu estava. Num reflexo, tapei a cara com o braço esquerdo para me proteger, mas fiquei com os cabelos molhados.

Goten veio à tona, Trunks apareceu a seguir. Esguichou água da boca. Chamou-me, acenando:

- Ana, vem!

Olhei para os limites do pedregulho. A descida afigurava-se complicada, porque era a pique e uma altura considerável separava-me da superfície da lagoa. Olhei para trás, à procura de uma ladeira que me levasse até às margens. Trunks percebeu.

- Salta! – Pediu, tornando a acenar. – É mais divertido.

- Saltar?

- Não tenhas medo. Estou aqui.

Recuei um par de passos. Dei uma ligeira corrida. Encolhi as pernas, agarrando-me aos joelhos. Fechei os olhos, retive o ar nas bochechas.

A água penetrou no meu corpo num abraço gelado. Encolhi-me com a sensação abrupta de ter passado do calor para o frio. Sacudi os pés e alcancei a superfície, saltando, abrindo os braços e espalhando um véu líquido em redor. A água doce era macia, não ajudava a flutuar como a água salgada do mar e sentia-me sem sustentação. Esbracejei, consegui alcançar um ponto da lagoa em que tinha pé e ergui-me, penteando os cabelos molhados para trás com as mãos. Sorri com a sensação boa de estar a lavar o suor e a poeira dos dias anteriores.

Quando abri os olhos tinha Goten na minha frente, tão corado que, se enfiasse a cara na água, esta era capaz de ferver.

- O que é que se passa? – Perguntei.

- Ana-san… - gaguejou e fez surgir timidamente o dedo indicador. – A tua… t-shirt.

- O que é que tem a minha t-shirt?

Olhei para baixo.

Tinha um grande problema. Era branca e estava molhada, colada ao corpo, a realçar os contornos dos seios, os mamilos escuros, todos os detalhes. Enfiei-me dentro de água, corando também.

- Ah… Gomen nasai, Goten.

- Eu é que não devia ter olhado… Gomen nasai, Ana-san.

E afastou-se com uma braçada.

- Podes tratar-me apenas por Ana.

Espreitou-me.

- Hum?

- Ana… É o meu nome. Não é preciso que me trates por Ana-san. Afinal, somos quase da mesma idade.

Sorriu-me.

Trunks emergiu junto à cascata. Chamou pelo amigo, para experimentar mergulhar ali, no centro da torrente ruidosa. Goten submergiu, nadou debaixo de água até onde estava o amigo.

Aproveitei para descontrair e também nadei. Apanhei alguns seixos, pesava-os na mão, largava-os sentindo a mão mais leve. Se fechasse os olhos eram como se fosse seixos e água da minha dimensão. Adorava enganar-me dessa maneira, mentir que era tão real e concreto como o meu mundo. Mas não passava de uma fantasia deliciosamente colorida e eu era igual à fantasia, desenhada e animada. E queria ficar assim para sempre.

Os dois rapazes, como se fossem ainda apenas miúdos, brincavam, chapinhando, rindo-se. Engoliam água no meio da brincadeira, ouvia o gorgolejar quando algum se engasgava, os gritos de prazer pueril. Perdiam-se entre as bolhas e a espuma, numa canseira louca, divididos entre a superfície e as profundezas, competindo, provocando-se, estreitando ainda mais a amizade que existia entre eles.

Saíram da lagoa, trepando como macacos pelas pedras lisas que ladeavam a cascata. Fizeram uma competição de saltos e de cambalhotas. Eu continuei a descontrair-me e a nadar, dando-lhes todo o espaço. As saudades ainda não estavam inteiramente mitigadas e aqueles dias sarariam as feridas abertas, os mal-entendidos gerados. Trunks precisava de se reencontrar, de ser o Trunks que tinha sido antes de ter ido parar à minha dimensão.

Desapareceram por alguns instantes. Ouvi-os rirem atrás da vegetação enquanto ensaiavam uma espécie de treino. Não conseguiam ficar muito tempo sem lutar, era contrário à natureza guerreira deles. Escutei os golpes e as gargalhadas, as tiradas espirituosas, as réplicas engraçadas.

Sorri. Descobri que adorava ver Trunks feliz.

***

Boiava no centro da lagoa, olhando para o céu que se escondia atrás das copas das árvores que fechavam num abraço verde e protetor aquele recanto do paraíso. Por momentos, esqueci-me que aquilo não era umas férias.

A água moveu-se subtilmente, alguém entrava na lagoa deslizando como um crocodilo silencioso. Voltei-me e descobri Trunks. Estava encantador com o rosto molhado, os cabelos púrpura colados à testa, os olhos cintilando com os matizes das gotas de sol refletidas na superfície da lagoa. Adorei-o naquele segundo.

O meu sorriso desapareceu quando ele se colou a mim.

- Onde é que estão as tuas roupas? – Perguntei.

- Não vamos precisar de roupas.

- Não… vamos? Nós…?

Beijou-me de repente. Com um gesto rápido tirou-me a t-shirt, desenfiando-a pela cabeça. Afundei-me envergonhada na lagoa até ao queixo, mas esta era tão transparente que se veria tudo.

- Trunks! O que é que pensas que estás a fazer?

Beijou-me outra vez, trincando-me ligeiramente o lábio inferior.

- Tem sido uma tortura estar contigo e não te poder tocar como quero.

- Eh… O que é que queres dizer?

- Não aguento mais.

O beijo seguinte foi ainda mais demorado. As mãos desfizeram o nó do cinto que me prendia as calças. Tocou-me nos quadris, puxando-me para si, aconchegando-me ao corpo dele debaixo de água. Afastei-o, pressionando-lhe os ombros.

- Espera! E Goten?

- Mandei-o embora. Disse-lhe que precisava estar contigo.

Procurou pela minha boca, desviei-me ligeiramente para poder continuar a esclarecer aquela situação.

- Mas ele pode voltar…

- Não vai voltar enquanto não acabar.

- E como é que ele vai saber…?

Lambeu-me o pescoço até à orelha, cheirando-me, aquecendo-me a pele.

- Eu e ele temos uma ligação especial – explicou, beijando-me. – Somos irmãos, conseguimos comunicar mesmo sem palavras. Ele irá saber quando deve voltar. Não te preocupes, Ana… Estamos sozinhos.

Olhei em volta para me certificar que era mesmo assim, que estávamos sozinhos. Distraiu-me com novo beijo.

Agarrou em mim pela cintura, sentou-me em cima dele. Estávamos numa zona menos funda da lagoa, os meus joelhos rasparam nos seixos. Enrolei os braços em redor da cabeça dele. Sorrimos um para o outro.

Acariciei-lhe o rosto devagar, limpando com os meus dedos frios o excesso de água.

- Vai ser diferente – sussurrou-me ele. – Tens o corpo da minha dimensão.

- Continuo a confiar em ti.

Fizemos amor entre as plantas aquáticas, numa rocha lisa e quente, banhados por um raio de sol. Lembro-me de ter visto borboletas por cima de nós, de ter visto estrelas em plena luz do dia.

Quando terminámos, olhou-me com intensidade.

- Irei lutar sempre para que fiques comigo. És minha. Não irei abrir mão de ti… Nunca!

Respondi-lhe:

- Não irei a lado nenhum.

Fechei os olhos, embalando-me num último beijo.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
O Olho do Dragão.



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