O Feiticeiro Parte III - O Medalhão de Mu escrita por André Tornado


Capítulo 21
III.3 A ira do feiticeiro.




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Nos aposentos do Sumo-sacerdote, a atmosfera estava pesada.

- Devia dar-vos um castigo exemplar para que aprendam a não ignorarem as minhas ordens, bando de incompetentes!

Como sempre a voz era monótona, sem pingo de entoação, mas os olhos raiados de Zephir cuspiam o mais elementar dos ódios. O colar dourado que usava refulgia com a luz das velas que ardiam nos castiçais de prata. A túnica vermelha caía-lhe desajeitadamente sobre o corpo magro, o que não impedia a nobreza orgulhosa e sombria do porte.

Kumis respeitava o mestre. Julep também o respeitava, mas não chegava aos exageros do irmão gémeo, que parecia mais temê-lo que respeitá-lo. Mas Keilo, o saiya-jin, vindo de um mundo aparte, desprezava-o e nem procurava escondê-lo.

- Julguei que tivesse sido claro. Nada de combates dentro do templo. E o que foi que sucedeu hoje? Combateram dentro do templo! Destruíram o centro do Universo, a glória da minha primeira conquista. Irritaram-me!... E vocês não queiram ver-me irritado.

- É impossível para um guerreiro controlar-se quando luta num potencial tão elevado. Existem… danos colaterais.

Zephir voltou-se para Keilo que falara. Encostava-se à parede, braços cruzados, um joelho fletido, queixo sobre o peito, olhos fechados.

- A destruição do Salão da Luz é mais que um dano colateral… – E cuspiu a palavra: – Saiya-jin!

Voltou-se depois para os demónios, apontou-os com um dedo esquelético.

- Vocês são os meus guerreiros. Servem-me, incondicionalmente. São utilizados por mim, criei-vos. Devem-me obediência, submissão. Devem-me a própria vida! Se não me servem, acabo com vocês… Mesmo sendo imortais, conheço o vosso ponto fraco, Julep e Kumis. E tu, saiya-jin, não passas de um reles feitiço, mesmo com todo esse poder que gostas de exibir. Não passas… de uma miserável lenda, poeira dos tempos, lembrança de uma raça extinta. Vives porque eu quero. E se eu quiser, acabo contigo.

Keilo encarou-o. Ameaçou com um sorriso torto, exibindo os dentes.

- Sim, fá-lo, feiticeiro. Acaba comigo… Depois serás tu a enfrentar sozinho Kakaroto… Será digno de se contemplar. Apenas com uma mão, ele vai conseguir partir esse teu pescoço raquítico. E o ambicioso feiticeiro que se serve de um livro mágico de um espírito do Outro Mundo e da sabedoria de um templo vazio para conquistar o Universo… deixa de existir.

A ameaça foi intolerável, apesar de Zephir ter apreciado a ousadia. Utilizar um saiya-jin era perigoso, mas compensador, em determinados momentos. Haveria de ser o seu garante da vitória total. Era-lhe demasiado precioso, apesar de o odiar. Mas também o dominava e isso era o que lhe dava mais prazer, domar o indomável, anular o rebelde.

Elevou um braço, encurvou os dedos da mão, como uma garra. Keilo ajoelhou-se com um grito, agarrou-se à cabeça. Tremia em convulsões dolorosas, berrando. Os dois demónios não se mexiam.

- Volto a afirmar, saiya-jin. Vives porque eu quero. Se eu desejar, voltas à poeira dos tempos, à lembrança… E, pelo que tenho visto, talvez deixes de ser uma lenda. Procurarei outra… Existem milhentas pelo Universo fora. Basta um feitiço e terei comigo outro guerreiro poderoso… Submisso. Um guerreiro que lute por mim…

Keilo urrava, babando-se, tentando escapar-se da garra que o manietava.

- E sabes, saiya-jin? Irei ser o Senhor do Universo… Um deus. Muito em breve. E não faltarão guerreiros que lutem por mim, os melhores, os invencíveis. As lendas!... Nessa altura, não precisarei de os inventar com os meus feitiços, eles virão. Tão reais quanto eu.

Baixou o braço. Keilo calou-se com um ronco. Quedou-se ajoelhado, a arfar.

- Tem cuidado. Repito: não queiram ver-me irritado.

Com um estalar de dedos, fez a pedra de cristal voar de um nicho e aterrar numa mesa de mármore branco, finamente esculpida, situada no centro dos aposentos. Assentou as mãos no tampo, a pedra de cristal luziu, iluminando-lhe a cara sinistra.

- Aquilo que fizeram ao Templo da Lua foi abominável. Devia castigar-vos, mas só iria perder tempo e dispender esforços desnecessários. O que está feito, feito está. Não se pode voltar ao passado e remediar erros para consertar o presente.

Engoliu devagar.

- Estou desagradado com o correr dos acontecimentos. Son Goku e os seus companheiros adiantam-se. Graças à vossa incompetência, levaram a rapariga da Dimensão Real e levaram também o jovem saiya-jin que estava a curar para lutar ao vosso lado. Enfim, contratempos que estou disposto a relevar, pois sei que o pêndulo da vitória ainda dança do meu lado. Chamei-vos, não apenas para vos avisar que não tolerarei mais desobediências, mas também para incumbir-vos de uma nova tarefa. Que confio que será cumprida com acerto.

Os dois demónios nem pestanejaram quando Zephir depositou neles um olhar frio e incisivo. Anunciou:

- Quero que vocês procurem pelas bolas de dragão.

- Bolas de dragão? – Indagou Julep.

O cofre prateado que estava em cima da mesa abriu-se e uma pequena esfera cor-de-laranja transparente, com uma estrela vermelha no interior, flutuou no ar.

- Isto é uma bola de dragão – explicou Zephir a controlar a bola com o seu poder mental. – Existem sete no total. Quero que procurem pelas seis bolas de dragão que faltam e que mas tragam.

- E onde estão as outras seis bolas de dragão, sensei? – Perguntou Kumis.

- Estão espalhadas pelo planeta.

A bola de dragão regressou ao cofre prateado. Continuou:

- A pedra de cristal irá dar a sua localização. A seguir, irei imprimir no vosso cérebro essa informação através da magia. Julep, tu irás procurar três bolas de dragão e Kumis, tu irás procurar as restantes três. Aproximem-se!

Os demónios obedeceram.

A luz da pedra de cristal aumentou e começou a cintilar. Zephir roçou as mãos pela sua superfície áspera, como que a absorver o brilho. Os lábios começaram a mover-se, a murmurar o conjuro necessário. A pedra encheu-se de imagens intermitentes, a tremer debaixo das suas mãos. Cintilou um pouco mais e, a seguir a um clarão mais intenso, apagou-se. Zephir alçou os braços e depositou as mãos na testa dos demónios, sobre o “M” negro. Deu-lhes o conhecimento que eles precisavam e adiantou:

- Assim que encontrarem uma bola de dragão, quero que a tragam imediatamente para o Templo da Lua. A seguir, saem para procurar as restantes.

Julep e Kumis inclinaram-se numa vénia e responderam:

- Hai, sensei.

- Já conhecem a localização das seis bolas de dragão. Agora, partam!

- Hai.

- E não me dececionem.

Os demónios saíram dos aposentos.

Zephir afagou a pedra de cristal que voltava a luzir timidamente e olhou para Keilo que se levantava, roncando ao de leve. Havia um odor incómodo a pele queimada. A boca arrepanhou-se-lhe numa espécie de sorriso. Dera-lhe uma excelente lição, que haveria de durar até à próxima tentativa de rebelião. Que iria ocorrer, ele não tinha dúvidas. Keilo era um desafio constante à sua autoridade. Um teste ao grande Senhor do Universo.

- Saiya-jin, tu ficas para proteger o Templo da Lua, caso Son Goku regresse para me tentar destruir.

Keilo endireitou-se, tremendo, os músculos tensos.

- Ouviste a minha ordem?

- Hai… sensei – respondeu a custo, a voz rouca.

 E também saiu dos aposentos.

Quando se achou sozinho, Zephir atirou-se para um banco, fatigado, sem energias. Pensou no Salão da Luz, transformado num monte informe de escombros. A boca amargou-lhe, o coração ficou ainda mais seco.

Sabia que iria ter um caminho espinhoso até à glória, tinha-o lido nos livros da Sala Sagrada.

“A Terra está protegida… por poderosos guerreiros das estrelas”.

Mas nunca julgara que fosse assim tão espinhoso. Aquele maldito Son Goku estava a ser um adversário formidável, pior do que antecipara.

Concentrou-se noutro pensamento… Algo importante, fundamental, que não se podia dar ao luxo de ignorar. Cravou os olhos vermelhos na pedra de cristal. E lembrou o que não devia nunca esquecer: Toynara estava vivo!


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo:
O refúgio nas montanhas.



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