Clichê! escrita por Jessearth


Capítulo 5
Não foi tão ruim assim


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora (de novo). Sério. Estou com uns probleminhas criativos, e também, pra ajudar, meu pai passou toda o Carnaval em casa monitorando meu tempo no pc.
Ah, como foi o Carnaval de vocês? O meu foi horrível :P Fiquei vendo a segunda temporada do House M.D. Foi legal...
Enfim, até lá em baixo.
Enjoy!



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Sua velha mãe foi levada para a sala juntamente com Marta e Josias – os únicos filhos que ainda moravam na casa. A cadeira de balanço na varanda foi trazida para sala e nela sentou-se a senhora, pondo um xale em suas costas; um bordado inacabado e agulhas no colo. Seus dois filhos a ladearam, protetores.

Guilherme assistiu a toda a cena de pé, no meio da sala, com as mãos juntas sustentando o queixo. Com o restante de sua família o encarando ansiosos, com os santos nos cantos do aposento (Virgem Maria, Jesus na cruz, Santo Antônio e vários outros que ele nunca se dispôs a aprender o nome), Guilherme sentiu-se como um garoto confessando um crime. De certa forma, era exatamente o que ocorria.

"Então?" instou a velha.

Os olhos de Guilherme se encontraram com os de sua mãe e os dois travaram um acordo silencioso: ele iria falar e ela ouvir até o final.

Guilherme tomou fôlego e, espiando seus irmãos de cada lado de sua mãe, começou sua história. Contou tudo - ou quase; contou a sua trajetória de sua vida na cidade, como fora nos primeiros momentos, e como se ele se adaptou as mudanças. Estava inconscientemente adiantando o assunto principal - sua perna quebrada -, o tema que sua mãe já lhe interrogara, mas que fora adiado para a história. Falou sobre as dificuldades de emprego e moradia. Contou suas vitórias, muito poucos, é verdade, mas significativas. 

Parou um pouco para tomar fôlego, colocou as mãos nos bolsos e tentou da melhor forma continuar de pé. Josias percebeu e lhe trouxe uma cadeira. Guilherme se sentou. E continuou. Começou a falar das derrotas, e de como elas começaram a se amontoar. Perdera o emprego, e com isso seu sustento, viveu de "bicos", mas não eram suficientes para dar conta de tudo. E com um sorriso soturno, contou o começo do fim.

Guilherme narrou, com fidelidade, aos seus três ouvintes sobre as contas sobre sua mesinha, do que cada aviso significava. Contou como perdeu a cabeça. Sob os olhares assustados de seus irmãos, narrou as decisões que tomara antes de seguir com o carro para a rodovia deserta e atirar-se na frente do carro. Nessa parte Marta escondeu o rosto entre as mãos e começou a chorar.

Omitiu detalhes como a garota que conhecera na beira da estrada e que o ajudara depois: Helena. Pensou um pouco e omitiu seu encontro com a Morte. Já era o bastante voltar para casa e contar à mamãe que era o fracasso que ela sempre disse que ele era, não passaria também como louco na frente deles.

Os três ouviram num silêncio assombroso, exceto sua mãe que bordava, enquanto Guilherme repetia as palavras que seu médico dissera ao evidenciar seu estado de saúde. Costela fraturada, rachadura no crânio e perna esquerda quebrada... Por um momento, Guilherme chegou a pensar que tivera muita sorte ao sobreviver, mas esse sentimento foi extinto ao notar a indiferença de sua mãe à história. Quando terminou, deixando bem claro seu desapego à vida, Guilherme olhou para seus irmãos. Marta estava com o rosto avermelhado e molhado, mas não chorava mais. Apenas o olhava mortificada. Josias não chorou, mas seu rosto não escondia o choque que sentira.

Guilherme virou-se para sua ouvinte principal. Sua mãe bordava tranquilamente. Quando enfim percebeu os olhares dos presentes sobre si, baixou as agulhas e fitou Guilherme com um suspiro.

"Você tem uma boa história", disse lentamente. "Quer minha opinião?"

Guilherme abriu um sorriso debochado, por instinto. "Foi você quem quis saber, primeiramente".

"É verdade". Sua mãe cruzou as mãos sobre o colo, o fitando. "Então acho que tenho que mostrar o que acho, não é mesmo?" Guilherme não respondeu, seriamente tentando ler sentimentos por trás das palavras frias. Não descobriu nada, então simplesmente a deixou continuar. "Aproxime-se. Vou dizer o que penso".

Guilherme se levantou da cadeira, incerto, apoiando-se a bengala. Olhou seus irmãos, sérios, antes de dar o primeiro passo para frente. Não estava certo disso. Cobriu a distância entre os dois, com passos lentos, justificados pela perna ferida. Aproximou-se da mãe com olhos desafiadores. A senhora o fitou por um milésimo de segundo, para então responder ao desafio. 

Guilherme virou o rosto completamente com a força do tabefe. 

Precisou de um segundo para perceber o que acontecera tamanha foi a velocidade. E pensar que é uma velha senhora... Moveu o maxilar, para cima e para baixo, testando o que quer que o mantivesse naquela posição. Afastou-se em silêncio. Manteve os olhos baixos enquanto alisava a bochecha atingida - que ele tinha certeza, estaria vermelha agora.

"Isso" sibilou sua mãe por fim "é o que acho se sua história, de sua vida. Você é um fracassado inútil. Não sei como alguém com o meu sangue pôde se tornar tão fraco. Você não merece viver. Morra logo e dê espaço para alguém que faça melhor uso". Sua voz sugeria que estava a ponto de cuspir de asco. "Você não tem onde cair morto, não é? Pode ficar aqui, para ver o quão generosa eu sou. Não vou deixar que saibam que um filho meu apodreceu na sarjeta". Disse isso e se levantou da cadeira de balanço a caminho de seu quarto.

Deixou para trás um silêncio desconfortável. Marta pegou os objetos de costura da mãe, e com um soluço seguiu a velha escada acima. Alguns segundos depois, Josias bateu as botas e saiu pela porta da rua. Guilherme se viu sozinho. Deixou-se cair na cadeira, massageando o joelho fora do gesso, e com um suspiro fechou os olhos. Sorriu.

Não foi tão ruim assim.


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Notas finais do capítulo

Esse capitulo também ficou muito curto (eu acho). Mas é por uma boa causa. O próximo vai bem maior. U_U
Ah, quase me esqueço. Um Obrigado *com reverencia* a Clarinha Lopes por ter favoritado a história. Sério, quase que eu não vejo. Me rendeu uma hora de um sorriso idiota de orelha a orelha, que fez meu pai me perguntar se tinha algum problema. Ele tá me perguntando isso com muita frequência ultimamente...
Bye, Bjs!
Mandem reviews!