Ismira escrita por Giu Sniper


Capítulo 16
Capítulo 15


Notas iniciais do capítulo

Antes mesmo de começar, desculpem-me pelos erros, por que eu sei que vão ter, e se encontrarem é só me avisar que eu corrijo.

Pois bem, fiquem com um POV Hodric/Ismira.
Aproveitem enquanto ainda podem ter a companhia do meus queridinhos, por que está acabando.
Ok, chega de blá blá blá, vão ler logo isso.

PS: é capaz de vocês repararem que eu dividi os POVs de uma maneira diferente, é que uma leitora disse que estava se atrapalhando com as mudanças, então eu separei desse jeito, até por que eu tenho a impressão de que o Nyah! está comendo os meus espaços, mas eu infelizmente não posso colocar os nomes dos POV antes de iniciá-los, ok?
Está bem, agora pode ler mesmo.



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— Todos devem se armar, sem exceção. — Eragon falava para os cavaleiros reunidos no centro de treinos aquela tarde, de pé em um palanque improvisado. O céu estava escuro e por vez ou outra um trovão soava ou um raio invadia o céu. — E andem acompanhados. — concluiu por fim, sendo seguido por um alvoroço de vozes inquiridoras.

Eu disse para o meu tio que uma justificação vaga desse tipo não seria suficiente. Falou para o dragão.

Realmente, você disse, mas ele preferiu não ouvir, não é mesmo? Vamos ver agora como ele vai resolver isso, vai ser divertido! Riu.

E realmente ver o tio desesperadamente tentando controlar os ânimos de todos era uma cena engraçada, de forma que se pegou rindo, logo em seguida contagiando Hodric, parado a seu lado. Não se lembrava da última vez que o vira rindo tão intensamente, talvez em Carvahall?

Estavam de mãos dadas, a garota não sabia desde quando. Encontravam-se visivelmente receosos e a profecia ainda martelava dentro de sua cabeça a todo momento, em especial a última parte: Uma morte, uma loucura, uma cura. Tinha medo do que as palavras poderiam significar.

Ismira passou os olhos pelo local, observando: as mesas que se estendiam dentro do local agora estavam tomadas por armas dos mais variados tipos, desde facas longas até martelos de guerra, passando por arcos e aljavas e espadas, mas algo ainda não encaixava em meio a tudo aquilo.

— Hodric, você viu o Finwë? — perguntou assim que teve certeza de que o elfo não se encontrava ali.

— Não, não o vejo desde ontem logo depois do jantar. Ele não está aqui?

— Não. — por que Finwë não estava ali? Será que algo acontecera? Muito estranho...

— E você viu a Vicky? — o garoto lhe perguntou. Não, ela também não estava ali, e pensando bem...

— Não, não a vejo desde o café da manhã. — silêncio. Por um momento chegou quase a suspeitar que... Não, não, isso era apenas uma peça que sua mente estava lhe pregando.

Agora, Eragon estava novamente atrapalhado em tentar explicar para os cavaleiros, alvoroçados, e os outros habitantes da ilha por que deveriam andar armados, novamente sem sucesso.

— Vamos ajudá-lo, logo. — falou, pegando Hodric pela mão e puxando-o em direção ao tio. A garota subiu no palanque, foi só o silêncio se instalar que começou a falar: — Estou aqui para dizer o que Ebritil não quer que vocês saibam. Não o culpem, ele quer mantê-los seguros, e eu simplesmente não me importo. Não ligo que estejam em perigo se puderem ficar atentos quando ele vier até você. — Primeiramente pareceu que Eragon queria fazer com que se calasse, mas antes mesmo de chegar até a garota parou. Das duas, uma: ou desistira, pois sabia que não conseguiria fazer com que não falasse, ou Saphira havia acabado de convencê-lo que esta era a melhor saída — Primeiro imaginem uma sombra, mas não uma sombra qualquer, é uma sombra que não obedece a ninguém e que não precisa da luz para existir, é apenas trevas. Agora pensem que essa sombra é concreta e que, se você quiser ou conseguir, pode tocá-la, e que por isso você teme que ela consiga chegar até você. Você é ameaçado e ludibriado por esse inimigo, e ele pode ser qualquer um. E repito: qualquer um. — ela sublinhou a última parte — É contra isso que vamos lutar.

Silêncio se seguiu, tão profundo que podia-se ouvir o correr do rio a tantos metros de distância, e este só foi quebrado alguns minutos depois por uma voz já conhecida por Ismira, porém não pela maioria ali presente. Era rouca e rascante, e que vinha da floresta.

— Uma morte, uma loucura, uma cura — um curto riso se seguiu — Afinal, quem é que vai morrer? Pode ser qualquer um, não é mesmo? Assim como eu também posso ser qualquer um. Posso ser alguém que você nunca antes viu, posso ser alguém muito importante, e posso ser até mesmo alguém que está do seu lado, não posso? A magia me permite isso. — Ele ficou em silêncio, como se esperasse uma resposta, mas logo começou novamente a falar — Sem muitos rodeios a mais, agora nós sabemos que alguém vai morrer, eu me preocuparia com o bem-estar dos desaparecidos — e então Ele riu mais uma vez. Sua risada longa e maléfica, que logo se perdeu novamente dentro da floresta.

Não se precisou dizer mais nada depois que Ele surgiu, não haviam dúvidas agora da existência do mesmo, e então, metade dos cavaleiros em silêncio e a outra metade aos sussurros, obedeceram à primeira ordem de se armar. Ismira não se mexeu, talvez devesse seguir o exemplo dos demais cavaleiros e ir atrás de um arco e uma aljava, mas não conseguia se mover, um único pensamento ocupava sua mente.

— Vicky e Finwë — falou.

— Alguém vai morrer. — ele concordou. — Pode ser qualquer um.

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No jantar a comida não tinha o mesmo sabor e nem mesmo as lichias pareciam querer descer pela sua garganta. Tinha uma aljava de penas negras penduradas nas costas, o arco pousado ao seu lado e uma espada curta pesando em sua cintura. O tio sempre soubera que algo acabaria acontecendo de alguma maneira, foi por isso que insistira tanto para que treinasse esgrima, e agora o mesmo se aplicava a ter que se armar também com espada, por pior que fosse sua habilidade.

“Arco e flecha não vai te ajudar em uma luta corpo a corpo, como lutarás então?” o tio lhe dissera àquela tarde quando se recusara a carregar também a espada à cintura, o que mais odiava é que no fundo era ele que tinha razão. Prometera a Sundavar que não morreria, logo, não iria morrer.

Ela e Hodric jantavam fora do refeitório naquela noite, a garota se recusara a ficar longe do dragão por qualquer instante, e então o cavaleiro a acompanhou, ao que Solus também se juntou à reunião.

Você acha que pode ter acontecido algo aos dois? A cavaleira perguntou, no fundo só o que queria era conforto.

Vicky e Finwë sabem se cuidar, o dragão parou. mas os dias têm sido bastante escuros ultimamente.

Eu queria voltar para casa. Se aconchegou ao pescoço negro do dragão, largando a comida mais uma vez.

Nós vamos, assim que tudo isso acabar. Quando eu estiver suficientemente grande para voar com você pegaremos o primeiro barco da ilha para Teirm e voaremos até Carvahall, não vai demorar.

Assim espero. Concluiu.

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Dormir era impossível, tamanha era a tensão entre os cavaleiros. Naquela noite o toque de recolher não soou e ninguém quis se aconchegar em suas camas. Na área que cercava o entorno no refeitório até quase os dormitórios os cavaleiros se aconchegavam como podiam perto de seus dragões, todos em um silêncio de enterro.

Os dragões deles também não estão aqui. falou para Solus, mais para puxar assunto do que para saber sua opinião.

É impossível ficar parado quando cortam a sua ligação com seu cavaleiro por motivo misterioso, sei disso por experiência própria.

O que Ele poderia querer com os dois? Perguntou, mas não houve tempo para a resposta do dragão, nesse instante outros dois da mesma espécie surgiram logo acima de suas cabeças, preparando-se para pousar. Será que são...

São. Solus confirmou.

A prateada Evarínya e o dragão banco de Finwë pareciam cinzentos à luz do luar, e cada um levava o cavaleiro nas costas. Algo havia acontecido, isso era certo, mas ainda deviam temer por eles?

Vicky foi a primeira a descer das costas da dragão, tinha os braços tomados por arranhões e sangue escorria de uma ferida na perna direita, dor tomava conta do seu olhar. Hodric apressou-se em ajuda-la, e não podia negar que estava curioso para saber o que havia acontecido, tanto que quando conseguiu se aproximar logo perguntou-a.

— Depois. — ela cortou-o afobadamente — Finwë. Nós precisamos ajudá-lo, rápido, me ajude a tirá-lo da sela. — a garota mancava e cada passo era seguido por um gemido de dor.

Com a ajuda também de Ismira, Hodric conseguiu tirar o elfo de cima do dragão e ambos o pousaram no solo. Finwë se encontrava desacordado e sangue jorrava de um profundo corte entre as suas costelas. Vicky aproximou-se do elfo, sentando no chão ao seu lado e posicionou a Gedwëy Ignasia sobre a ferida, recitando um encantamento de cura. Mesmo com a cavaleira ferida ninguém ousou interrompê-la ou ofereceu-se para fazer o trabalho em seu lugar, todos estavam petrificados com a chegada repentina de ambos.

Logo a ferida estava fechada e o sangue do elfo já não se desperdiçava mais. A cavaleira então parou, o seu próprio sangue ainda escorria por sua perna, mas ela não fez nenhum movimento para curá-la também, recusando até mesmo a ajuda de alguns que se ofereceram para fazê-lo. Só depois de algum tempo foi que falou:

— Ele estava armado, nós não. — ela parou e fixou o olhar no horizonte. Outro corte, Hodric reparou, cruzava seu rosto do final da sobrancelha até o queixo do lado esquerdo do rosto. — Estava escuro, não dava para ver nada. — uma lágrima amarga desdeu pelo seu rosto, tornando-se vermelha ao se misturar ao sangue.

Ela se calou. Hodric sabia exatamente como ela se sentia, ficar frente a frente com Ele não era nada fácil, mesmo depois de tantos encontros ainda sentia sempre aquela mesma insegurança.

— Ismira, — a garota falou repentinamente, atraindo a atenção da outra cavaleira que se sentava ali perto — vai usar essa espada?

— Não. — ela retirou a lâmina da cintura, entregando-a a Vicky. A garota só havia pego a arma depois de muita insistência do tio, e o cavaleiro sabia que mais cedo ou mais tarde ela arranjaria um jeito de não carregar mais aquele peso.

— Obrigada. — A primeira cavaleira pôs-se de pé, logo prendendo a espada em seu cinto. — Vai servir. — ela abaixou-se novamente, ajoelhando-se ao lado do elfo. Ela passou os dedos por sua face e pressionou seus lábios contra os dele, que permanecia desacordado. — Eu vou voltar. — levantou-se e partiu. A garota já estava longe quando conseguiu gritar-lhe:

— Aonde você vai?

— Atrás d’Ele, alguém precisa fazer isso! — ela partiu, seu dragão voando em seu encalço.

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Ela é louca, mas está certa. Refletiu enquanto se aproximava novamente do dragão.

Você também é louca se acha que ela está certa, Ismira. Ela acabou de conseguir sair de lá e está entrando de novo!

Mas vamos fazer o que? Ficar parados esperando que Ele venha até nós?

É mais seguro. O dragão respondeu hesitante.

Você está falando como meu tio, Sundavar. repreendeu-o. A cavaleira olhou de leve por sobre o ombro, Hodric estava de pé, tão imobilizado quanto uma estátua de pedra.

 Eu sei, mas só de pensar em... Você sabe.

Eu já te disse que não vou morrer, e eu sempre cumpro as minhas promessas. A cavaleira pousou a mão sobre o focinho do dragão, a mesma mão que confirmava o elo entre ambos.

Nesse caso, vamos atrás d’Ele. Respondeu.

Exatamente. Sorriu.

A cavaleira levantou-se, prendeu a aljava nas costas e pegou seu arco. Suavemente se aproximou do cavaleiro de olhos azuis: se iria atrás d’Ele achava que Hodric tinha o direito de saber e fazer a própria escolha.

— Hodric! — chamou-o subitamente.

— Sim? — só então o garoto pareceu acordar do seu estado de congelamento. A luz prateada da lua cheia fazia tudo naquela noite parecer cinzento.

— Eu e Sundavar vamos atrás d’Ele. — sua voz era quase um sussurro, quanto mais aquelas palavras demorassem a chegar até o tio melhor seria.

— Como? — ele pareceu surpreso.

— Nós vamos, mas você está livre para fazer a sua própria escolha. — deu-o um beijo no rosto e seguiu seu caminho em direção à floresta.

Os seus passos ecoavam como batidas surdas em meio ao extremo silêncio daquela noite. Depois de muito tempo de silêncio outro raio cortou o céu, sendo seguido pelo trovão e pousando nas árvores à sua frente. Embora as nuvens tomassem o céu naquela noite, em momento algum ela se sobrepunha à Lua.

— É mais difícil do que parece. — murmurou assim que se viu encarando a entrada da floresta, de alguma maneira imaginara que seria mais simples.

— Não se você estiver acompanhada. — uma voz conhecida murmurou às suas costas, mesmo assim sobressaltando-a. Hodric a havia seguido silenciosamente. — Você vai precisar de mim agora que deu sua espada a Vicky. — a garota sorriu, mirando os olhos do cavaleiro, e o beijou.

Adentraram a floresta de mãos dadas, não sabiam o que poderia acontecer dali para frente, e qualquer momento poderia ser o último.

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Escuridão. Apenas escuridão e alguns feixes de luar adentravam a floresta. Os assobios de morcegos eram os únicos sons que completavam o silêncio daquela noite. Acima das árvores em algum lugar tanto Sundavar como o próprio dragão sobrevoavam a floresta.

Andavam sem rumo. Não faziam a mínima ideia de para onde estariam indo ou, quem sabe, de onde Vicky estaria.

— Será que estamos muito na borda da floresta e ainda está muito iluminado? — indagou, de repente.

— Como?

— Todas as vezes que me encontrei com Ele estava sempre tão profundo e escuro na floresta que...

— Mas Ele já apareceu até mesmo à luz do dia! — a garota interrompeu-o.

— Debaixo de uma capa. — o primeiro replicou.

— E o que aconteceu com ela? Está lavando? — diante das palavras da garota, mesmo em um momento de tamanha tensão, Hodric não pôde deixar de rir.

— Como você consegue ser cômica em um momento como esse? — perguntou, ainda rindo. Se um mês atrás alguém lhe dissesse que naquele dia estaria em uma floresta escura, durante a noite, junto a Ismira e fazendo piadas enquanto tentavam encontrar alguém que tinha motivos para matá-los tomaria essa pessoa por um louco, mas essa era a estranha situação em que se encontravam.

— Esse nem era o meu objetivo! — Ismira falou, juntando-se ao riso do outro cavaleiro. Aquela piada não podia ser tão boa...

E por mais algum tempo ninguém falou nada, ficaram os dois lá: parados e rindo. O momento de descontração só cessou quando a já conhecida voz rouca e áspera começou a falar às costas dos cavaleiros.

— Muito interessante: vocês ficam rindo de quem tem poder para matar vocês. — os dois se viraram ao mesmo tempo, dando de cara com a figura encapuzada que estavam procurando.

— Achou a capa e resolveu aparecer? — Ismira instigou — Já estava ficando preocupada!

— Sentiu a minha falta? — Ele riu.

— Ah, coitado, tão iludido! — falava com um ar debochado. Hodric não compreendia como a garota conseguia confrontar Ele com tamanha tranquilidade. — Mas eu não gosto de perder meu tempo com indiretas e conversa fiada. O que você quer conosco?

— Direto, está bem. — Ele falava calmamente, o que só deixava Hodric cada vez mais inquieto. — Acho que não há problema em lhe contar. — mais uma pausa se fez. Ele pigarreou e prosseguiu — Estou atrás do antigo poder que diz a profecia, para trazer o meu avô e volta.

— Seu... avô? — Hodric falou pela primeira vez desde que Ele havia chegado.

— Sim, Galbatorix.

— Galbatorix? — Ismira repetiu com a voz elevada — Por que raios alguém ia querer trazer Galbatorix de volta? Nem se ele fosse meu pai!

— Você não entenderia, então não vou gastar o meu tempo e saliva tentando lhe explicar. — Ele fez uma pausa. — Ismira, você disse que prefere ser direta, então vamos ser rápidos e acabar logo com isso. A morte pode ser doce para você. — Ele puxou uma espada debaixo da capa. O metal brilhou na escassa luz de luar que ainda conseguia se esquivar por entre as folhagens e gritou enquanto rasgava o ar. Ismira instintivamente ergueu o arco com o objetivo de se proteger da lâmina, mas Hodric foi mais rápido, libertando a própria espada da bainha e aparando o golpe d’Ele.

— Não será hoje para ela, — o garoto investiu um ataque — mas quem sabe para você.

Nesse momento Hodric e Ele se envolveram em um acirrado combate. O primeiro se movia com rapidez, mas ainda não era suficiente para se esquivar e defender de todos os golpes infringidos pelo segundo, que possuía uma força exorbitante. Primeiro o cavaleiro ganhou um corte no antebraço direto, depois um no ombro e por último a espada do adversário perfurou a sua panturrilha esquerda, derrubando-o ao chão.

Um grito de dor fugiu de seus lábios quando sentiu a lâmina girar dentro da ferida, deixando o sangue quente escorrer para o solo. Essa é a hora pensou eu sou a morte da profecia. Fechou os olhos, como se aceitasse o seu destino.

— NÃO! — era Ismira, que cortou a trajetória homicida da espada d’Ele com o seu arco. Rapidamente a garota encaixou uma das flechas na corda, atirando-a em cheio no pulso que Ele usava para empunhar a espada. — Vamos, Hodric, você consegue andar. Vamos sair logo daqui, não é hoje que vamos morrer. — ergueu-o do chão, ajudando-o a caminhar.

Cada passo era uma agonia e locomover na velocidade que uma fuga exigia era angustiante, mas não se permitia reclamar. Não importava o quanto a dor o afetasse, continuaria a correr.

Assim que se viram fora da floresta Hodric desabou novamente ao chão, a dor atingindo-o com toda a sua voracidade. Sua panturrilha pulsava e lágrimas escorriam dos seus olhos turvando a sua visão.

Os cavaleiros haviam saído da floresta em algum lugar próximo a praia, a brisa suave e salgada acariciava-lhes o rosto.

— Vocês não fugirão tão facilmente. — a voz d’Ele vinha do emaranhado de árvores e se aproximava a cada segundo, podiam ouvir seus passos ecoando sobre as folhas mortas no chão da floresta. — Está escrito que haverá uma morte, e será hoje. — Ele surgiu de dentro das folhagens, a capa cinzenta sobre os ombros e a espada em punho, o qual ainda posssuía a flecha de pena negra atravessada.

Com passos curtos e rápidos Ele se aproximou de Hodric. Por mais que o cavaleiro tentasse se afastar, a ferida em sua panturrilha provocava uma dor lacinante sempre que se movia, e este já não tinha a espada para se proteger.

Em sua cabeça, pela segunda vez naquele dia, veio o mesmo pensamento de que aquele seria o momento de sua morte. Tudo depois disso aconteceu muito rápido para que Hodric pudesse sintetizar de imediato. Ele investiu a espada manchada do próprio sangue da futura vítima em sua direção. Mas antes que a lâmina chegasse até o garoto o seu dragão, com um rápido mergulho, se colocou em frente a sua trajetória, levando o golpe no lugar do cavaleiro. No meio de tudo ainda se pôde ver um par de flechas zunindo em direção a Ele, uma atingindo-o na coxa e a outra errando o alvo por pouco.

Ele riu, nem um pouco se importante com a dor que a flecha devia o estar infringindo. Hodric ainda tinha os sentidos congelados pela cena.

— Já tive minha dose de sangue por hoje. — a voz rouca falou — E daqui a pouco terei a minha morte. — Pegou a espada e partiu para dentro da floresta, mancando por conta da flecha de pena negra enterrada em sua carne.

Hodric pousou a mão trêmula sobre o pescoço do dragão, havia esquecido a dor que sentia. Nada mais importava agora.

— S-Solus? — chamou o dragão.

Hodric.

Fez esforço para se ajoelhar ao lado do dragão, procurando a ferida que a lâmina o infrigira. A espada atingira um espaço de escamas macias entre a pata esquerda e o peito. As lágrimas começaram a brotar dos olhos do cavaleiro.

A gente... Nós vamos pedir ajudar, você vai ficar bem denovo. O sangue do dragão tocou a sua pele, queimando-a como ácido.

Não, Hodric, profecias se concretizam, e esta predizia uma morte. Não há tempo para que ninguém chegue até aqui.

Não, Solus, a gente precisa tentar. Nós vamos conseguir!

Hodric, se for para morrer, fico feliz por ter morrido para te salvar. Quantos dragões prefeririam o mesmo fim?

Não, nós precisamos de um fim, somos imortais. O curso das lágrimas se tornava cada vez maior em seu rosto.

Você vai continuar com sua imortalidade, Hodric, mas sem mim.

Não, mas eu não quero isso! Você não pode me deixar, Solus, não.

Você já viveu dezesseis anos sem mim, pode viver o resto da sua vida. O dragão fez uma pausa. Uma poça de sangue ácido já havia se formado no chão. Hodric, você foi o melhor cavaleiro que eu poderia ter querido. Eu te escolhi como cavaleiro por um motivo único, e eu espero que eu você não se esqueça dessa sua parte. Minha vida valeu à pena. Os últimos resquícios de vida fugiam aos poucos dos olhos do dragão.

Logo Hodric estava novamente sozinho. Na sua cabeça agora só residia uma consciência, uma voz. Estava tão só quanto antes do dragão, mas mais vazio.

— Não! Não! Não! — meio falava meio chorava, aumentando o tom de voz a cada repetiçãod a palavra. Sentimentos inimaginavelmente horríveis e amargos tomavam conta de si. Não sabia mais o que se passava, o que estava e como estava acontecendo, sentia que estava perdendo o controle da própria mente para um outro lado dele mesmo, mas ainda assim não entendia o que estava acontecendo.

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A garota então ouviu um grito, um grito longo e torturante. Nunca havia ouvido nada parecido antes, e esperava não precisar ouvi-lo nunca mais. O som carregava dor, amargura, ódio e mais um monte de sentimentos negros, alguns já esquecidos, outros sem nome.

A morte. Sundavar murmurou.

A morte de um dragão pode provocar a loucura de seu cavaleiro. Ismira odiou-se por não ter pensado naquilo antes, ela teria tomado mais cuidado quando saísse atrás d’Ele. Eu podia ter evitado tudo isso! Lágrimas começaram a descer pelo seu rosto.

Não, Ismira, não se evita a maldição de uma profecia. Sim, ela sabia disso, mas de qualquer forma isso não tirava a culpa de seus ombros.

Mas se eu tivesse acertado o peito d’Ele ao invés  do pulso, se eu... Ele já poderia estar morto, Sundavar. Treplicou, aproximando-se ainda mais do dragão e abaçando-o pelo pescoço enquanto lágrimas quentes e salgadas como a brisa que soprava escorriam pelo seu rosto.

Você fez o que pôde, Ismira, e fez o que deveria fazer. Mesmo se qualquer outra coisa tivesse acontecido não mudaria o final, a profecia nunca deixaria as coisas acontecerem de outra maneira. Seguiu-se um silêncio que durou apenas alguns segundos.

A morte já está feita, Sundavar, e a loucura está começando, mas nem sabemos ainda o que significam as outras partes da profecia.

Mas saberemos. Prometeu.

Mas não quero saber, esse é o problema. A garota fez uma pausa. O que a gente faz agora?

Seguimos em frente, é tarde para voltar atrás.

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Ismira se enroscou nas asas do dragão, que a embalava em seu calor. A garota sabia que precisavam sair dali, mas da mesma forma que sabia que não conseguiria tirar Hodric do lado do corpo inerte do dragão, também não podia deixá-lo ali, aos prantos e desarmado, mesmo que para pedir ajuda.

O choro do cavaleiro era constante e o ferimento em sua perna ainda sangrava, mas ele parecia não se importar, como se nem mais sentisse a dor.

Nós precisamos ajudá-lo, Sundavar. Ele não pode ficar o resto da noite desse jeito! Disse em algum momento.

Já há pessoas atrás de nós à essa altura do campeonato, eles logo chegarão aqui. Ele fez uma pausa. Ismira, se você se aproximar dele o ódio que Hodric está sentindo pode recair sobre você, eu não quero ter que machucá-lo.

Mas ele está perdendo muito sangue! Reclamou.

Já temos a morte da profecia, não haverá outra. Ele pode esperar que seu tio chegue até nós, não vai levar muito tempo.

E realmente não demorou, dentro do que foi no máximo cinco minutos Eragon surgiu vindo da direção contrária à brisa na companhia de um elfo e um Kull. O tio se precipitou a sobrinha, o olhar carregado de preocupação.

— O que aconteceu, Ismira? — perguntou, inquiridor.

— Tio! — a garota desvencilhou-se das asas do dragão e correu para dar-lhe um abraço. Eragon era a pessoa mais próxima de família que tinha por perto, uma vez que Sundavar era parte de si. As lágrimas retornaram aos seus olhos. — É o Hodric, Solus...

— Calma, respire fundo. — a garota obedeceu — Agora, o que aconteceu?

— Foi Ele — secou as lágrimas, mas ainda tinha a voz embargada. — Ele. Ele ia martar Hodric, aí... Solus... ele... — se descontrolou e voltou a chorar, mas felizmente Eragon já havia entendido o que se sucedera.

— Hodric. Ele está ferido? — perguntou para a garota, que apenas fez que sim com a cabeça. — Está bem, nós vamos cuidar dele, ele não pode ficar aqui para sempre. Por que você e Sundavar não voltam para o refeitório? De repente vocês podem comer alguma coisa... Já está quase amanhecendo. — o tio encarregou o urgal de acompanhá-los, seguindo junto ao elfo em direção a Hodric.

Ismira seguiu sem reclamar, preferia não ver a cena que se seguiria. Ela já sabia que seria horrível, mas não esperava algo da magnetude que sentiu ao ouvir enquanto as palavras do garoto soaram atrás de si.

— Não! Eu não quero ir! — ele ainda chorava, podia perceber em sua voz — Me deixem morrer, por favor! Eu não quero continuar a viver sem ele! SOLUS!

Por mais que a garota não quisese ouvir as palavras do outro, era imposível ignorá-las, tão carregadas de dor e sofrimento quanto estavam. As lágrimas voltaram ao rosto mais uma vez.

Agora você já sabe por que eu não queria que você fosse falar com ele. Disse suavemente o dragão.

Agora sei. Ela fez uma pausa e secou as lágrimas. Obrigada.

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O Sol já havia desapontado no horizonte. Sol. Solus. Embora não conhecesse tanto o dragão sofria muito com a perda, tanto que, embora tivesse fome, não conseguia manter nada no estômago.

Eragon decidira confinar Hodric dentro de sua própria sala, ele dissera que o garoto estava muito desesperado e agressivo para ficar com os outros. Finwë permanecia desacordado e Vicky desaparecida, de modo que não tinha ninguém para conversar além do dragão.

Depois de duas tentativas falhas de comer alaguma coisa, a garota sentou-se em uma rocha próximo ao refeitório e ficou a refletir. Ele pode ser o herdeiro da escuridão falou em algum momento, tentar decifrar a profecia era a única coisa que podia fazer e se sentir útil. Se for mesmo o neto de Galbatorix.

Há sim essa possibilidade, mas também pode ser Hodric. Mesmo contra vontade o pai dele fez parte do lado negro da história. O dragão se juntou a cavaleira, por mais que a profecia tivesse ligado a tudo aquilo não deixava de ser uma forma de distração.

Sim. A garota parou novamente, tentava se lembrar da próxima linha da profecia. O antigo poder resurge.

Antigo poder... Antigos poderes. Há um livro sobre isso na biblioteca “Os três antigos poderes da magia”, acho que é isso.

Mesmo?

Sim, você o viu, eu me lembro, apenas não deve ter prestado atenção.

Vamos lá então, não temos nada a perder. A garota prontamente se levantou, não gostava de ficar parada por muito tempo.

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Sundavar permaneceu na porta da biblioteca enquanto Ismira procurava pelo livro em seu interior. O dragão não fazia ideia de onde o livro estaria da última vez, de modo que a cavaleira teve que olhar volume a volume em cada prateleira e estante da biblioteca, o que levou horas para ser concluído.

Esse livro não está aqui, Sundavar. concluiu ao fim da última prateleira da última estante.

Olhou tudo mesmo?

Tudo. Menos a secção reservada, é claro. Será que poderia estar lá?

Por que não?

Como eu teria visto um livro da secção reservada?

Não sei, ele poderia estar no lugar errado ou algo do gênero. Ou pode ter sido um devaneio meu também.

Quem seria descuidado a ponto de deixar um livro da secção reservada nas prateleiras comuns? Pelo que sei eles nem saem de lá.

Prefere acreditar que foi um sonho?

Meus sonhos tem se concretizado tantas vezes atualmente que eu ter sonhado com esse livro significaria a mesma coisa que dizer que não há dúvidas de sua existência. Vamos procurar o meu tio. Dizia enquanto se dirigia a passos largos para a saída da biblioteca. Ele vai me dar esse livro mesmo que ele não exista.

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Estava claro, tinha amanhecido de novo, mas estava muito escuro também. Estava mais escuro do que jamais esteve, nunca esteve tão escuro. Ainda doía, e não sabia quem era.

— Quem sou? Quem sou? — perguntava para as paredes, só haviam paredes.

Quem sou? Quem sou? Perguntou para si mesmo, só havia ele ali. Quem sou? Quem sou? Não obteve resposta, só havia ele ali.

— Quem sou? — perguntou novamente para as paredes.

Quem sou? Tentou perguntar mais uma vez para si, porque só havia ele ali. Escuro, está escuro. Tão escuro. Você está sentindo essa escuridão? Mas ninguém lhe respondeu. Só havia ele ali.


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Notas finais do capítulo

Sim, sim, I made that. Não foi tão fácil quanto parece, esta bem? Não me julguem e não matem meus personagens favoritos por causa disso (sintam a indireta leitores autores) e please não me apedrejem.

Semana que vem eu posto outro. : )

Acabando...
Acabando...
Acabando...
Acabando...
[editado/corrigido em 31/05/2013]



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