Caroline conseguiu convencer Klaus a deixar de lado os comprimidos para dormir, a título de experiência. Para induzir o sono, ela passou a massagear-lhe o pescoço e os ombros todas as noites e constatou com alegria que isso estava dando resultado.

— Estou me sentindo melhor com as massagens. Os compri­midos me deixavam entorpecido no dia seguinte — Klaus admitiu certa noite, tirando o paletó do pijama para que Caroline o massageasse. Você estava certa em me fazer abandonar o tranquilizante.

— É bom ouvir isso! — Caroline exclamou alegremente. — E estou admirada. Você nunca admite que tenho razão.

Nessa noite Klaus estava de bom humor porque tinha con­seguido fechar um grande negócio considerado como perdido.

— Os abutres estão rodeando porque pensam que estou fraco — disse ele, bocejando. — Um dos concorrentes tentou me roubar o melhor cliente e quase conseguiu.

— O que você fez para não perdê-lo?

— Chamei o cliente, ofereci-lhe mais vantagens do que o concorrente e bajulei-o.

— Bajulou-o? Você? — Caroline provocou-o.

— Surpresa, hem?

— Bem, imaginei que o seu estilo fosse o da confrontação.

— Você acha que me conhece?

— O que eu sei é que você quer ter o controle de tudo e de todos.

— Parece que você me considera um tirano. E também está sempre de prevenção contra mim.

— Não é bem isso. Acho que você é um homem poderoso, e quando todo o poder está só de um lado, há sempre alguém que sai perdendo. Eu sei o que é estar do outro lado... o das pessoas sem poder.

— Em que seu pai trabalhava?

— Ele não parava em emprego nenhum e morreu quando eu era pequena. Quem trabalhava era minha mãe.

— E o patrão dela era um tirano?

Subitamente Caroline reviveu a cena do seu primeiro encontro com Klaus Mikaelson. A mãe a levara para a fábrica e ele a descobrira.

— Você não devia estar aqui — ele dissera. Elizabeth aparecera depressa do lado da filha.

— Já estávamos de saída, sir.

— Ah, a senhora é Elizabeth Forbes, não? Fiquei sabendo da morte de seu marido. Lamento, sra. Forbes — Klaus dissera cordialmente.

Ele sabia o nome de todos os empregados e conhecia a si­tuação de cada um.

Elizabeth agarrara a mão da filha e deixara a fábrica rezando baixinho para não ser despedida.

Não a despediram. Pelo contrário, ela passara a trabalhar num turno mais conveniente e com um salário um pouco mais alto.

— Por que você interrompeu a massagem? — Klaus perguntou.

— Desculpe. Eu me distraí.

— Bem, você não respondeu à minha pergunta. Como era o patrão de sua mãe?

— Era muito generoso — Caroline disse devagar. — De fato, ele até a ajudou.

— Mas nem isso a fez gostar do infeliz, não é mesmo?

— Ele era uma pessoa distante, de modo que foi difícil ser-lhe grata.

— Você não acha que são as ações que contam?

Caroline pôde ver o rosto cansado da mãe ganhar mais brilho ao dizer:

— Mais dinheiro e um turno melhor. Oh, minha filha, isso vai melhorar muito a nossa vida!

— É verdade. São as ações que contam — Caroline concordou. — O patrão dela foi bondoso.

Ela perguntou a si mesma por que isso nunca ficara tão claro antes.

— Tive uma educação muito severa — Klaus continuou. — Meu pai vivia e respirava a tradição da família e preparou-me para herdar o seu império. Eu era um Mikaelson e tinha de ser capaz de administrar as terras e a fábrica. E devia fazer tudo melhor do que os empregados.

— E o seu irmão? — ela perguntou, tentando parecer natural.

— Kol? Meu pai não era severo com ele. Há uma diferença de oito anos entre nós e ele foi muito mimado. Kol tem um encanto natural. Com isso, teve regalias que sempre me foram negadas.

— Isso o magoava? Seria natural se você ficasse ressentido ao notar que vocês dois eram tratados de modo diferente.

— Eu tinha ciúme, sim, e ressentimento. Eu trabalhava e Kol se divertia. Ele cresceu achando que podia ter, por di­reito, tudo o que desejasse. Diante de qualquer dificuldade usava seu charme e sempre se saía bem.

— Você não gostava dele?

— Como não gostava? Ele é meu irmão. E um Mikaelson.

— Fale-me sobre seu irmão. Como era ele?

Era loucura fazer um pedido desses, mas Caroline vivera os últimos anos sob severa disciplina. Agora seu coração, seco como um deserto, clamava por um pouco de água.

— Por que você perguntou como era meu irmão? Ele não está morto.

— É claro que não. Eu... me expressei mal.

Ela queria que Klaus falasse sobre o Kol de seis anos atrás, seu lindo amor, de riso fácil que iluminava o mundo para ela. Queria que Klaus recriasse a felicidade que destruíra. Com isso, quase se havia traído.

— É difícil descrever meu irmão. Não sei lidar com as pa­lavras. Esse dom é Kol quem tem. Justamente por causa disso ele já arranjou uma porção de problemas e quem teve de solucioná-los fui eu.

Ele parou de falar. Caroline sentiu o coração batendo mais forte. Será que iria ouvir sua própria história?

— Com relação a Kol, há uma coisa que eu lamento ter feito. Tive a melhor das intenções e pensei estar agindo certo. Mas tudo deu errado. Foi horrível. Eu quis explicar, mas era tarde demais... Eu gostaria de saber o que aconteceu depois...

— A que você... se refere?

Klaus bocejou novamente. A massagem estava surtindo efeito.

— Nunca sabemos o que fazemos a outras pessoas; podemos estar achando que fizemos bem e acabamos por prejudicá-las. Achei que tudo iria dar certo... mas ela chorou... nunca ouvi ninguém chorar daquele jeito...

Caroline sentiu que ele estava completamente relaxado. Em seguida adormeceu. Ela sentou-se do lado da cama tentando entender aquelas frases confusas e interrompidas. Será que Klaus estava falando sobre a garota cujo coração ele despeda­çara seis anos atrás? Essa questão ficou na sua mente.

— Você está certo — ela sussurrou para Klaus, apesar de ele estar adormecido. — Nunca sabemos o que fazemos a outras pessoas. Talvez seja melhor assim. Principalmente se fizemos um mal e for tarde demais para ser corrigido.