Amor Do Presente Ou Do Passado? escrita por Mary e Mimym


Capítulo 20
Noite Indelicada


Notas iniciais do capítulo

Nenhuma desculpa pode ser considerada depois de tamanha demora, mas o capítulo está aí e esperamos muito que recompense o tempo sem atualização. Sinceramente, o século XIX os aguarda com surpresas.



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Era de se esperar. Os pais do ruivo e de Elesis estavam aos prantos na sala. Bernard já havia feito mais de dez xícaras de chá. Tanto para os patrões e os convidados como também para Lire e Arme, que estavam na cozinha.

O jantar fora cancelado, por ora, por causa do acontecido.

— Onde será que a Elesis se meteu? Pelo que sei, ela odeia o futuro noivo dela e saiu com ele e... Até agora nada dos dois! - Lire mantinha a voz baixa, mas não escondia a indignação e preocupação.

Arme se manteve em silêncio, há tempos estava quieta demais, não se mostrava preocupada pelo suposto sumiço de Elesis. Parecia enevoada com outros assuntos. Lire havia percebido, assim como Bernard. Ambos perguntavam se ela estava bem, mas Arme mudava de assunto ou simplesmente respondia que estava tudo bem.

Um alvoroço começou na sala. Lire conseguiu ouvir "Onde estavam? Meu Deus do céu!", provavelmente era a mãe da ruiva, pelo soar da voz.

Lire ameaçou sair da cozinha, mas Bernard impediu. Eles eram apenas empregados, precisavam saber como deviam se comportar naquela situação. Bernard repreendeu a loira com um olhar severo, que fez Lire dar um passo para trás e abaixar o rosto.

Estava tão preocupada com Elesis, mas de nada poderia fazer.

— Eu sei que são amigas, eu também queria estar com a milady, mas esse é um momento em que somos reprimidos... Reprimidos a ficar aqui. - Disse Bernard, que voltou a preparar os pratos do jantar, caso alguém quisesse comer. O que era bem possível, visto que os pais do ruivo não recusavam uma refeição sequer, ainda mais agora que a aflição havia "passado".

— Eu sinto muito, não me comportarei mais inadequadamente. 

— Muito bem, Lire. - Bernard assentiu satisfeito - Fiquem aqui caso peçam para servirem o jantar, eu irei alimentar os cavalos, acabei deixando os pobres animais sem alimento devido a esta confusão. Mas... - Ele olhou para as duas - Não saiam sem que os patrões peçam. 

As duas assentiram. 

Na sala, Jin havia adentrado com Elesis em seus braços. O ruivo aparentava estar desesperado.

— Filho, responda a pergunta da Duquesa. - Disse seu pai, de forma exigente - Por onde andaram?!

—Eu... - Jin fingiu estar ofegante - Eu sinto muitíssimo. - Ele colocou a ruiva no sofá, ainda desacordada.

— Explique o que acontecera, por obséquio. - Elscud mantinha certa indelicadeza, apesar das palavras.

— Explicar-te-ei, Duque. - Jin se virou para todos da sala, ficando de costas para Elesis - Eu e sua filha saímos para selar nosso amor.

A Duquesa levou as mãos até a boca assim como fez a mãe do ruivo.

Elscud deu um passo a frente e se manteve mais sério.

— Isso explica o fato de Elesis estar desacordada, filho?

Jin negou com a cabeça.

— Eu e Elesis depois... Bem, depois do que aconteceu, encontramo-nos com aquele republicano insano do Erudon. - Jin cuspia as palavras - E começamos a discutir. Elesis acabou se estressando com aquilo, o senhor - O ruivo se virou para Elscud - conhece bem a sua filha. Ela se colocou a minha frente, para me defender, e aquele ínfimo do Erudon a empurrou.

Sieghart havia cruzado os braços. Havia ficado pensativo com as palavras de Jin. Estava desconfiado de sua versão da história e apenas observava. Sieg conhecia a família Erudon e, mesmo com os desentendimentos, sabia que era uma família que evitava escândalos.

— Elesis acabou caindo para trás e bateu com a cabeça. - Jin continuou - Infelizmente isso aconteceu longe do centro urbano e não tinha ninguém que pudesse ajudar. Nem eu mesmo tive tempo de socorrê-la de imediato - Jin encenou estar desapontado consigo mesmo - Peço perdão por não ter impedido que Elesis agisse de tal maneira e sofresse consequências. Busquei saber se tinha algum ferimento, mas, graças a Deus, foi uma batida que apenas a deixou inconsciente.

Eslcud não mediu esforços para avançar em Jin.

— Como ousou em tocar em minha filha?! – Segurou o ruivo pelo colarinho.

— O senhor não quer... – Jin se esforçou um pouco para falar. Seu pai não se moveu, pois sabia que, se não houvesse o casamento, aquele acontecimento poderia desonrar a família Sieghart – O senhor não quer que eu me case com Elesis?! – Jin conseguiu se afastar, porque Elscud afrouxou as mãos – Agora nada nos impedirá, Duque. A não ser... – O ruivo olhou para a janela, como se indicasse que lá fora da casa que existisse o perigo - Que queira expor Elesis à desonra.

Elscud abaixou a face e percorreu os olhos até a sua filha. 

“Magia... Amor... Controvérsias... ‘Há quem o mate por querer, sem lhe tirar nunca a vida, pobre é todo o que o perder, e tem mais que uma medida.’ Salve a si mesma, Elesis...”

A ruiva acordou e levou a mão até a testa. Abriu os olhos vagarosamente. Estranhou o local. Deu-se conta, então, de que ainda vivia em uma época que não lhe pertencia.

O que está acontecendo?

— Deus! – A Duquesa olhou para a jovem se mexendo na poltrona e correu até a filha – Elesis, meu amor, como está se sentindo?

A ruiva não conseguiu responder, fechou os olhos e buscou por ar.

A Duquesa olhou para trás. Elscud não pensou duas vezes e saiu do lugar onde estava, correndo a passos fortes até a porta. 

Passou por Bernard, que estava indo alimentar os cavalos e exigiu:

— Chame Sieghart em particular e diga-lhe que estou indo resolver um assunto pendente. - Elscud cuspia as palavras com raiva.

— Queres adiantar o que seja, senhor? – Indagou Bernard, temendo o patrão, pois o ruivo tinha uma expressão severa e de puro ódio.

— Controverte-ei com a família Erudon. Apenas isso... – Elscud fechou a mão em punho - Temos um assunto que há muito tempo precisa ser resolvido... - E saiu da casa, seguindo para o celeiro.

Caminhou pelo jardim escuro, pouco iluminado pela lua prata que se escondia atrás de nuvens negras. Os olhos do Duque brilhavam em meio ao breu.

Chegando ao celeiro, o seu cavalo relinchou.

— Não se preocupe, - Disse Elscud se aproximando do animal – não iremos a uma guerra para sermos derrotados. Eu vou acabar com aquele Erudon insolente. E romper de uma vez essa ideia de revoluções...

O Duque olhou para a bainha que ficava pendurada no leito onde seu cavalo estava e a pegou. Retirou uma espada bem polida, com o aço reluzente e o cabo de ouro.

— Eis que Deus aprove minha conduta. – Guardou novamente a espada e prendeu em sua cintura.

Elscud montou em seu cavalo e saiu portão a fora numa velocidade estrondosa.

Bernard obedeceu a seu patrão. Deixou de lado a alimentação dos cavalos e seguiu para o salão onde a família estava reunida.

O servo parou na porta que dividia o corredor do âmbito familiar. Olhou para Elesis deitada e sentiu um aperto no coração, mas não pôde se manifestar. Queria consolar a Duquesa, mas calou-se com suas preces.

Olhou para Sieghart e, numa troca de olhares, chamou-o. Assim que o moreno pediu licença para se retirar, juntou-se a Bernard, que lhe contou o que Elscud havia pedido.

Sieghart olhou para trás, conseguiu ver um pouco como Jin estava reagindo a toda aquela situação.

— Elscud acreditou no que o filho do Marquês lhes contou. Ele será capaz de uma loucura, Bernard. – Disse Sieg, fitando o servo.

— O que está havendo, senhor? Eu realmente estou confuso.

— O caos está pairando sobre essa família, mas ninguém percebe. Há algo por trás disso tudo. Porém, - Sieghart suspirou – o problema agora é impedir que Elscud faça algo atroz.

O moreno lançou um olhar apreensivo e Bernard logo entendeu o que estava por vir.

— É preciso que se apresse, então. Com a velocidade do cavalo de Eslcud, é bem capaz que ele já esteja perto da fazenda dos Erudon.

— Sim. – Sieghart começou a caminhar, mas parou e deu um aviso: - Não diga nada a Elena, muito menos para o Jin ou qualquer pessoa. – Abaixou a cabeça – Preciso alcançar Elscud antes que... – Sieghart se calou e correu para fora da mansão.

Sieghart saiu com seu cavalo como se participasse de um torneio. Cortava o ar em sua velocidade feroz.

— Iá! - Bradou e bateu com os calcanhares nas laterais do animal para que cavalgasse o mais rápido.

—--

Elscud desceu de seu cavalo e andou forçando o chão. Adentrou pela fazenda dos Erudon cerrando o punho e encarando friamente a grande casa a sua frente. 

— Apareça, Ronan! Eu deveria ter impedido que a sua existência viesse a vingar! 

Elscud gritava para que todos ouvissem a sua ira.

A casa era enorme. Uma das maiores, junto com a da família de Jin e Elesis, da região.

Uma luz pôde ser vista em chamas em uma das janelas do andar debaixo.

— Apareça, seu desprezível, que se acha ufano¹ o bastante para respirar no mundo em que eu governo!

Uma mulher de longos cabelos negros trançados, usando uma camisola branca de seda e uma veste por cima, por causa do frio que fazia naquela noite, apareceu na porta. Ela segurava uma lamparina e tentava reconhecer o homem que causara tanto reboliço.

— Ora, ora, ora... – Disse Elscud, aproximando-se mais ainda da mulher – Não precisava sair de seus aposentos para me recepcionar. Quero falar com seu filho. Ou melhor: mata-lo.

— O que pensas estar fazendo, Duque? – Perguntou ela, num tom excessivamente calmo; porém, firme.

— Não quero coibir o seu descanso, então, por favor, entre e deixe que seu filho responda pelos seus atos.

— Viestes aqui para dizer a uma mãe dormir enquanto ameaças seu filho?! Quem pensais que és?! – A mãe de Ronan colocou a lamparina no chão, desceu alguns degraus até atingir o jardim e parou em frente de Elscud, que também havia parado de andar – Suma da minha vista, ou quem sairá daqui morto será a vossa pessoa.

— Incisiva como sempre. – Elscud riu – Mas não adianta proteger a sua cria, vim aqui em prol de uma retaliação. Sobretudo... Se continuares na minha frente, matar-te-ei junto com a escória de sua família.

A mãe de Ronan não suportou a ofensa e desferiu uma tapa no rosto de Elscud.

— Mãe! – Gritou Ronan, que apareceu na porta junto com seu pai.

— Saia de perto dele. – Exigiu o Sr. Erudon.

A mãe de Ronan recuou alguns passos, até se virar para seu marido. O Sr. Erudon caminhou até Elscud; Ronan continuou na porta. 

Elscud massageou a face direita, onde havia sofrido a agressão.

— Não deveria ter vindo à frente. – Disse o pai de Ronan, com uma postura superior.

A mulher abaixou a cabeça.

— Elscud, como disseste, não é mais o mesmo, Erudon. – Falou ao marido e continuou a andar juntando-se ao filho.

— Então fique longe dele... - Sussurrou, aproximando-se mais do ruivo.

— Já disse que não quero pai ou mãe protegendo este insano! – Bradou Elscud, colocando a mão na bainha.

— Saia de minha casa! – Exclamou o pai de Ronan – Não fizemos nada a vossa pessoa ou a vossa família. E, creio eu, que não esteja aqui para tratar de política a uma hora dessa.

Elscud tornou a rir.

— Não, meu caro Erudon, hoje não é dia para política, apesar de eu já saber que estais louco em querer ir contra a soberania do Rei. - O Duque passou a mão no rosto e encarou Ronan - Seu filho, - Respirou entre as palavras – tocou em minha filha e a feriu.

O Sr. Erudon olhou para trás.

— Ronan jamais faria isso. – Voltou a encarar o ruivo.

— Não acredito em palavras contrárias a conveniências.

— Estais insultando-me de mentiroso!? – Aumentou a voz o Sr. Erudon.

Elscud cuspiu no chão.

— És um mentiroso e criastes um filho desonrado!

— Atenue² o tom de voz em minha propriedade, Elscud! E nunca mais importune minha família com tuas loucuras!

— Ei! – Ronan resolveu se manifestar, desceu um degrau, mas sua mãe o impediu de continuar – Preciso saber o que estão falando de mim. – Olhou para sua mãe e protestou - Então não me impeça de ir até eles.

— Não, Ronan, nessa briga tu não entrarás. – Murmurou a mulher, com um ar preocupado.

Ronan puxou o braço que a mãe havia segurado e desceu as escadas. Ela suspirou aflita.

— Finalmente Deus enviou esta alma – Elscud sorriu para Ronan – até mim para morrer.

Desembainhou a espada.

Sr. Erudon olhou para o filho.

— Volte para a sua mãe. – Ordenou.

— Deixei-o, Erudon. - Elscud riu em sua loucura - Enganei-me em achar que ele não era honrado o bastante, mas chegar a desobedecer aos pais para arcar com seus pecados torna este jovem pecador muito digno.

— Não assumo nenhum pecado. Não pereço diante ti. Não morro em suas mãos. – Ronan se prostrou ao lado do pai e seus olhos azuis se iluminavam em prol da lua prata, que já não se escondia mais – Estou aqui para encerrar de vez esta desordem.

Elscud apontou a espada no pescoço de Ronan. O Sr. Erudon olhou para a ponta da lâmina que reluzia. Seu filho era homem, tinha idade o suficiente para exercer sua responsabilidade e se proteger sozinho. Mas era pai e não admitiria tal atrocidade por parte de Elscud. Também retirou sua espada da bainha.

Elscud riu.

— Não posso permitir que seu filho viva depois do que fez com Elesis. E por todo o reboliço que vem causando nesta cidade com suas ideologia indecorosas!

— Nunca fiz nada com aquela... – Ronan respirou fundo e engoliu a seco – Com a tua filha. Tampouco me mantive próximo a ela. Se tens alguém com quem se preocupar, é com o filho do Marquês.

Ronan moveu, com o dedo indicador, a lâmina para o lado, saindo da mira da espada. Virou-se. Achando que o assunto havia encerrado após suas palavras. 

Elscud ficou com mais raiva ainda. Juntou a espada ao corpo e encarou as costas do menino.

— És um tolo se acreditas que aceitarei tuas palavras ínfimas como argumentos para sair vivo! – Gritou o ruivo.

A mãe de Ronan arregalou os olhos e sua respiração pausou por segundos.

Sieghart ultrapassou o portão da fazenda e só deu tempo de gritar:

— Erudon! – Avisou Sieghart ao pai de Ronan, que agiu numa velocidade extrema e colocou sua espada entre Ronan e Elscud, já que o mesmo iria atacar o jovem por trás.

Ronan se virou num impulso e focou nas espadas juntas formando um “X”.

Sieghart desembainhou sua espada e apressou os passos ao descer do cavalo. A mãe de Ronan desceu rapidamente e acabou derrubando a lamparina na grama, apagando-se por causa da terra úmida.

— Ronan! Meu filho! – Correu até o rapaz e o abraçou para perto de si. Seu coração pulsava fortemente – Meu Deus!

Sieghart parou ao lado de Elscud.

— Perdestes a razão!?

— Deus não permitiria que Ronan continuasse vivo. O que... O que aconteceu? 

Elscud estava incrédulo.

— Deus é justo com os injustiçados, Elscud. – Disse Sieghart.

— Não! – O ruivo derrubou a espada do Erudon e atacou novamente Ronan, que teve a mãe como escudo a sua frente, a espada perfurou sua camisola, mas não a atingiu.

— Mates a mim antes de encostar-se a meu filho! – Disse a Sra. Erudon.

Sieghart irritou-se com aquela brutalidade diante a uma mulher e usou sua espada para parar Elscud e, com uma força estrondosa, conseguiu quebrar ao meio a lâmina em um só golpe.

— O que vós pensais estar fazendo?! – Questionou o ruivo, virando-se para o moreno e soltando sua espada quebrada.

Sieghart agarrou a blusa branca de Elscud.

— Estás louco e cego! Comece a pensar, Elscud! Acreditaste nas palavras de Jin?! – E jogou-o no chão, apontou para o ruivo e concluiu – Estás agindo como um animal dominado pela fúria do inferno! Se ousar dizer que preza tanto a Deus e que faz isso em nome dEle... – Sieghart olhou para o céu e suspirou – Comece a ter consciência do que faz e aja com a razão!

Sieghart guardou a espada e olhou para a mãe de Ronan. Não houve palavras para se desculpar depois de tudo o que ocorreu.

— Saiam daqui. – Disse a mãe de Ronan, com uma voz de choro – SAIAM! – Apontou para a saída de sua fazendo.

Sieghart assentiu.

O Sr. Erudon esticou o braço para ajudar Elscud, que não recusou e, com a mão suja de terra, segurou a do pai de Ronan. Ao se levantar, não trocou olhares com ninguém. Encarava o chão.

— Nossa briga não terminará aqui. – Disse Sr. Erudon.

— Não pense que, por ter saído ileso desta batalha, ganhará a guerra política. – Elscud se virou. Deixou os dois pedaços da espada no solo úmido e caminhou até seu cavalo.

—--

Sieghart saiu à frente com seu cavalo e Elscud esperou ter uma distância considerável para não se encontrar com o moreno.

Com certeza não teriam uma conversa em casa e, com certeza, a relação entre eles seria de antipatia.

—--

— Ronan. – Chamou o pai, quando os três já estavam dentro de casa – Fique longe daquela família.

— Respeitar-te-ei, meu pai. – Disse o jovem.

— Espero que sim...

O pai de Ronan não precisava saber do filho se ele realmente tinha feito algo com Elesis, acreditava nele e era isso que bastava. Pelo menos, até aquele momento.

—--

Jin saiu da sala e deixou que as mulheres cuidassem da ruiva. Deu uma desculpa persuasiva para não ocorrer suspeitas.

Encontrou-se com Bernard ao lado de fora da casa, pois o mesmo voltava do celeiro.

— Bernard. – Chamou Jin, parado na porta – Para onde foram o Duque e Sieghart?

O servo o olhou com cara de poucos amigos.

— Não sei, senhor. – Mentiu.

Jin estalou a língua. Não acreditou.

Silêncio.

Bernard passou pelo ruivo, mas nenhum dos dois trocou algum tipo de contato. Jin olhou para o céu e esperou.

Saiu da porta e caminhou a passos lentos até uma árvore gimnospérmica que ficava ao lado da mansão e encostou-se a ela.

— Então... Conseguistes o que queria...? – Murmurou uma segunda pessoa, que estava encapuzada.

Jin suspirou e sorriu.

— Ainda não... Mas estou próximo.

— O que fizestes para ter a confiança deles? – A voz delicada de uma menina soou como um vento gélido no rosto do ruivo.

— Disse que eu e Elesis ficamos juntos. – Ele inclinou a cabeça e sorriu maliciosamente para a pessoa que estava a sua frente.

— Como ousou fazer isto?! – Ela o empurrou contra a árvore.

— Fale baixo! – Murmurou como uma bronca – Queres que alguém descubra que tu estás aqui?

Silêncio.

— Saiba que eu menti. – Continuou – Não amo aquela ruiva exaltada. Ainda mais agora com a comutação entre os séculos. – Jin riu – Está sendo hilário.

— É bom mesmo que não ame Elesis.

— Não precisa ficar emulada³. – O ruivo tirou o capuz e passou a mão no rosto da mulher a sua frente – Saiba que meu coração pertence a vossa pessoa.

— Jin... – Colocou novamente o capuz – Estou me arriscando muito. Estou com medo.

— Não precisa temer. Eu sei o que estou fazendo... O futuro pertencerá a nós. – O ruivo a beijou.

— Preciso ir. – Ela olhou para trás – O Duque e Sieghart estão chegando. É melhor voltar para a mansão.

Jin assentiu. Admirava aquela mulher e as habilidades que possuía. Saiu dali e avisou:

— Seja cautelosa.

— Serei...

Jin se virou para frente e voltou para a casa e, antes de entrar, olhou para trás. Não viu mais ninguém. Sorriu.

—--

Elesis despertou e ficou mais consciente. Deu-se conta de que continuava na sala. Sentou-se.

— O quê... – Respirou fundo – O que houve?

Sua mãe sentou ao seu lado, passou a mão em seus cabelos e sorriu.

— Estais consciente agora, isso que importa.

Silêncio.

Se não bastasse a confusão na mente de Elesis, a Marquesa piorou tudo.

— Bem, já que vossa pessoa e meu filho selaram o vosso amor, nada mais vos impedirá de se unirem em matrimonial.

— Como assim? – Elesis olhou para a mãe, franzindo a testa.

A Duquesa estava esperando um momento certo para contar, mas como a mãe de Jin já falara, apenas deu a sentença final.

— Filha, o que fizestes antes do casamento foi uma desonra. Porém, - A mãe se levantou e encarou Elesis – se se casares antes de qualquer coisa que venha a vingar, não será motivo de escândalos para o nome de nossa família.

— Como assim?! – Repetiu Elesis e também se levantou – Que selo foi esse? – A ruiva estava desnorteada. Olhou para as duas mulheres a sua frente e deduziu por si só – Eu não fiquei com o Jin! Nunca!

— Elesis, eu sei o quão difícil deve ser admitir isso, mas não precisa nos esconder a verdade. – Aconselhou a Marquesa.

— Não estou escondendo... Ah... – Sentou-se subitamente. Sentiu uma forte dor de cabeça.

— Não se esforce, filha. – A mãe se agachou a sua frente – Ficará tudo bem. E o culpado pela sua dor será punido.

— Jin será morto?

A Marquesa quase caiu para trás. Colocou a mão no peito e rezou para que as palavras de Elesis não tivessem força o bastante e se rompessem no tempo.

— Não! – Exclamou a Duquesa – Jin nos contou o que houve.

— E o que houve? – Elesis perguntou entre os dentes, estava se preparando para mais uma mentira.

— O Erudon importunou vocês dois. Houve uma contenção entre Jin e ele, mas se colocou a frente e acabou caindo no chão e batendo a cabeça.

Elesis esbugalhou os olhos e ficou esbaforida.

— Eu vou matar o Jin! Como ele ousou contar isso a vocês?! Isso é mentira!

— Elesis! Não se altere! – A mãe a segurou pelo braço, apertando-a.

— E você não se encoste a mim! – A ruiva puxou o braço, levantou-se e foi em direção à escada. Reprovou a atitude de sua mãe.

— Onde pensa que vai?! – Gritou a Duquesa.

— Pensar. Preciso de um tempo a sós! Isso está virando uma loucura!

Elesis começou a subir a escada com pressa, dirigiu-se até seu quarto. A Duquesa foi atrás dela, mas, quando chegou, só encontrou a porta fechada.

— Elesis, saia deste quarto agora! Temos muito que conversar. Precisamos manter a calma e resolver sobre o casamento.

— Vai embora! – Gritou a ruiva dentro do quarto, sentou-se no chão e encostou as costas na cabeceira da cama. Apertou os ouvidos com a mão – Tudo isso não é verdade!

— Elesis! – A mãe da ruiva colocou a palma da mão na porta e encostou a testa também – Filha... O que está acontecendo...?

Elesis começou a chorar.

— Isso está sendo insuportável... – Soluçou – Eu quero minha vida de volta.

Abraçou a perna por cima do vestido e aconchegou o rosto entre o vão dos joelhos e ficou assim por um tempo.

— Duquesa? – Chamou a mãe de Jin – Não iremos resolver nada assim. Se Elesis está atordoada, deixe-a com seus pensamentos. Podemos decidir apenas entre nós duas.

A Duquesa assentiu e virou-se.

— Iremos marcar o chá com o Padre. – Determinou a mãe da ruiva.

— És uma mulher de atitude. Creio que meu marido e meu filho estão muito bem fazendo negócios com a sua família.

A Duquesa sorriu forçadamente e desceu as escadas, assim como a Marquesa.

—--

Elesis se levantou do chão ao ouvir o silêncio que se instalou. Sua mãe não estava mais ali por perto.

Sentiu o peso do vestido. Precisava trocar. Ainda mais que estava sujo de terra. Caminhou até o enorme guarda-roupa de madeira maciça e o abriu. Mais e mais vestidos...

— Eu vou matar o Jin... Ah se vou... – Murmurou e escolheu um vestido simples, que, na verdade, era uma camisola.

Entrou no banheiro do quarto e viu uma banheira. A água não estava quente e, pelo frio que fazia aquela noite, não seria uma boa encarar a água gelada.

Trocou-se e desceu vagarosamente. Dirigiu-se até a cozinha.

— Lire? – Chamou a ruiva.

— Elesis! – A loira não gritou, mas chegou bem perto. Correu para abraça-la – Estais bem? Eu... Eu fiquei preocupada.

A ruiva deu um sorriso forçado.

— Lire, por que me abraçou?

— Porque... Eu fiquei preocupada. – Espantou-se.

— Elesis! – Arme apareceu na cozinha e foi abraçar a amiga.

— O que há de errado com vocês? – A ruiva novamente se afastou – Eu não gosto de abraços e sabem disso.

— Estais estranha... – Comentou Lire.

— Eu não. – A ruiva olhou para a cozinha e para as vestimentas das meninas – Isso aqui que está muito estranho. Por que estão vestidas assim? Parecem até empregadas. – Riu.

— Mas somos. – Afirmou a loira.

— Está brincando, né? – Elesis olhou para Arme, que balançou a cabeça – Mas vocês estudam, são independentes... Por que estariam trabalhando aqui?

— Não podemos estudar, Elesis. – Arme arqueou uma sobrancelha.

— Esqueci-me que estou em outro século. Provavelmente estou sonhando. – A ruiva suspirou.

— Não creio que esteja sonhando. – Disse Lire – Não me sinto parte de um sonho, até porque consigo controlar perfeitamente o que falo.

Elesis abriu a boca. Não sabia como contra argumentar.

— Algo está acontecendo... – Murmurou a ruiva.

Lire e Arme se calaram.

— Elesis? – Apareceu Bernard – O que faz aqui?

 –O que você faz aqui?! – Ela sorriu surpresa, mas, antes de Bernard responder, Elesis continuou – Esquece a minha pergunta, você não é professor, até porque não estamos no século vinte e um, correto?

Bernard fez uma careta confusa e assentiu.

— Estás se sentindo melhor, Milady?

Elesis sorriu um tanto sem graça.

— Quanto mais tempo eu fico aqui, mas me sinto parte deste século. – Deu uma pausa – Não me chame de “milady”, Bernard, por favor. É tão estranho ouvir isso de um professor.

— Mas eu não sou professor.

— Enfim... – Elesis sentiu um aperto no coração e um frio na barriga. Era tão estranho estar perto de conhecidos, de amigos, mas se sentir no meio de estranhos – Eu vim aqui para esquentar água. Preciso tomar um banho. Passei uma noite horrível numa floresta horrível e... Meu dia está sendo...

— Horrível? – Sugeriu Lire.

— Exatamente. – Elesis riu.

— Não precisava vir aqui. – Avisou Arme – Levaremos a água fervida para seu quarto.

— Não precisam fazer nada por mim. Não são meus empregados. – Elesis estava aumentando o tom de voz.

— Deveras a situação, somos, sim, Milady. – Bernard parou um pouco para refletir – Disseste que estava em uma floresta, não foi?

Arme estava enchendo uma panela e parou para ouvir.

— Sim, por quê?

Bernard balançou a cabeça em sinal negativo.

— Está tudo bem? – Lire quis saber.

Arme voltou a encher a panela. Acendeu a lenha e deixou a água ferver. Virou-se para os três que estava na cozinha.

Elesis iria falar sobre o fato de Jin ter contado uma mentira, mas não deu tempo. Ouviu a porta da sala sendo brutalmente aberta.

— É melhor voltar para seu aposento, Milady.

— Por quê?

Bernard foi empurrando Elesis para fora da cozinha.

— Bernard?! O que está fazendo? Pare já de me empurrar!

— Seu pai chegou e não está nada contente. - Sussurrou.

— Eu preciso falar com ele. – Elesis tentou se virar para o corredor da sala.

— Não. – Bernard a segurou – É melhor não.

— Mas...

Milady, sei que não deve me obedecer, mas é para o seu bem. Lire e Arme levarão sua água. Mas, por favor, volte para o quarto e aguarde a tempestade passar.

— Que tempestade? – Elesis não estava entendendo a metáfora.

— Seu pai comanda a chuva tenebrosa e Sieghart os raios impiedosos, entendestes?

Elesis assentiu, mesmo não entendendo, correu até a escada e voltou para o seu quarto. Um dilúvio estava prestes a acontecer.

— Meu Deus... O que está acontecendo...?


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Notas finais do capítulo

*ufano¹ = imodesto, presunçoso,
*atenuar² = sossegar, diminuir,
*emular³ = disputar a preferência.