Capitulo 02
Eu me levantei e enxagüei a boca que estava com o gosto do vômito, escovei os dentes e saí do banheiro, suspirei, não estava gostando nada de ter de ficar indo ao banheiro vomitar.
Andei até a sacada da sala e fiquei olhando os carros andarem rapidamente com uma pressa imensa para chegar a algum lugar.
Provavelmente pessoas com compromissos, como todas as outras, compromissos são coisas que eu não gosto e não é somente por que eu só chego atrasada, mas sim por que eu realmente não gosto disso, não gosto do relógio também, somos comandados por uma pequena bolinha decorada que colocamos no pulso esquerdo, tão ridículo.
Suspirei, eu gosto de ficar na sacada, eu sempre ficava aqui quando brigávamos, ou aqui ou na casa da Luciana.
Luciana é minha amiga há anos, ela sempre me ajudou e eu a ajudo, mas ela já me rendeu algumas brigas...
Elas começaram quando o rick começou a trabalhar quando terminou a faculdade de direito- que é menos tempo que a de medicina- e começou a ficar estressado, ele chegava chateado, cansado e costumava a cair na cama e acordar só no dia seguinte, parava de falar as coisas de sempre que eu gostava de ouvir, me deixou um pouco de lado, mas o cumulo foi quando ele trouxe trabalho para casa.
Nesse dia eu estava voltando do trabalho de meio período numa loja, havia falado com as minhas amigas e eu ia ver com rick se não podíamos sair, fazia um bom tempo que não fazíamos isso, eu entrei em casa e tranquei a porta, vi a luz do escritório- não era bem um escritório, era mais uma sala de estudos para nós dois- acesa e fui até ela, provavelmente rick deveria estar lendo algum livro de direito ou ter cochilado enquanto lia um.
Mas ao entrar eu vi uma outra cena, rick lia um papel ao lado do computador que estava ligado e com alguns códigos, livros sobre direito trabalhista abertos ao redor dele.
Eu enruguei a testa.
- rick?- perguntei confusa.
Ele me olhou entediado e com um pouco de raiva e falou.
- o que foi?
Eu estranhei o modo dele falar, ele não costumava a falar assim comigo, era mais carinhoso.
- eu... eu falei com as garotas, elas estavam querendo ir num restaurante que abriu agora e eu queria saber se a gente vai. – eu falei um pouco confusa e hesitante.
Rick parecia muito diferente, sério, com raiva, estressado- mais do que o normal.
- não, eu tenho muita coisa para fazer, você pode ir se quiser.
Eu tive de me segurar para não cair, ele disse que eu poderia ir sozinha- no caso sem ele-?
Quem era essa pessoa? O que fizeram com o MEU Henrique?
- o-o-o que? Por que?o que está acontecendo?
Ele revirou os olhos.
- não está acontecendo nada só que eu tenho que trabalhar.
Trabalho?
Não, por favor não me digam que ele fez isso.
Mas ele tinha feito.
- você... trouxe trabalho para casa?- ele com certeza estava ficando irritado com as minhas interrupções no trabalho dele, mas... trabalho em casa?
Isso já era demais para mim.
- sim, eu trouxe, qual o problema?
- o problema é que desse jeito você vai ficar louco.- ele revirou os olhos.
- deixe de ser idiota samantha, isso é comentário do preguiçoso.
Eu me aproximei da mesa e disse.
- não. Esse é o comentário de uma pessoa racional que vê o seu namorado se matando de trabalhar, você vai ficar louco, rick, você trabalha o dia inteiro e agora trás até trabalho para casa, o que vai ser o próximo?vai se mudar para a empresa?
Ele se levantou.
- e se fosse, hein? seria melhor eu iria conseguir me concentrar ao menos, mas olhe você, você passa o dia sem fazer nada, eu tenho que cuidar de nós dois, samantha!
- passo o dia sem fazer nada? Eu TRABALHO a tarde e ESTUDO de manhã além de ter a pensão dos meus pais, rick, a gente não vai morrer se você não tentar se matar no trabalho.
- por favor samantha! Você acha que eu quero viver com a pensão dos seus pais e com você trabalhando meio período quando poderia estar estudando, só estou tentando fazer com que você tenha uma vida mais confortável, caramba, você tem que entender que nós somos adultos agora, não podemos apenas levar a vida do jeito que levávamos.
Eu o olhava chocada.
- como? Espera aí... espera aí.... como assim agora somos adultos e não podemos levar a vida do jeito que levávamos? Faça-me o favor Henrique, você fala como se nós fossemos uma dupla de desocupados que nunca fizeram NADA!
- EU NÃO DISSE ISSO!- ele gritou, eu senti as lágrimas nos meus olhos.
- para de gritar.- eu pedi me segurando para não gritar também e/ou começar a chorar.
- EU PARO SE EU QUISER!- ele gritou novamente, eu respirei fundo e gritei também.
- QUER SABER? GRITE O QUANTO QUISER, ACORDE OS VIZINHOS, SE MATE DE TRABALHAR, NÃO É ISSO QUE VOCÊ QUER?FAÇA ISSO! EU NÃO ME IMPORTO MAIS!- era óbvio que eu estava mentindo, mas naquele momento a raiva havia se apossado de mim completamente.
- NÃO SE IMPORTA? ISSO QUER DIZER QUE VOCÊ NÃO ME AMA, NÃO É?É CLARO, FOI AQUELE LEONARDO! VOCÊ ESTÁ ME TRAINDO COM ELE?- ele gritou, ótimo, agora o rumo da briga mudou.
- NÃO PONHA PALAVRAS NA MINHA BOCA! E NÃO TEM NADA HAVER COM O LEO!- eu gritei para ele.
- LEO? ESSE CARA SÓ QUER TE LEVAR PARA CAMA E VOCÊ SABE DISSO! AO INVÉS DE BRIGAR COM ELE VAI BRIGAR COM O SEU NAMORADO!
- NAMORADO? VOCÊ NEM PARECE MAIS UM! TRABALHA MAIS DO QUE PODE E NUNCA MAIS ME DEU CARINHO!
- CARINHO? MAIS DO QUE EU JÁ TE DOU?- ele pareceu surpreso com isso, será que ele realmente achava que estava me dando carinho?- EU POSSO ESTAR UM POUCO DISTANTE MAS É SOMENTE POR QUE EU QUERO UM FUTURO PARA NÓS!
Eu abaixei a cabeça, meu coração estava acelerado, eu estava tonta e tremendo, minha pressão estava baixando? Balancei a cabeça e falou.
- e vamos ter... vamos ter um futuro, mas esse futuro só vai acontecer se você continuar vivo e não se matar de trabalhar, Henrique.- eu falei me acalmando, eu já estava tão fraca que atropelava as palavras- como eu vou ficar com alguém que mesmo que eu ame não fica comigo? Não me dá carinho? Parece as vezes até que não se importa comigo?
- VOCÊ ACHA QUE EU NÃO ME IMPORTO COM VOCÊ?- ele gritou novamente.
Eu respirei fundo várias vezes tentando acalmar meu coração e fazer minha cabeça parar de rodar.
- não, não é isso, eu sei que você se importa comigo mas você tem trabalho tanto que às vezes parece que você... você não me ama mais...- eu falei ainda tentando me acalmar, eu precisava de um banho para me acalmar, sempre me acalmava.
- ENTÃO VOCÊ ACHA QUE EU NÃO TE AMO MAIS? FALA SÉRIO SAMANTHA! SE TUDO O QUE EU ESTOU FAZENDO É POR VOCÊ E.- eu o interrompi.
- E EU NUNCA PEDI!- ele arregalou os olhos,eu estava realmente brava agora.- A ÚNICA COISA QUE EU REALMENTE PEDI DE VOCÊ FOI AMOR E ISSO É O QUE VOCÊ ESTÁ ME NEGANDO! ESTAMOS AINDA COMEÇANDO A NOSSA VIDA E VOCÊ JÁ QUER QUE ELA ESTEJA PERFEITA E ESTABILIZADA MAS ELA NÃO ESTÁ!
Ele ficou apenas me olhando assustado, abaixou um pouco a cabeça.
- EU AINDA ESTOU NA FACULDADE, VOCÊ ACABOU DE SAIR, AINDA VAI DEMORAR UM POUCO PARA ESTABILIZAR ENTÃO PARE DE SE ESFORÇAR TANTO PARA ALGO ASSIM, OKAY? TEM A PENSÃO DOS MEUS PAIS, NÃO É MUITO,ELES NÃO SÃO RICOS, MAS AJUDA! TEM O SEU EMPREGO, AJUDA! TEM O MEU EMPREGO DE MEIO PERIODO, AJUDA! NÓS NÃO VAMOS TER UMA RENDA DE FAMÍLIA RICA, VAMOS TER UMA RENDA... RAZOAVEL! MAS VAI SER NOSSA E ISSO VAI SER O BASTANTE POR UM TEMPO!
- VIU SÓ? POR UM TEMPO!- ele falou como se tivesse vencido algo, eu o olhei séria.
- tempo suficiente, vai ser o tempo que eu preciso para acabar a faculdade e começar a residência, vai ser melhor, você tem que rever as prioridades, quando o fizer... voltamos a conversar.
Então eu fui tomar meu banho, nossas brigas costumavam a ser por besteiras também, mas essas por causa de dinheiro e trabalho eram as mais graves, logo Henrique veio e se desculpou, disse que realmente estava exagerando, voltou a ser mais carinhoso mas sem deixar as responsabilidades... era engraçado como eu era a irresponsável e ele o responsável...
Me levantei e andei até o meu quarto e fui até um espelho, eu estava horrível, uma blusa da feira de ciências da sexta série, um short folgado, meu cabelo bagunçado, meus olhos inchados, levei a mão inconscientemente para a barriga...
Talvez não tão responsável.
Eu olhei para o anel no meu dedo, não sabia se o olhava com raiva ou com felicidade, mas lembro da primeira vez que o vi... o meu aniversário...e o pedido de casamento de henrique.
Eu havia ficado até tarde no trabalho e quando cheguei em casa me deparei com uma festa surpresa.
- aí amiga, mais um aninho de vida!- falou Luciana me abraçando, eu retribui.
- obrigada mas... não precisava fazer tudo isso, Luci.- Eu falei, ela me olhou confusa.
- mas não fui eu que fiz isso.- eu enruguei a testa. - foi ele.- Ela apontou para ele.
Ó céus e como ele estava lindo, os cabelos louros cortados a tarde com o cheiro dele que eu tanto amava, os olhos castanhos me olhando com um misto de orgulho e felicidade por ter funcionado( eu sou muito atenta a essas coisas e sempre descubro as surpresas), eu deixei meu material e minha bolsa numa poltrona ali enquanto todos os meus outros amigos( eu não sabia que tinha tantos)se divertiam com o bolo e andei até ele.
- hum... me pegou de surpresa.- eu falei o olhando com um leve sorriso nos lábios.
- esse é o propósito se uma festa surpresa- ele falou sorrindo.- feliz aniversário.
Eu abaixei a cabeça e murmurei.
- achei que tinha esquecido.
Ele pegou minha mão e me puxou até o meio da sala aonde a Luciana tinha colocado para tocar Hero do Enrique Iglesias , eu levei meus braços para o pescoço e ele para a minha cintura.
- eu não esqueceria o seu aniversário, sam, você sabe disso. – ele falou.
- eu sei? – brinquei.- mas sério, obrigada pela festa.
Ele riu.
- eu não sabia que tinha tantos amigos.- eu comentei achando estranho.
- e não tem, eu contratei eles.- ele falou sério, eu ri.
- sério?- ele assentiu.
- mas tem algo... que é mais sério ainda?- ele falou, eu enruguei a testa e sorri ao mesmo tempo confusa.
- o que?
Ele tirou meus braços do pescoço dele e se agachou, OMG!
- samantha, você aceita se casar com esse meio-alemão idiota que te ama... mais do que tudo nessa vida?- ele perguntou.
Eu senti meu coração acelerar, isso realmente não havia passado pela minha mente, todas as pessoas ficaram numa rodinha.
Eu respirei fundo e disse.
- sim.
Ele sorriu e colocou o anel no meu dedo, o anel é lindo! Ele se levantou e me pegou no colo me girando.
- eu te amo.- eu falei olhando-o apaixonada.
- eu também te amo.
Ah... boas lembranças essas, de repente eu tive de correr até o banheiro de novo e vomitar, quando eu “terminei”, lavei a boca e escovei os dentes de novo, andei até a sala, eu já estava com fome.
- por que você vomita se está com fome? Assim tira tudo o que eu como!- eu reclamei com a minha própria barriga, que hilário.
Fui até a cozinha e olhei aquela comida toda, fiz uma careta, de repente eu ouvi um barulho de bolsa caindo, fechei a geladeira e ouvi algo.
Alguém estava destrancando a porta.
