Respirei fundo tentando ficar calma enquanto Ethan dirigia seu Bentley preto pelas ruas movimentadas de Nova Iorque. Não pude deixar de observar as pessoas nas ruas, a maioria andando rápido demais, mas por incrível que pareça eles não esbarravam uns nos outros tanto quanto eu esperava, a maioria vestindo roupas formais, levando maletas nas mãos, alguns acenando para taxis enquanto fumavam seus cigarros, mas nenhum deles permanecia parado, sempre todos em movimento, e isso era fascinante.

Apesar das pessoas serem interessantes o barulho dos carros, de sirenes, em geral todo o barulho que eles estavam fazendo era de certa forma irritante.

- Pode ligar o rádio? – perguntei sem desviar o olhar da janela, não querendo perder nada.

- Claro. – concordou Ethan ligando o radio em uma estação de musicas dos anos 90, eu reconhecia algumas das músicas por que eu ouvia Lara escutar as vezes antes de morrer, em sua maioria da banca AC/DC, apesar de sentir uma leve opressão no peito eu ignorei esse sentimento e voltei a prestar atenção as pessoas nas ruas.

E essa foi toda a conversa que tivemos no caminho até a central do FBI, às vezes enquanto estava dirigindo Ethan pegava minha mão na sua e apertava, e de algum modo seu toque conseguiu me acalmar o suficiente para não querer sair correndo e nunca mais olhar para trás.

Ethan pode ter falado que os federais agora só queriam meu depoimento, mas eu sei que matei homens, eu sei que cometi meus próprios crimes, e algo que eu sei é que existe essa grande chance de que eu não saia impune disso, não existe nenhuma garantia além da palavra de Mellone e a de Ethan de que nada vai acontecer comigo, Ethan não controla o FBI, muito menos Mellone.

Ehtan estacionou o carro em frente a um grande prédio com fachada de vidro, esse era bem mais moderno e bonito do que a sede de Detroit, e muito mais alto também, eu apenas podia desejar que não precisássemos ir até o ultimo andar. Respirei fundo e me preparei para sair do carro até que a voz de Ethan me parou.

- Evie...

- O que? – perguntei olhando para ele, minha voz soou baixa, nervosa.

Seus olhos estavam brilhando e ele parecia um pouco ansioso, o que era estranho para Ethan, já que sempre estava irritado ou extremamente calmo.

- Não fale nada que eles não tenham a necessidade de saber, ok? – perguntou com uma voz calma e erguendo uma sobrancelha.

- Ok. – concordei compreendendo o que ele realmente queria me dizer.

Ele acenou e saiu do carro, segui seu exemplo e sai também, o vento frio bagunçou meus cabelos curtos e eu apertei o casaco mais forte contra mim para me aquecer, mas logo Ethan estava ao meu lado, seu braço na minha cintura me mantendo firme e aquecida.

A parte de dentro do prédio era praticamente a mesma do de Detroit, varias pessoas, cabines com computadores, pessoas nos telefones, pessoas conversando. Ethan nos guiou até a mesa de uma mulher em torno dos cinquenta anos, seus cabelos estavam presos em um coque feio e ela estava muito acima do peso.

- Viemos encontrar com o agente Mellone, sou Ethan Ross. – ele falou mantendo uma voz firme e sua expressão agora era inexpressiva, ele havia colocado sua própria mascara e estava na hora de eu colocar a minha.

- Seu escritório é no quinto andar, ele já esta o aguardando. – informou a mulher com uma voz rouca que deveria ser de tanto fumar cigarros.

- Obrigado. – acenou Ethan para a mulher e para mim disse: - Escadas ou elevador?

- Escadas – respondi sem hesitar.

Ethan não contestou enquanto me levava pelas escadas, nem reclamou enquanto subíamos os lances, apenas segurou na minha mão e seguiu subindo. Quando finalmente chegamos ao quinto andar eu já estava sem fôlego, e Ethan como sempre, não estava nem um pouco alterado com o exercício.

- Lembre-se do que falamos! – me avisou uma ultima vez antes de entramos no escritório de Mellone.

Assim como a recepcionista disse, Mellone já estava nos aguardando, ele estava sentando em uma poltrona de couro, as janelas atrás dele nos dando uma bela vista da cidade de das pessoas andando na rua com rapidez.

- Não temos que ir a uma sala de interrogatório? – perguntei baixinho para Ethan enquanto entravamos na sala.

- Não, querida. – respondeu me dando um beijo na testa antes de me puxar para dentro com confiança, Ethan fechou a porta atrás de nós.

Mellone estava falando ao telefone quando entramos, ele parecia agitado enquanto falava, mas não chateado, logo que nos viu ele indicou as cadeiras em frente a sua grande mesa enquanto que se despedia de quem quer que fosse ao telefone.

- Que bom que chegaram – falou colocando o telefone no gancho – Assim podemos encerrar o caso logo.

Sentei na cadeira e Ethan sentou a meu lado, eu estava definitivamente aliviada de não ter que ir na sala de interrogatórios para isso, eu não gostava daquele lugar.

- Isso não vai demorar, apenas preciso saber o que ocorreu desde o momento em que trocamos você pelo Ethan até o momento em que resgatamos você.

- Nada de muito interessante aconteceu, Jerry me bateu e fiquei inconsciente a maior parte do tempo, então assim que chegamos ao galpão Jerry me levou a uma sala e me colocou em uma jaula. Downey também estava lá, ele tinha um braço quebrado e estava bem machucado, não tive muito tempo para conversar com ele antes de Jerry voltasse para buscar Downey, Jack estava com ele, e de acordo com o pouco que Downey me falou Jack esteve presente enquanto ele foi torturado, depois de Jerry levar Downey fiquei sozinha na sala, então me soltei peguei algumas armas e voltei para a jaula antes que alguém chegasse, depois disso esperei um tempo até que Jerry finalmente veio me buscar, ele me levou para seu “escritório” e depois disso quando estávamos sozinhos eu apenas agi... Jack estava lá também, mas não tive tempo de fazer muito coisa com ele... – murmurei lançando um olhar irritado para Mellone, eu ainda estava irritada por ele não ter cumprido sua palavra e ter ido me buscar antes do tempo.

- E sobre Slayer? – perguntou Mellone – Nós encontramos o corpo dele no galpão do Jerry, tem certeza que você não encontrou com ele lá? – perguntou mantendo uma voz calma e me olhando nos olhos.

Pressionei os lábios juntos ao entender o que ele estava insinuando.

- Eu não vejo Slayer desde o momento em que fomos atacados, e quando o toquei eu tinha o consentimento da agente Carter. – respondi mantendo minha voz mais fria que o normal.

- Tudo bem... acho que já terminamos a parte do seu depoimento. – ele disse para minha surpresa, logo ele estava assinando uns papeis na mesa, então logo voltou a olhar para mim – Agora acho que você quer saber o que vai acontecer.

- Claro. – afirmei conseguindo que minha voz soasse firme.

- Jerry e seus comparsas foram presos, incluindo Jack e West, e graças a seus depoimentos e as informações que nos deu temos mais que o suficiente para manda-lo para cadeia, ele será condenado a prisão perpetua. Agora sobre os crimes que você cometeu... eles serão esquecidos, não existe nenhum registro que condena você como cúmplice por qualquer um dos crimes de Jerry.

Soltei a respiração que não sabia que estava segurando ao ouvir isso. Eu não seria condenada pelos crimes do meu pai, eu não iria para cadeia, eu estava livre. Jerry estava preso, assim como seus comparsas, eu estava finalmente livre.

Não percebi que eu estava sorrindo até pegar um vislumbre do meu reflexo no vidro da janela, um sorriso de verdade estava em meu rosto, de repente a cadeira que eu estava sentada parecia ainda mais confortável, o mundo simplesmente parecia que tinha mais cor.

- Você é livre para fazer o que quiser a partir de agora, você já tem os documentos necessários para poder ter uma vida normal. – e por incrível que pareça Mellone sorriu para mim, inclinado em sua cadeira – Sem contar com a recompensa que irá receber por ajudar o FBI a prender um dos traficantes mais procurados dos EUA.

Isso foi uma surpresa, lancei uma olhar para Ethan que também tinha um sorriso de alivio e felicidade no rosto, seus olhos azuis tinham um brilho de tirar o fôlego.

- Recompensa? – perguntei voltando meu olhar para Mellone, mas foi Ethan quem respondeu.

- Sim, o dinheiro já foi depositado na nossa conta – respondeu ainda sorrindo.

Eu estava prestes a responder quando a porta do escritório de Mellone se abriu de repente e um homem entrou com presa.

- Sr., desculpe interromper, mas a pegamos! – afirmou o homem para Mellone lançando a mim e a Ethan um aceno antes de voltar para ele – Ela está na sala de interrogatórios, e pede a presença de um advogado.

- Tudo bem, deixe ela traga um advogado, mas isso não vai adiantar de nada... – murmurou Mellone dispensando o homem.

- Quem é ela? – perguntou Ethan assim que a porta se fechou nos deixando novamente a sós.

- Sua ex- noiva, ela foi a mulher que deu a informação sobre Jocelyn ser a tia de Evie – respondeu com uma voz calma – Foi um pouco trabalhoso descobrir isso, mas conseguimos, e por mais dinheiro que tenha o pai dela, ela cometeu um crime grave ao dar informações que tirou a vida de um agente federal, além do mais, ela esteve ajudando Jack, será condenada como cúmplice.

Não pude deixar de sentir satisfação com as palavras de Mellone, eu pensei que teria mais problemas para provar que Jasmine foi a culpada da morte de Jocelyn, mas pelo visto estava tudo definitivamente resolvido.

- Bem, e antes que eu me esqueça, você precisa assinar alguns papeis agente Ross para que sua transferência seja efetivada. – disse Mellone ficando de pé e indo até um armário.

Franzi a testa para Ethan, de que transferência eles estavam falando? Olhei para Ethan esperando uma resposta para minha pergunta não formulada, mas ele apenas se aproximou beijou meus lábios de leve com sorriso e se inclinou sobre a mesa para assinar os papeis que Mellone colocou ali.

Assim que ele terminou de assinar nós nos despedimos de Mellone e fomos embora, não comentei nada enquanto saímos do seu escritório, nem nada enquanto descíamos as escadas, e nem enquanto andávamos para o carro, permaneci calada até que ele fechou a porta do carro e eu não pude mais suportar.

- De que transferência ele estava falando? – perguntei semicerrando meus olhos para ele e cruzando os braços.

Ethan apenas olhou para mim por um momento antes de responder.

- Eu pedi transferência de Detroit, nosso apartamento está destruído e apesar de Jerry ter sido preso eu não acho seguro continuarmos morando no mesmo lugar, então achei que Nova Iorque seria nossa melhor opção. – ele falou dando de ombros.

- Nós vamos morar no apartamento que em que estávamos? – perguntei de repente pensando sobre todos os malditos lances de escada que eu teria que descer se nós formos morar definitivamente lá.

- Não, nós não vamos morar nele, vamos ficar apenas tempo o suficiente para encontrar uma casa – ele sorrindo para mim, seus olhos azuis me olhando com ansiedade aguardando minha resposta.

- Uma casa? – repeti completamente surpresa.

- A não ser que queria morar em um apartamento – respondeu erguendo uma sobrancelha para mim.

- Oh, não... eu prefiro uma casa, e- eu sempre quis ter uma casa – falei enquanto um sorriso surgia no meu rosto, tão largo que minhas bochechas ficaram doendo, mas não pude me conter, eu estava tão feliz.

Senti algumas lágrimas estúpidas descerem sobre meu rosto, enquanto eu finalmente acreditava que tudo tinha acabado, que estava finalmente livre do Jerry, que poderia viver uma normal com Ethan.

- Você vai poder escolher a casa que quiser – ele falou se aproximando de mim e beijando meus lábios, suas mãos me puxando para ele, e fui de bom grado, ele limpou alguns das lágrimas no meu rosto antes de continuar – Eu espero que esteja chorando de alegria... – murmurou baixinho no meu ouvido, sua voz fazendo meu corpo estremecer.

Passei meus braços em volta de seu pescoço enquanto respondia:

- Sim, eu estou tão feliz, e isso é tão estranho! - falei em voz baixa, como se algo ruim pudesse acontecer se eu falasse mais alto.

- Eu vou me certificar que você se sinta assim por muito, muito tempo – ele falou me dando um ultimo beijo antes de voltar a sentar direito – E apesar de eu realmente querer levar você para casa e mostrar como vou fazer para você continuar feliz, nós temos um compromisso.

De repente minha felicidade diminuiu um pouco e senti a apreensão tomar conta. Nós iríamos almoçar com meus avós, e apesar de que incrivelmente tudo estava dando certo até o momento, não pude deixar de sentir um pouco de medo sobre a reação deles.

- Ah, e antes que eu esqueça novamente – ele disse enquanto enfiava a mão dentro do casaco e retirava um envelope de um bolso interno. – Pegue.

Peguei o envelope com cuidado e lancei um olhar a Ethan.

- O que é isso? – perguntei confusa e curiosa ao mesmo tempo.

- Você só irá descobrir quando abrir... – falou se inclinando para pegar meu cinto de segurança e coloca-lo, depois disso ele deu a partida no carro.

Mordi o lábio com força enquanto abria o envelope com cuidado, eu estava prestes a tirar o que tinha dentro do envelope quando Ethan colocou a mão no meu queixo e falou:

- Seus lábios estão machucados, pare com isso. – apesar de sua voz soar suave o olhar que ele me lançou foi firme.

Revirei meus olhos para ele antes de finalmente olhar o que tinha no envelope e assim que li as primeiras palavras me senti gelar.

- O-o que? – perguntei sem deixar de olhar para o papel e as palavras que chamaram minha atenção.

CARTA DE ACEITAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE

NOVA IORQUE

Ethan sorriu para mim, antes de responder.

- É exatamente o que está ai, você foi aceita na NYU.

- Mas... como isso? Eu nunca fiz nenhuma prova... – perguntei confusa, ainda olhando para a carta em choque.

-Não importa como, você foi aceita e ponto final, suas aulas vão começar daqui a dois meses – ele disse, mas eu simplesmente não podia falar, minha voz estava em algum lugar inalcançável no momento – A não ser que você não queira isso...

- O QUE?! – eu praticamente gritei, minha voz voltando e mim como se nunca tivesse sumido – Eu quero! É claro que sim! Oh, meu! Eu não posso acreditar nisso! – falei enquanto continuava olhando para carta, então eu simplesmente enfiei a carta em seu rosto, apesar dele estar dirigindo e não poder ver o que tinha na carta por estar muito próxima do rosto – Olha isso, Ethan!! Eu vou para universidade!!

Eu não podia conter a euforia em mim, meu rosto doía de tanto que eu estava sorrindo, era incrível para mim que eu pudesse sorrir tanto assim em um tão curto espaço de tempo.

- Sim, baby, estou vendo, mas se você pudesse tirar isso da minha frente para eu poder dirigir... – ele disse, sua voz soando quase divertida.

- Oh, claro! – puxei a carta de novo para mim enquanto lia e relia tudo que tinha escrito.

Estou indo para universidade...

O sorriso não deixou meu rosto nem mesmo quando quase uma hora depois Ethan parou o carro em frente a uma casa estilo vitoriano no subúrbio, a casa era branca e bonita de dois andares, a grama era verde na frente e tinha apenas um carro na garagem.

- Pensei que íamos almoçar com os pais de Jocelyn... – falei olhando para casa com receio.

- Nós vamos, depois do que aconteceu com ela o FBI achou melhor transferir sua família para um lugar seguro. – respondeu.

Assenti para ele, de certa forma ficando aliviada que o FBI teve esse cuidado, porque apesar de ainda não ter conhecido eles eu me sentiria terrível ao saber que mais pessoas morreram por minha culpa. Respirei fundo enquanto via Ethan dar a voltar no carro até esta do meu lado.

- Vamos? – perguntou Ethan abrindo a porta do carro para mim.

Respirei fundo novamente antes de concordar e sai do carro, Ethan novamente passou um braço ao redor da minha cintura e me beijou na testa antes de irmos até a porta, mas antes que Ethan pudesse tocar na campainha a porta branca se abriu e eu finalmente me vi frente a frente com a única família que me restou.