Um toque no ombro desperta a menina.

- Você não deve falar de mim para outras pessoas. – Seu observador dizia em um tom sério. Ignorando o que foi dito ela se levantou da cama e abriu a mochila, de lá retirando o seu caderno de desenho.

- Olha o que eu fiz! – Exclamou a pequenina, abrindo o caderno na primeira página e entregando nas mãos do ser, que achou graça na forma em que a menina usou a palavra “olha”.

Vendo o desenho, suspirou, envolveu a menina com dois de seus tentáculos numa espécie de abraço e sorriu sutilmente, como quem não quer demonstrar afeição.

- Anda, me diz o que achou! – Ordenou, com uma voz suave e doce, enquanto pulava de joelhos na cama. Ele se sentou, assim podendo finalmente esticar sua coluna e observando o pedaço de papel ele suspirou.

- Adorei, minha querida. – Pausou por uns segundos, abrindo novamente o sorriso sutil para continuar a falar. – Se é o que queres ouvir... Adorei. – Depositou o pedaço de papel no criado-mudo do quarto, levantou-se da cama e soltou a menina. 

- Já vai? – Perguntou ela, triste. - Vou. Tenho coisas para fazer, mas amanhã volto.  – A menina levantou-se rapidamente, tomou o desenho em mãos e foi para perto do ser, esticou os braços o mais alto que pôde para tentar de alguma forma colocar o desenho no bolso do paletó dele. Murmurou baixinho, como alguém que tenta fazer esforço, na ponta dos pés, e se deixou cair sentada no chão, com lágrimas nos olhos. 

O ser tomou com gentileza o desenho de suas mãos e o guardou no bolso, acariciou seus cabelos e saiu pela janela. A menina sorriu pelo gesto de gentileza, e correu de volta para a cama, agarrando-se à Tibbers e caindo em sono profundo. 

Em outro canto da cidade agora se encontrava o ser, escondido entre os galhos de uma árvore, à espreita. Na rua, até então deserta, cambaleava um homem, há muito bêbado. Eventualmente levava à boca uma garrafa de whiskey Jack Daniel’s. Andava olhando para o chão, e parou ao ver um par de sapatos à sua frente. Ergueu a cabeça e viu a criatura, que agora tomava em mãos a sua garrafa e a quebrava em milhares de pedaços. Virou de costas e correu, tropeçando e caindo próximo à esquina, ao ver que o ser ali se encontrava. Sentiu um forte impacto nas costas, e algo perfurar sua pele e carne. Tentou gritar, mas algo segurou seu queixo, fechando sua boca. Olhou para o homem, implorando por sua vida com os olhos. Procurou pelos olhos da criatura, mas encontrou somente o vazio em sua pele pálida. A criatura se aproximava, cada vez que o homem piscava ele estava mais próximo, até chegar perto o suficiente para sentir o frio que emanava de seu corpo. O local onde sua boca deveria se encontrar agora esticava-se lentamente, até começar a rasgar. O ser abriu um sorriso, e de sua boca só se ouviu uma palavra.

- Durma. - E então o homem sentiu novamente um impacto nas costas, e perdeu sua consciência.