Decline escrita por Yumi Saito


Capítulo 9
VII — Verme.


Notas iniciais do capítulo

Capítulo editado. [14/03/2014].



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Hoje eu acordei meio cansada. Após ter terminado de falar com Castiel, já que a conversa não se estendeu após aquilo, fui terminar de assistir meu detonado. Quando era, finalmente, uma da manhã... eu resolvi deitar na cama.

Não preciso nem mencionar a parte que eu mal coloquei a cabeça no travesseiro e capotei. Ah, e hoje começa o tal trabalho comunitário. Eu juro que eu ainda vou raspar todo aquele cabelo da Ambre.

Quando cheguei ao colégio, deparei-me com Castiel escorado em frente ao seu armário. Estava com as mãos no casaco e os costumeiros fones de ouvido. Tentei não olhar para ele, mas foi tarde demais. A única coisa que fiz, foi dar um rápido aceno e seguir cabisbaixa para a sala de aula.

Peguei um livro que sempre levava comigo e comecei a lê-lo, para me distrair. Até então, estava tudo bem. Mas alguém tocou em meu ombro, eu olhei para cima e o vi.

— Vai ficar na aula de geografia?

Ponderei:

— É o jeito.

— Ah, que pena! — ele ironizou: — Hn, parece que perdi minha companheira para cabular aulas.

— Mas... só cabulamos uma aula juntos!

Ele torceu o rosto e deu um tapa de leve no alto de minha cabeça:

— Não me contrarie, garotinha — murmurou. — Vamos para o terraço.

Suspirei fundo e guardei meu livro na mochila. Coloquei uma alça dela no meu ombro e segui atrás de Castiel. Não deveria ter aceitado ir, mas o fato de Castiel ter me convidado, já me deixou extremamente feliz por dentro. E é obvio que eu não deixei transparecer...

Eu odeio, do fundo do meu coração, me apaixonar rapidamente.

Quando atravessamos a porta, eu já conseguia entrar no ritmo dos passos de Castiel e conseguir andar ao lado dele. Ambre estava na nossa frente, caminhando com suas duas outras amigas. Fiz questão de sorrir quando a vi:

— Andando com a novata, Castiel?

Ele suspirou e revirou os olhos. Rapidamente, Castiel passou o braço esquerdo ao redor da minha nuca e olhou fixamente para Ambre:

— Cuide de sua vida. E eu cuido da minha.

Ela estava, literalmente, estourando-se de raiva por dentro. O rosto avermelhado dela condenava-a. Apenas fiquei séria, mas gostaria de lhe dizer todas as verdades possíveis na cara.

Após isso, Castiel puxou-me pelo braço por alguns segundos, até ficarmos bem longe dela. Feito isso, ele me soltou e puxou uma chave. Caminhamos mais um pouco e ele se ajoelhou, ficando em frente à uma portinhola. Colocou a chave lá e a destrancou.

— Entre.

Fiquei um pouco apreensiva, mas agachei-me e passei pela pequenina porta. Ele trancou a porta novamente. Deparei-me em um cenário totalmente escuro e que cheirava mal. Mas logo Castiel se meteu em minha frente e usou a luz do celular para clarear o ambiente. Havia uma escada, subimos nela.

No final, passamos por mais uma porta e finalmente chegamos ao terraço. A vista de lá era incrível, dava para ver quase metade da cidade. E dava para ver também uma parte da praia que havia nela.

— É muito bonito...

Ele assentiu positivamente, sério. Puxou um cigarro e me ofereceu, mas recusei. Ele deu de ombros e acendeu o conteúdo, tragando levemente e despejando a fumaça pelo nariz.

Apagou o toco do cigarro no batente e arremessou para o chão. Continuou sério, sem dizer uma única palavra, apenas fixando seu olhar para a vista. Eu queria conversar com ele, mas não fazia ideia do que perguntar... E tinha medo de que ele ficasse irritado com algo que eu falasse.

Decidi ficar quieta e aproveitar a vista também.

— Vem sempre por aqui? — por fim, falei algo.

Ele assentiu positivamente:

— Quando preciso pensar, não penso duas vezes em vir aqui.

— Ah... — apoiei meus cotovelos no batente: — Mas por que me convidou para vir aqui?

— Eu gosto de você, novata — ele olhou para mim e sorriu: — É uma pessoa boa. Uma das únicas que consegue aturar Ambre e suas infantilidades.

Corei e sorri. Era bom, muito bom, saber que Castiel gostava de mim, pelo menos como amiga. Era bom saber que ele admirava o fato de eu tolerar Ambre... Mas também revidar, quando chegasse ao limite.

Me senti especial...

— Eu também gosto muito de você, Castiel.

Ele voltou a me encarar. Dessa vez, sério. Eu não sabia se tinha dito algo bom ou ruim. Não sei para qual sentido ele levou a minha frase, mas eu, falei no sentido mais que amigo.

Foi aí que eu me arrependi amargamente.

Castiel colocou a mão em meu ombro, com os lábios em uma linha reta. Seu olhar era duro, mas ainda sim transmitia uma paciência incrível.

— Você não pode sentir isso por mim, Slander — ele murmurou. — Eu sou um verme, e não quero que você fique infectada.

Ok. Ele acabou de jogar meus sentimentos no lixo, e eu estou com pena dele. Pena por ele ter dito que era um verme... Mil e uma coisas passaram em minha mente, do que Castiel poderia ter feito ao longo de seus dezoito anos. Eu não imaginava o quê poderia ter sido.

E era ele... E se fosse assim, eu queria. Eu gostaria de ser... Infectada.

Mas ao mesmo tempo senti um buraco se formando em mim. Senti que a qualquer momento eu poderia acumular alguma remessa de lágrimas em mim. Então, decidi sair do lugar.

— Eu vou embora.

Ele retirou a mão de seu ombro. Abaixei minha cabeça e peguei minha mochila. Fui em passos largos até a porta. Quando pus a mão na maçaneta, ele falou:

— Você não consegue entender o barulho na minha cabeça — falou ele, de costas. — Debrah me procurou. Queria que eu voltasse para a banda, e que eu voltasse para ela.

Ele fez uma pausa, tirei a mão de imediato da maçaneta:

— E o meu sonho era que ela voltasse, e que seguíssemos fazendo sucesso com a banda. Mas... ela nunca mais veio. Demorou dois anos, e chegou grávida. Naquela hora, Jane, eu me senti usado. Ela se rastejou até mim, implorando que eu entrasse na banda.

Aos poucos, a voz de Castiel vacilava, ao longo que falava:

— Eu recusei, no primeiro ato. Mas me arrependi, e disse que era para ela voltar em seis meses. Eu precisava de um tempo para pensar, para colocar as coisas no lugar e tomar uma decisão — ele fez uma pausa. — Uma decisão de ficar ou ir embora.

Meu corpo se arrepiou, virei-me para ele:

— Eu tenho pesadelos todas as noites... Eles me torturam. Sonho com meus pais e sonho com ela. E o pedido dela veio como uma bomba, para me destruir, para me desestabilizar.

— Castiel...

Murmurei, pronta para soltar todas as lágrimas que segurei forçadamente. Corri em sua direção e não me importei em abraçá-lo por trás. Eu só queria confortá-lo e dizer que tudo ficaria bem. Eu queria acabar com Debrah e tomar a dor dele para mim.

Eu o escutei soluçar, aquilo foi a gota d'água.

— Você não me conhece... — ele murmurou, virando-se para mim. Tirei meus braços ao redor dele: — Por isso não quero que vá em frente com isso.

Eu não imaginava que aquilo era apenas uma questão de tempo. Eu não imaginava que ele falaria coisas assim para mim, para preparar o terreno e jogar o veneno.

Mesmo estando magoada, eu o entendi. O entendi perfeitamente... E sabia que aquele sentimento insano teria de parar a se manifestar em mim. Um sentimento que se formou em apenas cinco dias era loucura.

Engoli em seco e assenti positivamente, derrubando algumas lágrimas. Tratei de limpá-las com a manga da camiseta.

Não disse nada. Suspirei pesadamente e saí, de cabeça baixa. Peguei meu celular e clareei os degraus da escada. Antes, eu olhei para trás... Mas ele não veio. Ele ficou lá.

* * *

Fiquei o resto da manhã prestando atenção no conteúdo e na porta também, onde o ruivo sequer apareceu.

Na tarde, troquei de roupa e voltei para o colégio. A diretora nos levou para um bairro decadente. Ele era sujo, e cheirava mal também. Tinha uma estrada de terra e casas de madeira, quase despedaçada. Concluí que em dias de chuva, os moradores deviam sofrer demais.

Eu e Ambre começamos a catar bitucas de cigarro, ambas quietas. Latinhas de cerveja também serviam e iam para nossas respectivas sacolas de lixo. Quando terminamos, deixamos em um canto para o caminhão de lixo passar e levar.

Mais tarde, entramos na melhor casinha que havia lá.

— Pode tirando seu cavalinho da chuva — Ambre murmurou. — Essa casa eu vou limpar.

— Sua preconceituosa! — vociferei. — Tem medo de entrar nas outras?

— Eu tenho! Essa gente que convive no lixo deve estar com um monte de doenças, não me atrevo pisar nas outras casinhas.

— Ah, essa pode ter uma boa aparência, mas quem garante que também não tem doença? — indaguei.

Ela ficou quieta e disse para eu me foder. Revirei os olhos. Ela bateu na porta, logo foi atendida por uma senhora. Ambre se ofereceu para limpar a casa, mas a mulher recusou, de forma rude.

Ri da cara dela, na frente da mulher.

Entramos em outra casinha, ao contrário da outra, fomos bem recebidas. Decidimos limpar a casa juntas, ela ficava em um canto da casa e eu em outro. Isso ajudava a gente a não se matar.

Quando era quinze para as oito da noite, ela ligou para o seu pai. Fui para casa apé. Me arrependi amargamente, meus pés reclamaram demais na metade do caminho. Mas consegui chegar viva e com pés ferrados em casa.

Tomei um banho para tirar o suor e o cheiro ruim instalado em mim.

Meu celular tocou, mas estava tão cansada que não atendi à ligação.


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