O apartamento de Pablo tinha dois quartos, sendo um seu escritório. Na verdade, era o lugar mais bagunçado da casa, ele jogava tudo lá. Não parecia um escritório, mas ele o chamava assim. Pablo era realmente um cara legal. Nos finais de semana ele deixava a gente dormir na cama dele, que era de casal. Camilla e eu dormíamos lá. Ele passava a madrugada toda na boate do pai, quando chegava em casa pela manhã, dormia no sofá, de tão cansado. Pedro não bebia,porque estava em serviço e trazia Pablo com ele as oito da manhã. Normalmente já estou acordada a essa hora. Camilla não acorda antes do meio dia.

  Era manhã do dia 22 de dezembro e para a minha surpresa, eu era a única a estar dormindo. Era segunda-feira e eu estava na cama de Pablo, que provavelmente estava bêbado no sofá. Eram 9:06 da manhã, o que me fazia achar um milagre Camilla já estar acordada. Fui até a sala e Pablo não estava no sofá. Um silêncio tomava conta de todo o apartamento. Fui até a cozinha, coçando o olho direito.

“Surpresa!” –Os três gritaram.

O Pablo era o mais empolgado, talvez porque ainda estava bêbado. Camilla correu até a mim e me abraçou apertado. Em seguida foi Pablo, que cheirava a álcool e logo saiu da cozinha. Pedro foi o último. Seu abraço não foi muito apertado, foi carinhoso.

“Parabéns. A partir de hoje, você será feliz sempre.” –Ele sussurrou enquanto me abraçava.

  A cozinha estava decorada com balões brancos enchidos com gás hélio. Eles tinham a logo da boate Low Club e tinham fitas douradas penduradas. Seis bolinhos redondos de chocolate enfeitavam a mesa e cada um tinha uma vela colorida. Camilla puxou um parabéns e Pedro a acompanhou. Sem graça, apenas fiquei nas palmas e depois apaguei as velas, anteriormente acendidas por Pedro. Cada um comeu um bolinho e fui levar um para Pablo, mas já estava dormindo no sofá, com o controle da TV na mão direita.

  Na mesa, junto com os bolinhos, havia uma garrafa de vodka até a metade. Não nos importamos que era segunda de manhã e terminamos com ela. Camilla fez amizade com uma menina do sexto andar chamada Heloisa e sempre ia para lá passar a tarde. Pedro e eu estávamos sentados na mesa da sala, tomando vodka e o mundo já parecia girar mais rápido.

“Não gosto quando começam a falar desse Teddy, Ed, que seja.” –Disse Pedro após o último gole de vodka do copo.

“Por que não?” –Perguntei antes de beber.

“Porque quero marcar sua nova vida e você fica lembrando da vida passada.” –Ele disse.

Pedro ficou decepcionado ao virar a garrafa e não cair uma gota de vodka. Meu copo ainda estava na metade e Pedro o pegou. Minha cabeça começou a doer e parecia que meu estômago estava cheio de sapos. Foi o primeiro animal nojento que me veio a cabeça. Pedro se levantou e ameaçou se sentar novamente, mas conseguiu se equilibrar. Ele foi até o escritório e ficou por lá por quinze minutos. Voltou com uma sacola na mão.

“Seu presente.” –Ele disse.

Era de uma marca famosa. Abri a sacola e haviam duas roupas. Tirei a primeira. Um vestido branco. O coloquei na cadeira e tirei a outra roupa. Um shorts jeans e uma bata vermelha.

“Natal e ano novo.” –Ele disse apontando para as roupas. –“A mulher da loja que me ajudou a escolher.”

“Parecem caras, mas muito obrigada.” –Eu disse me levantando.

Guardei as roupas novamente na sacola. Realmente lindas e a mulher da loja tinha um bom gosto. Pedro foi para o quarto de Pablo. O segui e ele já estava completamente apagado na cama. O arrumei. Como ele era pesado. O cobri com o edredon. O ar condicionado do quarto ainda estava ligado e ao contrário de lá fora, estava muito frio. O cobri até o pescoço e fui até a porta.

“Eu te amo.” –Ele disse.

Me virei e ele ainda estava com os olhos fechados e resmungava mais alguma coisa. Não consegui entender. Fechei a porta e o deixei dormir. O mundo ainda rodava e sentei no sofá o qual Pablo não estava dormindo. Acabei dormindo por lá mesmo.

Meu pescoço estava doendo e acabei acordando. Camilla e Pedro estavam me olhando e saíram correndo em direção a cozinha. Me levantei e fui ao banheiro. Acho que nunca liberei tanto líquido em toda minha vida. Ao lavar as mãos, pude ver meu rosto no banheiro. Todo rabiscado. Batom borrado, “Pedro” escrito na minha testa, bigodes de gato em minhas bochechas. Fiquei vinte minutos lavando meu rosto e quando sai do banheiro, consegui ouvir as gargalhadas de Pedro e Camilla, que estavam sentados no sofá com as canetas na mão.

“Você realmente apagou!” –Camilla disse rindo.

“Isso não tem graça.” –Eu disse.

“Qual foi? Tem sim!” –Disse Pedro.

“E eu, idiota, fui te cobrir.” –Eu disse para Pedro.

“Estou ficando com remorsos.” –Ele disse parecendo triste. –“Passou!” –Ele completou rindo.

Pedro e Camilla riam extremamente alto e eu não achava graça. Pablo saiu da cozinha com um sanduíche natural na mão esquerda e um suco de laranja na outra mão. Ele se sentou a mesa e ficou olhando para a gente. Começou a rir também.

“Não sei do que estamos rindo.” –Ele disse.

Pedro explicou tudo a ele e me levantei. Fiquei encarando-o e ele parou de rir. Pedro tinha uns dentes tortos, não muito, mas de tanto que eu o reparava rindo, pude notar. Ele era bastante atencioso. Todo dia ligava para o hospital para saber como Ana estava. Todo mês ele me levava ao túmulo de Mary para renovar suas flores. Pelo menos, nisso eu tinha sorte. Teddy, Mary, Pedro. As pessoas que escolheram cuidar de mim, cuidavam mesmo. Pena ter perdido duas pessoas.

Camilla foi para o quarto de Pablo, sem se importar que o mesmo estava dormindo lá. Fiquei sentada no sofá, enquanto Pedro arrumava o chão para dormirmos. Nada de interessante passava na TV. Por ser meu aniversário, eu me recusava a ajudá-lo a arrumar as coisas. Apenas o observava, deitada no sofá. Ele vestia apenas uma bermuda vermelha. Ele já não estava mais tão bronzeado, quase não ia a praia mais.

“Deveria me ajudar. A menos que queira dormir no chão frio.” –Ele disse dobrando um lençol.

“O sofá é confortável.” –Eu disse.

Pedro terminou se arrumar e se sentou na beira do sofá e se encostou em minhas pernas, que estavam dobradas. Ele me olhava como se não tivesse mais nada ao nosso redor. Seus olhos verdes brilhavam. Pedro estava cada vez mais perto, ele ia se inclinando até a mim.

“Ethan me aceitou no MySpace.” –Gritou Camilla da porta do quarto.