Capítulo VII

Akachan

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Pessoas tão honestas vagando pelas ruas

Me fazem lembrar que eu não passo de um canalha

Eu não presto, eu não presto

Eu não presto, eu não presto

Eu não presto, Titãs.

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– Nee Jun... – Era sábado e Kakashi estava sentando no sofá assistindo uma partida de vôlei enquanto Jun preparava o almoço. – O que aconteceu com Sasuke, Naruto e Sakura, meus alunos? Você chegou a conhecê-los?

– Mas é claro! – Respondeu a jovem a cozinha. – Claro que os conheci. Atualmente Sakura está fazendo faculdade de medicina, Sasuke engenharia e Naruto pedagogia. Consegue acreditar que o Naruto passou para a faculdade?

– Na verdade não! – Kakashi riu. Saber que Sasuke e Sakura estava na faculdade se graduando em engenharia e medicina não era nenhuma surpresa. Mas saber que Naruto também estava na faculdade, e ainda por cima fazendo pedagogia, isso sim era uma grande surpresa! – Como ele fez?

– Se matou de estudar durante um ano. Ele não passou de primeira.

Agora as coisas começavam a fazer sentido para Kakashi. Claro que Naruto não havia passado de primeira. Uma vez cabeça oca, sempre cabeça oca. Mas quando Naruto botava um objetivo na cabeça, ninguém iria conseguir fazê-lo desistir até que ele alcançasse o bendito objetivo. E Kakashi imaginava que era isso que havia acontecido. Naruto não queria ser deixado para trás pelos amigos, por isso havia se esforçado e entrado na faculdade também.

– Mas por que pedagogia? – Perguntou Kakashi curioso.

– Naruto nunca foi realmente bom em alguma coisa, mas ele gosta de crianças, então resolveu fazer pedagogia com enfâse na educação infantil. – Jun sorriu se lembrando do que o loiro havia dito anos atrás, quando finalmente havia passado no vestibular. – Ele queria ser chamado de sensei pelas crianças.

– Isso faz bem a cara do Naruto... – Kakashi desligou a televisão e se levantou do sofá, se dirigindo para a cozinha. Gostava de observar Jun preparar as refeições.

– Realmente, faz bem a cara dele...

– Sabe Jun, eu queria te perguntar algo esses dias, mas havia esquecido... – Na verdade, ele não havia esquecido, só não sabia como abordar aquele tema.

– Eu já lhe disse Kakashi... – Jun olhou sobre o ombro, vendo Kakashi sentado em uma das cadeiras da mesa. – Pode perguntar o que você quiser!

– Então. – Respirou fundo antes de falar. – Eu estive falando com o Jiraya esses dias e...

– Ah! – Jun se voltou, secando a mão no avental que usava. – Jiraya me ligou falando que ele vai lhe dar o emprego de volta! Por que não me avisou?

– Eh? – Kakashi coçou a nuca. Havia esquecido completamente disso.

– É por isso que você pegou todos aqueles livros, não é? – Kakashi assentiu. – Sabia que era isso! – Jun sorriu feliz e se voltou para a pia novamente.

– Mas não era isso que eu queria falar... – Se Jun o interrompesse de novo ele perderia a coragem. – Eu queria lhe perguntar como foi que nós nos conhecemos. Eu sei que foi no cursinho. Mas como nós nos conhecemos? Como nós nos comportamos na primeira vez que conversamos? Eu gostaria de saber... – Kakashi não sabia se estava pedindo muito. Mas ele estava interessado em saber sobre esses detalhes, principalmente depois do encontro com Anko.

– Bem... – Jun continuou de costas para ele e foi verificar uma panela que borbulhava. Não sabia se deveria sentir-se feliz por Kakashi estar demonstrando interesse em saber como eles se conheceram, ou se deveria se sentir apreensiva. – Como eu havia dito antes, nós nos conhecemos no primeiro dia de aula do primeiro semestre letivo de 2007.

– Sim, você disse.

– Então... Naquele primeiro dia de aula eu estava me sentindo super deslocada. Pareciam que todos ali já se conheciam. Eu estava super nervosa, sempre estudei em casa com tutures, nunca havia frequentado uma escola, e de repente estar naquela multidão... – Jun se arrepirou se lembrando daquela sensação desconfortável. Até hoje detestava estar em multidões. – Eu só sei que quando o sinal tocou, todos se viram desesperados, andavam e corriam. Eu fiquei desnorteada!

– O corredor de uma escola quando toca o sinal é o lugar mais perigoso para se estar. – Kakashi deu uma risadinha. Sabia muito bem o tipo de situação que Jun estava descrevendo.

– E não é! – Concordou. – Pois então. Eu estava naquele corredor super lotado com várias pessoas correndo. Uma dessas pessoas me deu um encontrão, fazendo com que todas as minhas coisas caissem no chão. Eu me vi desesperada, fiquei com medo de me abaixar e ser pisoteada. Então...

– Então...? – Kakashi perguntou, curioso.

– E então você apareceu. – Jun sorriu com a lembrança. – Não sei da onde você surgiu, sei que apenas surgiu e recolheu as minhas coisas. Foi bondoso e gentil comigo, e se ofereceu para carregar as minhas coisas até a minha sala. Acho que você percebeu o quão assustada e amedrontada eu estava.

– Provável... – Concordou Kakashi maneando a cabeça. Aquilo era algo que ele teria feito.

– Eu havia percebido que você não era um estudante na hora. Você se vestia muito melhor e era mais velho que qualquer outro garoto ali. Só não podia adivinhar que logo você seria o meu professor.

– Eu fui o seu professor? – Kakashi se surpreendeu. O que ele nunca poderia ter imaginado era que Jun havia sido uma aluna sua. Ele sabia que ela havia estudado no mesmo lugar que ele trabalhava, porém nunca havia passado pela sua cabeça que Jun havia sido sua aluna.

– Sim, você foi. – Finalmente Jun havia terminado de preparar o almoço. Hoje eles teriam soba como refeição. Ela pôs a comida na mesa e foi pegar um suco na geladeira. Quando ela quase estava chegando no eletrodoméstico, uma vertigem fez com ela visse tudo negro. Se segurou do melhor jeito que pode para não cair.

– Jun! – Kakashi exclamou e se levantou apressado, amparando Jun pelos ombros, do mesmo jeito que havia feito poucos dias atrás. – Você está quente... – Só de encostar nela ele poderia atestar isso. Na verdade, ela estava queimando.

– Nha! Que nada Kakashi. – Jun se pôs se pé e saiu de perto de Kakashi. – Estou quente pôs estava preparando a comida junto ao fogo. Eu estou... – Não terminou a frase pôs outra tontura se abeteu sobre ela. Dessa vez Kakashi não foi rápido o suficiente para ampará-la e a jovem foi ao chão.

– Oh meu Deus! – Kakashi se abaixou e pegou uma Jun desacordada nos braços. – Jun! Fale comigo! – Ele a sacudiu levente, e observou a jovem abrir os olhos.

– Mas o que... – Ela disse, meio desorientada.

– Você está queimando em febre! – Kakashi havia encostado a bochecha dele na testa dela, e só com ele simples movimento pudera ver o quanto ela estava quente.

– É só um resfriado! – Ela tentou sair dos braços de Kakashi. – E você não pode fazer esforço. Trate de me por no chão. A soba vai esfriar!

Jun se debateu até Kakashi finalmente a colocar no chão, meio que a contra gosto.

– Ok, vamos fazer assim. Você come e eu te levarei na emergência. – Kakashi puxou a cadeira para Jun, que prontamente sentou.

– Não será preciso Kakashi... – Ela pegou os hashis e espero Kakashi se sentar para continuar a falar. – Eu tenho médico marcado para agora mais tarde.

– Tem? – Perguntou enrugando a testa. Jun sempre costumava avisá-lo de todos os seus comprimissos com antecedência. Essa era a primeira vez que ela não o fazia. E ele tinha a leve suspeita que ela não o teria avisado se aquilo tudo não houvesse acontecido.

– Tenho. – Ela assentiu e levou uma porção de comida a boca.

– Ótimo. Eu vou com você... – Kakashi levou uma porção de comida a boca e Jun quase cuspiu a sua fora.

– Você não precisa ir! – Ela exclamou, rápido demais. Fazendo com que as suspeitas de Kakashi aumentassem.

– Porquê?

– Por que o quê? – Perguntou Jun sem entender.

– Por que eu não preciso ir ao médico com você? – Ele baixou os hashis e a encarou. – Você vai comigo em todas as minhas consultas. Então por que eu não posso acompanhar você na sua consulta?

– Porque... – Kakashi sabia que Jun estava preparando uma mentira. Ele quase podia ver as engrenagens do encéfalo da jovem trabalhando. – Porque eu vou ao ginecologista!

– Não me importo... – Kakashi deu de ombros e voltou a comer. Ele realmente não se importava se o médico que Jun ia era o ginecologista, embora ele duvidasse muito disso.

– Mas eu me importo!

– Depois que nós terminarmos de comer nós discutimos isso, tudo bem? – Kakashi sabia que não adiantava discutir com Jun. Mas ela querendo ou não ele iria acompanhá-la. Sentia que ela estava escondendo alguma coisa importante dele.

O resto do almoço se passou em silêncio. Muito mal Jun terminou de comer, ela se levantou e se retirou, indo para o quarto.

Kakashi suspirou e também se levantou. Não estava devidamente arrumado para sair, mas tinha medo de que se ele fosse se arrumar, Jun saísse sem ele ver. Se encostou na porta e esperou por ela. Ela só poderia sair se passasse por ele.

Alguns minutos depois Jun voltou, devidamente arrumada e penteada. Carregava uma bolsa a tira colo e o que pareciam ser vários exames numa das mãos. Ele sabia que eram exames por causa do logo característico de um famoso laboratório que eles apresentavam. Havia se tornado expert em exames desde que saíra do hospital.

– Com licença Kakashi... – Pediu educadamente Jun, sem olhá-lo.

– Você sabe que eu não vou deixá-la passar até me dizer o que raios está acontecendo ou então me levar com você! – Exclamou e Jun se encolheu um pouco, ainda sem olhá-lo.

– Certas coisas você não precisa saber... – Ela murmurou.

– Sabe de uma coisa? – Kakashi disse, já impaciente. – Se você não me conta, eu descobrirei por mim mesmo. – Disse a avançou nos exames que ela segurava nas mãos.

Surpresa, Jun reagiu puxando os exames para sí, porém Kakashi era mais forte, e em um puxão que ele deu, todos os exames voaram das mãos de Jun para o chão.

– Oh Deus! NÃO! – Disse em choque, vendo todos os seus exames espalhados pelo chão.

– Mas o que...? – Um exame em particular chamou a atenção de Kakashi. Ele tinha certeza que aquilo era uma ultrassonografia. Se abaixou antes que Jun avançasse naquele exame em particular.

– Me devolva! – Jun choramingou, tentando alcançar o papel que Kakashi colocou fora do seu alcance. – Me devolta! Por favor! – Iria implorar se fosse preciso.

Havia prometido a si própria que nunca deixaria Kakashi saber daquilo. Mas tanto esforço foi em vão. Agora ele sabia.

– Oh meu Deus... – Murmurou chocado. Aquilo era realmente uma ultrassonografia. Uma ultrassonografia do útero de Jun. Talvez quando ela disse que ia ver o ginecologista, ela não estivessa mentindo.

– Por favor Kakashi! – Lágrimas vieram aos olhos da jovem. Ela não queria que ele descobrisse. E com certeza não queria que ele descobrisse daquele modo.

Kakashi engoliu em seco e deu uma olhada na página anexa ao exame. Havia um nome em negrito no cabeçalho da folha: Exame de sangue de sexagem fetal. Aquele título não fazia o menor sentido para Kakashi, até que seus olhos se focaram nas últimas palavras daquela folha. O resultado do exame.

– Deus... – Murmurou chocado. Lágrimas vieram aos seus olhos e ele se voltou para Jun, vendo que ela também tinha lágrimas nos olhos. – V-Você... – Sua voz falhou e ele tentou de novo. – Você esteve grávida. Grávida de um menino.

Jun assentiu e as lágrimas escorreram pelo seu rosto.

Não queria que Kakashi houvesse descoberto isso, realmente não queria. Não queria ver esse tipo de expressão de pena no rosto dele. Aquilo era a última coisa que ela queria.

– Sim, eu estive...

– Grávida... – Murmurou e soltou o exame, deixando ele cair ao seus pés. Não sabia muito bem o que fazer com as mãos, por isso as colocou nos ombros de Jun e a puxou para ele, a abraçando pela primeira vez desde que ele havia acordado. – Grávida do meu filho...

– Uhum... – Jun apenas assentiu e deixou-se ser abraçada. Queria tanto esse abraço, queria tanto que até doia. Mas não o queria desse modo. Não queria esse abraço por Kakashi estar com pena dela. Mas ela também não tinha forças para recusá-lo. Apertou a camisa dele nas suas mãos e deixou as lágrimas rolarem.

– Como...? O que...? Por que...?! – Kakashi não sabia que perguntas fazer, e sabia que estava soando incoerênte, mas aquela informação o havia abalado. E o que o havia abalado mais ainda era saber que Jun estava suportando tudo aquilo sozinha. Estava suportando sozinha pois não podia confiar nele para contar, já que ele era um desgraçado desmemoriado. A apertou mais no seus braços e encostou o seu queixo na cabeça dela, sentindo as lágrimas dela cairem no seu pescoço.

– Eu perdi o bebê quando estava com quatro meses... – Murmurou ela. – Eu não estava muito bem de saúde, e isso contribuiu para a morte dele. – Jun soluçou e Kakashi a abraçou mais forte.

– Está tudo bem... – Kakashi acariciou-lhe o cabelo e as costas dela, tentando fazer com que ela se acalmasse. – Está tudo bem...

– Não está não! – Choramingou. – Eu fui a culpada pela morte do bebê! E... – Ela fungou. – E eu não queria que você soubesse. Não quero que sintas pena de mim. Não quero!

– Não Jun... – Kakashi quase riu. – Eu não estou sentindo pena de você. Estou sentindo pela de mim. De mim... – Kakashi deixou algumas lágrimas rolarem.

Ele era mesmo um canalha.

Enquanto ele havia passado esses últimos dias pensando em Anko, Jun estava doente e fragilizada a meses e ele nem suspeitava. Ela sempre havia se mostrado tão forte que Kakashi não conseguira ver os sinais de que ela estava sofrendo.

Ela não ia ao banheiro chorar a noite por causa dele. E sim por causa do akachan que nunca nasceria.

Era mesmo um canalha.

Continua...