Sob a Luz do Sol escrita por Tatiana Mareto


Capítulo 25
Capítulo 24 - Humanidade




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*tema: O-town’s Baby I Would*


Eu não fazia idéia do que meu vampiro estava tramando. Aquela noite ele estava muito esquisito, com um sorriso diferente nos lábios. A cada vez que ele me olhava eu podia notar algo que não estava ali, antes. A cada toque de seus dedos em minha pele dura e fria, como coisa morta deveria ser, eu sabia que ele estava diferente. E não era por Charles. Não era por estarmos em casa, de volta, sãos e salvos. Não era porque não houve derramamento de sangue, até porque jamais haveria sangue sendo derramado em um extermínio entre vampiros. Edward estava diferente porque ele estava me escondendo algo, e era algo que ele tinha certeza que eu iria gostar.


Os Cullen não deixaram Charles sozinho por nenhum minuto. Eu sabia que aquele pequeno híbrido seria o ser mais mimado que já pudera existir. E ele já estava reconhecendo a família, os olhares dispersos entre os tios e tias, entre os avós. Edward não sabia exatamente como ele se desenvolveria fora de meu ventre, nem mesmo Carlisle. O vampiro médico passou várias horas no seu escritório tentando achar alguma informação sobre o tema, mas Charles era único, diferente. Talvez somente minha família do covil pudesse ter alguma coisa mais precisa a respeito da evolução de Charles. Não sabíamos como ele se desenvolveria, e o quão rapidamente.


De certa forma, foi divertido ver a frustração de Rosalie quando Charles Henry adormeceu em seus braços. Estávamos no salão, Emmett assistindo jogos como sempre, eu nos braços de Edward como sempre, Esme realizando trabalhos manuais como sempre. Tudo como de costume desde antes da minha partida da casa. Mas meu filho era como eu e ele teve sono e adormeceu nos braços da tia, que pretendia passar mais tempo mimando o sobrinho.


_Quer que eu o leve para o quarto? – Edward perguntou, já aos risos, sabendo exatamente o que se passava com Rosalie.


_Não. – Ela disse, caminhando até a enorme janela de vidro. – Deixe-o comigo…  você se importa, Bea? – O olhar suplicante me foi dirigido, e Edward pressionou minha pele com força. Ele ria, achava graça do ocorrido, e com aquele sorriso estranho, que me deixava confusa. Eu queria ler sua mente; eu queria muito.


_Claro que você pode ficar com ele, Rosalie… eu vou adormecer mesmo. Fico feliz que Charles seja tão querido por vocês.


_Imagine se seria diferente! – Esme interrompeu suas atividades para repreender-me os pensamentos. – Ele é filho de Edward! Beatrice, ele é um Cullen, ele é parte de nossa família.


Aquilo era uma família, eu considerava. Uma família nos moldes das famílias humanas… completamente diferente do que eu vivia no covil. A família pela qual eu lutei, pela qual eu desafiei, pela qual eu arrisquei tudo que eu considerava de valor. Minha família. Eu considerava que nunca mais precisaria de nada, e que toda felicidade do mundo já estava em minhas mãos. Mas eu sabia que meu vampiro estava aprontando algo. Principalmente após ele ter se levantado, segurado minha mão e me puxado com ele para o andar de cima, ignorando os comentários maldosos de Emmett a respeito de termos acabado de passar muito tempo sozinhos.


_Você está feliz. – Aquela não foi uma pergunta, até porque Edward não tinha o direito de fazer uma pergunta como aquela se ele podia ler minha mente. Seus dedos seguravam minha mão e brincavam com o anel brilhante que estava em meu dedo anular direito. O topázio, a pedra da cor de seus olhos. Era a cor dos olhos de todos os Cullen, mas eu só enxergava Edward naquela pedra.


_Claro que eu estou feliz… – franzi a sobrancelha e olhei para ele, que ainda tinha aquele sorriso insuportável no canto dos lábios e fazia um bico irresistível. Edward era lindo demais, resistir a ele por si só era uma tortura inadmissível. – Você faz cada comentário… como eu poderia não estar feliz?


_Acho que me preocupo demais com você, e acabo por me frustrar nas expectativas. – Ele fechou a porta de nosso quarto e começou a abrir os botões do punho da camisa, passando rapidamente para o colarinho.


_Edward, falar por enigmas não é uma boa idéia agora. – Eu parei exatamente em sua frente, assumindo a tarefa de abrir-lhe a camisa. – Eu não consigo ler você. E não estou muito objetiva, ainda.


_Eu sempre julgo que você quer mais do que você aparenta querer. – Ele disse quase no mesmo instante em que tomou meus lábios para si. Se ele fosse começar aquilo, não poderia me mandar parar, depois. Edward sempre me provocava ao limite máximo e depois me mandava parar, alegando que precisávamos de equilíbrio. Mas eu definitivamente ainda não estava apta a tanto autocontrole.


_Isso não faz sentido algum. – Meu corpo já estava por sobre o colchão de nossa cama, e eu falava o mais baixo que conseguia. Não desejava mais derrubar uma casa, como algumas horas atrás, mas isso não me tornava menos assustadora. – Você continua falando através de enigmas!


_Bea, eu pedi você em casamento. – Ele se ajeitou ao meu lado, seus olhos atentos capturando os movimentos da minha face, seus dedos acariciando meus cabelos. – Você aceitou, e logo depois tudo se tornou um caos. Os vampiros apareceram; você foi para o covil, eu fui atrás de você, Charles nasceu, seu irmão enfrentou Rudolph… tudo isso deveria ter feito você perder o juízo. Eu perdi o meu, por alguns instantes. Foi difícil me encontrar, eu garanto. Mas você… onde foi que você escondeu a Beatrice assustada e submissa que chegou a esta casa? – Ele sorria, apesar do tom sério de sua voz. – Você está linda… está tão feliz… sequer parece incomodar-se com o fato de que ainda nem pensamos em marcar a data do nosso casamento.


Franzi os lábios e encarei Edward. Seu semblante sereno estava imutável, aquela aparência estática que ele assumia quando estava concentrado. Sentei-me na cama, ajeitei meus cabelos, encarei-o novamente. Aquele assunto altamente técnico definitivamente não era um bom companheiro dos meus desejos mundanos. Em poucos instantes tudo que eu pensava em fazer estava guardado em um canto do cérebro enquanto eu tentava absorver as preocupações do meu vampiro. Então era aquilo que ele estava me escondendo desde que tivera uma conversa com Alice. Então era aquilo que ele tentava manter oculto, e que eu aparentemente estava frustrando. Ele pretendia marcar a data do casamento! Mas… eu nem sabia o que era exatamente um casamento. Eu só conhecia casamentos dos filmes. E eles eram para os humanos. Como poderia ser o casamento entre dois seres míticos?


Talvez eu devesse estar infeliz, incomodada pelo fato de usar um anel de noivado e não ter ainda um esposo. Pelo fato de Edward ainda ser meu noivo, mesmo depois de termos um filho. Talvez eu devesse ter mais humanidade dentro de mim, pois eu era, definitivamente, parte humana. Mas eu não sabia ser humana. Eu desejei, com todas as minhas forças, conhecer os humanos. E desejei sê-los, por anos da minha vida. Poder crescer, envelhecer, morrer. Eu estava cansada daquela vida no covil, cansada daquela existência medíocre e cruel. Mas então eu vi a luz… meus olhos foram cegados pela luz, pela luz de Edward. Não era o sol que me fazia enxergar a luz, era Edward. Não foi o sol que me guiou por todos os dias na superfície, não foi o sol que me manteve alerta e corada. Foi Edward. Ele era meu sol, ele era meu astro rei. E então eu não queria mais ser humana, eu queria estar com ele para sempre, para tudo que o sempre significasse. Edward, o ser mais importante de toda a minha existência. Por ele eu quis ser um vampiro, ser eterna. Imortal. Por ele eu quis ser plena. E ele me fez plena.


Mas ainda faltava em mim a humanidade que havia nele. Edward, e todos os Cullen, já haviam sido humanos. Eles já haviam existido como seres humanos, naturais, mortais. Eles haviam nascido e se desenvolvido no tempo normal de duração de um humano. Eles conviveram com eles como se eles fossem; eles aprenderam com eles. Com os humanos. Eu não. Eu era uma criação de laboratório, um protótipo. Mesmo que eu tivesse parte de mim de carne e osso, mesmo que metade de mim fosse humana e essa metade me fizesse fantástica, aos olhos do vampiro que eu amava, eu não sabia ser humana. Eu não entendia os sentimentos, as angústias, as realizações. Ser humana para mim era um objetivo inatingível que nem a maternidade conseguiu tornar próximo.


Então, eu deveria estar insatisfeita. Mas eu não sabia se conseguiria agradar Edward sendo natural.


_Eu quero me casar com você. – Eu disse, puxando Edward para mim. – Eu quero você para sempre, e você sabe que o nosso sempre é significativo. Mas você me faz sentir tão completa que eu não consigo me sentir insatisfeita por ainda não ter isso.


_Saiu-se muito bem. – Ele sorriu, e eu tive certeza que nenhum dos meus pensamentos conseguiu sair ileso. Edward certamente tinha lido tudo, e minha tentativa de mantê-lo na ignorância foi, mais uma vez, frustrada. – Mas você não precisa fazer isso para me agradar.


_Não faço. – Beijei-o novamente. – Faço porque quero. Você sabe que eu quero; você disse que aquela Beatrice desapareceu…


_Sim, e eu não sei ainda o quanto isso me assusta. – Ele rolou por sobre mim, pressionando meu corpo contra os cobertores. Aquilo era natural demais, e era difícil imaginar que nossa força poderia facilmente quebrar a mobília. Não havia parâmetros de comparação, ambos éramos fortes e por isso não machucávamos um ao outro. Apesar de que minha pele era significativamente mais sensível do que a de Edward, pois a minha podia se ferir. – A Bea de antes… precisava de mim.


_A Bea sempre vai precisar de você. – Foi muito fácil livrar-me das considerações sérias de Edward e mergulhar no desejo novamente. – Agora que tal deixar esse assunto para a próxima década?


_Não vai dar. – Edward interrompeu o beijo, e aquilo me aborreceu. – Alice já foi acionada para tomar todas as providências…


_Alice? – Franzi a sobrancelha, pensando no quanto minha irmã vampira já estaria envolvida na história.


_Prepare-se… ela vem com tudo, quer arrasar o quarteirão.


Havia poucas coisas mais ‘sexy’ do que Edward, e uma delas era Edward falando gírias. Quando ele deixava de lado seu vocabulário mais erudito para proferir palavras profanas ou de pouca cultura, definitivamente não havia nada mais sexy. E como eu já estava muito no seu ritmo, foi fácil deixar-me seduzir por mais uma noite inteira. Principalmente sabendo que Charles estava em tão boas mãos; foi muito fácil esquecer-me de tudo por algum tempo. Por mais algum tempo. Felizmente, nada que justificasse ruídos insuportáveis e móveis destruídos.


Mas meu vampiro estava correto, como lhe era de costume. Alice estava totalmente engajada no projeto casamento, e considerando que ele havia pedido pressa… ela começou o dia bastante agitada. Eu duvidava que os humanos estivessem disponíveis para qualquer coisa naquele horário, mas Alice entrou por nosso quarto adentro dando saltinhos e rodopiando, como lhe era de costume. Durante as três noites que passei no covil eu acabei por sentir falta da ausência absoluta de privacidade na casa dos Cullen… era muito melhor ser surpreendida sem as vestes, em momentos íntimos, o que fosse possível de se surpreender, mas que eu estivesse com Edward. Por sorte, Edward já sabia que Alice chegaria antes mesmo de ela pensar em abrir a porta do quarto, o que foi providencial para que ela não presenciasse nada inadequado.


_Vou ver Charles. – Edward beijou meus cabelos e levantou-se. Ele estava vestido, e para minha surpresa completa eu também! Apenas eu dormia naquela casa; eu e meu filho. Éramos as aberrações dos Cullen. – Vocês duas, comportem-se.


Sentei-me na cama, recém acordada, completamente desconcertada, enquanto Alice me encarava com olhos brilhantes e translúcidos. Ela certamente também tinha caçado, pois a cor caramelo estava completamente diluída em sua íris. A face da minha irmã vampira era assustadora, e eu podia ler seus pensamentos sem ser capaz daquela façanha. Ela estava pensando alto demais, foi o que constatei.


_Bea. – Alice sentou-se à beira da cama com os lábios franzidos e o olhar concentrado. – Vou pular a parte das apresentações, porque Edward é um linguarudo e já te contou tudo. Certo? – Balancei a cabeça assentindo, mas Alice não estava esperando por uma confirmação. – Pois bem… você precisa me ajudar com a lista de convidados. Seus amigos humanos… todos eles.


_Os humanos? – Arregalei os olhos. – Mas… como vamos fazer isso dar certo?


_Você não tem que se preocupar com a parte do “dar certo”, isso é função minha. Preocupe-se apenas em me dizer quem você quer convidar… e em me dar carta branca para a decoração!! Deixe por minha conta e eu organizo tudo. Tudinho!


Meu olhar era de susto e confusão mental. Eu não era muito funcional quando acordava, e aquela história de casamento me era certo mistério. Eu não sabia mesmo o que fazer.


_Alice Cullen. – A voz de Edward ecoou pelos corredores, e em poucos instantes ele abriu a porta do quarto e entrou, sobrancelhas franzidas, Charles em seu colo. Por alguns instantes meus olhos se perderam na imagem mais linda que eu já havia visto, e eu tinha certeza que aquela era a imagem mais linda que existia. Charles não estava mais enrolado naquele pano flanelado, e eu podia vê-lo inteiramente. Seu pequeno corpo de bebê, coberto apenas por uma fralda, era ainda mais pálido do que o meu e estava totalmente em contato com o peito nu de Edward, que trajava apenas calças de malha e meias. Edward franziu também os lábios e me olhou, aquela aparência de reprovação por meus pensamentos. Mas não havia nada que eu pudesse fazer, a imagem do vampiro que eu amava segurando nosso filho em seus braços era tão linda que poderia ser considerada um pesadelo.  – Bea, fique com ele… Rosalie está preparando a mamadeira. – Edward me entregou o bebê, que imediatamente olhou para mim. – Alice, o que foi que combinamos?


_Edward… – Alice fez um bico. – Se eu tiver carta branca de Bea, será a vontade dela que eu faça tudo. Exatamente como você quer.


_Não. – Edward ainda tinha a expressão rígida. – O casamento é dela, ela participa de todas as decisões. Isso não é negociável.


_Você é bem estraga prazeres, sabia? – Alice fez uma careta. Rosalie apareceu na porta do quarto com a mamadeira de Charles, que tinha olhos escuros e olheiras profundas. A mesma reação de nossos organismos quando tínhamos sede. Ele me olhava, ansioso. Edward caminhou até Rosalie e pegou a mamadeira com ela, tentando ser gentil. Imaginei que ele estava mais cuidadoso com Rosalie do que de costume, e eu gostaria mesmo de compreender os motivos que o levavam àquilo. Eu duvidava que ele me contasse, mas mesmo assim eu desejava saber.


_Ela deve fazer isso… você sabe, Rose. – Edward disse, antes de trazer o alimento de nosso filho até mim. – Ele é muito ansioso por você, Bea. – Edward sorriu. – Fique com ele o máximo de tempo que puder…


_Não é sacrifício algum. – Sorri para Edward, em um daqueles momentos típicos dos filmes do covil. Os momentos felizes, nos quais tudo dava certo e todos os desejos se realizavam. Os momentos de conto de fadas.


_Como pretende que ela saia comigo para organizar o evento se ela precisa ficar com Charles? – Alice resmungou, ainda com um enorme bico nos lábios.


Edward encarou Alice e ele estava bufando. Ele perdia a paciência com certa facilidade, mas nunca o controle. Eu imaginava que só vira Edward sem controle duas vezes. Todas as duas vezes quando eu fui ameaçada por minha família do covil. De qualquer forma, eu suspeitava que se Alice continuasse a provocá-lo com aquela idéia de tomar todas as decisões do casamento ele iria destituí-la do posto de organizadora. Se ele pudesse fazer aquilo, levando em consideração a minha total incapacidade de organizar o casamento, sozinha.


_Alice Cullen, você é mesmo uma pequena insuportável. Ainda preciso descobrir como Jasper te aguenta. Eu sei que você pretende ir às compras em Seattle, então Bea pode ir com você. E levar Charles Henry, claro. Afinal, será bom para ele sair… eu acho. Ele ainda não é claro o suficiente para mim, mas vocês podem muito bem ir até Seattle, onde as pessoas não notarão vocês, com meu filho. Não há escusas que lhe permitam convencer-me que você deva organizar tudo sozinha.


Alice emburrou, mas percebi que daquela vez era definitivo. Ela não tentaria novamente persuadir Edward a deixar por sua conta toda a festa, e teria que aceitar as regras dele. Isso significava, definitivamente, incluir-me. Eu não estava tão ansiosa assim para fazer aquilo, mas eu não pretendia desapontar Edward. E eu queria sim, casar-me. Aquilo parecia tão correto e tão natural entre duas pessoas que se amavam… mesmo que eu e Edward não fôssemos pessoas, exatamente. Existíamos como pessoas, então aquele fato nos daria o direito de agirmos como tal.


_Não pense em facilitar as coisas para ela, Bea. – Edward beijou-me os lábios, rapidamente. Seus dedos brincaram com os cabelos quase brancos de Charles, passando por toda a extensão de seu corpinho ainda não desenvolvido. Um sorriso nasceu em seus lábios, mas ele logo o reprimiu, ciente de que as três mulheres presentes – eu, Alice e Rosalie – o observávamos curiosas. – Vou arrumar-me para a escola, vocês duas desapareçam daqui.


Eu ainda não tinha percebido, mas o sentimento estranho que estava comigo desde a saída do covil tinha nome. Eu estava me sentindo como nunca, eu estava me sentindo humana. Terminei de alimentar Charles enquanto o pai dele vestia-se para mais um dia de escola e me proporcionava uma vista mais do que maravilhosa. Eu sabia que ele costumava envergonhar-se dos meus pensamentos impuros a seu respeito, mas imaginei que ele estivesse se acostumando. Daquela vez ele nem interrompeu o que fazia, simplesmente terminou a tarefa e me sorriu. Eu estava naquele momento de não falar, e esses momentos eram raros em mim. Mas tantas coisas aconteceram em apenas um início de manhã que me senti acuada.


_Às vezes você torna as coisas tão mais difíceis! – Ele me beijou os cabelos, e havia humor em sua voz. – Vejo você à tarde… não deixe Alice escapar de seus compromissos.


_Edward… – Eu o chamei, enquanto ele deixava o quarto. – Não quero ir a Seattle.


_Vai deixar Alice vencer essa? – Ele suspirou, sem olhar para mim.


_Não… é que… eu não quero ir sozinha, com Charles.


Edward virou-se para mim, e novamente as palavras me haviam atropelado os pensamentos. Ele não havia captado nada daquilo em mim, sua surpresa era genuína.


_Pensei que esse apego tinha sido por causa da gravidez… que você voltaria ao normal após o nascimento dele.  – Edward apontou para Charles.


_Normal para mim é estar com você. – Fiz drama, como me era de costume. Eu sempre era tão dramática, Felicia dizia. – Precisa mesmo… ir à escola?


_Preciso sim. – Ele acariciou minha face. – Mas matarei algumas aulas, e voltarei a tempo de ir com vocês, tudo bem? Alice também vai à escola… voltaremos juntos para casa.


Assenti com a cabeça, e ele deixou o quarto. Pude notar a hesitação em seus gestos, e o meneio de cabeça informando que aquela era uma atitude difícil. Retomar uma vida considerada normal depois de tudo que ocorreu, depois de tudo pelo que passamos. Eu não gostei de ficar nem uma hora longe de Edward, e passar três dias sem saber quando o veria novamente foi uma tortura inadmissível. Era contraditório demais, para quem tem mais de cem anos de idade, sentir-se tão infeliz em um lapso temporal tão insignificante. Mas eu me senti; havia um pedaço de mim com Edward e eu só pude sentir-me perfeita novamente quando eu o tive em meus braços outra vez.


Mas o perigo havia acabado; as coisas ruins não existiam mais. Rudolph não nos seria um problema, nem nenhum dos híbridos. Não havia nada mais que pudesse colocar em risco a nossa aparente felicidade. Não havia por que temer. Mesmo assim, eu não conseguia me sentir bem. A inquietude da ausência de Edward me deixou novamente faltando um pedaço. Pensei se aquele sentimento ruim poderia ser sentido por Charles; se ele também tinha super poderes como Edward. Se ele poderia pressentir minha agonia e se aquilo faria mal a ele. Inicialmente, ele não parecia afetado por meus pensamentos contraditórios e desconexos. Permanecia sereno, em meus braços a me olhar, uma face linda e tranquila. Meu filho, e eu com aquelas angústias tão humanas.


Concentrada em minhas tarefas do dia, levantei-me e decidi vestir-me. Alice mantinha meu guarda roupas impecável, com todas as peças que combinavam formando pares para me facilitar a escolha. Eu precisava tomar o controle das roupas que vestia, apesar da conveniência que era seguir as tendências de Alice. Ela era sempre tão positiva, sempre tão cheia de estilo… mas eu precisava começar a assumir algumas responsabilidades, entre elas escolher minha própria roupa. Respirei fundo e peguei peças descoordenadas, que não formavam os pares deixados por minha irmã vampira. Deixei Charles por sobre a cama enquanto me vestia, e pensei que deveria conversar com ele. Eu não sabia se ele me entendia, mas se Edward conseguia captar seus pensamentos, ele podia me compreender. Se ele ansiava pela minha presença, talvez ele gostasse de conversar comigo. Parecia bastante tolo conversar com um bebê, mas ele era um ser vivo. E não podia ser tão estúpido conversar com seres vivos, afinal.


_Bom dia. – Esme nos recebeu. Desci para o salão, já bastante revigorada, e apenas Esme estava em casa. Os outros já haviam ido para a escola e Carlisle para o trabalho. – Como vão vocês dois? Ele já está alimentado?


_Sim, Rosalie levou a mamadeira até meu quarto.


Esme aproximou-se de mim e, ainda sorrindo, beijou Charles na testa. Talvez Esme fosse o membro da família Cullen que mais tivesse reações humanas. Seria porque ela era a mãe? Em algum tempo vestindo o manto da maternidade eu me tornaria como Esme?


_Alice está no escritório de Carlisle, se quiser falar com ela.


_Ela não foi à escola? – Surpreendi-me.


_Não, disse que tinha muito a resolver sobre o casamento. Ela parecia aborrecida, aconteceu algo?


_Alguns contratempos com Edward. – Eu quis rir. – Esme, onde Edward guardou os livros sobre bebês? Eles não estão em nosso quarto…


_Estão no escritório de Carlisle. Ele estava realizando algumas consultas… os dois estão estudando Charles.


Sim, estudando Charles. Aquilo soou tão esquisito quanto deveria, afinal meu filho não era um objeto de estudos. Mas quem não estaria curioso com a sua existência. Apesar de eu ter vivido em um covil cheio de seres exatamente iguais a Charles, ele ainda era o de genética mais confusa. De qualquer forma, eu estava com algumas idéias e precisava consultar os livros para saber como colocá-las em prática. Agradeci Esme e caminhei até o escritório de Carlisle, onde sabia que encontraria Alice, muito provavelmente emburrada em razão da discussão com o irmão. Mas a pequena Cullen não estava como eu esperava, estava apenas sentada à frente do computador de Carlisle fazendo pesquisas. Tentei não interrompê-la e por isso apenas peguei os livros e saí. Como Charles era muito silencioso eu nem teria problemas para realizar minha leitura com ele no colo, na sala.


Depois de ler tudo que eu precisava e achar algumas respostas, eu me convenci de que devia fazer o que pretendia. Meu filho estava sereno em meus braços e eu o encarei, pensativa. Nada daquilo havia feito mal a mim, nada daquilo havia me causado qualquer problema. Eu insistia em ser uma vampira,  mas os meus vampiros insistiam que eu deveria deixar minha humanidade fluir… talvez eu estivesse determinada a ceder, ou a pelo menos aceitar os dois lados. A experiência de quase perda de tudo que eu amava me deixou vulnerável e ao mesmo tempo mais forte, mais capaz de compreender a reação dos Cullen às emoções humanas. Eu não queria, na verdade, privar Charles daquela experiência. Da experiência de ser humano e vampiro, ao mesmo tempo.


Quando Edward chegou em casa, cedo, horário que seria almoço na escola, eu estava na cozinha. Obviamente ele tinha faltado as últimas aulas como me prometera, e eu acabei me surpreendendo. Eu não achava que Edward fosse realmente cabular aulas para ir comigo e com a irmã a Seattle, em busca de coisas para o casamento. Eu sempre achei que os homens não se importavam com aqueles eventos, era como os filmes retratavam. Era como os livros retratavam. Homens não se importavam exatamente com casamentos, eles até os evitavam. Mas Edward era mesmo diferente de qualquer coisa existente, e pontualmente no horário de almoço ele estava em casa. Também surpreso ao entrar e encontrar-me na cozinha.


Ele se aproximou olhando para o que eu fazia no fogão. Minha concentração estava totalmente voltada para evitar os pensamentos e impedir que Edward descobrisse minhas intenções antes de eu revelá-las. Ele percebeu minha tentativa de distraí-lo e desistiu, beijando-me os cabelos com um rosnado leve.


_Charles? – Ele quis saber de nosso filho.


_Com Esme… – Eu ainda respirava bem lentamente tentando não pensar em nada que me denunciasse.


_E você está na cozinha porque… está com fome? – Edward tentou entender minha atividade recente. Eu estava realmente cozinhando, e algo fervia lentamente em uma panela esmaltada. O cheiro era doce demais, e até nauseante. Não o mesmo doce de Edward… o cheiro de Edward era especial demais. Aquele era só um cheiro adocicado de alimento humano.


_Eu não. – Sorri para Edward, capturando seus lábios entre os meus bem rapidamente. Eu nunca podia demorar-me com Edward, eu sempre perdia a noção e o controle. – Mas sei de alguém que vai ficar com fome logo… principalmente se for encarar uma pequena viagem até Seattle.


Edward me olhou com curiosidade, e decidi deixar de torturá-lo. A curiosidade se tornou surpresa, e sua expressão era impagável. Sim, eu duvidava que ele pudesse imaginar que eu considerasse alimentar Charles com… leite. Era exatamente o que havia na panela esmaltada e decorada de Esme, leite com amido de milho, uma fórmula caseira muito antiga para alimentar bebês humanos. Nosso bebê era um híbrido que tinha um corpo semihumano, ele podia muito bem adaptar-se ao alimento como eu havia me adaptado. Eu já tinha um paladar muito definido, e o alimento humano não era muito agradável. Preferia sangue fresco, era verdade. Além do pavor imensurável, porém já sob controle, de tornar-me humana com as experiências. Charles Henry ainda não tinha paladar, ele estava apto a ser trabalhado. Era um bebê, um ser em crescimento. Ele tinha o direito, ao menos, de provar alimento humano.


Realmente, fora a viagem a Seattle que me fizera considerar preparar um novo alimento para Charles. Ele sentiria sede durante o passeio, e não seria viável alimentá-lo com sangue no meio dos humanos. Menos viável ainda seria deixá-lo com sede. Eu nunca deixaria meu filho sofrer de sede em meio ao aroma irresistível dos humanos. A agonia de estar entre os humanos, o ardor na garganta por sentir o cheiro do sangue deles e não poder saciar a necessidade natural de alimentar-se dele; eu não queria que Charles passasse por aquilo. Ele poderia suportar a dor se estivesse saciado. Então, eu decidi testá-lo, impiedosamente. Já me haviam testado de tantas maneiras diferentes que eu sabia que aquela experiência não seria prejudicial a Charles. Seria apenas uma tentativa, saber se ele se interessaria por alimentos humanos.


_Precisamos… nos arrumar para sair? – Eu disse, terminando de colocar o alimento na mamadeira. – Logo vai ficar tarde, e não é bom ficar com bebês recém nascidos fora de casa por muito tempo.


_Você andou lendo? – Edward remexeu os livros por sobre a bancada da cozinha. – Realmente, eu preciso saber onde foi que você escondeu a Beatrice.


_Ela cresceu. – Eu sorri, e o beijei novamente. – Vamos… Alice está chateada, você deveria desculpar-se com ela. Temos trabalho a fazer, não?


_Sim, temos. Um casamento a organizar… mas eu serei apenas um expectador.


Esme nos encontrou no salão, carregando Charles em um artefato bastante curioso. Edward riu para a mãe, e eu fiquei bastante confusa. Não conhecia exatamente aquele objeto, ele ainda não me havia sido apresentado.


_Achei que, para vocês saírem com o bebê, seria mais conveniente usar um desses. – Esme empurrou o que parecia ser um carrinho para meu lado. Charles estava deitado nele, enrolado mais uma vez no manto flanelado, totalmente vestido para sair. – Os humanos usam sempre. Agora vocês parecem realmente uma tradicional família humana… não é perfeito?


E totalmente assustador, claro. Sorri para Esme, enquanto Edward caminhava até as escadas para chamar Alice. Se ele precisasse mesmo ir até ela para que ela soubesse que ele a aguardava. Mais uma vez iríamos até a cidade no carro de Edward, o Volvo prateado que tanto me encantava. Daquela vez Edward iria dirigindo, no entanto. Eu não estava mais tão frágil quanto durante a gravidez, ele não precisava se sacrificar tanto – ter que suportar Alice dirigindo – por mim. A pequena Cullen desceu as escadas demonstrando indiferença à presença de Edward com um bico em seus lábios, segurando uma pasta com diversos papéis dentro, e me encarou.


_Check list. – Ela sacudiu a pasta, mostrando-me o que havia em seu interior. Iríamos para Seattle então, e chegaríamos rápido. Com Edward ao volante, chegaríamos muito rápido. A típica família de humanos, como disse Esme: um pai, uma mãe, uma tia e um bebê. Não havia sol algum no dia claro de Forks, e certamente não havia sol algum em Seattle. Minha família vampírica não precisaria preocupar-se com a exposição, e eu não precisaria me preocupar com o fato de o sol exercer algum efeito sobre Charles.


Alice passou a viagem enumerando os afazeres daquela tarde. A decoração ela pretendia encomendar pela internet, porém o Buffet e meu vestido deveriam ser comprados pessoalmente. Eu concordava com tudo que ela falava porque eu não entendia nada daquilo. Eu dissera a Edward, não era uma boa opção deixar-me por conta da organização de nada. Mas Alice cumpria meticulosamente sua função, comentando sobre tipos de flores, cores, aromas, e sobre o Buffet. Alimentos humanos, muita comida mesmo. Afinal, os vampiros seriam minoria no evento, a grande maioria dos convidados seria os meus amigos humanos. Nossos amigos.


Em Seattle, o primeiro lugar que fomos foi uma casa de eventos. Alice disse que seria mais simples encomendar todo o Buffet de um só lugar, pois assim teríamos menos chance de errar. Fomos atendidos por uma moça sorridente, que deixou seus olhos repousarem em Charles desde a primeira vez em que ele apareceu, no colo de Edward. Apesar de Esme nos ter arrumado aquele carrinho de bebê, Edward parecia sempre tentado a carregar Charles nos braços. E eu sabia que meu filho deveria preferir estar conosco. Meu vampirou riu, aquele sorriso canto de boca, quando a atendente comentou sobre o bebê. Minha curiosidade sobre o que ele sabia que ela estava pensando se atiçou, mas depois eu poderia perguntar-lhe do que se tratava. Alice determinou as guloseimas que seriam servidas, e eu me mantive por perto concordando ou discordando. Eu não tinha base para discordar, acabei apenas escolhendo entre um sabor ou outro, uma forma ou outra. Eu sequer entendia sobre sabores… minha experiência com alimento humano não era tão vasta.


_Não é muita comida? – Eu considerei, enquanto observava o cardápio.


_Você já decidiu quantos convidados serão? – Alice me encarou.


_Não fiz uma lista ainda… – Envergonhei-me.


_Então, deixaremos a quantidade em aberto. Mas os humanos adoram variedade… deixemos que se divirtam. É seu casamento, Bea. Não faremos economia.


_Os Cullen nunca fazem economia com nada. – Eu franzi os lábios e Edward deu uma risada. Ele estava na porta do estabelecimento, ainda com Charles, observando o movimento dos humanos.


_Não precisamos. – Alice riu, e fiquei feliz em vê-la sorrir. Eu não gostava da pequena vampira com aquela aparência séria que pertencia somente a Edward. – Então, podemos fechar? Pelo que pesquisei, essa casa tem o melhor conceito.


Assenti com a cabeça, entregando a Alice a seleção dos alimentos que seriam servidos no casamento. No dia seguinte Alice entregaria a quantidade de pessoas convidadas, para que a quantidade de comida também fosse definida. Tudo tinha que ser muito rápido. Edward queria tudo muito rápido.


O segundo lugar para o qual iríamos seria um estúdio. Alice disse um estúdio, e eu imediatamente pensei em música. Talvez ela estivesse pretendendo contratar músicos para tocar no casamento. Eu nem sabia por que, afinal os Cullen eram músicos. Eu sabia que Rosalie e Edward tocavam muito bem, e ouvira dizer que Jasper e Esme também mereciam justiça com seus talentos. Mas claro, os Cullen não tocariam na festa… eles seriam parte da festa, e não teriam que trabalhar nela. Obviamente Edward não tocaria na festa, ele seria o noivo… o noivo fica de pé esperando a noiva chegar. Mas a imagem de Edward vestindo preto e sentado ao piano, tocando qualquer coisa de Beethoven que eu tanto adorava, me encheu os olhos e foi quase como uma visão. Eu não pude evitar, apesar de saber que toda aquela imaginação já tinha chegado ao conhecimento de quem não deveria.


Mas o estúdio que visitaríamos era de costura. Alta costura, Alice me corrigiu três vezes. Visitaríamos um estilista, responsável pelo meu vestido de noiva. Aqueles vestidos brancos, cheio de renda, maravilhosos, que as mocinhas sempre vestiam durante o casamento. Eu nunca cogitei vestir nada daquilo. Segui os dois Cullen, que caminhavam a pé pelo passeio público, olhando para eles com uma perplexidade natural. Dois vampiros, carregando um híbrido, andando pelas ruas claras e geladas de Seattle. Eu nunca imaginei que viveria nada daquilo, era uma verdade absoluta. Eu nunca imaginei que viveria nada nem parecido com aquilo, com momentos como aqueles. Minha hesitação fez com que Edward diminuísse o passo até que eu o encontrasse. Com sua habilidade peculiar, ele entregou Charles para mim e me passou o braço pelo ombro, passando a empurrar o carrinho. Alice falava sem parar sobre tudo, e Edward me confortava em seus braços como sempre. Minha família, e nada poderia ser mais humano do que aquilo.


O estúdio parecia saído de uma cena de cinema. Alice mencionou que parecia um hotel cinco estrelas, mas eu só tinha como referência os hotéis da nossa viagem à Europa. Eu nem sabia que se contavam os hotéis pelas estrelas, era verdade. Hotéis não deviam ter estrelas, só o céu. Fomos atendidas, daquela vez, por um homem de aparência esquisita, muito diferente dos homens que eu estava acostumada, que falava muito alto. Meu filho não pareceu gostar de sua presença, e mais uma vez ele trocou de colo. O pai o levou para a porta, enquanto eu e Alice conversávamos sobre rendas e babados.


_Eu não acho branco uma boa idéia, Bea. – Alice considerou. – Não combina com sua pele.


_Se não precisa ser branco… – eu não sabia. – Eu gosto de muitas outras cores.


_Ela combina com tons pastéis. – O estilista falou, pegando um álbum cheio de amostras. – Vocês podem ficar entre essas opções aqui.


_Veja bem… – Alice começou a folhear o álbum. – Tem que ser um vestido moderno, sem cauda, eu pensei em algo que não tivesse ombros também, para que ela pudesse usar um colar que destacasse o colo… e também…


_Alice Cullen. – A voz repreensiva de Edward mais uma vez. – Esse vestido é seu, por acaso?


_Edward, você me pediu para organizar! – Ela protestou, olhando para o irmão. – O que eu vou organizar, afinal?


_Organizar, e não escolher por ela.


_Céus, Edward Cullen! – Alice rosnou. – Sabe o problema? Você não podia estar aqui! – Ela levantou-se. – Você é o noivo! O noivo não pode ver o vestido… o noivo não pode saber nada do vestido! Você devia estar em casa! Sim, em casa… e deixar que eu e Bea resolvêssemos isso!


_Você e Bea? Se eu não estivesse aqui você teria decidido tudo e ela seria expectadora. – Edward aproximou-se. Charles inquietou-se em seus braços, e ele modificou o tom de voz. – Não vou explicar de novo, o casamento é dela, ela escolhe tudo.


_Já sei! – Alice pegou o celular. – Vou chamar reforços!


_Reforços? – Arregalei os olhos, tentando interferir na discussão.


_Jasper! – Alice começou a discar os números, em velocidade maior do que eu considerei ser tolerada, na presença de humanos. – Vou chamar Jasper para tirar Edward daqui… assim podemos trabalhar.


_Jasper está em Forks, Alice. – Edward tentou contemporizar.


_E ele chega aqui em alguns minutos. Vamos tomar um café! Isso, saímos para tomar um café, e quando Jazz chegar ele arrasta você para algum lugar! Não posso lidar com isso agora, tenho muita coisa a fazer!


_Alice. – Eu decidi, então, interferir. Aquela briga tola entre os dois precisava acabar. Segurei o aparelho de telefone e o desliguei, antes que Jasper atendesse. – Você não precisa fazer isso. Quer saber? Escolha o vestido. Por favor, escolha algo que você sabe que eu vou adorar. Pode ser lilás… eu vou adorar se ele tiver cor de lavanda. Ou então cor de baunilha. Eu adoro baunilha, certo? Então… escolha. Não importa muito a renda ou o modelo, eu confio no seu senso de equilíbrio. Aliás, escolha tudo que for preciso, sim? Quando chegarmos em casa, você me mostra as opções de decoração. – E virei-me para Edward sem dar chance de que nenhum dos dois esboçasse qualquer reação. – E você, meu amor… vamos dar uma volta. Vamos andar por Seattle até que Alice tenha terminado suas tarefas. Leve-me a algum lugar divertido, sim?


Disse tudo em um fôlego só, tentando sorrir. Imaginei que meu impulso assustou Edward, porque ele me olhava novamente com aquela expressão de surpresa e admiração que por vezes me confundia. Alice abriu um largo sorriso e pulou em meu pescoço, abraçando-me daquela forma natural que eu vira Esme fazer tantas vezes.


_Obrigada Beaaaa! – Ela beijou minha bochecha. – Você não vai se arrepender.


_Quando você terminar tudo, ligue para o telefone de Edward e viremos te buscar.


Virei-me para Edward e o empurrei para fora do estúdio, com o carrinho de bebê. Peguei Charles no colo e o coloquei no carrinho, cobrindo-o com o manto de flanela. Ventava muito, e pensei que fosse mais natural para um bebê humano estar coberto. Depois continuei empurrando Edward e o carrinho pelo passeio, afastando-me do estabelecimento.


_Eu sabia que você a deixaria vencer. – Edward protestou, em tom de voz muito baixo.


_Não se tratava de uma competição. – Foi minha vez de protestar. – Edward, você disse que o casamento é meu e a escolha é minha. Pois escolhi, quero que Alice decida tudo. Não entendo nada disso mesmo… estou confusa e vocês dois só discutem. Quero estar com você, com Charles, quero aproveitar vocês dois e não passar horas escolhendo rendas e flores. Foi antes de ontem que meu filho nasceu, antes de ontem que saí do covil, antes de ontem que retomei minha vida. Vida, existência, seja o que for que chamemos isso.


_Realmente, o trauma lhe fez uma mulher diferente. – Ele beijou meus cabelos. – Diga-me, para onde vai me levar?


_Quero ir aonde vão os humanos quando saem em família.


_Eles vão ao parque. Mas está frio.


_Há crianças humanas brincando?


_Sim, sempre.


_Então leve-me ao parque. Charles precisa alimentar-se, será o momento certo.


Humanidade, era o que eu teria. Edward nos colocou dentro do Volvo prata e dirigiu até o parque. Ao longe eu pude ver, realmente, crianças brincando. Muitas delas, e seus pais ao redor, observando ou simplesmente conversando. Seríamos nós, naquele momento. Pais que observavam. Nosso filho, no entanto, não poderia brincar com outras crianças. Eu esperava que, em algum momento, ele pudesse. Eu esperava que Charles fosse exatamente como todo híbrido, inofensivo para os humanos. Que o sangue humano não lhe causasse transtornos; que ele fosse capaz de superar. Como eu superei; como outros híbridos sempre superaram. Mas naquele momento não, ele era um bebê e estaríamos ali apenas para diversão.


Sentamo-nos em um local mais reservado, próximo a um jardim. Eu podia ver as crianças correndo e divertindo-se em um espaço só delas. Fazia bastante frio, mas as pessoas ainda assim pareciam não se importar.


_Você acha que ele vai gostar disso? – Apontei para a mamadeira, que estava dentro da bolsa azul que Esme havia arrumado para Charles.


_Você gostou, logo da primeira refeição. – Edward recordou-se da minha primeira experiência com alimentos humanos. – É provável que ele ainda não tenha consciência suficiente da importância que é alimentar-se com comida humana.


_Você poderia pedir a ele que tentasse.


_Como se ele me entendesse. – Edward riu.


_Ele sempre entendeu você. – Considerei. – Desde quando ainda não havia nascido.


Edward franziu a sobrancelha e olhou para Charles. Os olhos dos dois se mantiveram ligados por alguns segundos, como se eles estivessem se conectando à mesma frequência.


_Sua mãe afirma que você me entende, então espero que ela não se decepcione. Você entende, Charles Henry, que você é um ser diferente de outros seres. Sua existência é diferente… e você precisará aprender a lidar com isso. Sua mãe quer lhe oferecer algo que poderá ajudar bastante em sua adaptação ao mundo. Seria bom se você provasse… não é tão ruim assim, ela gosta.


Eu ri, de uma forma bastante espontânea, enquanto Edward conversava com Charles. Ele era formal, quase como se estivesse dirigindo-se a uma autoridade importante. Talvez Charles fosse, para ele, uma autoridade. Aquilo explicaria os olhares reverenciais e a admiração dele para com o filho. Mas apesar de tudo Charles era um bebê, e por mais fantástico que ele fosse, seria mais simples se Edward usasse um vocabulário mais simples. De qualquer forma, eu decidi arriscar e tomei nas mãos a mamadeira, oferecendo-a a Charles.


A reação de um híbrido ao alimento humano não era das melhores. A minha foi chocante. Eu recusei alimentar-me por várias semanas, meses. E o aroma sempre me causou irritação. Certamente, imaginei que Charles fosse sentir a mesma repugnância ao alimento viscoso e adocicado. Mas acabei por surpreender-me, e aquela surpresa me fez rir ainda mais. Ao primeiro contato do alimento com a pequenina boca de Charles, seus lábios se prenderam ao bico plástico da mamadeira e ele começou a sugar o leite. Franzi os lábios e o observei por alguns instantes. Seus olhinhos estavam circundados por marcas arroxeadas, mas ele os tinha fechados. Lentamente, Charles sugou todo o conteúdo da mamadeira, sem recusá-lo em nenhum momento.


_Eu disse que ele te entendia. – Falei para Edward, em êxtase.


_Por incrível que possa parecer, ele gostou. – Edward também sorria. – Ele realmente gostou… seus pensamentos estão tão claros… apesar de serem tão inconclusivos e relacionados a cores.


_Você sabe que me sinto vivendo em uma dimensão paralela, não sabe Edward? Você sabe que eu ainda não estou concebendo tudo isso… que as coisas parecem finalmente estão dando certo, que eu não corro nenhum risco, que nenhum de nós corre nenhum risco; que estamos juntos e dessa vez nada vai nos atrapalhar. Eu ainda não aceitei o fato de que eu estou vivendo a vida que eu sempre imaginei, mas que nunca poderia ser destinada a mim porque eu sempre fui, e sempre serei, um monstro.


_Sim, eu sei. – Edward me abraçou forte, talvez até mais forte do que deveria. – Eu sei e eu não acho que deva sentir-se assim. As coisas dão certo, mesmo para monstros. E você não é um monstro. Foi você que me fez ver que eu também posso não ser um monstro. Que talvez eu possa viver, existir, plenamente sem ser um monstro.


_Nunca seremos humanos. – Olhei em seus olhos, com angústia.


_Isso nunca importará. – Edward delineou os contornos da face de Charles, que parecia ansioso. Conscientemente, mesmo em meio a tantas pessoas, mesmo em público, ele tomou meus lábios para si em um beijo úmido, demorado, inesperado. – O sentimento é o mesmo.


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