Joey se sentia horrível. Acordara passando mal, o estômago revirado, só de embarcar para Minnesota em duas horas.

        - Vamos, filho, se anime. Casa nova, vida nova – disse a mãe, do banco da frente.

        - Mas eu não quero uma vida nova, mãe!

        - Não reclame, filho. Pessoas vêm e vão. Algum dia nós podemos vir visitar seus amiguinhos.

        - Não vai ser a mesma coisa.

         - Eu sei que não, mas por enquanto o jeito é esse.

        - Alguém me mata! – ele dizia, olhando para fora da janela. Sabia que se Wandinha estivesse ali, seria a primeira a se voluntariar, o que só aumentou seu desprazer.

        - Amor, é melhor falar com seu filho.

        - Eu não posso parar o carro agora, a gente vai perder o vôo.

        - Se você não quer que eu cause um acidente aqui, é melhor parar naquele acostamento! – ela ameaçou, obrigando-o a fazer uma curva perigosa.

        - Joseph, escuta, querido. Essa mudança é para nosso próprio bem. Lá em Minnesota é legal. Lembra quando você disse que queria ser jogador de hóquei?

        - É. Quando eu tinha cinco anos. Pai, o que eu quero mesmo é ficar aqui, curtir meus amigos, aproveitar a vida.

        - Essa mudança já é uma decisão tomada. Não há nada que você possa fazer para mudá-la. Agora, você pode escolher ir do jeito fácil ou do jeito difícil.

        - Do fácil, pai – ele disse, vendo que aquilo tudo não ia levar a nada.

        - Isso mesmo. Um sorriso?

        Joey deu o menor sorriso que conseguiu.

        - E agora, tá feliz?

        - Muito – disse o pai, e voltou a dirigir.

        Joey foi o caminho inteiro observando as árvores que passavam, e os lagos, que eram cada vez menos, a medida que se aproximavam da estrada. Passaram também pelo parque em que fizeram o piquenique com tia Franie. Aquilo, ele nunca ia esquecer.

        Chegaram no aeroporto e fizeram o check-in.

        Foram as piores horas da vida de Joey. Tudo o que queria era voltar para casa, mas se recordava de que jamais voltaria.

        Dali para frente, seriam só ele e suas lembranças.

        - Pronto, vôo 2965, é o nosso – disse Sra. Anderson, puxando Joey pelo braço em direção ao portão de embarque.

        Joey deu uma boa olhada em volta. Aquela seria sua última visão de Cemetery Lane. Viu as pessoas, suas bagagens, placas... E bem no canto do andar, perto das escadas rolantes, viu uma garota de tranças vestida inteira de preto, ao lado de um garoto de camisa listrada.

        “Wandinha e Feioso?”, ele pensou, mas só teve certeza quando os irmãos o avistaram, e fizeram sinal para que Joey se juntasse a eles.

        Ele não pensou duas vezes. Agarrou sua mochila, pôs nas costas, e soltou seu braço da mão da mãe, saindo em disparada na direção deles.

        - Joseph! – Sra. Anderson chamava, em vão, parada no portão de embarque, causando um congestionamento no aeroporto.

        Joey correu com tudo o que pôde para longe daquela loucura. Passava sob pernas, pulava sobre malas. Só o que ele não sabia era que a verdadeira loucura estava prestes a começar.

        Assim que se viu próximo a Wandinha e Feioso, os abraçou com tanta força que quase os derrubou para trás.

        - Depois, Joseph – Wandinha dizia – Agora, nós temos que sair daqui depressa. Sua mãe já tá vindo aí.

        Os três subiram o mais rápido que puderam, e a mãe ainda os perseguindo.

        - Ela tá chegando perto! O que a gente faz? – Joey perguntou.

        - Pula a janela – disse Wandinha, agarrando-o pela camisa, saltando pela janela do aeroporto.

        Para sua surpresa, eles aterrissaram bem no guindaste de lavar janelas, empurrando para fora um pobre funcionário.

        - Desculpe! – Joey gritou para o homem, que ainda caía.

        - Tio Fester, pode subir! – Feioso pediu.

        Imediatamente a plataforma começou a subir.

        - Legal te ver de novo – disse Joey.

        - É, resolvi bolar um plano, afinal – respondeu Wandinha – Sabe... É estranho de explicar... Eu meio que quero você por perto, sempre.

        - Tenho certeza que assim vai ser muito melhor. Eu e você juntos – ele disse, segurando a mão dela – Sabe, eu não me preocupo mais, porque sei que tudo vai ficar bem. Tudo fica bem com você por perto.

        Assim que chegaram ao topo do edifício, tio Fester, segurando Bicho nos braços, mostrou as escadas de emergência. Os quatro desceram as escadas rapidamente, sem nem se encontrar com Sra. Anderson.

        Quando chegaram à rua, e viram o carro funerário da família, imediatamente pularam para dentro dele.

        - Para onde nós vamos? – perguntou Joey.

        - Para casa, mi amigo. Hoje é noite de tango! – disse Gomez, animado, no banco da frente – Aliás, todo dia é! Certo, cara mia? – ele perguntou, cobrindo de beijos o braço da esposa.

        - Claro, mon cher – ela olhou para Joey – E... Joseph... Eu queria dizer que... Se vocês quiserem, continuar aquele seu namorinho... Bem, contem com o meu apoio – Joey abriu um sorriso de orelha a orelha – Mas se você fizer uma coisinha – por menor que seja – que magoe minha filha, então teremos uma conversinha. Você, eu e meu machado.

        Isso não tirou o sorriso de seu rosto, sabia que faria o máximo para que Wandinha ficasse... hum... infeliz?

- Finalmente – disse Joey – Tudo voltou ao normal! – ele virou para o lado, pegou a mão de Wandinha e deu-lhe o mais longo beijo de agradecimento que pôde.

        Joey passou os próximos três meses morando na casa dos Addams, até que sua família o encontrou.

        Bastante assustados com até onde o filho pôde ir para evitar a mudança, os pais de Joey decidiram cancelá-la, e recuperaram a casa do outro lado da rua.

        Joey passou cada dia desde então visitando os Addams, como sempre fizera.

        E no fim, tudo acabou bem.