Cursed To Death escrita por anearlywitch


Capítulo 7
Prisão




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A sala onde eu me encontrava não era nem um pouco amigável, mas eu não me importava. Eu tinha entrado em um tipo de transe, onde eu não conseguia parar de pensar naquela noite. Não era por falta de vontade: eu tentei me convencer de que eu estava com sono, que nada daquilo fora real, que era um efeito colateral da terapia, que eu estava imaginando coisas. O problema é que a imagem dele com aquele moletom não quer ir embora, parece que foi impressa na minha face. Eu não me importo com mais nada, eu só quero vê-lo de novo. É o que eu peço.

O médico discute com o anestesista, que estava contestando o que o homem iria fazer. Tudo o que eu conseguia fazer era observar o teto, pensando em como um anjo poderia descer e me resgatar. Como eu merecia uma ajuda.

O homem magro se aproxima, escolhendo uma das seringas. "Eu acho errado, sabe. Continuar com a eletro. O Dr. Morgan acha que é o melhor, no entanto" ele suspira e procura mais na sua caixinha. "Já volto" ele diz - não tenho certeza se fora pra mim ou para o médico - e sai com pressa.

Eu me ponho a pensar em como tudo isso tinha se desenvolvido. O que aconteceria se nada disso tivesse acontecido? Minha banda com o Jon tinha poucas músicas formadas, e, pensando melhor agora, eu não sei se teria dado certo. Mas nada é certo, e talvez se nós tivéssemos algum sucesso eu não estaria aqui, preso na St. Andrews, fazendo tratamento de choque à força. Talvez minha vida tivesse ido para o rumo certo, como eu pensava que iria. Talvez eu poderia criar uma relação, casa, filhos. Mas agora eu sei que nada disso vai ser possível – e se for, vai demorar. E muito.

O anestesista chega, e eu não me importo em olhar para o seu rosto, então eu só estico meu braço. Eu sinto a picada, rápida e quase indolor, passando pela minha pele. Estava demorando tempo demais dessa vez, então eu flexiono minha cabeça para frente, procurando a face do homem.

O que eu encontro não é o que eu espero.

"Brendon! Brendon! Espera!" eu grito enquanto ele se vira, a face branca e sem emoções indo consigo. Eu tinha certeza do que eu estava vendo. Eu grito mais alto, procurando alguém que o parasse, por favor, eu preciso falar com ele.
Eu tento me levantar, mas pateticamente caio no chão, o efeito da anestesia fazendo efeito rapidamente antes de eu cair no sono.

***

Suas mãos tocavam o meu peito nu, formando pequenos círculos em todo o seu comprimento. Eu conseguia sentir seu hálito enquanto ele ria perto do meu pescoço.

"Ela começou a gritar, e eu tive que correr mais rápido que um ninja e finalmente entrar no nosso ônibus" ele ri mais alto, arrumando melhor o seu rosto no meu peito.

"Fãs" eu suspiro, um enorme sorriso no meu rosto.

"Fãs".

Ele levanta sua cabeça e olha para mim, os olhos cheios de brilho. "Eu nunca esperei ser tão feliz"

Eu rio e pressiono meus lábios na ponta do seu nariz, e ele faz uma careta e depois me beija lentamente. O tempo não passava em volta de nós, e tudo que me interessava era o calor que eu sentia pressionado ao meu corpo.
Ele se aconchega nos meus braços novamente, e eu o deixo dormir, ao mesmo ritmo em que meus olhos fecham lentamente, e tudo o que eu sinto é a sua respiração, constante e calma, antes de começar a sonhar.
***

"Ryan. Ryan, psh" algo cutucava, forte, meu braço.

"Ryan"

"Ryaaaaan"

Eu finalmente acordo, e a primeira coisa que vejo é um pouco desconfortante. "Ana? Mas que po-"

"São dez e meia, você já perdeu o café"

Eu a fito, tentando assimilar tudo o que estava acontecendo. "Droga, eu realmente queria um pouco daquele delicioso cereal" eu falo, um pouco rude e irônico, mas depois me lembro de como a situação dela era delicada. "Mas não importa, não é? O que você está fazendo no meu quarto?"

"Eu fiquei preocupada" ela diz, baixo, olhando para seus pés descalços. Seu cabelo estava preso em um coque mal feito, mas ele ainda assim estava elegante. Bem, elegante para um sanatório.

"Tudo bem," eu me levanto, procurando um casaco, "você quer caminhar?"

Seus olhos se abrem ao mesmo tempo em que o seu sorriso. "Adoraria!" ela espera eu colocar meu casaco, meu cachecol e meus chinelos e estica o braço para mim, e nós andamos até o jardim.

Estava frio, como eu previra, e ela não estava vestida para o frio - ela usava uma calça justa e uma camiseta de colégio antiga - mas se recusava a voltar ao dormitório e insistia que não estava com frio.

"Enfim, com quem você estava sonhando?"

Eu pisco. "Como?"

"Você estava sorrindo. Que nem um idiota" ela sorri e aperta mais meu braço ao redor do seu. Ela era uma das pessoas mais confiáveis desse lugar, tirando algumas das poucas crises que ela tinha. Fora isso, ela sempre fora adorável e compreensiva.

"Eu não estava sonhando" eu minto, olhando para as nuvens negras no horizonte.

"Dãh, você não me engana" ela aponta para o próprio rosto, as unhas vermelhas mais vibrantes por culpa do sol.

Eu suspiro. "Brendon"

"De novo? Ryan-"

"Eu vi ele ontem"

Ela para de caminhar e se desvincula de mim, olhando nos meus olhos cansados com preocupação. Depois de um tempo ela pergunta, "Como foi?"
Esse era o bom da Ana: ela não questionava. Ela simplesmente confiava em mim a ponto de acreditar em toda essa história de fantasmas sem contestar um simples ponto.

"Ele falou comigo. E quando os enfermeiros estavam chegando, ele se foi"

Ela olha para o nada por alguns instantes e depois enrola seu braço no meu novamente, recomeçando a andar. "Ele estava feliz?"

Eu penso um pouco. "Assustado"

"E você?"

"Assustado" eu quase sussurro, olhando para seus olhos azuis com profunda honestidade.

Ela suspira e coloca um braço ao redor dos meus ombros. "Qualquer coisa que você precisar, pode contar comigo" ela sorri e aperta meu ombro com delicadeza.

"Você não pode. Eu-," eu olho para o horizonte novamente, "eu só quero sair daqui"

Ela sorri. "Nada é impossível"
***

Hoje era dia de visitas, e eu não conseguia mais esperar para ver o Spencer e o Jon. Eu precisava desabafar com alguém que me escutasse - e que fosse, principalmente, sã. Eles já não vinham faz um bom tempo, e eu começava a me questionar como que eles estavam indo. Será que o Jon finalmente abriu um abrigo para gatinhos?

Eu estava sentado em uma mesa, as mãos sujas de tinta. Ótimo dia esse, onde eles nos fazem sentir como crianças na pré-escola. Bem, a maioria das pessoas aqui ainda são, de certo modo. Eu tinha simplesmente jogado tinta no papel, movendo meus dedos sem nada que pudesse se tornar em uma forma concreta. Isso era relaxante, de certo modo. Ajudava a esquecer.

Minha mistura multicolorida agora parecia um céu, alaranjado, esperando pela escuridão da noite. Esperando pelas trevas, aliada de muitos, inimiga de outros.

Eu olho para a esquerda, e vejo vários adultos se divertindo, usando os dedos, alguns o cotovelo, os pés. Uma baixinha usava o nariz. Tudo estava no status quo.

Eu passo os olhos e vejo a Ana, sozinha em uma mesa, concentrada em um papel cheio de formas pretas. Eu resolvo deixá-la fazer o que ela quer, voltando à minha mistura. Eu resolvo pegar uma caneta preta, a mais grossa, e faço pássaros pelo o meu céu laranja. Isso me lembrava do passado, aquele passado que parecia tão distante, mas ao mesmo tempo muito perto.

Para ser honesto, eu começava a questionar minha sanidade. Quer dizer, eu não conseguia vê-lo antes. Agora isso já ocupa todos os meus pensamentos, minhas ações e meu humor. Muita coisa para uma pessoa que eu considerava nunca mais ver na vida.

Tanto que, se eu espremesse meus olhos, se eu fizesse algum esforço criativo, eu conseguia ver uma forma familiar no meio da minha pintura desconexa.

***

"É necessário que você seja totalmente honesto" a mulher diz, uma sobrancelha erguida, esperando minha resposta anterior. Ela me lembrava da minha psicóloga, para falar a verdade. Ela tinha o mesmo coque, o mesmo olhar sob os óculos. A única coisa que a diferenciava era as roupas: aqui, totalmente brancas, sem exceções.

"É a verdade" eu digo, com a maior interpretação que eu conseguia. "Foi só aquela noite, e eu acho que fora efeito da medicação. Eu estava com insônia"

Ela pensa, olhando para seu papel. "Você conhece a Ana?" ela pergunta sem levantar o olhar.

"Sim"

"Ela realmente gosta de você, sabe" a mulher - não me dei o trabalho de decorar seu nome - cruza os braços e se recosta na cadeira. "Como um irmão. Ela confia em você. E também não para de falar de você"

"Ela nunca para de falar, então isso não me surpreende"

Ela suspira. "Ela me contou, Ryan. Como você disse, ela fala bastante".

Nesse momento, meus olhos já estavam no meu colo, procurando esconder a verdade evidente nos meus olhos. "E ela se preocupa com você. Ela falou do... Brendon" ela hesita, mas fala o seu nome.

"É mentira"

"Não, não é" ela se aproxima de mim, descansando os cotovelos nas suas próprias pernas. "Sabe, de todos aqui, você é o que mais me intriga. Você não parece doente"

"E EU NÃO SOU" eu grito, rangendo os dentes.

"Tenho certeza que não" ela diz, calma, e anota alguma coisa.

"Olha, eu tenho absoluta certeza de que minha mente é saudável. Eu não preciso estar aqui, longe dos meus amigos, não preciso de choques, nem de terapia. Eu só quero ir para casa". Minha honestidade transparecia por meus olhos - ou pelo menos foi a intenção.

A mulher suspira novamente. "Eu sei, mas... Ainda não podemos"

Eu podia sentir meus dentes se despedaçando. "Posso, pelo menos, esperar meus amigos?"

"Não acho uma boa ideia"

"Quer saber?" eu digo, me levantando, "vai se fuder"
***

“Não, Thomas, é a Martha”

“Martha! Quanto tempo, prima!”

“Na verdade-, ah, claro, primo” a mulher diz, a decepção evidente. Ela poderia ser qualquer coisa. Mulher, filha, tia, sobrinha. Ela não iria dizer o que realmente era, já que não queria ferir os sentimentos de uma pessoa doente. Claro que não. Totalmente fora de questão.

No momento em que os dois vão em direção ao jardim, eu me pergunto se meus amigos iriam aparecer. Eles não poderiam simplesmente desistir de mim. O Spencer disse, até, que ia abrir uma ação para me tirar daqui. Depois disso, eu podia jurar que eles me queriam em casa, sã e salvo. Pelo o visto não.

O portão estava se fechando, e eles ainda não tinham aparecido. Eu levanto e vou em direção à coordenação. Se eles iam me ignorar, eles deviam me dar um bom motivo para isso.

O homem que sentava na mesa pequena estava lendo um livro qualquer sobre espiritismo, e eu limpo minha garganta para demonstrar minha presença. Ele olha de cima do seu livro com um olhar entediado, e eu me sinto instantaneamente desrespeitado. “Pois não?” ele diz, o cinismo transparente.

“Eu quero fazer uma ligação”

“Todos querem”

“É importante”

Ele me analisa alguns instantes. Ele pega uma prancheta em baixo da sua mesa, passando a caneta por uma lista. “Qual o seu nome?”

“Ryan. Ryan Ross”

Ele procura por mais alguns instantes e bate a tampa da caneta em uma linha. “Eu receio que não posso autorizar, senhor Ross”

“O quê?”

“Aqui na lista diz que você não pode fazer ligações”

“Por quê? Eu pensei que era permitido aqui”

“Pois é, você está na listinha ‘NOPE’” ele diz, ironicamente, e volta a ler o seu livro.

“Quem fez essa lista?” Eu já estava começando a ficar irritado.

“Não posso divulgar essa informação” ele diz sem tirar os olhos do livro.

Eu saio rapidamente, batendo os pés, e me sento em um banco do jardim. Tudo aquilo estava suspeito pra mim.

Primeiro: meus amigos não me visitavam desde muito tempo atrás, e eu garanto que eles não fariam isso comigo.

Segundo: por que não me deixariam fazer uma ligação? Eu nunca fui um problema aqui – fora a vez em que eu tentei, em um momento de desespero – fugir na primeira semana. Aquilo piorou minha reputação, mas não acreditava a ponto de me restringirem uma merda de ligação.

Terceiro: eu pensava que a terapia que eu estava fazendo era algo ocasional, mas agora era mais frequente do que antes. Aquilo estava começando a me deixar com sequelas, como dor de cabeça, dificuldade em pensar, e devo admitir que eu estava ficando cada vez mais obcecado pela a visão que eu tive. Aquilo com certeza foi um efeito colateral.

Eu deveria começar a fazer uma lista.

Eu sinto alguém se sentando, e quando olho, percebo que é a Ana, ofegante, com um papel em mãos. Ela estava com um vestido floral adorável, mas eu não sei por que eu pensei nisso em primeiro lugar. “Você quer a liberdade?” ela pergunta, o tom de um comercial antigo. Eu rio com a imitação. “Bem, felizmente, você é amigo da pessoa certa!” Ela gesticula para o papel. “E ela tem a solução”

“Ana...”

“Eu achei a sua resposta” ela volta para a sua voz natural, me fitando com sorriso nos lábios. “Agora é com você, Ryan Ross. Você quer mesmo sair daqui?”






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